O AUTORITARISMO

01-12-2010 00:45


O autoritarismo não é propriamente um sentimento, mas um modo de ser, uma atitude, em que a criatura impõe ou tenta impor a sua vontade aos seus semelhantes. Na maior parte dos casos ele é dispensável, só encontrando guarida nas pessoas prepotentes, ávidas de poder, já que implica no cerceamento do livre-arbítrio das criaturas.

Ao discorrer sobre esse tema, vamos considerar seus aspectos e influências na vida familiar, nas relações interpessoais e na política.

É essencialmente necessário cuidar da educação e formação do caráter das crianças como dever primordial da união familiar, de modo a prepará-las para a vida nos embates que irão ou terão que enfrentar, a cada momento, como adultos. Colocando amor, dedicação e carinho, além de muita tolerância, paciência e compreensão nessa transcendental tarefa, jamais será preciso utilizar-se da força ou do autoritarismo para conseguir os resultados desejados.

A criança aceita, de bom grado, tudo o que lhe é transmitido, porque está ávida de conhecimentos. Gradativamente, dia após dia, semana após semana, mês após mês, no decorrer dos anos, ela vai assimilando conhecimentos e construindo a sua experiência de vida através dos ensinamentos que recebe, das ações dos adultos, que sempre observam com muita atenção. Por isso, é preciso dar bons exemplos de conduta, própria de cada um, pois os exemplos falam mais alto e marcam indelevelmente a mente dos infantes, que nos cobram por isso o tempo todo.

Na verdade, já a partir do nono mês, o bebê começa a se pôr em contato com situações de liberdade e restrições, fase em que a autoridade dos pais funciona através do olhar e das expressões faciais mais simples. De um a três anos, ela se inicia no mundo das palavras e já entende o significado de algumas seqüências vocálicas mais simples. Somente após o terceiro ano e até o sexto ano de vida começa a criança a organizar os pensamentos e a respeitar a hierarquia familiar. Nesta fase é importante ela saber qual é o seu espaço dentro da casa, já que o seu “eu” começa a despontar com muita força. Aos sete anos, a criança começa a desenvolver o raciocínio lógico, sendo próprio, nesta fase, acentuar os momentos de diálogos sobre os temas centrais mais expressivos da vida. Após os onze anos, já adolescente, desenvolve o raciocínio abstrato e está em condições de começar a entender os porquês dos temas mais avançados, já que se acha em pleno desenvolvimento da inteligência e, até mesmo, da consciência de si mesma como criatura humana, sendo, portanto, uma fase própria para consolidar as noções de ética e de conduta.

Nesse cenário, nesse palco de fundo, por anos e anos, os pais têm a oportunidade, a responsabilidade e o dever de semear em terreno fértil para colher boa colheita, formando criaturas fortes e de bom caráter. Suas relações com os filhos deverão sempre ser conduzidas em ambiente de franca camaradagem, de respeito mútuo, de compreensão, de paciência e de tolerância, colhendo a amizade natural que os filhos gostam de nutrir e, sempre que podem, nutrem por seus pais. Não importa o grau de instrução dos pais ou sua posição social. O mais importante é cercar de carinho essa relação, desde a mais tenra idade da criança, que tudo percebe, até mesmo muito além de nossa imaginação. Não impor nada, não usar de autoritarismo para impor idéias e sentimentos, refreando o egoísmo, a vaidade e a presunção, o que não significa que não se deva agir com firmeza benfazeja em muitas situações. É preciso não confundir entre ter autoridade e ser autoritário para não se tornar demasiadamente liberal. É preciso saber evitar que a criança fique perdida entre o que é proibido e o que é permitido, para que esse quadro de dúvidas não venha abalar o processo educativo. Da mesma forma, como cada um dá valor ao seu livre-arbítrio, os pais devem procurar transmitir a necessidade de as crianças cultivarem esse valioso atributo espiritual com responsabilidade, para que possam agir com liberdade dentro de sua esfera de ação, sem ferir o mesmo direito que seu semelhante também possui, sempre respeitando as leis naturais e as leis vigentes em cada país.

Os eventuais defeitos de conduta que possam surgir durante a formação do caráter das crianças deverão ser tratados face a face, olhos nos olhos, com franqueza, com conversa aberta e franca, dando-lhes a oportunidade do diálogo e da contra-argumentação. É possível ser imperativo, determinado e firme, sem ser autoritário. Lembre-se, sempre, que é mais fácil e possível desentortar uma planta pequenina do que quando se torna grande e forte. É dever dos pais conseguirem esse objetivo sem esmorecimento e disso deve fazer o principal empenho de suas vidas.

Nas relações interpessoais, entre adultos, o autoritarismo deve ser evitado a todo custo. Nas relações de trabalho nas empresas, mesmo naquelas em que as organizações são bastante hierarquizadas, através de organogramas de trabalho muito sofisticados, devem os chefes evitar o autoritarismo, porque este priva as criaturas de sua liberdade criadora, submete-as à humilhação e desagrega a sua auto-estima. Melhor seria que as posições de chefias fossem exercidas através de lideranças autênticas e consentidas, em ambiente de extrema camaradagem e respeito mútuo, sem orgulho e sem vaidade, lembrando sempre que o todo é a soma das partes e, portanto, cada parcela de trabalho é necessária para assegurar o bom funcionamento dos órgãos de produção, da mesma forma como, no organismo humano cada órgão é absolutamente necessário para assegurar e manter a boa saúde do corpo.

Nos órgãos públicos e na política é onde vemos, com mais freqüência, o império do autoritarismo criar raízes e se multiplicar. Isso não quer dizer que não tenha que haver hierarquia nas organizações privadas e públicas, mas esta tem que ser exercida com disciplina, ordem e, sobretudo, com muito espírito de justiça. Os políticos recebem um mandato e, por isso, não devem se esquecer que, numa democracia autêntica, são legítimos representantes do povo que os elegeu, cabendo-lhes representá-lo em seus anseios e necessidades expostos e aprovados em programas de campanha. Portanto, deveriam dar o melhor de si ou, pelo menos, se esforçar para, nos embates das idéias, introduzirem o que for necessário no corpo das leis, em consonância com os referidos anseios. Mas, infelizmente, não é isso o que acontece. O que vemos, a toda hora, é prevalecer o jogo de interesses particulares, pressionando e corrompendo aqueles que são a maioria, orgulhosa e gananciosa, de caráter duvidoso e de vaidade aflorada nesta vasta fogueira de vaidades! Os interesses maiores, de cunho geral, são deturpados e distorcidos, disso resultando leis iníquas e de aplicação complexa e duvidosa. A prepotência de muitos e a resistência de outros, obstruindo as votações nas reformas sabidamente necessárias, levam ao desgoverno e às revoltas populares de conseqüências imprevisíveis. É, portanto, de maior significado ressaltar que a ética da responsabilidade deve acompanhar todos aqueles que possuem cargos públicos e servir de verdadeiro antídoto ao autoritarismo e à corrupção.

Muito pior ocorre nas organizações ditas policiais, criadas para manter a ordem e a segurança na sociedade. Aqui, o autoritarismo, em nome da segurança, reina altaneiro. Vemos, a toda hora, na mídia e ao vivo, cenas de repressão de causar arrepios, mesmo nas pessoas mais insensíveis. Os agentes de segurança, pagos pela sociedade para garantir o sossego e a paz para melhor convívio dos homens, não raro, voltam-se contra essa mesma sociedade, deixando de cumprir os seus elevados deveres. Nas batidas policiais e, principalmente, nos inquéritos, exorbitam-se da autoridade de suas funções e torturam aqueles que caem nas suas malhas, na sanha frenética de obterem confissões forçadas, submetendo essas criaturas a condições subumanas, sob o ímpeto de seus instintos bestiais. É a violência gerando violência, através do autoritarismo levado ao extremo. Muitos desses fatos são expostos pela mídia e arregimentam boa parte da sociedade para a eles se oporem, na forma de organizações não-governamentais de âmbito nacional e internacional, criadas para a defesa dos direitos humanos.

Atos como esses causam revoltas na população, extremando o seu estado de ânimo e contribuindo para a deterioração do convívio humano. Somente com a evolução da espiritualidade das criaturas, da compreensão e do real significado de suas vidas, da necessidade de elevar seus sentimentos de amor e solidariedade de uns para com todos, será possível mudar o rumo dessas nefastas ações e caminhar firme para a eliminação do autoritarismo que sempre se fundou no falso princípio de que uns são melhores e mais poderosos que outros, em contraposição ao princípio cristão de que todos são, em sua essência, iguais perante o Todo.