JUSTIÇA
A justiça é a aplicação do direito, isto é, a competência ou capacidade de dar a cada um aquilo que é seu, dentro do melhor direito e de acordo com o a melhor consciência dos atos e fatos. Na prática, ela se realiza através das instituições do Poder Judiciário e de acordo com a especialização de cada uma delas, em consonância com as leis constituídas de cada país ou nação.
É preciso ter sempre em mente que não existe direito sem deveres e obrigações. A cada direito cabe um dever. Essa noção é tão fundamental como a noção do certo e do errado, que é inata no indivíduo. Aqui, temos o que chamamos de direito natural. Um direito se diz natural quando ele emana da própria essência do ser. Assim, quando dizemos que toda criatura deve ser respeitada por seu semelhante, como ser humano que é, estamos lidando com um direito natural; mas, em contrapartida, essa criatura, por sua vez, precisa respeitar a outra. Daí, o princípio de direito natural bem conhecido que lembra que o direito de qualquer pessoa termina onde começa o direito da outra. É a invasão da esfera de livre ação do direito de um pelo do outro que gera os conflitos, os quais demandam a ação da Justiça.
Sendo o homem imperfeito, as sociedades por ele constituídas são, também, imperfeitas. Em decorrência, as leis instituídas por cada povo, a despeito de levarem em conta os preceitos da boa moral, da tradição e costumes são, também, falhas, apesar do grande esforço que os poderes constituídos fazem, procurando atualizá-las constantemente para se ajustarem ao progresso e à evolução das sociedades a que servem. Isso, falando do direito substantivo, ou seja, da coletânea de leis, tais como foram criadas para a sua aplicação.
Passando-se para a realidade da aplicação das leis e da justiça tudo se torna mais complexo e embaraçoso por causa dos artifícios introduzidos durante o processo pelas partes envolvidas no conflito, seus defensores legais ou advogados e o juiz e seus auxiliares, a quem cabe o dever profissional de aplicar a justiça em concreto. Os caminhos e descaminhos a que está sujeito o processo de apuração da verdade ou pseudoverdade sofrem muitas interferências, inclusive de falsas provas escritas e faladas, isto é, documental e testemunhal. Assim, quando enfim, decorrido muito mais tempo do que seria lícito esperar, a sentença é proferida pelo juiz, a justiça proclamada é quase sempre uma injustiça. Daí, a criatura perder a paciência e querer fazer justiça com as próprias mãos é um passo!
Já o conjunto das leis constituídas de um país, que disciplina a conduta dos seus cidadãos face uns aos outros e perante o Estado é bem mais complexo e o não conhecimento das leis não constitui desculpa para que as mesmas deixem de ser aplicadas e se faça justiça, toda vez que forem desrespeitadas. Mas, isso constitui o objeto, a finalidade mesmo do Direito Substantivo e do Direito Objetivo. O primeiro constitui a estrutura das leis de que se vale a Justiça para concluir se um direito foi ofendido ou não; já, o segundo cuida do processo e das formalidades da execução das sentenças judiciais. Trataremos aqui da justiça natural, da justiça como moral de conduta.
O conjunto de regras de bem viver sobre as quais se apoia a conduta das criaturas faz parte de seu acervo espiritual e resulta da manifestação da consciência de cada um. Quanto mais apurada e depurada a consciência através da experiência e longa convivência com seus semelhantes, processada em centenas ou até milhares de encarnações, a criatura vai se posicionando sempre de uma forma mais apropriada e mais perfeita no sentido de fazer e promover o bem geral, conduzindo com equanimidade e justiça as suas ações. Isso se chama evolução espiritual. Assim, toda vez que a criatura ofende o próximo ou invade a sua esfera de ação, praticando injustiças, estará se afastando do princípio fundamental da moral cristã: “Não faças a outrem o que não queres que te façam”. A quebra dessa lei natural e fundamental leva a criatura a praticar injustiças, afastando-se dos caminhos do Bem e incorrendo em faltas morais graves pelas quais terá que pagar, de uma forma ou de outra, não importa quando nem como. Lamentavelmente, essa lei é quebrada milhões de vezes por dia, em cada segundo que passa. Por isso, vivemos em um mundo doente, perturbado e caótico.
Ocorre, muitas vezes, que a criatura tem que enfrentar situações que surgem sem que, aparentemente, saiba explicar a causa, por mais que procure, principalmente nas grandes cidades, onde vivem milhões de indivíduos provenientes de várias localidades do país e de vários planos espirituais. Este torvelinho de pessoas, cada um com suas preocupações, carências, ambições e falhas de caráter, enfrentando situações muitas vezes adversas, usando o seu livre-arbítrio sem o respaldo do bom senso e do raciocínio, causam a seus semelhantes embaraços e prejuízos de toda sorte, não raro, difíceis de serem recuperados, quando não a própria morte através da violência desenfreada e perversa de seus atos. As situações de conflito que daí decorrem são inevitáveis e nem sempre a Justiça terrena alcança os resultados que supostamente eram esperados, ainda que tardia. Milhares e milhares de casos por dia não chegam a bom termo, tornando-se inevitáveis o expediente dos recursos protelatórios às instâncias superiores, o que, quase sempre agrava mais ainda os conflitos, lesando o direito da parte ofendida e, assim, cometendo-se injustiças de toda sorte que marcam indelevelmente as criaturas.
É muito provável que, cada um de nós, pelo menos uma vez na vida, tenha passado por situações de injustiça amarga e sofrida na carne e no bolso. É a lei de causa e efeito atuando na vida das criaturas que, quando não encontram uma explicação próxima ou remota dentro do panorama de sua atual encarnação, sentem-se desamparadas e injustiçadas. Nesses casos, a causa vem de vidas passadas em outras encarnações, de falhas cometidas pela criatura, cujo resgate está ocorrendo na atual encarnação, sem que disso se aperceba. Somente uma criatura esclarecida do real sentido da vida e que se conhece como Força e Matéria, conhecedora dos princípios espiritualistas, que tenha exata consciência dos deveres a cumprir, sabe compreender, atravessar e até superar essas situações de aparente injustiça, dando a volta por cima, como se diz popularmente. Assim procedendo, poderá evitar impulsos negativos que, muitas vezes, levam as criaturas a quererem fazer justiça com as próprias mãos, alimentado sentimentos de vingança, ódio e rancor que só trazem desgraças e agravam mais ainda a situação.
Existe um ditado muito bem certo que diz: “o que não tem remédio, remediado está pela sua própria natureza”, indicando que uma solução foi dada ou que nada mais há a fazer. E outro que sentencia: “a justiça tarda, mas não falha”. Consagrados pela sabedoria popular, ambos parecem ter o mesmo significado e sua aceitação não significa comodismo, conformismo ou pusilanimidade, mas ato de moderação e superioridade espiritual. Esgotados todos os recursos que a Justiça terrena nos pode proporcionar, se ainda assim, nos sentirmos injustiçados, o melhor que temos a fazer é procurarmos esquecer o problema e tratar de cuidar da vida. Jamais partir para fazer justiça com as próprias mãos ou continuar se remoendo por dentro. Nossa atitude deverá ser de olhar para frente e continuarmos nossa vida, lutando sempre para alcançar o progresso material e a evolução espiritual, caminhando de cabeça erguida, sempre sem nos deixarmos abater por coisa alguma. Os valores materiais que venhamos a perder podem nos causar dificuldades temporárias, mas nossos valores espirituais serão realçados e acrescidos pelas atitudes positivas que viermos a adotar e, isto é mais importante que tudo o mais, por ser permanente e definitivo. Olhando mais além de uma simples passagem e transitoriedade da vida terrena, podemos muito bem compreender o acerto de atitudes desprendidas e desapegadas dos bens materiais, que constituem quase sempre uma armadilha para a estagnação espiritual das criaturas.
Devemos lutar sim, mas por valores morais, procurando sempre desenvolvê-los e enaltecê-los em todas as atitudes que viermos ou tivermos que tomar, procurando garantir o fiel cumprimento de nossos deveres, tratando com equanimidade todos os problemas por que tivermos que passar. Procurando utilizar o nosso manancial de recursos e atributos espirituais, empregando somente os bons pensamentos, colocando a vontade em ação segundo os princípios da moral cristã, isto é, dirigidos somente para o bem geral da humanidade e aplicando o nosso livre-arbítrio de acordo com os ditames de nossa consciência, estaremos procurando ser justos conosco mesmo e com os nossos semelhantes. Caminhando pari-passu com esta justiça interior, plasmada em nossos bons atos, em consonância com a nossa própria consciência, estaremos eliminando, ou pelo menos, minimizando ou neutralizando grande parte das causas de nossos conflitos exteriores oriundos das nossas relações interpessoais com outras criaturas.
Ficar sempre alerta, não se descuidar nunca, porque o que se faz de errado em um segundo pode acarretar conseqüências muito desagradáveis na vida, causando abatimento e desânimo generalizado, difíceis de serem vencidos. Nunca reclamar de uma situação desfavorável ou conflituosa. Resolver o conflito com paciência e determinação, caminhar para novos empreendimentos de cabeça erguida, vontade firme e procurar esquecer as dores e agruras já passadas. Depurando-se lembranças tristes e reminiscências amargas tudo volta ao normal para que a criatura siga o seu plano evolutivo sem maiores tropeços, porque cada vitória alcançada reforça a confiança em nós mesmos.