A harmonia universal e a evolução espiritual

26-05-2012 15:03

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Caruso Samel

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A harmonia universal e a evolução espiritual

 

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A harmonia universal e a evolução espiritual

ISBN 85-98627-33-X

Outubro 2006

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                              

 

 

 

 

JUSTAS HOMENAGENS

 

 

 

“O universo é uma harmonia de contrários”.

 

Pitágoras

 

“Você não pode ensinar nada a um homem; você pode apenas ajudá-lo a encontrar a resposta dentro de si mesmo”.

 

Galileu Galilei

 

“O mais incompreensível do mundo é que ele seja compreensível.”

 

Albert Einstein

 

 “O espírito progride e evolui pelas encarnações que vai fazendo, mas se essas encarnações passadas de nada valeram, porque o presente demonstra tanta materialidade, procure-se a causa desse estado de coisas, de modo a que se promova a evolução dos espíritos. Esse preparo que vem faltando faz com que as criaturas passem à obsessão.”

 

Luiz de Mattos, in Clássicos do Racionalismo Cristão. v. 1,s.d, p. 30.

 

 

“O homem que se sabe servir da pena, que pode publicar o que escreve e que não diz a Verdade, deixa de cumprir um dever, comete o crime de covardia, é mau cidadão.”

 

Júlio Ribeiro, filólogo, citado por Luiz de Mattos in Pela Verdade, 9ª edição, 1983, p. 32.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

DEDICATÓRIA

 

 

 

Este livro, escrito sob o primado da Razão, é dedicado a todos os livres-pensadores, a todas as pessoas de boa vontade e aos que pensam, um dia, se libertarem dos maus hábitos, dos vícios, das imperfeições, do misticismo obscuro, das crendices e das superstições, que tanto alienam os seres humanos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

S U M Á R I O

Justas homenagens                                                                4/7

Dedicatória                                                                            5/9

Sumário                                                                               6/11

Prólogo                                                                                7/13

 

PRIMEIRA PARTE: NOSSA REALIDADE OBJETIVA

Capítulo 1- O Universo                                                      10/19

Capítulo 2 - Força e Matéria                                               24/35

Capítulo 3 - Os caminhos da Evolução                                      37/51

Capítulo 4- Metodologia Científica                                   59/75

Capítulo 5 - Verdade, Realidade e Paradigma                            59/91

 

SEGUNDA PARTE: UMA REALIDADE MAIS ABRANGENTE

Capítulo 6 - O surgimento do espiritismo                         91/115

Capítulo 7 - O advento do Racionalismo Cristão                    103/129

Capítulo 8 - A Força Inteligente                                              110/137

Capítulo 9 - A primazia do espírito                                 134/165

Capítulo 10 - A importância do pensamento                           158/193

Capítulo 11 - A aura: espelho da alma                                     167/203

Capítulo 12 – A mediunidade                                         177/215

Capítulo 13 - A intuição: nossa bússola                          195/235

Capítulo 14 - O livre-arbítrio constrói o destino             213/255

 

TERCEIRA PARTE: INDÍCIOS E EVIDÊNCIAS

Capítulo 15 - Casos sugestivos de reencarnação             223/269

Capítulo 16 - Experiências de quase-morte                             239/289

Capítulo 17 - Regressão às vidas passadas                      262/313

 

QUARTA PARTE: EPÍLOGO

Capítulo 18 - O despertar da espiritualidade                           274/329

Capítulo 19 - Ultimatum à racionalidade                        284/341

PRÓLOGO

.

 

Esta obra não foi escrita para descrever e explicar o inexplicável – Deus. Muitos filósofos, cientistas, religiosos, místicos e até matemáticos, tentaram explicar a existência de Deus. Mas, suas “explicações”, com pouquíssimas exceções, não passam de “embromações” sem pé nem cabeça, faltando nelas um mínimo de racionalidade e espiritualidade. Muitas dessas pessoas fundaram seitas e religiões baseadas em seus credos ou em de seus mestres predecessores, materializando, às suas imagens, o conceito de Deus, para melhor servirem aos seus propósitos terrenos. Outros, agindo como espertalhões, impingiram a idéia de Jesus-Deus ou Jesus-filho de Deus, para ser adorado pelos ignorantes como salvador da humanidade, como se fazia nas primitivas eras do paganismo com os ídolos. Poucos, muito poucos, através de intuições, às quais damos um sentido mais amplo e profundo do que a meditação assimilaram, o significado imaterial de Deus, sentindo essa grandeza universal no seu contexto maior das leis universais e imutáveis que tudo regem.

Essa obra é dedicada a todos, indistintamente, que são livres-pensadores, mesmo sabendo o autor que os princípios nela expostos não serão por todos aceitos, muito menos assimilados, sendo até mesmo repelidos, a priori, por muitos. Mas o nosso objetivo maior é atrair a atenção dos pesquisadores e doutores de todas as ciências, principalmente os físicos, médicos, biólogos, psicobiólogos, fisiologistas, neurocientistas, psicólogos, parapsicólogos, filósofos e, até mesmo, os céticos em geral, convocando-os a se dedicarem, em suas pesquisas, aos fenômenos gerados pela atuação da Força Inteligente, que pertence ao mundo invisível, sobre a Matéria.

Nossa principal mensagem é a de poder estimular as melhores inteligências que estão por trás das descobertas e revelações maravilhosas que a ciência já nos trouxe, principalmente no século XX e no início deste século. Nós pretendemos despertar suas atenções, empenho e recursos para a pesquisa do imaterial, para demonstrar experimental e definitivamente, a verdadeira natureza da Força Inteligente. Demonstrar que essa é a Força que plasma e opera a matéria em todos os reinos da Natureza e, no Homem, insere seus atributos de uma forma maravilhosa, como por exemplo, a consciência, o pensamento, o raciocínio, o livre-arbítrio (vontade própria), a criatividade e os numerosos sentimentos e emoções que subjazem à Matéria.

Então, o primeiro passo é seguir a instrução, já tão antiga que o tempo já quase apagou, contida no Templo de Delfos, na Grécia: Nosce te ipsum – Conheça a ti mesmo. Sim, é fundamental sabermos o que somos – Força Inteligente e Matéria. O segundo passo é sabermos de onde viemos – o que é de fato essa Força Inteligente, que constitui o nosso “Eu” e de onde ela vem. O terceiro passo, essencial para fechar o ciclo de evolução dessa Força Inteligente, é saber para onde ela vai e o que acontece com ela, quando o corpo físico tombar e sua matéria se transformar em outras matérias. Aí, desprovidos de qualquer misticismo, vamos entender realmente o que é essa Força Inteligente e conhecer seus atributos, que não são, nem podem ser produtos do cérebro e enfim, da Matéria.

Para isso, mostramos nessa despretensiosa obra que não é preciso ser místico ou renegar o método científico. O que se torna necessário é construir um método científico próprio para estudar, explicar e estabelecer hipóteses, teorias e leis aplicáveis aos fenômenos que constituem a Vida Fora da Matéria, campo em que o pesquisador e o “objeto” pesquisado reagem entre si, muitas vezes até invertendo essa relação, já que o “objeto” pesquisado é Força Inteligente com todos os seus atributos.

Dados esses primeiros passos e, investindo talento e recursos nessa direção, a Ciência, com certeza, obterá resultados admiráveis e esclarecedores sobre tantos e tantos fenômenos ditos paranormais ou transcendentais, para os quais a Parapsicologia, até agora, não nos trouxe respostas convincentes. São esses fenômenos que estamos descrevendo e analisando nessa obra com isenção de ânimo, inexplicáveis pela Ciência durante milênios e para o ser comum da humanidade, até aqui, tidos como sobrenaturais e milagrosos e que os vêm deixando medrosos e submissos à exploração das religiões.

Este é o desafio para os cientistas do século XXI. O autor sentir-se-á satisfeito se a centelha contida nos capítulos dessa obra puder entusiasmar todas as inteligências nobres e sérias.

If Science comes to use its human resources of privilleged minds and the material resources which they already possess and admit, before hand, the existence of the Intelligent Force and the Spirit, both modelling Life, it only will remanin the scientific prove of the actuation of theses forces by using an adequate scientific method, which science will know how to find. Starting and establishing a logical hypothesis, by no doubt, we will come to a scientific explanation about many mysteres considered for long millenials as supernatural, which up to now is tormenting the humanity, transforming them in natural phenomena. The phenomena can seem misterious or undisclosed due to the long lasting ignorance of such matters.

Se a Ciência usar os seus recursos humanos de mentes privilegiadas e os recursos materiais de que já dispõe e admitir, aprioristicamente, a existência da Força Inteligente e do Espírito, ambos modeladores da Vida, restará apenas a comprovação científica da atuação dessas forças usando um método científico apropriado, que a ciência saberá encontrar. Começando e estabelecendo uma hipótese lógica, com certeza chegaremos à explicação científica sobre tantos mistérios considerados há tantos milênios como sobrenaturais, que até agora vêm atormentando a humanidade, transformando-os em naturais. Os fenômenos podem parecer misteriosos e inexplicáveis porque a ignorância sobre esses assuntos ainda perdura.

We will observe many reactions to the described ideas in this book, since we are pointing many paradoxes and perplexities still not solved, not because the lacking of talents and resources, but due to the pure materialist treatment that Science is adopting up to the present, let it be by idleness or by accomodation of many scientists or even by other interests.

Vamos observar muitas reações às idéias descritas nessa obra, pois estamos apontando muitos paradoxos e embaraços ainda não solucionados, não por falta de talentos e recursos, mas devido ao enfoque puramente materialista que a Ciência vem adotando até agora, seja por indolência, seja por acomodação de muitos ou mesmo por outros interesses.

Dado o grande avanço que ocorreu na ciência e na tecnologia no século XX, organizamos a primeira parte dessa obra com o objetivo de unificar um corpo de informações atualizadas sobre os assuntos expostos. Com isso, aqueles que, pela primeira vez tomam conhecimento dos assuntos discutidos nessa parte, não terão dificuldades, seguindo facilmente a linha de envolvimento apresentada na segunda e na terceira Partes (sugestão).

Com fundamento nesta visão científica introdutória, passamos à segunda parte, para tratar efetivamente do assunto sugerido no título da obra e nos respectivos capítulos nela contidos. Neles, expomos um estudo mais minucioso do que é a Força Inteligente, da sua evolução até ao nível de Espírito, da evolução deste através de sucessivas e numerosas encarnações, bem como, da sua emancipação quando finalizadas as etapas encarnatórias. Exploramos aqui, também, os caminhos da contínua evolução dos espíritos nos mundos astrais superiores, quando o Espírito não mais precisa encarnar. Ficará mais evidente, então, que a Evolução, tanto nos mundos físicos como nos mundos espirituais, constitui a lei maior que dá o respaldo necessário ao verdadeiro sentido da vida, isto é, a mesma lei aplicável ao desenvolvimento moral e espiritual do homem e como este se insere no contexto universal. Com isso em mente, pretendemos levar nossos leitores a uma mais ampla e melhor conscientização sobre a universalidade do processo evolutivo e mostrar o verdadeiro sentido da vida na Terra, eliminando o medo da morte e tantos males dele derivados. Por certo, a sociedade sofrerá grandes transformações no enfoque que atualmente tem da vida e da morte, com reflexos permanentes na própria sociedade e seus costumes. Mas isso é um trabalho para muitas gerações.

Na terceira parte, apresentamos indícios e evidências da vida fora da matéria, ou seja, dedicamos um capítulo ao exame das experiências de quase-morte, outro à reencarnação e mediunidade e um terceiro, às regressões às vidas passadas, como forma de cura a certos traumas e fobias. Os fenômenos de regressão ocorrem de fato, mas nem todos os psicólogos e psiquiatras admitem a explicação reencarnacionista. Os estudos sobre a mediunidade vêm atraindo pesquisadores sérios, interessados que estão em desvendar os “mistérios” da vida além da morte. Todas essas pesquisas já estão nos laboratórios de algumas universidades americanas e os resultados vêm surpreendendo, dia a dia, os pesquisadores.

Na quarta parte, encerramos a nossa obra, fazendo um forte e sincero ultimatum aos cientistas e pesquisadores, um verdadeiro apelo para adaptarem um método científico que seja adequado ao estudo e pesquisa desses tipos de fenômenos e que, enfim, não percam mais tempo, na procura dos fenômenos em que a explicação cabal e definitiva só é possível quando se leva em consideração a causa atuante – a Força Inteligente, em seus numerosos graus de evolução. Verão então que, tanto no macrocosmo, como no microcosmo e em todos os seres viventes de qualquer reino da natureza, estão sempre presentes a Força Inteligente e a Matéria, esta última sempre sob a primazia daquela. Sem a Força Inteligente, a Matéria se desagrega e se transforma em elementos e outras substâncias, enquanto que a Força Inteligente evolui sempre, organizando e animando outros corpos.

Em resumo, propomo-nos, com essa obra, alcançar os dois objetivos, a seguir: primeiro, despertar o interesse dos cientistas para tão importante assunto, dando-lhe foro de ciência, que por si mesmo já o é e segundo, estimular os espíritas e espiritualistas a um conhecimento racional mais profundo do transcendental, abandonando o misticismo, as crendices e as superstições incutidas em suas mentes pelas religiões em geral, ao longo de suas vidas. Não é preciso ir buscar a espiritualidade e as técnicas de meditação em países do Oriente e da Ásia, como a Índia, Tibet, Japão, China, etc. A espiritualidade autêntica pode ser achada e praticada aqui mesmo no Brasil: é só procurá-la. Que esta seja mais uma semente, dentre tantas obras e artigos sérios já escritos sobre o assunto.

 

 

 

 

PRIMEIRA PARTE:

 

NOSSA REALIDADE OBJETIVA

CAPÍTULO 1

 

 

O UNIVERSO

 

 

Existem incontáveis sóis e incontáveis Terras todas girando em volta de seus sóis do mesmo jeito que os sete planetas de nosso sistema solar. Nós vemos apenas os sóis, pois estes são os maiores corpos e os mais luminosos, mas seus planetas permanecem invisíveis para a gente por serem menores e não luminosos. Os incontáveis mundos no universo não são nem mais nem menos habitados do que nossa Terra.        

                                                                          Giordano Bruno

De l´Infinito,  universo e mondi.

O universo está cheio de coisas misteriosas esperando pacientemente que o nosso espírito fique mais aguçado

Palavras otimistas de um filósofo anônimo.

 

 

1.      Astronomia, Cosmologia e Astrofísica

 

Com toda certeza, a Astronomia é a mais antiga de todas as ciências. Desde 3.000 anos a.C, os chineses, assírios, babilônios e egípcios já observavam o firmamento com objetivos práticos como, por exemplo, medir o tempo, determinar a época mais apropriada para plantio e colheita de alimentos ou até mesmo com o objetivo de prever o futuro e determinar a influência dos astros sobre os seres humanos (Astrologia). Uma das mais antigas descobertas foi a determinação, relativamente precisa, da duração do ano (inclusive na cultura asteca), das fases da lua e das estações do ano. Não é nosso intuito fazer um histórico da evolução da Astronomia ao longo da cultura humana, mas vale a pena lembrar que o ápice dessa ciência na Antigüidade deu–se na Grécia antiga (600-400 a.C.), somente sendo ultrapassada a partir do século XVI.

Atualmente, a Astronomia é uma ciência tecnologicamente muito sofisticada que tem por objeto, o estudo da constituição, posição relativa, mapeamento e movimento dos astros ou corpos celestes existentes por todo o universo. Essa sofisticação compreende dois grandes ramos: a Cosmologia e a Astrofísica, ambos na vanguarda do conhecimento do universo, atuando em uma interface nem sempre muito clara. (1, 2).

A Cosmologia tem por objeto o estudo da estrutura e origem do universo, além de descobrir as leis que o regem num sentido mais amplo. Os cosmólogos desenvolveram e vêm desenvolvendo as mais diversas teorias e leis num esforço de desvendar o enigma do universo, contando para isso com os recursos da Astrofísica e da Física moderna. (3)

A Astrofísica, por sua vez, é o ramo da Astronomia que cuida da constituição física e química dos astros disseminados pelo Espaço e que, no seu conjunto, constituem o universo. Ela trata do uso dos radiotelescópios, do telescópio Hubble (no espaço), do telescópio Chandra (raios X), da espectrofotogrametria, dos desvios espectrais, etc. (4)

Já a Física moderna, cuida de dar respostas, às grandes questões da estrutura da matéria e das partículas (de matéria e de energia) existentes e atuantes no interior do núcleo atômico (força nuclear forte e decaimento radiativo). Trata, também, do estudo das várias formas de energia que atuam fora do núcleo (força nuclear fraca e magnetismo), bem como da força da gravidade e das leis que a regem entre si e no seu conjunto. Desde a década de 50, os físicos vêm teorizando sobre a unificação dessas forças no sentido de obter-se uma possível “Teoria do Tudo”, apaziguando assim, a Teoria Quântica, que cuida do microcosmo e a Teoria da Relatividade Geral, que cuida do macrocosmo.

 

2.      Teorias sobre a formação do universo

 

Ao longo dos tempos, desde as mais remotas eras, o homem não só contemplou infinitas vezes o firmamento como deve ter se questionado sobre a forma e a extensão do espaço e os astros que ele abriga, isto é, sobre o cosmo.

Foram os gregos de quem tanta cultura herdamos, seja na literatura, seja nas artes, seja no campo filosófico e até mesmo na área das ciências naturais, os quais nos passaram as primeiras idéias sobre o universo. Por volta de 600 a.C., Anaximandro admitia que o cosmo tivesse surgido da água. Idéia esdrúxula, mas não foi contestada durante 200 anos!

Ainda na Grécia, em 400 a.C., Eudoxo de Cnido, aproveitando uma idéia de Pitágoras, criou o modelo geocêntrico, colocando a Terra no centro do universo. Em 200 a.C., Ptolomeu e Aristóteles adotaram e difundiram este modelo, que prevaleceu durante quase 2000 anos.

Somente no século XVI, surgiram os primeiros movimentos no sentido de alterar este modelo. Nicolau Copérnico (1473-1543) foi o primeiro a sugerir que o Sol era o centro do universo e não a Terra, teoria que tomou o nome de modelo heliocêntrico. Giordano Bruno (1548-1600) acrescentou que o universo não tinha limites, era infinito e, por contrariar os ensinamentos da Igreja Católica, foi julgado e queimado pela Inquisição. Galileu Galilei (1564-1642) apoiou esta teoria e foi obrigado a negá-la, sob confissão, para não ter o mesmo fim que Giordano Bruno.

No século XX surgiu a teoria do modelo finito do universo, em constante expansão, proposto por George Lemaître e Alexander Friedman. Em 1950, Fred Hoyle tentou ridicularizá-los, chamando-a de teoria do Big Bang, nome que acabou sendo adotado para essa teoria, que também prega a existência de quatro dimensões no universo. Esta é a teoria mais aceita atualmente.

Em 1960, surgiu a teoria do multiverso, que prega a existência de mais de um universo no espaço infinito, haja vista que a teoria do Big Bang não respondeu duas questões, a saber: primeiro, o que existia antes e segundo, o que há além do espaço do universo.

No início do século XXI (2001), surgiu a teoria ecpirótica, que defende a idéia de que o universo teria surgido do choque entre duas “membranas cósmicas”, as branas, a partir de uma quarta dimensão do espaço e que este choque, teria sido percebido como o Big Bang. Se a teoria da relatividade e a teoria quântica estiverem corretas, diz uma corrente de físicos, esta é uma teoria que faz sentido.

 

3.      Um pouco mais sobre a teoria do Big Bang

 

Como dissemos acima, atualmente é a teoria mais aceita sobre a origem do universo, que foi estabelecida pelo cientista russo, naturalizado norte-americano, George Gamow em 1948. Ele postulou que o universo teve origem entre 13 e 20 bilhões de anos atrás e se formou a partir de uma concentração de matéria e energia extremamente densa e quente, situada em um único ponto (ponto zero – não dimensão zero). Nesse momento, o tamanho do universo seria quase zero. Nele estava contida toda a matéria de forma tão concentrada, que sua temperatura seria quase infinita. Segundo essa teoria, esse ponto teria sido o começo dos tempos e, a partir dele, teve início a formação e a expansão das galáxias. Os físicos fazem uma descrição especulativa e pormenorizada dos eventos desde o instante zero, isto é, a partir do exato momento da explosão ou big bang, mas nós não vamos nos preocupar com isso aqui. Uma das evidências do acerto dessa teoria é que as galáxias estão afastando-se umas das outras, como acontece com os destroços de uma explosão, conforme verificaram os astrofísicos. Ainda não foram respondidas pela comunidade científica, duas grandes perguntas: qual o motivo pelo qual nosso universo teria sido estruturado da forma como o foi e, porque ele teria sido criado.

Segundo essa teoria, desde a sua formação, o universo vem se expandindo e resfriando. Físicos e cosmólogos admitem que, no primeiro milésimo de segundo da criação, teria existido somente uma mistura de partículas subatômicas composta de quarks e elétrons, que são as formas de matéria (partículas) mais fundamentais conhecidas pela ciência.

Nessa primeira etapa de formação, com o resfriamento decorrente da expansão, os quarks que se movem inicialmente em velocidades próximas à da luz, entram em desaceleração em razão da redução da temperatura e, por isso, deixam de existir como partículas livres. É o momento em que eles se associam uns aos outros para formar os prótons e os nêutrons, o que ocorre entre os dez primeiros minutos de idade do universo, havendo a formação dos núcleos mais simples, na forma de hidrogênio, constituído de apenas um próton.  Ao mesmo tempo, são formados também, núcleos de hélio, o segundo átomo da escala atômica, composto de um próton e um nêutron. Nesta altura, toda a matéria do universo que está na forma de plasma, é constituída desses dois núcleos, ainda sem os elétrons, na proporção de 75% de hidrogênio e 25% de hélio. Ainda hoje, esses são os dois principais elementos químicos mais abundantes no universo, representando mais de 90% de toda a matéria conhecida.

A terceira etapa dessa história fantástica, começa cerca de 300 mil anos depois do início da grande explosão, com a junção dos elétrons aos núcleos atômicos para formar os primeiros átomos completos. Devido à alta gravidade ainda reinante até aquele momento, a luz não conseguia escapar da massa em expansão, até que um ponto crítico foi alcançado e fez-se a luz! Até então, ela fazia parte da expansão, no mesmo ritmo em que esta ocorria junto à matéria e tudo estava às escuras.

Daí para frente, o universo torna-se transparente e luminoso e os fótons, que são partículas de luz, libertam-se e passam a interagir em menor grau com os átomos. Estes fótons deixaram rastros ou “fósseis”, atualmente captados pelos nossos melhores telescópios, inclusive o Hubble, de que falaremos mais adiante. Decorridos quase um bilhão de anos desde o Big Bang, os átomos agregam-se e começam a formar as primeiras galáxias.

 

4.      O Espaço e seu conteúdo

 

Para se ter uma idéia da grandiosidade do universo, apresentamos a seguir uma pequena descrição dos principais objetos celestes, sem a pretensão de esgotar o assunto, já que este não é o objetivo deste livro.

 

i As galáxias

 

Uma galáxia é formada por uma imensa quantidade de estrelas, nebulosas e matéria interestelar. As galáxias são de três tipos ou formas: elípticas, espirais e irregulares. Por sua vez, as galáxias organizam-se em grupos ou aglomerados. A nossa galáxia, Via Láctea, é do tipo espiral e pertence ao chamado Grupo Local, um dos menores grupos, contendo cerca de 40 galáxias. Além de pertencer ao menor grupo, possui a forma de um disco com diâmetro de 130.000 anos-luz e espessura máxima, no centro, de 12.000 anos-luz. Um dos maiores grupos, o Grupo das Virgens, possui 2500 galáxias! Os grupos de tamanho médio contêm cerca de 100 a 500 galáxias. Dentro do nosso grupo de galáxias, a Via Láctea é a maior, seguida de Andrômeda, que é do tipo elíptica. (6)

O nosso Sol, com o sistema solar, está situado em um dos braços da espiral a dois terços do centro. Para dar uma rotação em torno do núcleo da galáxia, o Sol leva 225 milhões de anos! (6)

Para calcular o número de galáxias, os cientistas apontaram o telescópio Hubble em direção a um minúsculo ponto celeste do tamanho de um grão de areia observado a um metro de distância. A luz que vinha das estrelas, daquele ponto, era tão fraca, que foram precisos dez dias consecutivos de exposição para se obter uma boa imagem. Pois bem, só ali o exame da imagem revelou a existência de 620 galáxias, das mais diferentes distâncias, tamanhos e formas. Com base nesta e em muitas outras observações e estudos, pesquisadores extrapolaram os resultados e chegaram à incrível estimativa de que em todo o universo podem existir cerca de 125 bilhões de galáxias! Esta cifra é 50% mais alta que a estimativa anterior. Cada uma dessas galáxias tem entre 100 milhões a 1 bilhão de estrelas, como o nosso Sol. Algumas dessas estrelas estão situadas a 12 bilhões de anos-luz, isto é, cerca de 1 bilhão de anos após formado o  universo. (5)

 

i As estrelas

 

Uma estrela pode ser definida como um objeto celeste, em geral de forma esférica, em cujo interior a temperatura e a pressão são elevadíssimas, principalmente no centro. Nas estrelas, ocorrem reações termonucleares com liberação de considerável quantidade de energia, que se propaga do centro para a periferia. Desta, a energia é transmitida ao espaço interestelar na forma de radiações eletromagnéticas, da qual o calor e a luz constituem modalidades.

As estrelas reúnem-se em grupos ou aglomerados do tipo aberto e globular. Só em nossa galáxia, há cerca de 100.000 grupos abertos, dos quais somente cerca de 1.100 são conhecidos. As formações globulares são contadas entre 10.000 e 1.000.000. (6, 7) Ao todo, estima-se que, somente na Via Láctea exista cerca de 400 bilhões de estrelas! (7)

Como nasce uma estrela? (8) Por atuação da força gravitacional, ocorre a aglomeração do material contido nas nebulosas, representado principalmente por nuvens de hidrogênio e hélio e poeiras. Este processo, que leva à contração dos gases, aumenta também a temperatura do material aglomerado, até um ponto em que se inicia a fusão termonuclear e, desde que haja gás suficiente, estará formada uma estrela. Caso não haja gás suficiente (menos de até 50 vezes o tamanho do planeta Júpiter), forma-se, então, uma anã marrom. (8)

E como morre uma estrela? O produto da “morte” de uma estrela depende de sua massa (8). Se a sua massa for menor que oito vezes a massa de nosso Sol, ao se esgotar o seu combustível nuclear (hidrogênio), forma-se uma anã branca, em torno da qual pode ou não haver uma nebulosa planetária, passando antes pela fase conhecida como gigante vermelha em que a expansão dos gases aumenta consideravelmente o diâmetro da estrela. É o que poderá acontecer com o nosso Sol, que já tem 4,5 bilhões de anos de existência e, daqui a mais 4 bilhões de anos, seu diâmetro estará chegando próximo à órbita de Marte! Se a massa da estrela for oito vezes ou mais, maior que o nosso Sol, o processo de exaustão do combustível nuclear pode se tornar catastrófico. Isso acontece porque, num certo momento de sua existência, começa a se formar ferro e outros elementos mais pesados que se esfriam na forma sólida, ocasionando um colapso da estrela. Os destroços ricocheteiam no núcleo e são lançados no espaço, bem como os gases, para formar uma nova nebulosa. Uma das duas situações seguintes pode ocorrer com o núcleo remanescente: se sua massa for maior que 2 ou 3 vezes a massa do Sol, forma-se um buraco negro; se for menor, forma-se uma estrela de nêutrons. (8) Uma explosão descontrolada de uma estrela massiva (massa acima de oito vezes a massa solar) pode dar lugar a uma supernova, que resulta num brilho intenso que pode durar meses. A última supernova detectada foi a SN1987, da galáxia Grande Nuvem de Magalhães, pelo Observatório Las Campanas – Chile, em 24 de fevereiro de 1987. Sua carga de neutrinos atingiu a terra duas horas após ser vista. (11)

i Anãs brancas

 

Quando a massa de uma estrela moribunda atinge valor menor que 2 ou 3 massas solares, ela se transforma em uma anã branca. (7) Para se ter uma idéia, o diâmetro do Sol é de 1.400.000 km e ele poderá dar lugar, daqui a 3 ou 4 bilhões de anos, a uma anã branca, com diâmetro aproximado de 10.000 km, isto é, aproximadamente o tamanho da terra, mas com uma densidade muitíssimo maior.

 

i Buracos negros

 

Os buracos negros são corpos celestes maciços (com grande densidade) e, portanto, com elevadíssimo campo gravitacional, com condições de sugar toda e qualquer matéria que se aproxima do horizonte de eventos (próximo a sua borda) e ultrapasse o limite de singularidade, não escapando sequer a luz. Ele se forma pela morte de uma estrela de massa acima de oito vezes a massa do Sol e que tenha esgotado todo o seu combustível nuclear e dele se livrado, ficando apenas o seu núcleo maciço contendo ferro e elementos mais pesados. Buracos negros foram detectados pelo telescópio Hubble e pelo telescópio Chandra, ambos operando em satélites no espaço, que captam as suas emissões de raios X. Os buracos negros têm um fortíssimo campo gravitacional, giram a altíssima velocidade e acompanham o processo de expansão do universo. Um exemplo de buraco negro é o objeto estelar Cygnus XR - 1. (7)

 

i Estrelas de nêutrons

 

As estrelas de nêutrons são corpos celestes com massas super concentradas. Sabemos que as estrelas evoluem durante milhões e milhões de anos. Com as estrelas que tiverem massa inicial acima de dez vezes a do Sol, acontece algo de especial. Depois de explodirem como supernova, o núcleo fica extremamente concentrado, criando condições para que os elétrons se comprimam com os prótons, formando nêutrons. O resultado será uma estrela de nêutrons na qual se poderia comprimir a massa de um Sol e meio em uma área de 20 km de diâmetro. (9)

 

i Anãs marrons

 

São estrelas que falharam na sua formação. Por isso mesmo, as anãs marrons não combinam com a idéia de um universo perfeito. Em geral, são consideradas estrelas que não deram certo, porque não tiveram massa suficiente para iniciar o processo de fusão nuclear em seu interior. Portanto, elas não conseguem emitir calor nem luz própria: são frias e escuras. Algumas vivem isoladas, outras fazem parte de um sistema binário em que uma estrela marrom gira ao redor de uma estrela maior. Esquisitas e raras, elas ainda precisam ser mais bem estudadas e explicadas. (10)

 

i Quasares

 

Os quasares são fontes de forte emissão eletromagnética (ondas de rádio) com uma aparência semelhante à das estrelas, de cor azulada. Seu nome vem das iniciais dos dizeres Quasi Stellar Radio Sources. O primeiro quasar foi descoberto em 1961. São também tidos como buracos negros encontrados no centro de algumas galáxias, além de serem muito compactos (altíssima densidade) e muito brilhantes, alguns com brilho até um trilhão de vezes mais intenso que o Sol. As massas dos quasares vão de 1 bilhão a 1 trilhão de vezes a massa do Sol. Acompanham o processo de expansão do universo a uma velocidade que chega a décimos da velocidade da luz. (7)

 

i Pulsares

 

Os pulsares são estrelas de nêutrons com rádios-pulso. (9) Estima-se haver cerca de 1 bilhão de pulsares somente na Via Láctea, das quais cerca de 1000 já são conhecidas. O primeiro pulsar foi descoberto por Anthony Hewish em 1967 (prêmio Nobel de 1974). Quando a massa de uma estrela moribunda atinge valor menor que 3,2 massas solares, ela se transforma em uma estrela de nêutrons .(7) Um pulsar tem um período de pulsação de 1,337 segundos, com um período de rotação de 4,4 segundos quando muito longo e de 0,0016 segundos quando muito curto, estes girando com velocidade de 625 voltas/segundo! (7, 10)

 

i Nosso sistema solar

 

O Sol é a nossa estrela, sendo responsável pela temperatura, evaporação e aquecimento, além dos diversos processos biológicos que ocorrem com plantas e animais de todas as espécies.

O sistema solar é formado por nove planetas - Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Plutão – além dos sessenta e um satélites que orbitam os planetas e um grande número de pequenos corpos conhecidos por asteróides e cometas. Um décimo planeta, com o nome de Sedna, localizado além de Plutão, teve sua descoberta anunciada em 2005, achando-se em processo de verificação ou confirmação. Desses planetas, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno são gasosos. As órbitas de todos esses corpos celestes são elípticas, sendo que os cometas possuem órbitas extremamente excêntricas.

Estudos científicos indicam que o Sol deve ter se formado há aproximadamente 4,5 bilhões de anos. Sua massa é cerca de 300 mil vezes maior do que a do planeta Terra, sendo seu diâmetro próximo a 1.400.000 quilômetros. A distância entre a Terra e o Sol é de aproximadamente 150 milhões de quilômetros. A temperatura média no núcleo do Sol chega a 15 milhões de graus Celsius. Nesta parte mais interior da estrela, ocorrem reações nucleares como, por exemplo, a fusão entre átomos de hidrogênio. Na fotosfera ou superfície, o Sol emite luz, calor e outras formas de energia, como os raios cósmicos. Ainda compõe o Sol uma camada de gases que envolvem a estrela.

 A cada ciclo de onze anos, o Sol passa por um período de extrema agitação, enviando para a Terra, tempestades solares. O assim chamado “vento solar”, carregado de eletricidade (ionizado), quando chega à Terra, acaba por interferir nos sistemas eletrônicos, redes de energia, computadores, aparelhos eletrônicos, sistemas de comunicação entre aviões, navios e satélites. Estas mesmas ondas de energia e eletricidade chegam a criar as conhecidas auroras boreal e austral, fenômeno em que o ar brilha nas regiões próximas aos pólos magnéticos da Terra, gerando um espetáculo de luzes e cores nos céus.

Do ponto de vista químico, o Sol é formado pelos seguintes elementos:  73% de hidrogênio, 25% de hélio e 2% de outros elementos.

 

i Planetas fora do sistema solar (exoplanetas)

 

Procurar planetas orbitando estrelas de nossa galáxia (Via Láctea) e de outras, tornou-se uma tarefa excitante para os astrônomos e astrofísicos de nossa era. Vale a pena citar aqui o que disse Giordano Bruno no final do século XVI, em sua De l´Infinito, universo e Mondi:

 

Existem incontáveis sóis e incontáveis Terras todas girando em volta de seus sóis do mesmo jeito que os sete planetas de nosso sistema solar. Nós vemos apenas os sóis, pois estes são os maiores corpos e os mais luminosos, mas seus planetas permanecem invisíveis para a gente por serem menores e não luminosos. Os incontáveis mundos no universo não são nem mais nem menos habitados do que nossa Terra.

 

É atribuída a Jesus a frase: “na casa do Pai existem muitas moradas” – convém notar a semelhança desta afirmação intuitiva com a de Giordano Bruno em De l´Infinito, universo e mondi, citação que consta do início deste capítulo. É impressionante, realmente extraordinário como elas estão se confirmando através da recente corrida para a descoberta de novos planetas fora do nosso sistema solar, os assim já chamados de exoplanetas!

Em julho de 2004, já passava de 230 o número de exoplanetas descobertos no curto prazo de dez anos! (15) Com o aprimoramento das técnicas utilizadas nessas descobertas, em poucas décadas, possivelmente teremos registrado milhares deles. A NASA e a Agência Espacial Européia têm planos para lançar quatro futuras missões orbitais super equipadas com equipamentos sofisticadíssimos. Estes trabalhos serão feitos, também, em coordenação com a SETI – Search for Extraterrestrial Intelligence. Podemos até ter a chance de poder visualizar, pela primeira vez, um exoplaneta.

Em 1991, foi descoberta, pelo Radiotelescópio de Arecibo, uma estrela não parecida com o nosso sol, em volta do pulsar PSR-1257+12. Em 1995, outra estrela, agora parecida com o sol, foi descoberta por Michael Mayor e Didier Queloz, junto à estrela 51 Pegasi. Em maio de 1998, o Telescópio Hubble detectou uma imagem junto à estrela TMRC-1C. Finalmente, em 1999, pela primeira vez por observação direta, foi descoberto visual e telescopicamente junto à estrela HD269458, um novo planeta, tendo-se medido o seu diâmetro. Em 2001, já haviam sido catalogados cerca de 21 exoplanetas. Daí até os dias de hoje (agosto de 2005), este número já ultrapassa 230.

Nos dias de hoje, os astrônomos já dispõem de cinco métodos para executar esse trabalho e um serve para confirmar o outro. Este trabalho é possível, devido ao avanço dos métodos visuais, pois, até recentemente, os astrônomos tinham que se basear em medidas precisas da velocidade da estrela, em muitos casos, realizadas ao longo de vários anos. Não vamos descrever aqui os métodos utilizados porque não é o nosso objetivo nos aprofundarmos no assunto, mas podemos informar que já se pode calcular e medir, entre outras coisas, a rapidez da rotação, a massa do planeta, o seu volume, a sua densidade, a distância da estrela e as características da órbita.

O nosso conhecimento sobre os novos sistemas solares está se alargando de uma maneira inesperada, principalmente se tomarmos o perfil do sistema solar como base, onde o planeta mais próximo do Sol é pequeno, rochoso (sólido) e sem atmosfera (Mercúrio). Já os intermediários, têm tamanho médio, são rochosos e têm algum tipo de atmosfera (Vênus, Terra e Marte) e num deles viceja a vida em toda sua plenitude. Quanto aos mais distantes, são essencialmente gasosos e gigantescos (Júpiter, Saturno e Netuno). Plutão é o penúltimo planeta, também sólido. Do último planeta do sistema solar, descoberto em 2005, de nome Sedna, ainda não estão disponíveis informações confirmadas.

Curiosamente, não é com esse perfil de distribuição que têm se apresentado os sistemas onde os exoplanetas foram descobertos. Assim, “Existem planetas que têm 14 vezes a massa de Júpiter e estão mais perto da estrela que orbitam do que Mercúrio do Sol. Outros têm órbitas altamente elípticas, variando suas distâncias da estrela quase tanto quanto o tamanho do sistema solar. A maioria gira ao redor de sua estrela em velocidades assustadoras: um deles completa o seu “ano solar” em menos de três dias. Assim, ou ele está muito perto da estrela, ou gira muito depressa (ou ambos!). O menor planeta achado até hoje é do tamanho aproximado de Júpiter e gira em torno de uma estrela muito parecida com o Sol. Também foi achado um planeta que orbita a uma distância quase igual à da Terra ao Sol, o que levanta a possibilidade de abrigar formas de vida”. (15)

A Astronomia entrou pelo século XXI com enormes e excitantes perspectivas. Tudo nos leva a crer que, “um dia seremos capazes de visualizar esses planetas, ou até de determinar evidências indiretas de que eles abrigam vida semelhante à nossa. Nesse dia, nossa concepção sobre nós mesmos e sobre o destino da humanidade sofrerá uma mudança irreversível”. (15)

 

5.      O maravilhoso telescópio espacial Hubble

 

O telescópio espacial Hubble foi batizado com o nome do astrônomo Edwin Powell Hubble (1889-1953) que, em 1924, descobriu a existência de outras galáxias, além da Via Láctea. Este fantástico instrumento, que envia cerca de 5 gigabytes de informação por dia sobre o universo, acaba de completar quinze anos de existência e custou cerca de dois bilhões de dólares. Só para ilustrar, no ano de seu lançamento (1990), ele enviou mais informações sobre o universo do que tudo o que se sabia dele até 1990. Além das informações técnicas e parâmetros astronômicos da mais variada natureza, até abril de 2005, tinha enviado para a NASA, cerca de 700.000 fotografias de quase todo o universo, ampliando incomensuravelmente o conhecimento humano sobre o mesmo. Este maravilhoso equipamento foi planejado e projetado nos anos 40-50, construído nos anos 70-80 e posto em órbita em 24 de abril de 1990. Sua “resolução de 0,1 segundo de arco pode “ver” uma bola de futebol a 500 km de distância ou distinguir os faróis de um carro situado na Lua! Isto é uma resolução dez vezes superior ao melhor telescópio colocado na superfície da Terra”. (16)

Se o Hubble fosse um telescópio colocado no solo, ele seria um telescópio de “potência” média. A “potência” de um telescópio está na quantidade de luz que ele pode receber instantaneamente de um objeto e isso, por sua vez, é função do seu diâmetro. O Hubble é um telescópio refletor (seu elemento óptico principal é um espelho), com 2,40 metros de diâmetro. Os dois maiores telescópios do mundo estão no observatório de Mauna Kea, no Havaí e têm dez metros de diâmetro, cada um. Atualmente, há vinte e oito telescópios maiores que o Hubble, espalhados pelo mundo, em funcionamento. Mais que um telescópio, o Hubble é um verdadeiro observatório espacial, contendo instrumentação necessária para vários tipos de observação. Ele contém três câmeras (de grande campo, inclusive para objetos escuros), um detector astrométrico, um espectrógrafo de alta resolução e um espectrógrafo de alta velocidade, além de computador de bordo. A nova câmara instalada pesa 315 quilos e é tão poderosa, que permite registrar imagens um milhão de vezes superior às captadas pelo olho humano! (17) Além de fotografar os objetos e medir com grande precisão suas posições, é capaz de “dissecar”, em detalhes, a luz que vem deles. O Hubble está em uma órbita baixa, a 600 km da superfície da Terra e gasta apenas 95 minutos para dar uma volta completa em torno de nosso planeta. A energia necessária para o seu funcionamento é coletada por dois painéis solares de 2,4 x 12,1 metros cada. A sua massa é de 11.600 kg. (16)

O Hubble foi reparado em pleno espaço mais de uma vez, para corrigir um grave defeito em sua óptica, pois falhou ao focar com precisão (espécie de “miopia”) os objetos, principalmente os mais fracos, com a precisão planejada e desejada. Esse defeito foi “diagnosticado” como aberração esférica, uma distorção óptica causada por uma forma incorreta de seu espelho principal. Perto das bordas, a curvatura desse espelho estava menor do que deveria, ou seja, aproximadamente 1/50 da espessura de um fio de cabelo humano. Trocar o espelho seria algo caro e difícil. A solução adotada foi projetar uma óptica corretiva para seus instrumentos. Essa óptica foi instalada com grande sucesso, em dezembro de 1993. (16)

O Hubble excedeu a todas as expectativas dos seus criadores, a ponto de recentemente a NASA noticiar que iria desativá-lo por falta de verbas e problemas recentes com o ônibus espacial. Esta notícia gerou protestos na comunidade astronômica de todo o mundo. Seus objetivos foram todos alcançados e podem ser resumidos como sendo “investigar corpos celestes pelo estudo de suas composições, características físicas e dinâmicas; observar a estrutura de estrelas e galáxias e estudar suas formação e evolução; estudar a história e evolução do universo. Para atingir esses objetivos, a pesquisa do Hubble é dividida em “Galáxias e Aglomerados; Meio Interestelar; Quasares e Núcleos Ativos de Galáxias; Astrofísica Estelar; Populações Estelares e Sistema Solar”. (16)

O substituto do Hubble vem aí. O grande objetivo de seu substituto, chamado Telescópio Espacial de Nova Geração – NGST, mas que também está sendo chamado de WEBB, (17) a ser lançado entre 2010 e 2012, é chegar aos limites do tempo-espaço, ou seja, chegar às origens do universo. Ele ficará numa órbita muito mais alta, entre a Terra e a Lua, fora do alcance dos ônibus espaciais e operará a uma temperatura bem mais baixa do que a atual. Isso permitirá uma sensibilidade milhares de vezes mais sensível do que a dos atuais telescópios instalados na superfície terrestre. (17) Seus objetivos: “determinar a idade e o tamanho do universo, mapear sua evolução e desvendar os mistérios das galáxias, estrelas, planetas e da própria vida”. (18)

Apenas para completar estas informações, não poderíamos deixar de apresentar alguns dados sobre o Observatório Chandra de Raios X (orbital) que, junto com o Hubble, é responsável pela revolução astronômica dos últimos cinco anos. Lançado em 23 de julho de 1999 pela NASA, o Observatório Chandra, nome dado em homenagem ao físico Indiano Subrahmanyan Chandrasekhar (1910-1995), que recebeu o Prêmio Nobel de Física em 1983, tem por finalidade pesquisar, mapear e detectar fontes de emissão de Raios X e Raios Gama como, por exemplo, os buracos negros, quasares, pulsares, supernovas, etc. Tem sua órbita entre a Terra e a Lua, com perigeu a 16.000 km e apogeu a 13.3000 km, oferecendo, pois, uma grande excentricidade. Possui dois espelhos de 1,2 metros e quatro outros de menor diâmetro. Além dos detectores de Raios X e Raios Gama, possui câmeras sensíveis a Raios Gama e Espectroscópio de Raios Gama. Oitenta e cinco por cento de sua órbita está acima do cinturão de Van Allen (nuvem de partículas carregadas que envolvem a Terra) permitindo 55 horas de observação a cada ciclo. Há outros observatórios de Raios X, tanto orbitais como baseado em terra, mas não chegam nem de perto da relevância do Observatório Chandra.(19)

 

6.      A teoria inflacionária

 

A teoria da expansão do universo, que os físicos consideram com todo o rigor científico, é uma conseqüência direta da Teoria do Big Bang. Devemos relembrar que o físico Albert Einstein previu, nas equações que embasam a sua Teoria da Relatividade Geral (1915), a evolução do universo. Essa hipótese foi corroborada em 1922, pelo físico e matemático russo Alexander Friedmann (professor de George Gamow), que descobriu uma solução para as Equações Cosmológicas que apontam para um universo em expansão. Em 1929, os astrônomos Edwin Powell Hubble (1889-1953) e Milton Humanson (1891-1972), confirmaram a expansão das galáxias, atestando assim a expansão do universo, tudo de acordo com a lei de Hubble. Segundo essa lei, todas as outras galáxias afastam-se da nossa própria galáxia - a Via Láctea, numa velocidade proporcional a sua distância da Terra.

Ao longo dos anos, muitas evidências sobre a validade da Teoria do Big Bang vêm sendo acumuladas pelos astrofísicos, a ponto de muitos afirmarem hoje que ela tem 99,9% de validade. Esta quase certeza, resulta da descoberta, em 1965, por Arno Penzias (1933 - ) e Robert Wilson (1936 - ), da chamada “radiação de fundo”, que resultou da formação do  universo, quando a luz (Força) e a Matéria se libertaram uma da outra, há cerca de 13 bilhões de anos. Isso porque essa radiação ainda permanece no espaço, captada, não como luz, mas como ruído de fundo na forma de microondas, tendo sua maior intensidade na freqüência de 1,1 mm. Seu nome é “radiação de fundo cósmica” e ela é uniforme em qualquer direção em que apontam os equipamentos de recepção. Por essa descoberta, Penzias e Wilson ganharam o Prêmio Nobel de Física, em 1978. Mais recentemente, em 1990, o satélite COBE - Cosmic Background Explorer, lançado pela NASA (Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço), fez um mapeamento das regiões onde é intensa a produção dessas microondas. Trata-se, portanto, de uma fantástica radiografia do universo, 300.000 anos após a sua formação, quando as estrelas ainda não tinham iniciado a sua formação. Desde o final de 1998, numerosas observações astronômicas levaram os astrofísicos a concluírem que o ritmo da expansão do universo vem se acelerando a uma taxa entre 5% a 6%, a cada bilhão de anos. O mérito da determinação dessa taxa de expansão coube às equipes dirigidas pelos norte-americanos Saul Perlmutter e Brian Schmidt.

 Alan Guth, respeitado físico do MIT (Massassussets Institute of Technology), começa o seu trabalho, intitulado “Uma eternidade de bolhas”, com a seguinte frase: (20)

 

Se a teoria inflacionária da cosmologia for correta, significa que o universo está bem longe daquilo que tínhamos pensado. Provavelmente o universo também é muito mais velho do que nós pensamos, e não inclui apenas um, mas uma infinidade de big bangs.

 

Apesar do nome, a forma clássica da teoria do Big Bang não é realmente uma teoria de uma explosão por completo. Ela realmente descreve só o resultado da explosão. Ela descreve como o universo primitivo, quente e denso, expandiu-se e esfriou-se; descreve como os elementos químicos leves foram sintetizados durante esta expansão, e como a matéria coagulou para formar galáxias e estrelas. Mas não diz nada sobre o que explodiu, ou o que causou esta explosão e, então, não faz nenhuma predição sobre a uniformidade do universo logo após a explosão.

 

O seu artigo parte para outras considerações em busca de uma explicação para o que os físicos chamam de “vazio” e “falso-vazio”, que não cabe no contexto desse capítulo. O que realmente interessa aqui é mostrar que, apesar da grande validade da teoria inflacionária, ela ainda deixa muitas perguntas sem respostas.

Então, nós devemos levantar duas terríveis dúvidas a respeito dessa teoria. Primeira: qual o motivo pelo qual o nosso universo teria sido criado e, segunda, por que ele teria sido criado da forma como foi criado. É de se considerar também que, no instante inicial, não havendo ainda o espaço, como expandir alguma coisa, qualquer que seja, do nada ou quase nada para o tudo ou o quase tudo, que é o espaço atual e o que ainda será preenchido com a própria expansão em andamento? Isso me parece uma grande charada, difícil de explicar e para a qual a mente humana não está à altura de entender.

O físico Einstein, quando lançou a sua Teoria da Relatividade Geral (1915), considerou que a expansão do universo era homogênea e que o espaço era finito e curvo. Posteriormente, o astrônomo Edwin Powell Hubble, estabeleceu uma constante de proporcionalidade para explicar o afastamento das galáxias (1929), o que implicou na reformulação de algumas considerações de Einstein, já que a lei de Hubble estabelece que as galáxias mais distantes e com elas, o universo, expandem a uma velocidade mais elevada. Mais recentemente (2000), os astrofísicos já estão admitindo que “O universo é chato como uma tábua”. (11) Assim, nos dias de hoje, a tendência é considerar uma expansão não homogênea e um espaço não curvo, completamente o oposto do que admitira Einstein. Afinal, onde estará a verdade?

De outro lado, em 1975, o físico Murray Gell Mann, à frente do acelerador de partículas da Stanford University, estabeleceu o novo princípio revolucionário de que as partículas atômicas, por si só, jamais poderiam ser formadas se, sobre a energia cósmica universal, não atuassem agentes estranhos ao domínio material, com poderes para estruturá-las. (12) Qual é então o agente estruturador? O próprio Werner Karl Heisenberg, ao formular em 1927, o Princípio da Incerteza, observou que, “partículas lançadas sobre um mesmo alvo em idênticas condições, nem sempre obedeciam à mesma trajetória, sofrendo um desvio anômalo sem que se pudesse saber o motivo pelo qual assim agiam”. Ele chegou a dizer que pareciam ovelhas desgarradas com vontade própria. (12) Afinal, não valeria a pena investigar que “vontade própria” seria esta? Quem sabe se não é por falta de uma investigação mais profunda desse agente invisível que tudo move e que mais parece uma força inteligente, que a Teoria Quântica ainda não encontrou o seu status de total aceitabilidade por parte de todos os físicos modernos? São perguntas para refletir! Falta investigar esse outro domínio não material ou imaterial.

 

7.      Aspectos filosóficos e metafísicos

 

Do que ficou exposto, físicos eminentes estão trabalhando e tentando estruturar mais de uma dezena de novas teorias, procurando ajustá-las a outros padrões, sem fugir ao rigor matemático, assim como, ao entendimento do homem médio comum. Mas poucos têm a coragem de explorar alternativas mais próximas da filosofia e da metafísica. Com as lacunas apontadas acima, torna-se imprescindível uma aproximação do incognoscível por outra via que não a simplesmente material, buscando um agente inteligente para explicar fatos e fenômenos que fogem ao materialismo exclusivo. O que estou querendo dizer é que precisamos resgatar as idéias derivadas da dualidade força-matéria, quase abandonada desde Descartes e Leibniz, por serem consideradas coisas não sérias. As superstições, crenças infundadas e as religiões, de modo geral, têm muito a ver com esse quase descaso dos cientistas pelo conceito da dualidade. Voltaremos a este assunto quando tratarmos da Força Inteligente.

Algumas das teorias são variações da teoria do Big Bang. É o caso da teoria do italiano Paolo de Bernardis (2002), que chega à conclusão de que teria havido Big Bang, mas não vai haver o Big Crunch (Grande Esmagamento, ou seja, retorno da expansão) por faltar matéria para reverter a expansão. Se houver comprovação da existência da “matéria escura”, que representaria 90% de toda a matéria do universo, então esta teoria ficaria invalidada. (14) A existência da “matéria escura”, preocupa atualmente os físicos e cosmólogos. Por essa teoria, o universo seria plano e infinito com expansão eterna. Uma outra teoria, postulada pelos físicos Paul Steinhardt (USA) e Neil Turok (Reino Unido), publicada em abril de 2002 na revista Science, especula que o universo seria cíclico com seqüências intermináveis de Big Bangs e Big Crunchs. Mas, para isso teria que ser provada a existência da “energia escura” e estamos muito longe disso.

As especulações teóricas dos cientistas têm o mérito de levar ao debate idéias muitas vezes lógicas e bem fundamentadas, não relegando a um segundo plano o seu conteúdo de intuição ou de inspiração, ambas expressando a mesma coisa, embora essa última, seja mais aceita pelos céticos e materialistas. As especulações científicas costumam nascer como ciência em estado bruto, necessitando lapidação. Algumas chegam a se firmar em mitos, como o mito da criação do universo a partir do nada, para depois procurarem uma explicação para o que seja o “nada” ou o “falso nada”.

Não devemos estranhar que o Vaticano, já em 1951, julgava válida a teoria do Big Bang, que mutatis mutandis, assemelha-se ao mito da criação bíblica. De outro lado, a teoria cíclica de criação do universo, guarda certa semelhança com a teoria do eterno retorno, com evolução (fase de expansão) e involução (fase de contração), mas deixa de lado o conceito essencialmente evolucionário, sempre em uma única direção, como o conceito humano da seta do tempo que aponta sempre em direção ao futuro. Esta acomodação ou coexistência entre ciência e religião, não resistirá ao julgamento final, onde a verdade triunfará. Pois, enquanto na ciência várias teorias diferentes podem coexistir de modo pacífico, na religião, isso é bem mais difícil. As dissensões religiosas, por exemplo, entre o Cristianismo, Judaísmo e Islamismo, todas monoteístas, cultuando um mesmo Deus, embora com nomes diferentes, são irreconciliáveis, por causa do fanatismo dogmático de todas elas.

Portanto, é de se esperar que o futuro esteja reservado à Ciência, onde os cientistas estão sempre dispostos a admitir seus próprios erros quando uma teoria falhar e outra se mostrar melhor, isto é, a Ciência jamais se coloca em posição irredutível. E isso está na própria essência da Ciência, que admite uma construção progressiva, onde a sua história já mostrou que as ditas “verdades científicas” são muitas vezes provisórias, sujeitas sempre a uma revisão evolucionária de suas teorias e leis, em função de novas evidências e realidades. Há, é claro, os teimosos e vaidosos, mas eles sempre acabam curvando-se à verdade.

A nossa conclusão destes conceitos é que toda verdade humana é provisória e ela evolui em função do conhecimento ou saber que, por sua vez, acompanha a evolução humana. Num mundo globalizado, que já está dando os seus primeiros passos, isso se torna cada vez mais real. Encontrado o verdadeiro caminho, respeitadas as culturas próprias de cada povo, o mundo encontrará tempos de paz e muita prosperidade e outro será o viver na terra.

 

Referências deste capítulo

 

 1) FILHO, Kepler de Souza Oliveira. Astronomia Antiga. Acesso em 18 jul 2005. Disponível em https://astro.if.ufrgs.br/antiga/antiga.htm

 2) COSTA, J.R.V. Para que serve a astronomia. Disponível em: https://www.zenite.nu/menu01/0201.htm. Acesso em 18 jul 2005.

 3) IAG/USP-DEPARTAMENTO DE ASTRONOMIA. Informações Gerais (curso). Acesso em 18 jul 2005. Disponível em: https://www.astro.iag.usp.br/~ronaldo/intrcosm/InfGer/index.html

 4) WIKIPÉDIA, Enciclopédia. Astrofísica. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Astrofisica. Acesso em 18 jul 2005.

 5) ANÔNIMO. O espaço – conta de louco. Revista Veja, São Paulo, 2 jan 1999

 6) TREVISAN, Marina. Aglomerado de estrelas. Disponível em: https://www.cdcc.sc.usp.br/cda/sessao-astronomia.  Acesso em 20 jul 2005.

 7) MATIOLI, Eder. Buracos Negros. Disponível em: https://www.cdcc.sc.usp.br/cda/sessao-astronomia  Acesso em 20 jul 2005.

 8) SCHEMBERG, Mário. Nasce uma estrela. Disponível em: https://www.cbpf.br/~martin/CAMS/Estrelas/vidaestrelas.html.  Acesso em 21 jul 2005.

 9) TREVISAN, Marina. Estrela de nêutrons. Disponível em: https://www.cdcc.sc.usp.br/cda/sessao-astronomia.  Acesso em 20 jul 2005.

10) FERRAZ DE OLIVEIRA, Priscila Di Cianni. O Pulsar da nebulosa do Caranguejo.         Disponível em: https://www.uranometrianova.pro.br/astronomia/AA004/nebcaranguejo.htm. Acesso em 21 jul 2005.

11) GRECCO, Dante. 10 fatos intrigantes do Cosmo. Revista Galileu São Paulo, Mar 2001 Disponível em: https://www.ajornada.hpg.ig.com.br/ciencia/ciencia00012.htm. Acesso em 21 jul 2005.

12) IMBASSAHY, José Carlos de Brito. Energia cósmica fundamental. Revista Espiritismo e Ciência, São Paulo, n. 7, p. 06-09. Disponível em: https://www.ajornada.hpg.ig.com.br/colunistas/imbassahy/imb-0002.htm. Acesso em 24 ago 2005.

13) DIEGUEZ, Flávio. O universo é chato como uma tábua. Superinteressante, São Paulo, n. 154, p. 52-67, jul 2000.

14) SCHWARTSMAN, Helio. O eterno retorno. Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, 2 fev 2002. Disponível em: https:// www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/ult510u57.shtml. Acesso em 24 ago 2005.

15) WHITEHOUSE, David. Hubble pode ter descoberto cem novos planetas na Via Láctea. Disponível em: https://www.bbc.co.uk/portuguese/ciencia/story/2004/07/040702_hubble.shtml. Acesso em 24 ago 2005.

16) SIQUEIRA, Ethevaldo. Hubble, uma janela para o Universo. O Estado de São Paulo, São Paulo, 30 set 2001.

17) WHITEHOUSE, David. Hubble pode ter um substituto, mais potente. O Estado de São Paulo, São Paulo, 31 mai 2005.

18) SIQUEIRA, Ethevaldo. Hubble vê os confins do universo. O Estado de São Paulo, São Paulo, 7 abr 2002.

19) ASTRO NOTÍCIAS. Descoberto buraco negro no centro da Via Láctea (Chandra). Disponível em:  https://www.astro.up.pt/nd/astro_news/2000/0320pt.html. Acesso em 24 ago 2005.

20) NASA. A monster in the Middle of the Milky Way. Disponível em: https://science.nasa.gov/headlines/y2000/ast29feb_1m.htm. Acesso em: 24 ago 2005.

21) GUTH, Allan. Uma eternidade de bolhas. Disponível em: https://paginas.terra.com.br/educacao/labertolo/Cosmologia/Cosmology/bibang_Guth.htm. Acesso em 24 ago 2005.

22) HAWKING, Stephen. O Universo numa casca de noz. São Paulo: Mandarin, 2001.

23) FALK, Dan. O universo numa camiseta – À procura da teoria do tudo. Porto Alegre: Globo, 2005.

24) GREEN, Brian. O universo elegante. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

 

CAPÍTULO 2

 

 

FORÇA E MATÉRIA

                                                            

“Na Natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”. Lei da conservação das massas. Antoine Laurent Lavoisier (1714-1789), Químico.

 

“Ainda não sabemos o que é energia. Não sabemos ainda por ser a energia uma coisa estranha”.  Richard Feynman (1918-88), físico quântico.                                                                                  

 

A. FORÇA

 

Neste capítulo, focalizaremos o conceito de Força, tanto do ponto de vista da Física quanto do ponto de vista da Filosofia, através dos tempos até os dias atuais. No primeiro enfoque, apresentaremos uma visão científica da Força e, no segundo, uma visão filosófica.

 

1.      Visão científica da Força

 

Atualmente, sabemos que todos os corpos e substâncias são de fato combinações feitas de átomos, como previu Demócrito (460-370 a.C.), que, por sua vez, são compostos de numerosas partículas subatômicas mantidas juntas por somente quatro forças fundamentais da natureza, cujas intensidades aumentam na ordem em que se apresenta, a seguir:

 

i A Gravidade

 

A Gravidade é a força que mantém os nossos pés firmes junto à Terra e também que mantém ligados o sistema solar e as galáxias. Se a força de gravidade pudesse ser interrompida de alguma maneira de uma hora para outra, nós seríamos arremessados imediatamente ao espaço exterior a 1.700 km por hora. Além disso, sem a gravidade, o Sol, que se mantém unido graças a ela, explodiria em uma catastrófica erupção de energia. Sem a força da gravidade, a Terra e os planetas girariam para fora do sistema solar nas profundezas do espaço supergelado e as galáxias se desintegrariam em centenas de bilhões de estrelas. O conceito mais moderno de alguns físicos arrojados é que a gravidade resulta de uma deformação do espaço-tempo.  Atualmente existe uma grande celeuma científica sobre o assunto (5).

 

i O Eletromagnestismo

 

O Eletromagnetismo é a força que mantém os elétrons da eletrosfera dos átomos ligados ao núcleo atômico com a energia de aproximadamente dez elétron-volts. Esta força é responsável pela iluminação de nossas cidades e energização de nossos aparelhos eletrodomésticos. A revolução industrial e a eletrônica nos deram as lâmpadas incandescentes e fluorescentes, a televisão, o telefone, o computador, o rádio, o radar, as microondas, o telefone celular, etc., todos subprodutos da força eletromagnética. Sem esta força, nossa civilização estaria estagnada há várias centenas de anos, relegada a um mundo primitivo iluminado à luz de velas e fogueiras. É fácil compreender que o domínio da força eletromagnética por James Clerk Maxwell (1831-1879), a partir do ano de 1860, revolucionou radicalmente o nosso estilo de vida. Para sentirmos isso, basta ocorrer um blecaute, quando, por algumas horas, somos forçados a viver nossas vidas repetindo os hábitos de nossos antepassados dos últimos séculos. Anualmente, as estatísticas nos dizem que, mais da metade da riqueza industrial do planeta deriva, de um modo ou de outro, do uso da força eletromagnética. A civilização moderna, sem o uso da força eletromagnética, seria inconcebível (5).

 

i A Força Nuclear Fraca

 

A Força Nuclear Fraca é a força que controla o decaimento radioativo (radioatividade) dos átomos. É a força fraca dos radioisótopos utilizados em equipamentos hospitalares modernos na forma de traçadores radioativos, que abriram as portas para a medicina nuclear. Neste sentido, a tecnologia de diagnóstico e tratamento permite produzir imagens do cérebro ao vivo, detectáveis em uma tela de computador, sendo possível observar o que se acredita ser o processamento do pensamento (não a sua geração) e das emoções (aqui também, não a sua produção) pelo decaimento do carbono radiativo do açúcar levado ao cérebro pela corrente sanguínea (5, 6).

 

i A Força Nuclear Forte

 

A Força Nuclear Forte (5, 7), é a força que mantém os prótons e nêutrons unidos no núcleo atômico, com uma energia da ordem de dez milhões de elétron-volts. É um milhão de vezes mais forte que a força eletromagnética. É ela que dá o imenso poder ao Sol e, assim também, a todas as estrelas, fontes inquestionáveis e inesgotáveis de energia. Sem a força nuclear forte, as estrelas tremeluzentes se apagariam e o espaço ficaria totalmente escuro. Sem o Sol, toda a vida na Terra pereceria e os oceanos congelariam. É a força nuclear do Sol que torna possível a vida na Terra. Esta força foi dominada pela moderna tecnologia humana e é ela a responsável pela geração de energia elétrica nas usinas nucleares, mas também, é ela que, ao explodir uma bomba atômica de hidrogênio, libera uma quantidade tão grande e devastadora de energia que pode ser comparada a um pedaço do Sol em queda sobre a Terra. A partir da descoberta da bomba atômica (1945), a história humana, pela primeira vez, enfrentou um novo e intrincado jogo de escolhas políticas que poderia, inclusive, levar à aniquilação total de toda a vida na Terra. Com o conhecimento da força nuclear forte, nós finalmente pudemos entender e compreender a colossal máquina energética que existe dentro do Sol e das estrelas, mas também pudemos vislumbrar, pela primeira vez, o risco de se exterminar a humanidade.

 

2.      A Teoria da Relatividade e a Física Quântica

 

Podemos afirmar, sem nenhum exagero, que o domínio de cada uma destas quatro forças fundamentais da natureza, mudou toda a face da civilização humana nos últimos três séculos, principalmente no século XX. Por exemplo, quando Newton tentou resolver matematicamente a sua teoria de gravitação, por não haver condições de cálculo aplicáveis, foi forçado a desenvolver uma nova matemática (cálculo diferencial e integral) e formular as suas célebres leis da gravitação e do movimento celeste (5). Estas leis da mecânica, por sua vez, ajudaram na implantação da Revolução Industrial que ergueu a humanidade de milênios incontáveis de atraso, de trabalho opressivo e de miséria.

Portanto, é fora de dúvida que, sempre que os cientistas desvendaram os segredos de cada uma das quatro forças fundamentais da natureza, isto irrevogavelmente alterou o curso da história da civilização moderna. A história moderna nos confirma que algumas das maiores inovações científicas derivaram da compreensão e utilização gradual destas quatro forças fundamentais da natureza.

Submetidos que estamos aos ditames destas quatro forças fundamentais, cabe a esta altura perguntarmos: elas podem ser unidas em uma única super força? Será que elas são as manifestações de uma realidade mais profunda, totalmente desconhecida da ciência atual?

Nos dias de hoje, há duas teorias físicas que explicam, parcialmente, as características misteriosas destas quatro forças fundamentais da natureza. Ambas, a teoria da relatividade geral e a teoria quântica, no seu conjunto, conseguem explicar a soma total dos conhecimentos físicos ao nível fundamental, sem nenhuma exceção. Estas duas teorias são as mais bem sucedidas de todos os tempos, tendo passado pelos testes de milhares de experiências e desafios científicos. Desta forma é que as leis da química e da física podem ser explicadas por estas duas teorias.

Para descrever e explicar os fenômenos do mundo subatômico – o microcosmo, a teoria quântica se aplica maravilhosamente. Contudo, por contraste, para descrever e explicar os fenômenos do macrocosmo – o espaço sideral, o mundo das estrelas, das galáxias, dos buracos negros e da Criação do Universo – os fundamentos por excelência residem na teoria da relatividade geral. (5)

É a teoria quântica que explica três das quatro forças essenciais da natureza (a eletromagnética, a força nuclear fraca e a força nuclear forte), acima descritas, através da troca de minúsculos pacotes de energia, chamados quanta. Quando uma lâmpada é acesa e um feixe de luz é emitido, por exemplo, trilhões e trilhões de fótons, ou quanta de energia se deslocam a partir de sua origem – a fonte emissora. Todos os fenômenos eletromagnéticos, envolvendo a emissão de luz de qualquer tipo, radiações e ondas como as aplicadas nas transmissões de rádio, TV, radar, microondas, raios X, raios laser, etc., são causados pelo movimento destes fótons minúsculos de energia. Igualmente, a força nuclear fraca é governada pela troca de partículas subatômicas chamadas W-bosons, evitando, assim, que a grande maioria dos átomos se desintegre naturalmente pelo fenômeno da radioatividade. A força nuclear forte, por outro lado se explica pela presença das partículas elementares conhecidas como quarks, mantendo, assim, os prótons do núcleo bem próximos uns dos outros pela troca de gluons, outro tipo de partícula nuclear, responsável por um efeito do tipo “colagem” ou estabilização dos prótons. O único átomo desprovido desse mecanismo é o hidrogênio (o primeiro elemento da Tabela Periódica), por só possuir um próton em seu núcleo. (5, 6)

Todavia, a teoria quântica encontra-se em estreito contraste com a teoria da relatividade geral de Einstein, que postula um quadro físico completamente diferente para explicar a força de gravidade. Esta teoria, que não dispensa a quarta dimensão (o espaço-tempo), nos ensina que todos os movimentos no espaço se processam segundo uma trajetória curva, levando a uma definição de força completamente nova. Por ela, o conceito de força é substituído por outro conceito mais elegante, que leva em conta a curvatura do espaço: a força da gravidade nada mais é do que o subproduto da deformação do espaço. Segundo essa teoria, a Terra move-se ao redor do Sol em um caminho curvado, porque o espaço-tempo por si só é curvado. Neste novo quadro, a gravidade não é uma “força”, mas um subproduto da deformação do espaço-tempo. (5) Assim, num certo sentido, a gravidade não existe; o que move os planetas e as estrelas é a distorção do espaço-tempo, que é um continuum de quatro dimensões: três espaciais e uma temporal.

Os cientistas encontram-se, há mais de cinqüenta anos, numa encruzilhada, tentando resolver este impasse científico representado pela incompatibilidade entre estas duas teorias. O próprio Albert Einstein, autor da teoria da relatividade especial (conversão de matéria em energia segundo a clássica fórmula E = mc²) e da teoria da relatividade geral (que explica a gravidade), trabalhou na solução deste problema durante os últimos trinta anos de sua vida, sem sucesso. São quadros físicos diferentes – pacotes (quanta) de energia de um lado versus o continuum do espaço-tempo de outro, exigindo diferentes tratamentos matemáticos para descrevê-los. Esta é a raiz do problema. Todas as tentativas feitas pelas maiores mentes do século XX, no sentido de fundir a teoria quântica com a teoria da gravidade, falharam. Inquestionavelmente, o maior problema da segunda metade do século XX diante dos físicos de hoje, é a unificação destas duas estruturas físicas em uma só teoria, que passou a ser denominada pelos físicos de “Teoria do Tudo”, mas que não foi sequer formulada.

”Houve quem comparasse este triste estado de coisas como uma mãe natureza que tem duas mãos, em que nenhuma delas se comunica com a outra. Nada poderia ser mais embaraçoso ou patético do que ver alguém cuja mão esquerda agiu em ignorância total da mão direita”, (5) disse o físico Michio Kaku, que enfrenta este dilema. 

 

3.      Teoria das Supercordas

 

Os físicos mais renomados do mundo inteiro, inclusive muitos prêmios Nobel, trabalham incessantemente sobre o assunto, buscando a solução do problema, não sem enfrentarem entre si, grandes e intensas controvérsias. Está em voga, no momento, a nova teoria das supercordas, que vai preocupar os cientistas do mundo inteiro nos próximos cinqüenta anos deste século XXI, da mesma forma que a teoria quântica ocupou os últimos cinqüenta anos. É uma teoria “louca o bastante” para ser correta, que postula que toda a matéria e energia podem ser reduzidas a minúsculos fios carregados de energia que vibram em um universo de 10 dimensões. (5) Mas, é uma teoria sedutora, que soa bonita, mas parece muito esdrúxula! As cordas podem vibrar em freqüências diferentes, como as cordas de um violino. Cada freqüência, por sua vez, corresponde a uma das quase trezentas partículas subatômicas já descobertas pelos físicos. O grande problema dessa teoria é que é preciso reinventar uma nova matemática, para tratar das equações extremamente complexas necessárias para a sua demonstração. Edward Witten, do Instituto de Estudos Avançados de Princeton (USA), tido como sucessor de Albert Einstein, é um dos muitos que estão nesta desafiadora empreitada. (5)

Para resumir: as “notas” da supercorda são as partículas subatômicas, as “harmonias” das supercordas são as leis da física e o “universo” pode ser comparado a uma sinfonia de supercordas vibrando.

Quando a corda vibra, porém, ela faz o continuum espaço-tempo circunvizinho deformar-se. Surpreendentemente, afirmam os físicos, um cálculo detalhado mostra que a supercorda força o continuum espaço-tempo a ser torcido exatamente como Einstein originalmente predisse. Se isso vier a ser demonstrado, ainda que só matematicamente, os físicos estarão de posse de uma descrição harmoniosa que unificará a teoria dos quanta com a teoria do continuum espaço-tempo. (5)

 

4.      Visão filosófica da Força

 

Não devemos perder de vista que a separação entre filosofia e ciência, como conteúdo pragmático, é muito recente e só se consolidou em meados do século XIX. Assim, os pensadores anteriores a 1850, que se dedicavam à especulação metafísica do desconhecido ou ao estudo da natureza, eram todos tidos como sábios e não como filósofos ou cientistas ou mesmo intelectuais, conceitos estes de introdução muito mais recente. Alguns tinham o conhecimento de um enciclopedista, tão profundo e diversificado era o seu saber. (9) A separação, hoje, aceita de tantos conhecimentos dissociados das ciências ditas exatas (Matemática, Química e Física), ou delas se diferenciando via especialização para pesquisa, ou com fins profissionalizantes (Filosofia, Psicologia, Sociologia, etc.), impôs-se mais precisamente a partir da Revolução Industrial. A filosofia moderna nasceu, assim, como conseqüência e como necessidade à época do Racionalismo de René Descartes (1596 -1650), englobando e realinhando conceitos mais avançados e seguros de metafísica, ética, moral, política, força e matéria, espírito e corpo, consciência, causalidade, substância, etc. Estes conceitos, principalmente sobre a exata compreensão da dualidade espírito-corpo, da consciência e de milhares de fenômenos a eles associados, constitui um grande desafio para a ciência.

Sob o ponto de vista filosófico-idealista, tudo o que existe deriva de uma Razão Universal, de supremacia absoluta. Por exemplo, para Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770 - 1831), filósofo alemão da escola idealista pós-Kant, o mundo (Terra) é a forma de realização, cujo princípio deriva da idéia absoluta de um princípio racional e ideal superior, divinizado pelas religiões que, no processo de autodesenvolvimento, conhece sua própria essência através da natureza e da história humana, isto é, este princípio acha-se em perene evolução. Há aqui uma aproximação indireta ao princípio da Evolução. (18) Concepções análogas do mundo são próprias de numerosos filósofos do idealismo objetivo. Já os idealistas subjetivos consideram todos os objetos do mundo exterior como se fosse algo derivado do mundo interior do homem, de suas sensações e percepções. Devemos lembrar que, os objetos possuem propriedades que são características da própria Matéria, enquanto que, a Força comanda o movimento e as transformações e, nas suas formas mais evoluídas, possui atributos.

Mas, voltemos um pouco mais no tempo. Na segunda metade do século XVII, Leibniz (1646 - 1716) refletiu profundamente sobre o conceito de substância e, juntamente com ele, introduziu o conceito de mônada, este último inspirando-se, por analogia, na teoria atomista de Demócrito e também, nas idéias de Giordano Bruno. (8, 13) Segundo ele, “para que uma coisa seja realmente um ser – uma substância – ela precisa ser verdadeiramente única, precisa ser uma entidade dotada de genuína unidade. Unidade substancial requer uma entidade indivisível e naturalmente indestrutível”.

Ora, a matéria, como nós a percebemos, é extensa (ocupa lugar no espaço) e infinitamente divisível (inclusive o próprio átomo – unidade fundamental da matéria), logo não pode ser a verdadeira substância, isto é, a essência dela mesma. (8) A essência é única (gênero, representada pela Força fundamental) e, ao mesmo tempo, individualizável (espécie – o mundo físico, representado pela matéria fundamental), indivisível, eterna e inesgotável. O ser verdadeiro deve possuir unidade (Força)  e, como os corpos (Matéria) são extensos e divisíveis, eles não representam essa unidade (Força). A partir desse raciocínio lógico, quase palpável, Leibniz criou o conceito de mônada. A unidade está nas mônadas, que são pontuais (partículas da Força) e indivisíveis, e assim respondem pela realidade das coisas. Força e Matéria, quando unidas, representam a nossa realidade física, atuando sempre a Força sobre a Matéria  que com relação ao movimento é inerte. (10) Os termos Força e Matéria foram por nós introduzidos aqui e nas considerações que se seguem, no sentido de atualizar estes conceitos.

Para o observador atento, existe aqui uma forte semelhança com a atual teoria das supercordas, de que tratamos ao final da visão científica da força. A palavra “mônada” significa “unidade” (vem do grego: monas). O termo foi usado primeiro pelos pitagóricos, como o nome do número inicial de uma série de números. Giordano Bruno empregou o termo com sentido de “substância real”, (7) emprego que ele teria copiado de Plotino e passado a Leibniz, que certamente leu os seus escritos.

Falemos um pouco mais das mônadas. Mas, de que são feitas as mônadas? De dois elementos: um elemento material (Matéria) e um elemento espiritual e dinâmico (Força), que no seu conjunto formam sua natureza específica, são inseparáveis nos mundos físicos (como na Terra, por exemplo), enquanto uma determinada Força (individualizada) atuar sobre uma determinada matéria (individualizada) e variam quantitativamente, isto é, cada mônada tem uma relação de quantidade diferente entre o que possui de material (propriedades) e de espiritual (atributos ou qualidades intrínsecas), dependendo de qual corpo constitui, se um corpo bruto de uma pedra (reino mineral) ou o corpo de um ser vivente (vegetal ou animal, inclusive o próprio homem). (8, 10, 18)

Todas as mônadas (Forças) são eternas, imortais. Porém, toda mônada (Força), quando atuando sobre a matéria mineral ou organizada (seres viventes), conserva sempre certo grau de passividade – sua imperfeição, da qual a mônada criada (na forma conjunta de Força-Matéria) só se libertará como Força por meio da evolução. A matéria-prima (concebida em abstrato, pois não existe sem a matéria segunda, a forma), é a matéria em si mesma, de todo passiva, sem nenhum princípio de movimento. A matéria segunda ou “vestida” é aquela que tem em si um princípio de movimento, que é o princípio vital nos seres mais avançados, ou seja, a Força no seu conceito mais potencializado. Assim, à matéria-prima, de todo passiva, dotada apenas de extensão (como queria Descartes), Leibniz contrapõe a matéria segunda ou “vestida”, que contém a Força espiritual, dotada de ação. O elemento material na mônada, corresponde à passividade da matéria-prima e o elemento imaterial, corresponde à atividade da forma da substância, dada pela Força; matéria e forma, Força e Matéria, como em Aristóteles e mesmo como em Platão, pois cada mônada representa uma matéria-prima ou princípio passivo, posta em ação pelo elemento ativo (Força) que é, na escala humana, uma alma, um espírito que busca a perfeição. (8, 10, 18)

É de assinalar-se que Baruch Spinoza (1632 - 1677), também trabalhou e considerou o conceito de mônada, com o seguinte raciocínio:

 

[...] ora, toda substância é mônada, todos os corpos são feitos de mônadas, e estas são unidades rigorosamente indivisíveis e, portanto, inextensas, porque a extensão é sempre divisível. Estas mônadas simples não podem deteriorar-se, nem serem dissolvidas (têm vida eterna) e também não derivam de qualquer composição. Constituem a verdadeira substância (essência), porém variam em si mesmas, no seu grau de espiritualidade, e assim podem constituir substâncias diversas de Deus e próprias de cada coisa. (21)

E, como fala aqui em espiritualidade, estava se referindo ao Homem. Leibniz propôs que o mundo consiste somente de um único tipo de substância (gênero), um único e verdadeiro ser que é a Natureza ou Deus, porém existe uma variedade infinita de substâncias (espécie) desse tipo. A dualidade interna das mônadas, em parte materiais e em parte espirituais, faz com que participem, ao mesmo tempo, de um mundo espiritual e de um mundo físico, o que é parecido com a idéia de que o material e o espiritual são “as duas faces de uma mesma substância”, como pretendia Spinoza. Devemos lembrar que Spinoza tornou-se ateu já na sua juventude.

Vemos assim que, a dualidade para Leibniz (8, 10) e para Spinoza, (22) não tinha o mesmo significado, sendo o conceito cartesiano de dualidade muito mais radical. Leibniz contesta Descartes sob dois aspectos, dizendo que os cartesianos erraram em supor duas substâncias isoladas, a substância extensa (Matéria) e a substância espiritual (Força)  e erraram também por reduzirem a matéria simplesmente à extensão. Quanto ao primeiro aspecto, nas mônadas, que são a única substância, coexistem as duas naturezas, a material e a espiritual, de modo que tudo contém seu grau de materialidade e espiritualidade, sem que isto represente uma dualidade radical, como pretendia Descartes. Quanto ao segundo, Descartes (14, 15, 16) não se ocupa da Força, mas apenas do movimento, mera mudança de posição de um objeto em relação as suas coordenadas iniciais (cinemática, um capítulo da mecânica). O movimento visível não é simples movimento local observado, ele deve ser o resultado de uma Força; é produzido por uma “força viva”, que está na mônada. O conceito de Leibniz é uma formulação na qual, ao contrário da concepção da Mecânica cartesiana, o movimento não é criado por uma energia cinética, mas existe como parte da mônada. A chamada matéria, na sua essência, contém também, força. A idéia de uma natureza estática e inerte é substituída por uma idéia dinâmica; em contraste com uma física da extensão, ele retoma o pensamento grego de que a natureza é princípio de movimento. Ao contrário de Descartes, Leibniz (1675) considera os seres como forças vivas, não como máquinas. A noção de substância sempre foi essencialmente de coisa inerte que não explica a resistência que a matéria oferece ao movimento. Lembramos que os três foram contemporâneos e Leibniz encontrou-se pessoalmente com Spinoza, na Holanda.

Assim como rejeita a posição dualista de Descartes da independência entre uma substância material e outra espiritual, Leibniz rejeita igualmente a posição monista materialista de que o pensamento e a consciência estão no campo puramente material e mecânico. No seu livro Hypothesis Physica Nova, (1671) ele diz que, o movimento deriva, como havia sustentado o astrônomo alemão Johannes Kepler, da ação do espírito (Deus). Além do princípio de que as mônadas compõem todas as coisas do mundo exterior, existe a experiência interior, a experiência da consciência, a qual não pode ser explicada por números ou movimento.

Em resumo, a mônada não tem extensão, não é divisível, não é material. São unidades sem partes, que formam os compostos; são os elementos das coisas. Mônada é força, é energia, vigor. As mônadas são unidades de força. Não força física, mas capacidade de atuar, de agir. (8, 10)

Depois de definir a substância como ação, Leibniz explicou que a ação essencial da substância é a representação. A atividade contínua da mônada é o esforço de se realizar, representar a si mesma como consciência, adquirir sempre mais consciência daquilo que virtualmente contém em si mesma. Apesar de sua quantidade ser infinita, cada mônada é totalmente diferente uma de outra. Elas variam também em seu poder de representação. A forma mais primitiva, a percepção, compreende uma representação confusa e obscura de si mesma. A forma mais evoluída, a apercepção, consiste na representação clara perante si mesma, ou consciência de si mesma. (8, 10, 22)

 

B. MATÉRIA

 

Conforme sabemos, no Universo existe uma quantidade infinita de matéria dispersa, aglomerada e agrupada sob as mais diversas formas. Igualmente, na realidade de nosso mundo Terra, tudo o que ocupa lugar no espaço (extensão), inclusive a própria Terra, é constituído de matéria. Ela é diretamente percebida pelos nossos sentidos físicos. A matéria, apesar de inerte, pode se apresentar em movimento, ativada pela Força. Do ponto de vista absoluto, nada é imóvel em parte alguma do Universo: tudo está em movimento permanente e contínuo. Daí dizermos que há uma harmonia dinâmica em todo o Universo. Vamos examinar, a seguir, a matéria sob dois enfoques ou visões diferentes: a visão científica e a visão filosófica. Caracterizando-a como um dos componentes do Universo, passaremos a escrever seu nome com a inicial maiúscula.

 

5.      Visão científica da Matéria

 

Desde a mais remota antiguidade até a atualidade, o homem tem usado seus recursos mentais e seu engenho para conquistar as forças da natureza e empregá-la em seu benefício. Na descoberta da realidade concreta e essencial da Matéria não foi diferente. Há cerca de 2.400 anos, por volta da passagem de Pitágoras pela Terra, todo o conhecimento da Matéria ainda era reduzido aos quatro elementos fundamentais: ar, água, terra e fogo. Foi Demócrito de Abdera (Trácia), discípulo de Leucipo e Pitágoras, filósofo pré-socrático (460–370 a.C.), de sabedoria enciclopédica, que nos legou os primeiros conhecimentos sobre a verdadeira natureza da Matéria através de sua Teoria Atomista. Para ele, a Matéria era constituída de partículas minúsculas, indivisíveis e invisíveis a olho nu, a que ele chamou de átomos (do grego: sem divisão). Esta semente, que ficou em estado latente durante mais de 2.300 anos, só veio a germinar no final século XIX, mas só foi de fato consolidada na primeira metade do século XX, quando os segredos do núcleo atômico foram desvendados pela Ciência.

Vimos, pois, que até então, os átomos, bases essenciais da Matéria, eram considerados indivisíveis, desprovidos de estrutura e imutáveis. Mas, bem antes disso, a Ciência Química lidava com os átomos como elementos primários, invisíveis e indestrutíveis da Matéria, que podiam se unir, separar e mudar sua situação no espaço específico de suas estruturas, determinando assim toda a diversidade qualitativa e quantitativa das numerosas substâncias e produtos que podia criar. Deste modo, a idéia da imutabilidade dos átomos identificava-se com a idéia da Matéria como um dos componentes básicos do Universo. A favor dessa visão universal da Matéria, o químico Antoine Laurent Lavoisier (1743–1794), em 1774, verificou experimentalmente que, num sistema químico fechado, a massa total permanece constante. Com base nas suas demonstrações experimentais estabeleceu o princípio químico e filosófico geral que recebeu o nome de Lei da Conservação das Massas: “Na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”. Este princípio universal corroborou o princípio da indestrutibilidade dos átomos, estabelecido pela Teoria Atomista de Demócrito há 2.300 anos!

Para ter-se uma idéia da diminuta dimensão dos átomos, vamos tomar um minúsculo fio de cobre, desses que são utilizados nas instalações elétricas de sua casa e dividi-lo em partes cada vez menores. Saiba que, mesmo que você utilize um microscópio e continue dividindo-o em pedacinhos microscópicos, você estará ainda muito aquém de ver um átomo de cobre. Então, quanto mede o átomo de cobre? Bem, para imaginar isso, saiba que se você pudesse alinhar átomos de cobre um ao lado do outro, ao longo da extensão de um milímetro, caberiam 10 milhões de átomos! Outro exemplo: uma pequena esfera inteiriça de cobre de dois centímetros de diâmetro contém cerca de 25 setilhões de átomos, isto é, o número vinte e cinco seguido de vinte e quatro zeros! Isto quer dizer que, se mantivéssemos as mesmas proporções e ampliássemos o diâmetro dos átomos para o mesmo diâmetro da esfera de cobre (dois centímetros), esta teria agora 200 milhões de centímetros de diâmetro ou 200 quilômetros! É por isso que chamamos este pequeno mundo de microcosmo, em oposição ao macrocosmo, isto é, toda a extensão do universo. (23)

Mesmo assim tão diminuto, o átomo é, por sua vez, constituído de partículas muito menores e que têm grande utilidade para nós. Vários modelos atômicos precederam o atual, como o do inglês John Dalton (1803), o do inglês Joseph J. Thomson (1903), o do neozelandês Ernest Rutherford (1911). Atualmente, desde 1913, é adotado o modelo básico criado pelo físico dinamarquês Niels-Bohr, que é representado por um pequeno núcleo central envolvido por uma ou mais camadas de partículas dispostas em órbitas que giram em torno dele, constituindo a eletrosfera. Nas camadas orbitais, semelhantemente aos planetas, circulam partículas que têm o nome de elétrons, que possuem carga elétrica negativa. No centro, o núcleo fixo, como se fosse um pequeno sol é muito mais estável que as camadas orbitais e contém partículas mais pesadas que os elétrons, sendo as principais de duas naturezas: os prótons, com carga elétrica positiva e os nêutrons com carga neutra. Nos átomos, o número de prótons é igual ao número de elétrons, variando a sua quantidade de um tipo a outro de átomo, determinando assim, o número atômico do elemento. Os átomos, no seu estado normal, são estáveis e suas cargas estão eletricamente equilibradas. Para facilitar o estudo, os átomos foram dispostos em uma tabela - conhecida como Tabela Periódica dos Elementos - de forma organizada e lógica quanto aos seus números atômicos, onde o átomo de Hidrogênio é o mais simples, ocupando o primeiro lugar e, o átomo de Urânio, de número 92, que ocupa o último lugar na escala atômica natural dos elementos, é o mais complexo. Com o advento da energia atômica, esta tabela dos elementos naturais foi estendida para incluir, também, os elementos transurânicos, que são atualmente em número de 21, de modo que, a Nova Tabela Periódica dos Elementos engloba 113 elementos. Para se ter uma idéia de grandeza, um átomo típico tem o diâmetro de 10 elevado a menos 8 do centímetro e o seu núcleo, de 10 elevado a menos 13 do centímetro, isto é, o átomo inteiro é 100.000 (cem mil) vezes maior que o núcleo. Entretanto, mais de 99% da massa do átomo encontra-se no seu núcleo. (1, 3)

Todos os átomos possuem propriedades, algumas genéricas e outras específicas, dando-lhes identidade própria. Os átomos podem se aglomerar com um ou mais átomos idênticos ou diferentes, formando as moléculas que, por sua vez, são as menores porções de uma determinada substância. A Química e as tecnologias dela derivadas dizem respeito às reações e fenômenos, utilizando a Matéria e, portanto, os átomos e moléculas, em suas mais variadas formas, para produzir substâncias e produtos de grande utilidade para a nossa vida moderna. Para conseguir isso, esta ciência necessita apenas interagir na camada orbital mais externa de elétrons, chamada de camada de valência.

De outro lado, outro conjunto de propriedades dos átomos, que decorre da existência de elétrons livres, é objeto da Física Clássica e atividades dela derivadas. Estes elétrons, proporcionados por certos materiais como o cobre do nosso exemplo anterior, gerados por excitação da referida camada sob determinadas condições, servem para produzir eletricidade, campos elétricos e eletromagnéticos, bem como, numerosos outros fenômenos que inter-relacionam a Força e Matéria.

Com relação à interferência nos núcleos atômicos, esta resulta muito mais complexa e muito mais dispendiosa, qualquer que seja a sua finalidade – pesquisa, geração de eletricidade, produção de bombas atômicas e produção de radioisótopos para uso em Medicina. Para alcançar esses objetivos, há necessidade de se recorrer aos conhecimentos da Física Nuclear, atualmente uma tecnologia sob rigoroso controle das Nações Unidas.

Há a considerar-se, ainda, as partículas elementares que, à exceção do elétron, atuam no interior do núcleo ou possuem vida independente. Na atualidade, já foram descobertas cerca de trezentas variedades de partículas elementares. À maioria das partículas conhecidas, correspondem antipartículas (opostas a elas pelo sinal da carga elétrica e por algumas outras propriedades), como por exemplo, ao elétron (carga negativa) corresponde o pósitron (carga positiva), ao próton, corresponde o antipróton (carga negativa), etc. Há diferenças sutis entre as partículas e as antipartículas que afetam somente algumas propriedades parciais da Matéria, como o sinal da carga elétrica, o momento magnético, etc., mas, a maioria de suas propriedades são iguais. Possivelmente, aplicam-se à antimatéria as leis da ação recíproca nuclear, eletromagnética e gravitacional e, por conseguinte, as leis que regem a formação das distintas combinações químicas, dos sistemas cósmicos, etc. Talvez, em vez de se usar o termo “antimatéria” para designar esta forma hipotética da Matéria, seja mais correto empregar o termo “matéria de antipartículas”, pois que a massa última em repouso que caracteriza a substância é própria também de todas as antipartículas, exceto a do antineutrino. (2)

Mais especificamente, não se pode incluir na categoria de Matéria partículas elementares como o neutrino e o antineutrino de distintos tipos, cuja ação recíproca com a Matéria é débil, pois estas partículas possuem uma fortíssima capacidade de penetração. Estas partículas absorvem uma considerável quantidade de energia das estrelas, preenchem todo o espaço que nos rodeia e seu papel na transformação geral da Matéria no Universo deve ser muito grande, embora a Ciência esteja ainda muito distante de desvendar seus segredos. E o que pensar das antipartículas dos neutrinos – os antineutrinos? (2)

 

6.      Visão filosófica da Matéria

 

Muitas teses ousadas e algumas até profundas, foram formuladas ao longo da História sobre a Matéria. As concepções materialistas buscaram no desenvolvimento científico sua fonte de inspiração, firmando-se nas propriedades fundamentais da Matéria (campo de estudo da Química) e nas leis que regem o movimento físico (campo de estudo da Física). Foram os materialistas franceses do século XVIII, que argumentaram a favor da tese de que a Matéria e o movimento são inseparáveis – na tentativa de sepultar o dualismo Força e Matéria de René Descartes – e de que o movimento é um atributo importantíssimo, uma forma de existência da Matéria. O fundamento do movimento inerente à Matéria gerou enormes controvérsias. Daí, entre tantas concepções de Filosofia Materialista, com fundamento na Matéria, devemos nos deter em apenas duas.

 

i Materialismo Mecanicista

 

As leis da mecânica de Isaac Newton (1642–1727) eram consideradas leis universais da natureza e também, princípios fundamentais do ser que condicionam todas as demais leis da natureza e da sociedade. Estas leis constituíam a base do materialismo vigente a sua época – o materialismo mecanicista, que precedeu ao materialismo dialético de Marx e Engels. Os grandes progressos científicos operados nas Ciências Naturais (Teoria da Evolução, de Charles Darwin), na segunda metade do século XIX (1859) e os descobrimentos da Física e da Química, prolongaram-se por todo século XX. Neste período, com o desenvolvimento da teoria do campo magnético, o descobrimento da radioatividade e da estrutura complexa dos átomos e tantos outros, as bases da visão mecanicista do mundo, se viram minadas. Pois que, enquanto não se encontrava uma explicação ampla para o fenômeno da radioatividade, usada como uma prova de que a Matéria “desaparece”, a lei da conservação das massas, estabelecida por Lavoisier, parecia ter caído por terra. (2) Apesar destes novos descobrimentos, os defensores do materialismo dialético continuaram afirmando que a destrutibilidade do átomo, sua inesgotabilidade, a mutabilidade de todas as formas da Matéria e de seu movimento foram sempre o pilar do materialismo dialético.

Surgiram, então, muitas correntes de filosofia materialista, com as mais variadas concepções, todas elas, porém, valendo-se exclusivamente das percepções de nossos sentidos físicos e dos instrumentos criados pelo próprio homem. Os materialistas tentam explicar o mundo que nos rodeia por meio da atividade de um órgão material, o cérebro humano, afirmando que até mesmo as idéias e os conceitos mais abstratos são produzidos pela atividade cerebral. Esta corrente de pensamento pretende nos passar a idéia de que o mundo que nos rodeia, não é nada mais que uma forma concreta da Matéria, um determinado estado ou propriedade dela, um produto de sua mutação constante e regular. Os seguidores dessa corrente chegam a afirmar que a Matéria é a única base universal de tudo que existe, de todos os objetos e fenômenos da realidade e expressa a essência mais geral do mundo.(2) Pensam assim e baseiam suas justificativas, na realidade observada no desenvolvimento da Ciência ao longo da História do Homem, principalmente no aproveitamento tecnológico do último século.

A Matéria e toda a quantidade infinita dos mais diferentes objetos que existem e se movem no espaço e no tempo, têm uma diversidade inesgotável de propriedades. Nossos órgãos dos sentidos podem perceber só uma parte insignificante de todas as formas da Matéria realmente existentes; porém, graças à construção de aparelhos e instrumentos de medição cada vez mais perfeitos, o homem amplia sem cessar os limites do mundo conhecido. Assim, as partículas elementares que a ciência descobriu no século XX, diferenciam-se qualitativamente por suas propriedades dos corpos macroscópicos com que se relaciona o homem em sua vida diária e isto aprofunda, de maneira essencial, as nossas noções da Matéria.

 

i Materialismo Dialético

 

Para o materialismo dialético, que impregnou o socialismo marxista adotado pela União Soviética e países satélites, durante a maior parte do século XX, o conceito de Matéria como realidade objetiva tem um sentido amplo e caracteriza a Matéria e todas as suas propriedades, leis gerais, leis de movimento, leis de existência, etc. a ela associadas. Estes “agregados” são, diante deste conceito, verdadeiros acessórios inerentes à Matéria, como por exemplo, certa lei de sua existência, um tipo de movimento, etc., inseparáveis da Matéria, porém não idênticos a ela e, portanto, não se pode conceituar de Matéria. Assim, o movimento, o espaço, o tempo e as leis da natureza possuem uma realidade objetiva, porém não se pode conceituá-los como Matéria, A Matéria existe em forma de variedade infinita de objetos e sistemas concretos, cada um dos quais possui movimento, estrutura, concatenações e interações espaço-temporais e outras muitas gerais e particulares. A Matéria não existe fora dos objetos e sistemas e, neste sentido, não há objetivamente “matéria como tal”, matéria “pura”, como substância primária e amorfa. O materialismo dialético admite a substancialidade da Matéria, porém só no sentido do que ela é precisamente como a única base universal, o substrato para as diversas propriedades, concatenações, formas de movimento e leis. Qualquer forma de Matéria (incluídos os micro objetos) possui uma estrutura complexa, uma infinidade de concatenações internas e externas, bem como a faculdade de se trocar em outras formas.

O materialismo dialético, (2) que refuta a existência da “matéria primária” como essência última e imutável, reconhece a substancialidade da Matéria somente no sentido de que precisamente ela (e não a consciência, nem algo sobrenatural), é a faculdade base universal das distintas propriedades dos fenômenos e determina a unidade do mundo circundante. Afirmam os materialistas dialéticos que o desenvolvimento sucessivo do conhecimento permitirá, sem dúvida, penetrar em níveis estruturais mais profundos da Matéria, sem invalidar a sua filosofia. Por isso, o conceito de substância mudou qualitativamente seu sentido na filosofia marxista.

O materialismo dialético e as leis dele decorrentes servem de base metodológica para efetuar investigações científicas, elaborar uma concepção científica e materialista do mundo e interpretar os descobrimentos da ciência de acordo com a realidade do mundo Terra. Note-se que esta doutrina se aperfeiçoa sem cessar, se aprofunda com o progresso do conhecimento científico e se formam novas categorias e leis que refletem, em grau cada vez maior, a realidade, a qual será sempre cada vez mais complexa que todas as nossas noções atuais, inclusive as mais perfeitas. (2)

Porém, o materialismo dialético falha ao afirmar que a Matéria é a base substancial universal de todos os fenômenos, não foi criada por nada, é indestrutível, eterna no tempo e infinita no espaço, tem existência objetiva e é independente da consciência. No nosso entendimento, trata-se de uma vã filosofia que não resiste a uma análise mais profunda.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) ROSSETTI. Modelo atômico de Bohr – o átomo impossível. Disponível em: www.rossetti.eti.br/index.htm. Acesso em: 06 jul. 2005.

 2) KONSTANTINOV, F. Fundamentos de la Filosofía marxista-leninlista – Materialismo Dialéctico – La materia y sus formas principales de existencia – Editorial Progresso – Moscú, 1977. Acesso em 06 jul. 2005.

 3) NETO, Luiz Ferraz. Constituição do núcleo do átomo. Disponível em www.leobarretos@uol.com.br. Acesso em 06 jul. 2005.

 4) MONTANER Y SIMÓN (Editora). Materialismo - Dicionario Enciclopédico Hispano-Americano, Montaner y Simón Editores, Barcelona, 1893 – Tomo 12 p. 579-582. Disponível em: www.filosofia.org/enc/eha.index.htm. Acesso em 06 jul. 2005.

 5) KAKU, Michio: Há uma teoria do tudo? (Is there a theory of everything?). Disponível em: https://paginas.terra.com.br/educacao/labertolo/Cosmologia/Cosmology/life_Hawking.htm. Acesso em: 06 jul. 2005.

 6) ANÔNIMO. Força nuclear fraca. Disponível em: www.pcarv.pro.br/inicio/default.asp. Acesso em 30 jun. 2005.

 7) ANÔNIMO. Força nuclear forte. In:_HAWKING, Stephen W. Disponível em: www.pcarv.pro.br/inicio/default.asp.   Acesso em 30 jun. 2005.

 8) KONSTANTINOV, F. Fundamentos de la Filosofia marxista-leninlista – Materialismo Dialéctico – El movimiento y sus formas principales – Editorial Progresso – Moscú 1977. Disponível em: ...??? Acesso em 06 jul. 2005.

 9) CHAUÍ, Marilena. As idéias de substância e de causalidade. Universidade de São Paulo, USP. 2005.

10) COBRA, Rubens Queiroz. Páginas de filosofia moderna. Disponível em: www.cobra.pages.nom.br/frmp-bruno.html#Caixa. Acesso em 27 jun. 2005.

11) COBRA, Rubens Queiroz. Páginas de filosofia moderna. Disponível em: www.cobra.pages.nom.br/frmp-leibniz.html#Caixa. Acesso em 27 jun. 2005.

12) GUILHERME LEIBNIZ. Disponível em: www.mundodosfilosofos.com.br/cartesianismo.htm#E.  Acesso em 27 jun. 2005.

13) OS FUNDAMENTOS DA MONADOLOGIA. Disponível em: www.mundodosfilosofos.com.br/leibniz.htm#A Acesso em 27 jun. 2005

14) O CARTESIANISMO (VIDA). Disponível em: www.mundodosfilosofos.com.br/descartes.htm#A. Acesso em 27 jun. 2005.

15) O CARTESIANISMO. (Discurso sobre o Método). Disponível em: www.mundodosfilosofos.com.br/descartes2.htm#A. Acesso em 27 jun. 2005.

16) O CARTESIANISMO (Meditações). Disponível em: www.mundodosfilosofos.com.br/descartes3.htm#A. Acesso em 27 jun. 2005.

17) HISTÓRIA DA FILOSOFIA MODERNA – cap 15 Art 1º Filosofia Racionalista – Séc XVIII – itens 607-613. Disponível em: www.cfh.ufsc.br/~simpozio/novo/2216y605.htm#TopofPage. Acesso em 02 jul. 2005.

18) VERGEZ, André e HUISMAN, Denis. História dos filósofos. 3.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1976. p. 187-197.

19) STEVENSON, Jay. O mais completo guia sobre filosofia. São Paulo: Mandarim – 2001.

20) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 42.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 1991.

21) LEIBNIZ, W. F. Monadalogia. In:_ VERGEZ, André; HUISMAN, Denis. História dos filósofos. 3.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1976. p. 187-197.

22) SPINOZA, Baruch. In:_VERGEZ, André; HUISMAN, Denis. História dos filósofos. 3.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1976. p. 170-184.

23)COELHO, Aristides Pinto. O que você deve saber sobre a energia nuclear. CNEN – Comissão Nacional de Energia Nuclear. Rio de Janeiro: Graphos, 1977, 32 p.

CAPÍTULO 3

 

 

OS CAMINHOS DA EVOLUÇÃO

 

“Nada no mundo vivo faz sentido, se não for à luz da evolução”

Theodosius Dobzhansky (1973).

 

 

Está fazendo 147 anos desde a publicação, em 1859, da obra Sobre a origem das espécies por meio da seleção natural ou mais abreviadamente, A origem das espécies, de autoria do naturalista inglês, Charles Spencer Darwin (1809-1882). Darwin fez a sua famosa viagem de quase cinco anos (1832-1836) a bordo do H.M.S. Beagle. Nessa viagem, a rota do Beagle incluiu Tenerife, Ilhas Cabo Verde, Brasil (Salvador e Rio de Janeiro, na ida e na volta), Uruguai, Argentina (Buenos Aires e Terra do Fogo), Chile, Peru, Ilhas Galápagos, Taiti, Nova Zelândia e Tasmânia. Mas foi nas Ilhas Galápagos, que ele mais informações colheu (1). Ao longo da viagem, Darwin fez observações e recolheu exemplares de uma rica e variada flora e fauna e passou a estudá-las durante 24 anos, para só então publicar o seu livro. Foi um trabalho sério e consciencioso.

Devemos lembrar que, somente na década de 1830, Karl Ernest von Baer organizou os trabalhos de Citologia e, juntamente com Theodor Schwann e Mathias Jakob Schleiden, estabeleceram as bases da Citologia, mostrando que animais e plantas são compostos dos mesmos elementos – as células (2). Quase ao mesmo tempo, na França, Claude Bernard (1813-1878) desenvolvia a Fisiologia. Por sua vez, as leis da hereditariedade descobertas por Gregor Mendel (1822-1884), foram propostas após Darwin ter publicado os seus trabalhos. Somente no início do século XX, os mecanismos da herança genética tornaram-se conhecidos através dos estudos sobre os cromossomos e os genes. A partir daí, com o desenvolvimento da Biologia Molecular (James Watson e Francis Crick, descobridores da estrutura do DNA e ganhadores do Prêmio Nobel de Medicina, em 1951) e, finalmente, da genômica (seqüenciamento do DNA, no final do século XX), surgiu a Teoria Sintética da Evolução ou Neodarwinismo, que se fundamenta na mutação e na recombinação gênica, conhecimentos esses que só foram incorporados à teoria de Darwin recentemente para explicar as diferenças entre indivíduos da mesma espécie e contrapor-se às críticas dos céticos e dos defensores do Criacionismo. (1)

Decorridos tantos anos, sem que aparecesse outra teoria melhor que a destronasse, a chamada teoria evolucionista de Darwin é a que mais se adapta aos fatos observados, ao explicar a evolução pela seleção natural entre as espécies. Lembramos que uma teoria bem parecida foi, simultânea e independentemente, apresentada pelo britânico Alfred Russel Wallace (1823-1913). (1, 2)

Mais que a obra Origem das espécies, Darwin provocou a ira da Igreja Católica ao publicar, doze anos mais tarde, a sua obra, A Descendência do homem (1871), em que reforçou sua teoria de que o ser humano teria descendido dos primatas. Com essa obra, Darwin entrou em confronto com a história bíblica da criação como está descrita no Gênesis. Os conservadores de toda a Europa também protestaram contra a teoria, por se recusarem a admitir que os ancestrais da espécie humana tivessem sido animais. Na época, Darwin foi muito ridicularizado por isso pela imprensa européia, que publicou “libelos contundentes ou sarcásticos contra o naturalista e suas teorias, consideradas extravagantes, anti-sociais e atéias. Uma charge daquele período, que se tornou conhecida do grande público, representava-o com corpo de macaco, encimado por seu crânio longilíneo, fisionomia séria e longa barba”.(3) Darwin sabia muito bem que a divulgação de suas idéias causaria repúdio e talvez seja por isso que protelara, por mais de vinte anos, a sua publicação. Só divulgou o seu trabalho “quando tomou conhecimento das pesquisas e das conclusões de Alfred Russel Wallace, as quais estavam na iminência de serem divulgadas”.(3)

É lógico que ele teve defensores de expressão no meio científico em que transitava como, Thomas Huxley, Paul Broca e Ernst Haeckel, além do próprio Alfred Russel Wallace, que lhe reconheceu a primazia da Teoria da Evolução. Diante de uma teoria tão revolucionária, colocaram-se, de um lado, os darwinistas que percebiam, nas idéias “do polêmico naturalista, um modelo simples, completo e elegante, capaz de explicar a diversidade das espécies e as origens dos seres vivos e do homem em particular.” (3) Do outro lado, colocaram-se os criacionistas, defensores da fé, da religião e das escrituras ditas sagradas. Estas posições antagônicas são como água e azeite, não se coadunam e não se misturam, a tal ponto que, se o cerne dessa discussão tivesse ocorrido fora da Inglaterra e recuado cerca de um século, Darwin teria sido acusado de blasfêmia e heresia e teria sido queimado vivo na fogueira pela Inquisição. Doloroso é saber que a polêmica do criacionismo versus evolucionismo ainda subsiste nos dias de hoje, em pleno século XXI. Mais adiante, neste capítulo, vamos tratar dessa disputa que, para os religiosos é matéria de fé e, para os evolucionistas, matéria de razão e lógica.

Como até o momento a evolução das espécies só cuidou do reino vegetal e animal, inclusive o homem, nós vamos tratar aqui também da “evolução” que ocorreu no reino mineral, pois este também constitui um elo fundamental da Natureza. Coube a Charles Lyell (1797-1875), o pai da Geologia moderna e contemporâneo de Darwin, de quem se tornou amigo, na sua obra em três volumes, Os princípios da Geologia, só publicada entre 1830-1833, introduzir o conceito de “gradualismo” (observem a semelhança com o termo evolucionismo, de Darwin) na formação geológica da crosta da Terra. Sua obra frutificou e hoje, nós temos a evolução da Terra descrita em eras e períodos geológicos, resultantes dos grandes eventos e cataclismas pelos quais passou e vem passando o nosso planeta. Mas, nenhum cientista, que seja do nosso conhecimento, tratou da evolução da matéria em si, da sua organização e estruturação como cadeia inicial da evolução das espécies, embora a tenha estudado brilhantemente no que diz respeito ao conhecimento intrínseco do átomo e das partículas e sua interação tanto no núcleo atômico (prótons e nêutrons) como na eletrosfera (elétrons). É inegável que os resultados desses estudos e descobertas da Física e da Química, principalmente no século XX, levaram a humanidade a desfrutar de uma tecnologia avançada, descuidando-se, porém, dos valores morais do ser, isto é, a Ciência vem afastando-se da Filosofia da qual é filha legítima. Vamos, também, tratar da evolução do homem, não como espécie (matéria), mas como ser (Força Inteligente – o Espírito).

 

1.      Evolução da Força através da Matéria

 

Os conhecimentos cosmológicos atuais, quando fazemos um retrospecto desde os primórdios do Universo, qualquer que seja a teoria que venha ser adotada para explicar a sua origem e porque ela existe, não deixam dúvidas de que a evolução da matéria partiu do mais simples para o mais complexo. A direção em que ocorrem tais processos, sempre dos mais simples aos mais complexos, caracteriza o que chamamos de Evolução, não apenas material ou somática, mas também da Força e com ela, da energia em suas mais diversas formas conhecidas e desconhecidas da Ciência oficial. Inicialmente, formaram-se as partículas de energia (elétrons e quarks) e, quase que simultaneamente, as partículas de matéria (prótons e nêutrons) mediante a atuação da Força Universal. É fácil deduzir que ambas, Força e Matéria, formaram-se nessa seqüência, porque a Força precisa da Matéria para evoluir e constituir os mundos por elas formados. Só milhões de anos mais tarde após a origem do Universo, formaram-se os primeiros átomos de hidrogênio (matéria) – o mais simples, com um próton no núcleo e um elétron na eletrosfera. Este elemento aglomerou-se pela força de atração das massas e formaram-se as estrelas, que são verdadeiras usinas de força (fusão nuclear do hidrogênio, transformando-se este em hélio). Da fusão do hélio através da nucleosíntese, surgiram os elementos mais pesados. É de se notar que a formação dos elementos químicos não é indefinida – ela produz certo número de estruturas atômicas naturais (exatamente 92) e pára por aí. A combinação de átomos do mesmo elemento e de elementos diferentes, segundo as leis da química, produz as moléculas, macromoléculas e moléculas gigantes.

A formação dos planetas do sistema solar ocorreu há cerca de quatro e meio bilhões de anos. No que diz respeito à Terra, levando-se em conta o seu resfriamento até às temperaturas ambientais conhecidas e a atuação de numerosos fatores como intemperismo, vulcanismo, etc., formaram-se os oceanos e a crosta terrestre. Estas contêm, substancialmente, moléculas do tipo inorgânicas ou minerais, que são numerosas, embora em muito menor número que as do tipo orgânicas (que sempre contêm o elemento carbono). Para melhor estudar a crosta terrestre, os geólogos criaram as chamadas eras geológicas (pré-cambriana, paleozóica, mesozóica e cenozóica), todas abrangendo longos períodos geológicos bem definidos. Ainda segundo geólogos e paleontólogos, a rocha mais antiga conhecida, data de 3,8 bilhões de anos. (5) Desde o período arqueano da era pré-cambriana (2,5 bilhões de anos – 650 milhões de anos dos dias atuais), teriam surgidos os primeiros seres vivos, derivados de substratos coloidais conhecidos como coacervatos. Colóides são substâncias químicas complexas de elevado peso molecular.

Na crosta terrestre disseminaram-se os minerais, objeto de estudo por parte de uma ciência – a Mineralogia. A ocorrência de numerosos elementos na forma pura (diamante, enxofre, ouro, para citar alguns) e combinada (óxidos, carbonatos, silicatos, sulfetos e sufatos), seja como substâncias amorfas, seja nas mais variadas e lindas formas cristalinas, é conhecida de todos. Nelas, os átomos reuniram-se para formar as moléculas, constituídas, seja pelos mesmos elementos simples, seja por diferentes elementos, formando compostos binários, terciários e quaternários, em estruturas cristalinas, muitas delas ocorrendo na natureza sob a forma hidratada. Estas estruturas compreendem sete sistemas cristalográficos ou singonias (regular, tetragonal, hexagonal, romboédrico, rômbico, monoclínico e triclínico), todos com suas constantes cristalográficas e características de simetria (eixos) próprias .(6)

De acordo com a sua composição química, (6) os cristais estão classificados em grupos que dão origem a nove classes e várias subclasses, que vão desde os elementos químicos puros ou nativos (metais como o ouro, prata, cobre e não-metais como o diamante, grafite, enxofre), aos compostos químicos (sulfetos, sais halóides, óxidos, oxisais (dois tipos), fosfatos-arseniatos-vanadatos, silicatos e minerais radioativos). Quem observa os cristais e suas formas, muitos deles com notável brilho, cor e iridescência, não deixa de ficar encantado com sua beleza. Algumas dessas maravilhosas substâncias possuem formas alotrópicas – mesma composição química e estruturas cristalinas diferentes, como o enxofre e o carbono (carvão, grafite e diamante) que parecem nos dizer que têm individualidade própria. São formas de vida rudimentar, intrínsecas aos átomos que os constituem, mostrando-nos que neles a Força Inteligente age e interage, organizando o seu arranjo em simetria, condição que lhes dá a forma e outras propriedades, características de cada espécie mineral. Usei aqui o termo espécie, de propósito, para significar que, na verdade, os minerais são a ponta inicial das espécies em evolução, infelizmente não incluída na obra, A origem das espécies, de Darwin, mesmo tendo sido ele amigo de Lyell, como se expôs anteriormente.

Talvez por ser  Matéria o domínio da Física e da Química e, sendo a Geologia uma ciência distinta, ainda que conhecida por Charles Darwin, este notável naturalista não fez observações no reino mineral, perdendo-se assim uma excelente oportunidade de estender o conceito de evolução à matéria sob todas as formas. Darwin limitou-se, assim, à matéria organizada – que sempre contém o elemento carbono, encontrado no reino vegetal e no reino animal, inclusive no Homem. Mas, ainda que Darwin tivesse incluído a matéria organizada nas suas concepções evolucionistas, faltaria uma teoria global da evolução, que viesse incluir a ação da Força Inteligente, sob todas as formas, sobre a Matéria. Nem os físicos modernos (século XX), nem os filósofos, até o presente momento (2006), dirigiram seus esforços e inteligências para estudar e examinar a vida fora da matéria em todo o seu alcance e esplendor.

A vida fora da matéria embora sentida e conhecida pelos sábios filósofos da mais remota antiguidade, só passou a ser estudada, demonstrada e comprovada a partir de meados do século XVIII, com os trabalhos de William Crookes e numerosos outros investigadores independentes, conforme é amplamente apresentado no capítulo 6 – O surgimento do Espiritismo. Mas, ainda que nos limitemos ao planeta Terra, onde se conhece a vida tal como ela  se faz representar nos reinos da Natureza, constatamos que nem os físicos nem os pesquisadores da Biologia (biólogos, geneticistas, etc.) e da Medicina (neurocientistas), ainda  se dispuseram a se embrenhar nesse campo, tão essencial ao verdadeiro conhecimento da vida na Terra.

Foi Luiz de Mattos (7) que, já em 1910, num lance de grande intuição, afirmou que, na Natureza, só existem Força e Matéria e que a primeira atua sobre a segunda em todos os processos e afirmou ainda que, essa verdade estende-se desde o microcosmo até ao macrocosmo. São dele estes dizeres, constantes da página 49 do livro Racionalismo Cristão, 43ª edição: (7)

 

O globo terrestre é uma esfera de matéria organizada impregnada de forças que atuam diretamente sobre os átomos, constituindo-os, unindo-os e mantendo-os em equilíbrio, na sistemática de uma complexidade de movimentos.

O átomo está em constante vibração produzida pela energia existente no seu interior e liga-se a outro átomo pela força de coesão para compor a molécula. É também essa mesma força de coesão que une as moléculas entre si.

 

 Trata-se de um rasgo de intuição, quando os conhecimentos sobre o modelo atômico e da física quântica ainda estavam na sua infância, conhecimentos esses que não estavam ao alcance de Luiz de Mattos, por não ser este um cientista, mas filósofo espiritualista autodidata.

Mais adiante, na mesma obra citada, à página 50, Luiz de Mattos apresenta um esquema, mostrando a interação da Força Universal sobre a Matéria nos três reinos da Natureza, destacando-se os seus atributos fundamentais, com a predominância da Força (reino mineral), Força e Vida (reino vegetal) e Força, Vida e Inteligência (reino animal), nesta ordem. E a seguir, acrescenta (7), à página 51 da obra citada:

 

Não se deve inferir, daí, a inexistência de vida no reino mineral nem inteligência no reino vegetal. Apenas se menciona a predominância dos atributos fundamentais apontados, para facilitar a compreensão do leitor, dada a transcendentalidade do assunto.

O ser humano que quiser demorar-se na investigação deste importante tema, encontrará campo aberto para desdobrar o raciocínio, fortalecer as suas convicções e concluir que essas duas fontes substanciais – Força e Matéria – são o princípio e o fim, são unidades que se tocam em seus extremos, que correm paralelas e que, na sua incomensurabilidade, abrangem o infinito e penetram e envolvem o Universo.

As expressões aqui empregadas são relativas, à falta de outras que melhor possam exprimir uma concepção de ordem absoluta.

 

Compreende-se, portanto, que Luiz de Mattos, desde o início de sua obra lançada com o nome de “Espiritismo Racional e Científico Cristão”, hoje conhecida e divulgada como “Racionalismo Cristão”, com quase 100 anos de existência, sempre enxergou, ensinou e divulgou um conceito mais amplo de vida – um conceito não materialista da vida ou, expresso em termos doutrinários, um conceito espiritualista da vida, quando nela sua expressão suprema – o Homem é incluído, conforme veremos mais adiante. Para ele não só a Matéria evolui, mas também e principalmente a Força que incita todas as formas de matéria, desde a inorgânica ou mineral (da química inorgânica), à orgânica (da química orgânica, que tem o elemento carbono como fundamento) e à biológica (química biológica, que é uma estruturação refinada da química orgânica, para dar origem às células e aos sistemas biológicos).

No limiar do século XX, a própria Ciência tinha uma idéia muito simples do que seria a Matéria. Esta era tida como qualquer substância. Tomemos, por exemplo, ainda com os conhecimentos daquela época, uma pedra qualquer, que quando quebrada ou triturada se apresenta sob a forma de pó ou poeira. Essa poeira, por sua vez, era formada de moléculas, por trás das quais se ligavam os átomos, que se apresentavam na forma de minúsculas bolinhas esféricas, algo indivisível. Para os químicos e físicos daquela época, em que as idéias eram absolutas, tudo parecia certeza e Matéria era tudo que fosse palpável. Só a ela a ciência se dirigia para questioná-la em suas propriedades, dentro do realismo alcançado pelos sentidos físicos e permitido pelos instrumentos de laboratório. Haveria aqui um lugar para a Força Inteligente e para o Espírito (a Força na sua forma mais evoluída, inteligência atuante)?  Dever-se-ia procurar a Força como um subproduto da Matéria ou como algo independente fora dela e sobre ela atuando? Este era o dilema encontrado por Luiz de Mattos e pelos cientistas em geral.

O caminho seguido pela Ciência foi o da investigação da Matéria, pois, como vimos, a essa altura ela já havia se livrado da Filosofia e colocada a experimentação como sua principal ferramenta de investigação, deixando em segundo plano o instrumento da razão, própria do ser humano, juntamente com boa parte da lógica. No início do século XX, estava nascendo a teoria quântica com uma reformulação revolucionária de tudo o que se conceituava sobre a Matéria, conforme o texto abaixo que reproduz uma entrevista do filósofo francês Jean Guitton com os doutores em semiologia (ciência que estuda a significação dos processos culturais) e os físicos teóricos Igor e  Grichka Bogdanov, onde o grifo é nosso (8):

 

Eis-nos no início dos anos 1900. A teoria quântica nos diz que, para compreender o real, é preciso renunciar à noção tradicional de matéria: matéria tangível, concreta, sólida. Que o espaço e o tempo são ilusões. Que uma (mesma) partícula pode ser detectada em dois lugares ao mesmo tempo. Que a realidade fundamental não é cognoscível.

Estamos ligados ao real dessas entidades quânticas que transcendem as categorias do tempo e do espaço ordinários. Existimos através de “alguma coisa” cuja natureza e espantosas propriedades temos bastante dificuldade de apreender, mas que se aproxima mais do espírito que da matéria tradicional.

 

Tratamos dessas grandes alterações havidas na Física durante o século XX, no capítulo 2, que dedicamos à Força e Matéria, do ponto de vista exclusivamente científico. Vamos agora tratar da outra alternativa, a não materialista, em que a realidade não se limita à Matéria visível, onde espaço e tempo não passam de simples abstrações, puras ilusões dos sentidos humanos. Como dissemos, essa foi a alternativa seguida por Luiz de Mattos em suas pesquisas filosóficas e espiritualistas, pois seus estudos levaram-no a considerar a Força como partícula da Inteligência Universal – Força Criadora. Quase da mesma forma agiu a Física quântica, que considerou que a realidade não é causal, nem local: nela, espaço e tempo são abstrações, puras ilusões, com a diferença de que esta coloca tudo como conseqüência da Matéria. Veja esta citação: (8)

 

 “As conseqüências dessa reformulação ultrapassam em muito tudo aquilo que hoje estamos em condições de acrescentar à nossa experiência, ou mesmo à nossa intuição. Pouco a pouco, começamos a compreender que o real está velado, inacessível, que dele percebemos apenas a sombra, sob a forma provisoriamente convincente de uma miragem. Mas o que há então sob o véu?”

 

Diante desse enigma, só restam duas atitudes a tomar: uma nos conduz ao absurdo, de continuarmos endeusando a Matéria, a outra nos levará à pesquisa do incognoscível, cujas leis continuam desafiando a Ciência. Este dilema não poderá perdurar por mais tempo, pois a humanidade está carente de informações e pedindo uma direção segura para sua evolução. Afinal, o que é real? Por que existe o ser e qual é o seu destino? Precisamos levantar o véu da Matéria para descobrirmos. Estas questões serão tratadas nos capítulos da segunda parte deste livro.

Trata-se de um campo desconhecido e aberto à investigação séria e honesta, sem o ranço místico das religiões. É necessário apenas coragem e valor, que todo cientista honesto possui, mas que é preciso não hesitar em examinar com isenção de ânimo, aceitando os resultados surpreendentes, mas não milagrosos que, com certeza, vão encontrar além da Matéria. A hora é agora, no limiar desse novo século, pois a humanidade está cansada de tanto materialismo!

Ainda mencionando Jean Guitton, (8) ele afirma que nós precisamos dar um passo decisivo, demonstrando que “há continuidade entre a Matéria dita “inanimada” e a Matéria viva. De fato, a vida retira diretamente suas propriedades dessa misteriosa tendência da Matéria para organizar-se a si mesma, espontaneamente, para dirigir-se a estados incessantemente mais ordenados e complexos. Já o dissemos: o Universo é um vasto pensamento. Em cada partícula, átomo, molécula, célula de matéria, vive e atua incógnita, uma onipresença”. E mais adiante: “A presença manifesta dessa inteligência, até no cerne da matéria, afasta-me para sempre da concepção de um Universo que teria aparecido “por acaso”, que teria produzido a vida e a inteligência “por acaso”. O que está por trás dessas asserções é que o Universo tem um eixo, um propósito, que estamos designando como evolutivo, do átomo mais elementar à mais elevada inteligência possível na Terra e algures no espaço infinito, que representamos como Inteligência Universal (causa transcendente), fonte de todas as partículas inteligentes portadoras da vida.

Quando mencionamos que há uma causa inteligente não estamos nos referindo ao Deus das religiões nem às idéias dos religiosos de todas as religiões sobre Deus, nem a um suposto Deus super matemático (o Acaso da teoria das probabilidades, nem ao Infinito do cálculo infinitesimal ou ao Infinito Universal). Não se trata de nenhum ente ou super ente. Nós estamos falando de causas ou agentes ainda não conhecidos pela Ciência oficial. Nós estamos falando de causas super galácticas ou entre galácticas, não sobrenaturais, porque o natural não é só o que se vê com os nossos pobres olhos. Estes vêem os objetos e as coisas que refletem apenas a luz visível, uma ínfima fração de todo o amplo espectro eletromagnético. Os cientistas falam muito de realidade (veja, mais adiante, o capítulo 5 sobre Verdade, Realidade e Paradigma) e endeusam este conceito como se ele se aplicasse apenas ao mundo material. Como seria essa realidade, por exemplo, se nossos olhos físicos enxergassem uma porção maior do espectro eletromagnético, por exemplo, se tivéssemos olhos penetrantes como os Raios X? Para não nos estendermos, o que queremos dizer é que toda realidade, seja ela objetiva ou subjetiva, é sempre relativa. O que estamos querendo dizer é que a evolução não se limita apenas à forma, mas também, à Força, à essência, ao Espírito, que não têm forma, mas podem assumir qualquer forma, usando-se do fluido universal, que é uma matéria tênue, rarefeita, plasmável pela Força.

A Força (gênero), que abrange o Espírito (espécie superior da Força), evolui sempre e essa evolução começa nos átomos, desde o mais simples (hidrogênio) até ao mais complexo elemento químico natural (o urânio) tanto no reino mineral, como no vegetal e animal, porque afinal, todos os corpos são átomos que vão se estruturando em formas cada vez mais complexas, sob a ação da Força, ao longo dessa evolução, conforme veremos mais adiante. Afinal, o Universo e tudo o que nele existe tem uma história e essa história está longe, muito longe de ser conhecida pelo Homem. Talvez nós, como seres humanos, estejamos passando por uma super evolução, sem que possamos dar conta disso, pois a evolução é um processo demasiadamente lento e seus efeitos só são observados em longo prazo. Daí, nos atrevermos a pensar numa evolução para uma “superespécie” humana, capaz de usar, por exemplo, a telepatia como elemento biológico de recepção e transmissão do pensamento.

2.      Evolução da Força nos Seres Vivos

 

Exceções feitas ao monóxido de carbono, dióxido de carbono, ácidos carbônico, bicarbônico e seus sais, os carbonatos e bicarbonatos, cujos estudos fazem parte da química inorgânica ou mineral, todas as substâncias que contêm carbono em suas moléculas constituem objeto da química orgânica. Este conceito nasceu quando, em 1828, Friederich Whöler (1800-1882) sintetizou pela primeira vez a uréia. Decorreram-se 140 anos para que Arthur Kornberg (1918 -    ) – prêmio Nobel de Medicina em 1959 - e Mark Goulian obtivessem, em 1967, a síntese do ácido desoxirribonucléico, o DNA, molécula com estrutura helicoidal portadora do código genético.(9)

 

i A origem da vida

 

Durante o período que decorreu desde o lançamento da obra, A origem das espécies de Charles Darwin (1859), que não cuidou da origem da vida, até os dias atuais (2006), muitas especulações sobre este tema foram aventadas sem convencer a todos os estudiosos, ainda que muitas delas tivessem recebido abordagem científica. Na última metade do século passado, a Biologia experimentou um grande avanço, a ponto de desvendar o código genético da multiplicação celular e promover a clonagem de embriões. Experiências de laboratório permitiram a formulação de teorias coerentes, plausíveis e aceitáveis sobre a origem da vida, obviamente sem o caráter de verdadeiras, como as que foram apresentadas, quase que simultaneamente, por J. B. S. Haldane (1892-1964) e Alexandr Ivanovitch Oparin (1894-1980).

Vamos examinar, muito resumidamente, a hipótese do químico russo Alexandr Ivanovitch Oparin (1894-1980), divulgada por volta de 1936, versão mais ou menos aceita por cientistas (biólogos) sobre a formação dos primeiros seres “vivos”. Oparin possuía conhecimentos de Astronomia, Geologia, Biologia e Bioquímica e os empregou para a suposta solução deste problema. Ele observou pelos seus estudos de Astronomia que, alguns planetas do sistema solar possuem atmosfera redutora com a presença de gases como hidrogênio, metano e amônia.

Por analogia, Oparin admitiu que quando a Terra se formou e se solidificou ainda quente, ocorriam freqüentes tempestades com descargas elétricas (relâmpagos) e estes teriam provocado reações químicas entre os elementos anteriormente citados e o vapor de água, formando moléculas mais ou menos complexas de aminoácidos. Assim, parece bem verossímil que nos primórdios de sua formação, a atmosfera do planeta consistisse de hidrogênio, vapor de água, gás carbônico, vapores sulfurosos, amônia e metano. Não havia oxigênio na atmosfera, sendo esta redutora (o contrário de oxidante) por excelência. O vapor de água era proveniente da intensa atividade vulcânica que, mesmo nos dias de hoje, é trazido junto com o magma vulcânico, à proporção de até dez por cento. Com o arrefecimento da Terra, formaram-se os oceanos, mares e lagos primitivos, ainda bem diferentes dos atuais. Em algum momento, durante o período arqueano (3,5 – 2,5 bilhões de anos atrás) da era pré-cambriana, surgiram os primeiros “tijolos” químicos na forma de aminoácidos e proteínas. Com a persistência das chuvas, durante milhares ou milhões de anos, os aminoácidos e proteínas foram arrastados e levados para os lagos, mares e oceanos. Por um tempo incalculável, estas proteínas combinavam-se e recombinavam-se, multiplicando-se qualitativa e quantitativamente nas águas mornas dos referidos lagos, mares e oceanos. Dissolvidas em água, formaram uma espécie de “sopa” química, que poderia ter se concentrado em alguns pontos, quem sabe junto às praias e rochedos, para dar lugar à formação de colóides. A interpenetração dos colóides levou à formação dos coacervatos, (10) um tipo especial de colóide.

Esta hipótese é plausível porque, no Universo, em muitas estrelas, a análise espectral revela a presença de moléculas de amônia e moléculas orgânicas de pequeno porte na forma de hidrocarbonetos. Experiências de laboratório simularam as condições provavelmente existentes na Terra no início do aparecimento da vida, passando-se descargas elétricas (simulando as descargas elétricas das tempestades) através de uma mistura de gases contendo hidrogênio, vapor da água, amônia e metano, sintetizando, assim, moléculas orgânicas, do tipo aminoácidos (moléculas que contêm carbono, hidrogênio e nitrogênio). Isto foi feito por Harold Urey e Stanley Miller, por volta de 1952. O passo seguinte, foi criar condições de laboratório para o aparecimento de macromoléculas que se autoduplicassem, produzindo cópias de si mesmas e isso foi conseguido, embora sujeito a muitas opiniões contrárias.

Com esse embasamento, teorizou-se que, com o acúmulo de moléculas do tipo das indicadas, circunscritas a espaços muito restritos, teria dado lugar à formação de uma “sopa” química. Esta, quem sabe, mediante a ação catalítica de argilas (barro) e outros elementos metálicos, ou mesmo certas enzimas ou fermentos sintetizados durante um longo processo, teriam formado macromoléculas de nucleoproteínas e lipídios, acopladas às estruturas coloidais, conhecidas como coacervatos. A interação entre coacervatos, nucleoproteínas e lipídios teria criado as condições necessárias para que surgissem as células, na forma dos primeiros seres unicelulares – os procariontes (células sem núcleo). Suspeita-se que os primeiros fósseis mais antigos encontrados e datados de cerca de 3 bilhões de anos sejam provenientes de procariontes. Uma descrição bem detalhada desse processo pode ser vista na referência (9) e, principalmente, na referência. (11) Extraímos, de um trabalho da professora Cynara Chemale Kessler, o seguinte: (9)

 

Neste aspecto, a estrutura coloidal da matéria orgânica teria dado lugar às membranas celulares. O problema da síntese das grandes moléculas subdivide-se em dois, interdependentes: o primeiro trata apenas do aparecimento das moléculas que se conhece atualmente; o segundo, refere-se ao modo pelo qual se deu a passagem do estado de uma simples “sopa” de moléculas orgânicas para o aparecimento de formas celulares organizadas.

Para o primeiro problema, a resposta é aparentemente paradoxal. Imaginemos uma pequena proteína formada por cinqüenta aminoácidos, de vinte variedades. Desmontando-se essa proteína e reagrupando-se seus aminoácidos, de todas as formas possíveis, isso resulta num número altíssimo: a unidade seguida de 48 zeros. Portanto, se nos mares primitivos eram possíveis todas as combinações (e eram, sem dúvida), por que razão vingaram as que produziram a vida? O paradoxo está em que vingaram exatamente porque produziram a vida.

 

Possivelmente, apareceram outros tipos de macromoléculas, além do RNA (ácido ribonucléico) e do DNA (ácido desoxirribonucléico), mas somente estas últimas conseguiram organizar-se em pequenas unidades autoreprodutoras, usando as outras como alimento, numa espécie de “canibalismo”. Com essa hipótese, admite-se que os procariontes (representados por bactérias e algas, cujas células não contêm núcleo) - primeiros seres vivos, eram heterótrofos, como os animais e fungos atuais, que comem outros seres vivos para sobreviverem. Somente muito tempo depois, há cerca de 1,5 bilhão de anos, surgiram os eucariontes (cujas células contêm núcleos) - autótrofos, seres vivos que criam seus próprios alimentos, como as plantas atuais. Isto teria sido possível com o aparecimento dos cloroplastos (elementos formadores de clorofila) no interior das células. Segundo esta versão, os animais (reino das moneras – bactérias e certas algas destituídas de cloroplastos, tipo cianofíceas ou algas azuis) teriam surgido antes que os vegetais.

Acabado o canibalismo inicial, que durou milhões de anos, os unicelulares evoluíram para um estágio de complexidade tal que permitia o aproveitamento das reações fotoquímicas. Com esse mecanismo de fotossíntese (transformação do gás carbônico atmosférico pela clorofila, em produtos orgânicos que constituem as plantas, com liberação de oxigênio), evitou-se o extermínio da vida incipiente representada pelos procariontes, o que ocorreria se o canibalismo entre eles prosseguisse. É de se mencionar que, até o surgimento dos eucariontes, a vida se organizou nos mares, sob as águas, pois a atmosfera era essencialmente redutora, com apenas 0,001% de oxigênio. Somente há 1,8 bilhões de anos atrás, a atmosfera teria alcançado elevados teores de oxigênio (hoje, cerca de 21%), em função de milhões de anos de fotossíntese dos seres unicelulares primitivos (vegetais), principalmente por meio do plâncton oceânico. (10)

Graças ao aperfeiçoamento da microscopia ótica eletrônica, além de outras técnicas e de acordo com o tipo estrutural das células (procariontes e eucariontes), Whitaker classificou os seres vivos atuais em cinco reinos: monera (procariontes: bactérias atuais e certas algas), fungos, protistas (protozoários e algas unicelulares), animal (pluricelulares), plantas (pluricelulares), sendo estes últimos quatro todos os eucariontes. (12)

Como dissemos as hipóteses acima são plausíveis. Mas organizar-se a matéria, mesmo numa estrutura complexa e propícia à vida, não significa que a vida esteja presente e nisso reside a diferença entre existir e não existir como ser, mesmo que se trate de uma única célula. É necessário iniciar-se nela o processo metabólico, isto é, imprimir-lhe a Força Inteligente que lhe garanta o que nós chamamos “vida”, seja como forma celular autotrófica ou heterotrófica. A vida em si, de onde vem de onde se originou? Será que replicar uma molécula de aminoácidos, nucleotídeos ou mesmo de DNA, significa também replicar a vida? 

Dada à natureza também filosófica da questão, uma vez que nada acontece por acaso, para cada efeito tem que haver uma ou mais causas, vamos reproduzir aqui uma parte do diálogo havido entre os autores do maravilhoso livro Deus e a ciência, de Igor e Grichka Bogdanov com o filósofo Jean Guitton, conforme relatado na referência: (11)

Igor Bogdanov - Tomemos um caso concreto: numa célula viva subsistem uns vinte aminoácidos, que formam uma cadeia completa. A função desses aminoácidos depende, por sua vez, de cerca de 2000 enzimas específicas. Continuando o mesmo raciocínio, os biólogos foram levados a calcular que a probabilidade de que um milhar de enzimas diferentes se aproximem de um modo ordenado até formar uma célula viva (ao longo de uma evolução de muitos bilhões de anos) é da ordem de 10 elevado à potência de 1000 contra um.

 

Jean Guitton - O que equivale a dizer que essa chance é nula.

 

Igor Bogdanov - Foi o que levou Francis Crick, prêmio Nobel de Biologia graças à descoberta do DNA, a concluir, no mesmo sentido: “Um homem sensato, armado de todo o saber à nossa disposição hoje, teria a obrigação de afirmar que a origem da vida parece atualmente dever-se a um milagre, tantas são as condições a reunir para viabilizá-la.”.

 

Grichka Bogdanov - Precisamente. Retornemos um instante às origens, há quatro bilhões de anos. Nessa época distante, ainda não existe o que chamamos vida. Sobre a Terra dos primeiros tempos, varrida pelos ventos eternos, as moléculas nascentes são incessantemente agitadas, cortadas, reformadas e depois novamente dispersas pelo raio, pelo calor, pelas radiações e pelos ciclones.

Ora, desde esse estado primitivo, os primeiros corpos simples se reúnem segundo leis que já não devem nada ao acaso. Por exemplo, existe na química um princípio hoje conhecido pelo nome de “estabilização topológica de cargas”. Essa “lei” implica que as moléculas que comportam, em sua estrutura, cadeias de átomos em alternância (especialmente o carbono, o nitrogênio e o oxigênio) formam, ao se reunir, sistemas estáveis.

De que sistemas se trata? Nada menos que peças fundamentais que compõem a mecânica do vivente: os aminoácidos.

Sempre segundo a mesma lei de afinidade atômica, eles vão reunir-se por sua vez para formar as primeiras cadeias desses preciosos materiais da vida que são os peptídeos.

No cerne desse caldo primitivo, nas vagas negras dos primeiros oceanos do mundo, começam assim a emergir, segundo o mesmo processo, as primeiríssimas moléculas nitrogenadas (que são chamadas “purinas” e “pirimidinas”), das quais vai nascer, mais tarde, o código genético. A grande aventura começa, levando lentamente a matéria para cima, numa irresistível espiral ascendente: as primeiras moléculas nitrogenadas se reforçam, associando-se ao fosfato e a açúcares, até elaborarem os protótipos dos nucleotídeos, esses famosos elementos de base que, ao formarem por sua vez intermináveis cadeias, conduzem à etapa fundamental do vivente, que é a emergência do ácido ribonucléico (o célebre RNA, quase tão conhecido quanto o DNA).

Assim, em apenas algumas centenas de milhões de anos a evolução engendrou sistemas bioquímicos estáveis, autônomos, protegidos do exterior por membranas celulares e que já se assemelham a certas bactérias primitivas.

 

Jean Guitton - Afora o aprovisionamento de energia, abundante na época, o verdadeiro problema com o qual se defrontaram essas células arcaicas era o da reprodução. Como esses preciosos aglomerados poderiam manter-se? Como essas pequenas maravilhas da natureza poderiam garantir sua perenidade? Acabamos de ver que os aminoácidos, de que eram formadas, obedecem a uma ordem precisa. Era preciso, portanto, que essas primeiras células aprendessem a “recopiar” em algum lugar esse encadeamento de suas proteínas de base, a fim de que elas mesmas ficassem em condições de fabricar novas proteínas, conformes em todos os aspectos às precedentes.

A questão é, portanto, saber como as coisas se passaram nesse estágio: como essas primeiríssimas células inventaram os inúmeros estratagemas que conduziram a este prodígio, a reprodução?

 

Igor Bogdanov - Neste caso também foi uma “lei”, inscrita no próprio cerne da matéria, que permitiu o milagre: os aminoácidos mais polares (isto é, os que comportam uma carga eletrostática elevada) são espontaneamente atraídos por moléculas nitrogenadas, enquanto os menos polares agregam-se antes a outras famílias, como a citosina.

Assim nasceu o primeiro esboço do código genético: ao se aproximar de certos nucleotídeos (e não de alguns outros), nossos famosos aminoácidos elaboraram lentamente os planos de sua própria construção, depois os instrumentos e materiais destinados a fabricá-los.

 

Grichka Bogdanov - É preciso insistir mais uma vez: nenhuma das operações evocadas acima pode ter sido efetuada ao acaso.

Tomemos um exemplo, entre outros: para que a agregação dos nucleotídeos conduzisse “por acaso” à elaboração de uma molécula de RNA utilizável, teria sido preciso que a natureza multiplicasse às apalpadelas as tentativas durante pelo menos 10 elevado a décima quinta potência anos, ou seja, durante cem mil vezes mais tempo que a idade total do nosso Universo.

 

Jean Guitton - Em outras palavras, uma tentativa ao acaso sobre a Terra teria sido suficiente para esgotar o Universo inteiro. Um pouco como se todos os esquemas da evolução tivessem sido escritos antecipadamente, desde as origens.

Mas aqui volta uma pergunta. Se for verdade que a evolução da matéria para a vida contém em si uma ordem, de que ordem se trata?

Observo que se o acaso tende a destruir a ordem, a inteligência se manifesta no sentido contrário, pela organização das coisas, pela instalação de uma ordem a partir do caos. Concluo portanto, observando a estarrecedora complexidade da vida, que o próprio Universo é “inteligente”: uma inteligência que transcende o que existe em nosso plano de realidade (no instante primordial daquilo a que chamamos Criação) ordenou a matéria que deu origem à vida.

Porém, uma vez mais: qual é a natureza profunda dessa “ordem”, dessa inteligência perceptível em todas as dimensões do real?

 

Jean Guitton - Se uma ordem subjacente governa a evolução do real, torna-se impossível sustentar, de um ponto de vista científico, que a vida e a inteligência apareceram no Universo em conseqüência de acidentes, de acontecimentos aleatórios, nos quais estaria ausente qualquer finalidade. Observando a natureza e as leis que dela emanam, parece-me, ao contrário, que o Universo inteiro tende para a consciência. Melhor ainda: em sua imensa complexidade, e apesar de suas aparências hostis, o Universo é feito para gerar vida, consciência e inteligência. Por quê? Porque, parafraseando uma citação celebre, “matéria sem consciência não é senão ruína do Universo”. Sem nós, sem uma consciência para legitimá-lo, o Universo não poderia existir: nós somos o próprio Universo, sua vida, sua consciência, sua inteligência.

Conseqüentemente, precisamos reavaliar o papel do que chamamos acaso. Jung sustentava que o aparecimento de “coincidências significativas” implicava necessariamente a existência de um princípio explicativo que devia juntar-se aos conceitos de espaço, tempo e causalidade. Esse grande princípio, chamado princípio de sincronicidade, é baseado numa ordem universal de compreensão, complementar da causalidade. Na origem da Criação não há acontecimento aleatório, não há acaso, mas um grau de ordem infinitamente superior a tudo aquilo que podemos imaginar: ordem suprema que regula as constantes físicas, as condições iniciais, o comportamento dos átomos e a vida das estrelas. Poderosa, livre, infinitamente existente, misteriosa, implícita, invisível, sensível, ela está ali, eterna e necessária por trás dos fenômenos, acima do Universo, mas presente em cada partícula. ( 8)

 

Do que ficou exposto neste diálogo sábio, constata-se que nós não somos simples produto deste pequeno planeta, ou então, no dizer de Theodosius Dobzhansky: (2,13) “nada no mundo vivo faz sentido se não for à luz da evolução”.

 

i A Evolução das Espécies - Darwinismo e Neodarwinismo

 

Embora Charles Darwin, na sua obra, A origem das espécies (The origins of species), não tenha abordado diretamente o problema da origem da vida, com sua longa viagem de mais de cinco anos no Beagle ao redor do mundo e após exaustivos estudos comparativos baseados na variação das espécies, ele inferiu várias leis dela decorrentes, estabelecendo a teoria da seleção natural. Na verdade, não foi fácil teorizar sobre um assunto ainda não desbravado pelos naturalistas, desde Aristóteles.

Apesar de muito ridicularizado no seu tempo, pouco a pouco a teoria foi ganhando terreno e se firmando. Quem leu a sua obra sabe das dificuldades que encontrou, como por exemplo, nas imperfeições dos registros geológicos e nas incoerências que se apresentavam e, talvez por isso mesmo, tenha levado tanto tempo em divulgá-la. Ainda assim, abordou assuntos como o instinto animal, as afinidades mútuas entre as espécies, o hibridismo, a embriologia dos órgãos rudimentares, etc. Ele mesmo admitiu muitas imperfeições em sua obra, mas nela ficou evidente a luta pela preservação das espécies, fundamentada na seleção natural.

Darwin morreu em 1882 e, após a celeuma de muitos anos, a seleção natural como mecanismo evolutivo foi aceita e tornou-se um fato, mesmo sem ele ter explicado como a variação surgia nos organismos e era passada de geração a geração. Só com o aparecimento da Genética, fundada por Gregor Mendel (1822-1884), a herança entre as espécies foi plenamente explicada em 1865 e retomada no começo do século passado. Mesmo assim, durante o primeiro quarto do século XX, a teoria da evolução foi perdendo terreno, para só readquirir força com os trabalhos do geneticista russo Theodosius Dobzhansky (1900-1975), a partir de 1936, que propôs a unificação da Genética com o Darwinismo. Muitas outras questões que ficaram em aberto na teoria foram, mais tarde, esclarecidas pelos zoólogos Ernst Mayr e Julian Huxley (neto de Thomas Huxley), pelos geneticistas de populações R.A. Fisher e J.B.S. Haldane e o paleontólogo George Gaylord Simpson. A definição de espécie de Ernest Mayr (37), como conjunto de organismos que se cruzam entre si, mas que estão sexualmente isolados de grupos semelhantes, é adotada até hoje. Foi ainda Ernest Mayr que criou a moderna Síntese Evolucionista, também conhecida como Neodarwinismo, teoria que reúne a seleção natural de Charles Darwin com a Genética e a Ecologia. Vemos assim, que a obra de Darwin não foi destronada, antes vem sendo completada e acabada pouco a pouco, o que demonstra que a idéia da evolução é bem aceita pela ciência e pela humanidade em geral. Ernest Mayr (1904-2005), professor emérito da Universidade de Harvard, foi o autor da obra clássica “Sistemática e a Origem das Espécies”, publicada em 1942. Ao todo, escreveu 25 livros, o último concluído pouco antes de sua morte, em 2005, versando sobre filosofia da Biologia.

Além da celeuma evolucionismo versus criacionismo, que veremos mais adiante, há também, na atualidade, críticas amargas dos físicos à Biologia como ciência. Mas, não há dúvida que a Biologia é realmente uma ciência independente como observamos nas afirmações de Ernest Mayr: (32)

Eu mostro que a Biologia é uma ciência séria, legítima e honesta, como as ciências físicas, e todas as idéias que costumavam ser misturadas com a filosofia da Biologia, como o vitalismo e a teleologia, que vieram para tentar desacreditar a Biologia, todas essas coisas esquisitas estão fora. A Biologia tem exatamente as mesmas bases das ciências físicas, compostas de leis naturais. As leis naturais se aplicam à Biologia da mesma forma que se aplicam às ciências físicas. Mas as pessoas que comparam ambas, e os filósofos que põem a Biologia junto com as ciências físicas, deixam de fora um monte de coisas. Você pode ver claramente que a Biologia não é a mesma coisa que as ciências físicas. Dou apenas dois exemplos - um são as biopopulações. Biopopulação é algo que simplesmente não existe nas ciências físicas, e, no entanto, é a base de quase todos os conceitos em Biologia. E a segunda coisa na qual a Biologia difere por princípio das ciências físicas é que, nas ciências físicas, todas as teorias, sem exceção, são baseadas em leis naturais. Em Biologia não há leis naturais que correspondam às das ciências físicas. Você pode perguntar como você pode ter teorias sem leis. Bem, em Biologia, as teorias não se baseiam em leis, mas em conceitos - como o de seleção natural, em Biologia evolutiva, ou conceitos como os de recursos ou de competição, em ecologia. Claro, em última instância, as leis físicas são a base de tudo, mas não diretamente da ecologia.

 

É interessante notar que a teoria darwinista e o neodarwinismo têm resistido como teorias aos maiores avanços da ciência na área de Biologia Molecular, Embriologia e Genômica, realizados a partir dos anos cinqüenta aos dias de hoje, como ainda nos relata Ernest Mayr na entrevista já citada:(37)

 

Quando a Biologia se originou? Bem, até o século 18, você tinha vários campos de atividade biológica, como anatomia e taxonomia, mas não tinha o campo da Biologia. A palavra “Biologia”, curiosamente, foi proposta três vezes, independentemente, por volta de 1800, por três autores – dois alemães e um francês. Minha proposição, que fiz em livros anteriores, foi que a Biologia como um campo que você pode reconhecer como algo diferente das ciências físicas, que você pode designar por uma única palavra, se desenvolveu e se tornou o que é hoje em um período relativamente curto. Foram cerca de 40 anos, [a partir] de 1828, quando Karl Ernst von Baer organizou a embriologia, e logo depois vieram os fundadores da citologia, [Theodor] Schwann e [Matthias Jakob] Schleiden, que causaram um grande furor quando publicaram seu trabalho na década de 1830, ao mostrar que animais e plantas são compostos dos mesmos elementos, as células. Então veio o grande período da fisiologia, com Claude Bernard, na França, e pessoas como Johannes [Peter] Müller e outros, na Alemanha. Esse foi um terceiro campo. Após algum tempo vieram [Charles] Darwin e [Alfred Russel] Wallace e a Biologia evolutiva, e depois, em 1865-66, a Genética. Então, essa série de ciências que começam com a embriologia e terminam com a Genética são os alicerces da Biologia. Você pergunta sobre a Biologia Molecular. Bem, deixe-me dar mais um passo ou dois atrás. Houve um período no começo do século passado durante o qual a síntese evolucionista teve lugar. Até aquela época, ou seja, o período entre 1859 e a síntese, nos anos 1940, houve uma grande reviravolta na Biologia evolutiva, na qual foram propostas pelo menos quatro ou cinco grandes teorias básicas da evolução, como a das células germinativas. A síntese evolucionista, iniciada por [Theodosius] Dobzhansky e à qual se juntaram depois pessoas como eu, Julian Huxley e [George] Simpson, pôs um fim às elaborações teóricas no campo da evolução. Você tem [Oswald Theodore] Avery mostrando que os ácidos nucléicos, não as proteínas, são o material da evolução, e aí vieram James Watson e Francis Crick e todos os desenvolvimentos em Biologia Molecular, depois a genômica. Cada vez que uma dessas grandes revoluções acontecia, alguém esperava, por exemplo, que a síntese evolucionista fosse precisar ser reescrita. Mas o fato é que nenhuma dessas revoluções na estrutura da nova Biologia, de Avery à genômica, nada disso realmente afetou o paradigma darwinista. Dito isso, desde Watson e Crick novos livros aparecem tentando provar que o darwinismo é inválido. Nenhum deles foi um sucesso. Agora, finalmente respondendo à sua pergunta, o gozado é que a Biologia Molecular tem um impacto notavelmente pequeno na teoria estrutural da Biologia. Pelo menos é o que me parece hoje em dia. Claro, os biólogos moleculares podem apontar para o código genético e dizer que o código mostrou que a vida como a conhecemos só pode ter se originado uma vez, senão não teríamos o mesmo código para todos os organismos. E há outras contribuições da Biologia Molecular, mas nenhuma delas realmente tocou a teoria estrutural do paradigma darwinista, na minha opinião.

Mas, por outro lado, se você fosse um citologista, você poderia dizer que a demonstração de Schwann e Schleiden de que todos os organismos consistem em células é uma fundação tão importante da Biologia como, digamos, a de que todos os ácidos nucléicos consistem em pares de bases. Eu diria que, do ponto de vista filosófico, os achados descritivos da Biologia Molecular não são mais importantes do que as conquistas na origem da Biologia no período de 1828 a 1866. Essas descobertas são tão importantes quanto qualquer coisa em Biologia Molecular.

Com relação à determinação de espécies distintas com base no DNA, a diferença molecular tão somente pode não ser indicativa de que as espécies são diferentes, não havendo um conjunto de regras que determine isso. Ainda, segundo Ernest Mayr,(2) em entrevista dada em 2004:

Pode ser um único gene. Você tem duas escolas de evolucionistas, aqueles centrados nos genes e aqueles centrados nos organismos. Na década de 20 do século passado, quando J.B.S. Haldane e R.A. Fisher tiveram grande sucesso na Genética Molecular, havia uma grande crença em genes isolados, e você tinha a definição de evolução como a mudança nas freqüências de genes através das gerações, uma definição que nenhum geneticista que se preze daria hoje. Naquela época, havia uma polarização entre os chamados geneticistas de populações, que são centrados nos genes, e os naturalistas, que diziam que o indivíduo é que é selecionado e que o gene é apenas a forma por meio da qual o indivíduo é selecionado. Isso foi até os anos 1930. Então começou a se demonstrar, caso a caso, que tudo também dependia do contexto de outros genes. Portanto, um gene único não podia ser imediatamente selecionado. Um gene sempre ocorre no contexto de um genótipo, e no do fenótipo produzido por esse genótipo. Isso foi indicado por Dobzhansky em 1937, mas não realmente enfatizado. Aí vieram vários autores, alguns amigos de Dobzhansky, ressaltando que era a combinação de genes, portanto o indivíduo, o alvo da seleção natural. Depois, em 1970, saiu um artigo de Dick [Richard] Lewontin mostrando como não podia ser um só gene, e, em 1984, outro artigo de Lewontin com o filósofo Eliott Sober. Levou 60 anos, de 1924 a 1984, para essa visão centrada no gene ir embora. Mas ainda hoje autores como [Richard] Dawkins insistem nela. Eu tenho uma citação maravilhosa do Dawkins, na qual em uma única frase ele admite que o gene não é o alvo de seleção e depois ignora isso, dali em diante. Mas ela estará no meu novo livro [risos].

 

Parece fora de dúvida que, nada acontece na evolução sem ter passado pelos caminhos da seleção natural. Mayr interpreta que o que muitas vezes pode acontecer na seleção natural, é a eliminação dos genes inferiores e nem sempre a seleção dos melhores e disso as pessoas não se dão conta, afirmando que “essa seleção é bem menos egoísta que a seleção dos melhores”. Enfim, na evolução, podem acontecer as duas coisas: seleção dos melhores genes e também, eliminação dos genes inferiores, entendendo-se que muitos genes não são suficientemente bons para serem selecionados, embora, da mesma forma, não sejam suficientemente ruins para serem eliminados.

Um outro geneticista de renome internacional, Theodosius Dobzhansky (1900-1975), refletindo sobre o mundo biológico, que contém entre 1,5-2 milhões de espécies estudadas e talvez outro tanto ainda desconhecidas, variando em tamanho da ordem de 10 micra (dez milionésimos do metro) nos vírus, até 30 metros de comprimento e 135 toneladas na baleia azul, nos chama atenção para esta prodigiosa diversidade e conclui: “tudo isso é compreensível à luz da teoria da evolução, mas o que nos parece uma operação sem sentido é ter Deus criado uma multidão de espécies para nada”. E ainda, em favor da seleção das espécies, afirma: “o ambiente apresenta desafios às espécies, as quais podem responder mediante variações genéticas adaptativas”. (13)

Recentemente foi publicado um livro com o título, O gene egoísta, (14) de autoria de Richard Dawkins, zoólogo com amplos conhecimentos de Biologia e Genética, respeitado nos meios científicos dos Estados Unidos, mas também muito combatido por suas idéias diferenciadas sobre a seleção natural de Darwin, de quem é ardoroso adepto. O principal aspecto de diferenciação é que, ao contrário de Darwin, que considerou em sua teoria a sobrevivência do mais apto, ele prefere adotar como regulador da evolução, a sobrevivência do estável. Insatisfeito por muitas explicações oferecidas por outros respeitáveis estudiosos, como Sir Karl Popper, pelo geneticista L. L. Cavalli-Sforza, pelo antropólogo F. T.Cloak e o etólogo J. M. Cullen, pergunta: “O que, afinal de contas, é tão especial a respeito dos genes (14)?” E ele mesmo responde: “A resposta é que eles são replicadores”. Seu principal argumento é que os genes adquirem certas e especiais qualidades, porém limitadas, em função do meio ambiente em que se desenvolvem e replicam essas qualidades aos seus genes descendentes. Mas, ao contrário do que muitos são levados a pensar, não se deve supor que as características herdadas sejam fixas e inalteráveis. Outro aspecto interessante de seu livro é a utilização do termo “máquina de sobrevivência” para qualificar não somente os humanos, mas todos os seres vivos.

 

3.      Criacionismo versus Evolucionismo

 

Parece incrível que, com todo o progresso tecnológico de nosso tempo, ainda exista uma grande corrente contra o evolucionismo, criada pelos religiosos que se fundamentam no Velho e no Novo Testamento (Bíblia). Pior ainda, a esses religiosos fundamentalistas aliaram-se cientistas que ainda não se desvencilharam das crenças religiosas, dando-lhes suporte que não resistem aos argumentos bem fundados do evolucionismo.

 

i O Criacionismo

 

Muitas são as correntes dos criacionistas, que estão fazendo pressão, inclusive junto aos legisladores, nos Estados Unidos (Arkansas e outros Estados do Sul), Inglaterra e Brasil, no sentido de obrigarem as escolas a ensinarem o criacionismo bíblico. Mas, para efeito desse nosso trabalho, vamos apenas mencionar as três principais correntes.

Em primeiro lugar, destacamos o Criacionismo Religioso Puro, fundamentalista, sem pretensão científica, baseado estritamente nos textos bíblicos. É uma visão mística, distorcida do mundo em que vivemos e do Universo maravilhoso que a ciência vem descortinando e para os quais os seus seguidores, insistem em manter os olhos fechados, a despeito da realidade tecnológica de nossos tempos. Nem mesmo aceitam os argumentos da razão e da lógica filosófica, preferindo manter suas posições fundamentadas no entendimento arcaico de um passado remoto. Trata-se de uma fé religiosa, arraigada ao nível individual e coletivo no seio das religiões bíblicas, que só a educação escolar e a elevação do nível cultural, em longo prazo, poderão alterar.

Há uma posição intermediária, que poderemos chamar de Criacionismo Intermediário, também conhecido como Criacionismo da Terra Antiga, (15) um pouco mais escolarizado, composto por legiões de pessoas que se dizem adeptas de uma ou outra religião, mas não são fundamentalistas. São pessoas que mantêm as suas religiões, em geral de origem bíblica, mas sem a ela se dedicarem, delas conservando apenas os ensinamentos éticos e morais, sem se importarem com a parte divina que nelas se acha impregnada. Para essas pessoas, não há conflito entre suas religiões e a ciência, sendo mais flexíveis, não se apegando a certos dogmas religiosos. Interpretam o dilúvio como episódio local e não universal e aceitam a história da terra segundo as eras geológicas e períodos geológicos. Há até mesmo, dentre eles, aqueles que aceitam a teoria do big bang para a criação do universo. Apesar desses posicionamentos, não aceitam a teoria da evolução.

A terceira corrente compõe-se dos que defendem o Criacionismo “Científico” Fundamentalista .(15)  São pessoas com convicções religiosas muito fortes, que desejam resgatar a ortodoxia religiosa, porém “vestida” de ciência. Por isso mesmo, seria melhor que fosse denominada de “corrente cientifista”, a qual vem se difundindo e ganhando terreno a partir dos anos cinqüenta. Seus seguidores pretendem dar validade científica a tudo que está na Bíblia, por conter esta a palavra de Deus, tentando, entre outras coisas, provar: (a) situar-se a idade da Terra entre 6000 – 12000 anos, (b) a existência da arca de Noé, (c) a existência da Torre de Babel, (d) o episódio de Josué, quando Deus parou o Sol sobre Jericó, etc. Por tudo isso, este grupo é também conhecido como Criacionismo da Terra Jovem. Ele está ganhando terreno nos Estados Unidos, tendo conseguido inclusive a intervenção federal em alguns Estados do Sul para o ensino do criacionismo nas escolas. Embora os defensores desse grupo apresentem alguns conceitos que poderiam até ser considerados razoáveis, corre-se o risco da ocorrência de certas deturpações sob o manto da ciência, para defender uma causa que seus seguidores julgam justa.

 

4.      O “Projeto Inteligente”

 

Mais recentemente, surgiu um grupo novo sob o título de “Projeto Inteligente” (“Intelligent Design”) proposto pelo bioquímico Michael Behe, (16) em seu livro, A caixa preta de Darwin, que também trata do assunto na entrevista sob o título, A verdadeira questão. Suas idéias foram lançadas na Conferência da Simples Criação (Mere Creation Conference), em 1996 e, desde então, vem angariando adeptos. Mike Behe é católico e esteve sempre exposto ao darwinismo. Mas, em 1997, ao ler o livro Evolution: a theory in crisis (Evolução: uma teoria em crise) de Michael Denton, se deu conta de que havia muitas questões na teoria evolutiva ainda não discutidas e explicadas, pois ela não discorria sobre como a vida teria surgido. Intrigado e depois de muito pesquisar na literatura, Behe descobriu que não existiam documentos que realmente tratassem da questão de como surgira a vida e desenvolveu a idéia de que, de fato, estes sistemas eram o resultado de um “Projeto Inteligente”. Pouco depois, juntando-se a Phil Johnson, pesquisador que também apresentou idéias nesta mesma direção, não de refutar, mas de advertir que a teoria da evolução deixava questões a resolver, criou o “Grupo do Projeto Inteligente”, destinado a criticar a evolução sob o ponto de vista científico. Um outro livro que chamou a atenção de Behe foi, O Relojoeiro Cego (Edições, 1970), de Richard Dawkins. Este livro e o de Denton usavam exemplos semelhantes, mas chegaram a conclusões completamente diferentes, para explicar como se pode apoiar uma teoria com evidências e que extrapolações legítimas dela podemos tirar.

Segundo Behe, o tema básico do seu livro, A caixa preta de Darwin, nos mostra que, “em ciência, uma caixa preta é uma máquina, dispositivo, ou sistema que faz algo, mas você não sabe como funciona; é completamente misterioso. Pode ser misterioso porque você não pode ver dentro ou porque você simplesmente não pode compreendê-lo. Para Darwin e para seus contemporâneos do século XIX, a célula era uma caixa preta”. (16) Hoje, sabemos que a célula é a base da vida e os biologistas desvendaram os seus segredos, mas o que a ciência daquela época podia ver com seus grosseiros microscópios era apenas o contorno de uma célula. Daí, segundo ele, a visão simplista dos cientistas contemporâneos de Darwin. Por isso mesmo, dizemos nós, Darwin foi um gênio notável e, até hoje, não destronado.

Tomando-se a complexidade existente no interior da célula como base, Behe examina o que ele chama de “máquinas miniaturizadas” (as proteínas e ácidos nucléicos) e argumenta que, a seleção natural darwiniana não “poderia tê-las produzido porque elas têm uma propriedade chamada de complexidade irredutível”, comparando a complexidade irredutível, com uma ratoeira que tem várias partes e todas as partes devem estar presentes antes que ela possa funcionar. E argumenta que, tais sistemas são mais bem explicados como o resultado de um deliberado projeto inteligente, já que é assim que nos comportamos quando vemos algo bem real no nosso mundo macroscópico. Daí a razão e o nome “Projeto Inteligente”, com que Behe batizou sua idéia, propondo trabalhar nela para ver aonde ela conduzirá a ciência.

Convém salientar que, há muitas reações e críticas à idéia do projeto inteligente, afirmando que este é um criacionismo disfarçado, mas Behe rebate que há uma boa diferença entre chegar a conclusões baseadas na observação do mundo físico, como é esperado de um cientista e chegar a uma conclusão baseado nas escrituras ou em convicções religiosas. É inegável que, alguns sistemas bioquímicos são demasiadamente complexos para serem considerados obra do simples acaso ou da geração espontânea da vida, idéia ultrapassada desde Pasteur.

Qualquer que venha ser o direcionamento que a idéia do projeto inteligente venha a ter, é inegável que ele tem implicações de natureza religiosa ou teológica óbvias e o seu eventual desdobramento ainda vai levantar muita poeira. Há, presentemente, um grande avanço na Biologia Molecular, técnicas de seqüenciamento do DNA, Embriologia, Genômica, clonagem de células, etc., mas estamos longe de explicar a questão essencial de como surgiu a vida na Terra e, muito mais distante ainda, de poder explicar a natureza do homem e porque ele está aqui neste insignificante planeta em evolução. Assim, pensamos que não pode haver nenhum tipo de obstrução, seja da ciência, seja da filosofia, com relação ao verdadeiro conhecimento da vida.

É inegável que o evolucionismo e, modernamente o neoevolucionismo, vieram para ficar. Embora ele não tenha resposta, ainda, para todas as questões, os cientistas continuam nos oferecendo estudos e conclusões sobre muitas delas, à medida que a ciência avança. Vale salientar que, mesmo por estímulo dos debates que estão ocorrendo pela Internet, por meio de livros e em seminários científicos ou religiosos, haverá sempre brechas a serem exploradas e lacunas a serem preenchidas, de que muito se aproveitarão os cientistas e até mesmo os religiosos para combatê-los.

 

5.      Evolução da Força no Homem

 

O criacionismo divino imediato, definitivo, cristalizado, como consta na letra do Gênesis, pelo qual Deus teria criado todas as espécies de seres vivos, tais como se encontram presentemente, não se coaduna com as descobertas arqueológicas e paleontológicas de nossos tempos, nem com os avanços havidos em outros ramos da ciência. Nos dias de hoje, o criacionismo não passa de uma bela alegoria e, como tal, deve ser entendido. É fácil compreender que, na época em que o Gênesis foi escrito a humanidade não estava preparada, nem tinha os conhecimentos que tem hoje, para compreender e entender outra cosmogenia que não fosse similar àquela.

Sendo a ciência a busca da verdade, ela não deve se isolar de outros ramos do conhecimento como o tem feito nos últimos dois séculos, afastando-se da filosofia, ainda que seus métodos de investigação utilizem diferentes metodologias. Por último, mas não sem menos força, há a considerar os progressos havidos na Psicologia e por que não dizer, também, na Parapsicologia, no Espiritismo e no Espiritualismo, conforme colocamos no capítulo 6 – O surgimento do Espiritismo e no capítulo 7 – O Advento do Racionalismo Cristão.

A grande polêmica que hoje vemos ser travada entre os criacionistas e os evolucionistas localiza-se num único nó de discórdia: o entendimento do que uns e outros fazem da natureza da Força Criadora ou Inteligência Universal, que os mulçumanos denominam de Alá e os religiosos cristãos denominam de Deus e outros povos têm as suas denominações. Nenhum conhecimento verdadeiro pode haver dessa verdadeira grandeza, se o homem não colocar uma pá de cal no misticismo e despir-se de suas mazelas, de seu egoísmo e de sua vaidade e de tudo o mais que o avilta como ser superior. Enquanto isso acontecer, estaremos expondo nossos instintos inferiores, não estaremos sendo racionais nem estaremos utilizando a lógica que o bom senso nos aconselha. É sobre isso que vamos tratar nos capítulos da segunda parte dessa obra.

Em primeiro lugar, precisamos deixar de lado os dogmas religiosos, que vão continuar servindo a maior parte da humanidade, pois o seu grau de evolução espiritual não alcança mais do que isso: exprimir a sua fé naquilo que lhe é revelado pelas religiões como provindo de Deus. Mas também, a ciência precisa livrar-se de seu hermetismo e os cientistas precisam abrir o leque de suas descobertas para o homem de conhecimento médio, pois a ciência e as verdades dela decorrentes devem estar para todos e não apenas para uns poucos privilegiados. Há necessidade também, de simplificar as coisas para o uso comum e para o entendimento mais geral possível.

É interessante também assinalar que, a grande polêmica tem o seu fulcro principal, além dos interesses puramente religiosos, nas aparências ensejadas pelo que a Matéria representa, pois nela residem quase que exclusivamente os efeitos e não as causas de tudo o que acontece, que reside na Força. Infelizmente, com raras exceções, a ciência vem dedicando seus esforços só ao estudo da Matéria e, para isso, conta com grandes verbas. Podemos até compreender que assim seja durante muito tempo, mas não o será por todo o tempo, porque os estudos sobre a Matéria esgotam-se em si mesma, chegando a um beco sem saída. Se quisermos realmente merecer o título de homo sapiens, precisamos considerar, com profundidade e propriedade, o estudo da Força em si e sua atuação sobre a Matéria, num processo evolutivo da Força, que no homem encontrou o seu meio adequado no planeta Terra. Tudo o que foi feito até aqui em matéria de evolução, tratou apenas da evolução somática, da Matéria como tal, negligenciando a evolução mais importante que é a evolução da Força. A isso consagraremos o nosso livro, no sentido de apontar o que já se conhecem e estimulam a pesquisa no que ainda nos falta conhecer. Muitos cientistas já chegaram perto, bem perto mesmo, de uma mudança de paradigma, mas por uma razão ou outra, desistiram de levar adiante pesquisas nesse sentido. Muitos poucos o fizeram, mas foram casos isolados e seus trabalhos ou não tiveram a divulgação necessária ou seus autores foram colocados no ostracismo. Por isso, ressente-se de seu prosseguimento.

Existe um ditado e a evolução é uma prova disso, que diz: “a natureza não dá saltos”, que pode ser usado para significar que tudo tem o seu tempo certo. Assim, vale esse ditado para nos situarmos na evolução hominal. É fácil de entender que há cerca de dois milhões de anos e isso é quase nada em termos de evolução somática das espécies, tínhamos o primitivismo de nossos ancestrais, que vieram constituir os primeiros corpos adequados para a evolução do Espírito, ainda que se tratasse de corpos em transição para o nosso atual estágio de evolução humana. Mas foram necessários e suficientes, à época, para darem início ao que chamaremos de a evolução hominal.

Chegou o momento de afirmarmos que o início da evolução hominal, isto é, da Força no corpo humano como Espírito encarnado, coincide também com o início da evolução espiritual no planeta Terra, a partir da qual começaram a surgir, gradativamente, as diferentes raças com suas culturas diferenciadas, como ainda acontece na atualidade. À medida que a evolução somática progredia juntamente com as respectivas culturas, se realizava como continua realizando, silenciosamente, a evolução espiritual que cada vez mais encontrava condições propícias para a sua realização. Nós vamos poder apresentar nos capítulos constantes da segunda parte de nossa obra que, também a evolução espiritual não dá saltos e ela objetiva, principalmente, a evolução da inteligência, da moral e da ética, vale dizer do caráter, pela apuração contínua dos sentimentos mais nobres do homem, até a eliminação completa dos seus instintos animalescos.  Esta evolução é individualizada, isto é, ela é feita de “per si”, mas ela se realiza, também, em grupos.

 

Referências deste capítulo:

 

1)SAKALL, Sergio. Darwin. Disponível em: www.sergiosakall.com.br/montagem/5darwin.html . Acesso em 08/08/05.

 

2)LEITE, Marcelo e Mirsky, Steve. Para Ernest Mayr, Biologia não se reduz às ciências físicas. (entrevista aos 100 anos). Disponível em: https://zoo.bio.ufpr.br/diptera/bz023/ernst_mayr.htm. Acesso em 28/08/05.

3)ALVES, Cláudia Aparecida. Criação e evolução. Disponível em: www.cacp.org.br/Evolucao-2.htm.  Acesso em 08/08/05.

 4)TIAGHO, Paulo de Tarso São. Evolucionismo e criacionismo à luz do Espiritismo. Disponível em: www.terraespiritual.locaweb.com.br/espiritismo/artigo1614.html. Acesso 08/08/05.

5)ANÔNIMO. Eras, Períodos e Épocas Geológicas. Disponível em: www.avph.hpg.ig.com.br/eras.htm.  Acesso em 15/08/05.

6)ALTABA, M. Font. Atlas de Mineralogia. Rio de Janeiro: Livro Ibero-Americano, Ltda., 1963. Ed. Especial.

7) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 43.edição.Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2001 p. 49.

8)GUITTON, Jean. Deus e a ciência. Disponível em:  www.plenitudeonline.com.br/noticias/news/index_noticias.php?id=16. Acesso em 10/08/05.

9)KESSLER, Cynara Chemale. Origem da Vida. Disponível em: https://www.logic.com.br/prof.cynara/origemvida.htm. Acesso em 16/08/05.

10)WILKIPEDIA. Teoria de Oparin. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_de_Oparin. Acesso em 29/08/05.

11)ARAUJO, Jorge. Gênese da Vida.  Disponível em: www.ateus.net/artigos/ciencias/genese_da_vida.html. Acesso em 28/08/05.

12)MEIO AMBIENTE – Os grandes reinos. Disponível em:  www.geocities.com/kinren12000/reinos.htm. Acesso em 18/08/05.

13)DOBZHANSKY, Theodosius. Nothing in biology makes sense except in the light of evolution, Disponível em: https://people.delphiforums.com/lordorman/light.htm. Acesso em 26/08/05.

14)DAWKINS, Richard. O gene egoísta. Belo Horizonte: Itatiaia, 2001. p. 22.

15)VALÉRIO JR., Marcos. Criação x evolução. Disponível em: www.evo.bio.br/EVOXCRIA.HTML.  Acesso em 28/08/05.

16)FLÁVIO, João e Cristiano, Paulo. A verdadeira questão – uma entrevista com Michael Behe. Disponível em: www.cacp.org.br/critica%20a%20darwin.htm. Acesso em 27/08/05.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 4

 

 

METODOLOGIA CIENTÍFICA

 

“Pesquisa científica é a realização concreta de uma investigação planejada, desenvolvida e redigida de acordo com as normas da metodologia consagrada pela ciência. É o método de abordagem de um problema em estudo que caracteriza o aspecto científico de uma pesquisa”. Prof. João Álvaro Ruiz em, Metodologia científica, 1978.

 

Um pouco de história não faz mal a ninguém, sendo salutar para criar um pano de fundo ao que está contido nesse capítulo. Desde a mais remota antiguidade, o homem interroga a natureza em busca de explicações e respostas aos seus questionamentos. Assim, ao longo da história, vem sendo construído o conhecimento das coisas e dos fenômenos em todas as áreas de atuação humana. Muito desse conhecimento foi estabelecido à custa de tentativas e erros. Vimos também, em outra parte dessa obra que, até por volta de 1750, o saber humano era unificado sob o manto da Filosofia. A separação entre Ciência e Filosofia, que se acentuou a partir da Revolução Industrial, por um lado trouxe enormes benefícios pela especialização científica e sua decorrência tecnológica, mas de outro, esta fragmentação deixou o homem à deriva de outros assuntos igualmente importantes para a sua evolução. É disso que vamos tratar mais adiante na segunda parte de nosso livro. Antes disso, vamos fazer um enfoque para entender e compreender porque a metodologia científica é um instrumento de busca da verdade e como é usada para esse fim.

Uma afirmação muito genérica seria dizer que a ciência deriva de fatos, baseia-se nos fatos da experiência e da experimentação. Outra afirmação, também simplória, será afirmar que a ciência deve basear-se naquilo que podemos ver, ouvir, tocar, isto é, firmado no exame cuidadoso e isento do que os nossos sentidos físicos podem perceber e interpretar, nunca em opiniões pessoais ou em fantasias especulativas. Sempre que a observação da natureza, do mundo, do universo e seus fenômenos forem conduzidos de forma isenta e séria, “[...] então os fatos estabelecidos dessa maneira, constituirão uma base segura e objetiva para a ciência. Se, além disso, o raciocínio que nos leva desta base factual às teorias e leis que constituem o conhecimento científico for sólido, então se pode considerar que o próprio conhecimento resultante está estabelecido com segurança e é objetivo”. (3)  Isso é válido ainda hoje, mas muita coisa aconteceu de lá para cá, como a ampliação do conhecimento, o preparo de cientistas e pesquisadores, além de uma sofisticação cada vez maior dos instrumentos de pesquisa.

Mas isto nem sempre foi assim. A verdadeira ruptura com a tradição Aristotélica de encarar a ciência, nasceu no começo do século XVII, quando Galileu introduziu as observações e as experiências para embasar os fatos. Mais importante que isso, foi estabelecer uma atitude e estratégia que ficam notórias na história da ciência. Para Galileu, o importante era aceitar os fatos observados e, sem qualquer idéia preconcebida, construir a teoria de modo a ajustar-se-lhes. Não vamos nos alongar nos detalhes da época de suas experiências e de sua atribulada vida, mas queremos deixar bem visível o seu valor, ao exprimir claramente a perspectiva de que o conhecimento científico baseia-se nos fatos estabelecidos pela observação e pela experiência. Esta tese ainda vigora hoje. No dizer de A. F. Chalmers, (3) “Quem aceita e explora esta história sobre o nascimento da ciência sustenta que, antes do século XVII, os fatos observáveis não eram levados a sério enquanto fundamento do conhecimento. De acordo com a história habitual, o conhecimento baseava-se em grande medida na autoridade, especialmente na autoridade do filósofo Aristóteles e na autoridade da Bíblia. A ciência moderna tornou-se possível apenas quando os pioneiros da nova ciência, como Galileu, colocaram em questão estas autoridades por meio do recurso à experiência”.

À medida que a ciência se desenvolvia, surgiram duas escolas de pensamento – a dos empiristas e a dos positivistas, que representaram tentativas de formalizar aquela que afirmamos anteriormente ser uma perspectiva comum da ciência — a de que o conhecimento científico deriva dos fatos. John Locke, George Berkeley e David Hume foram os empiristas britânicos dos séculos XVII e XVIII que sustentavam que todo o conhecimento deve derivar de idéias implantadas na mente pela percepção sensorial. Já os positivistas tinham uma perspectiva mais ampla dos fatos e, com uma orientação mais pragmática, partilhavam a perspectiva dos empiristas segundo a qual o conhecimento deve derivar dos fatos da experiência. No século XIX, Auguste Comte introduziu o positivismo lógico. Dessa escola surgiu, nos anos 20 do século XX, em Viena, uma escola filosófica que procurou seguir a linha de Auguste Comte, dando muita atenção à forma lógica da relação entre o conhecimento científico e os fatos. Concluímos, assim, que o empirismo e o positivismo partilharam a perspectiva comum, segundo a qual, o conhecimento científico deve derivar de alguma maneira dos fatos apurados pela observação. Estava criado o materialismo científico.

 

1.      Fato e Experimentação

 

É preciso sempre verificar qual a natureza dos fatos e o modo como os cientistas têm acesso a eles. A. F. Chalmers (3) dedicou os três primeiros capítulos de seu livro, Afinal o que é ciência? ao exame da natureza dos fatos e o quarto capítulo ao exame do modo como os cientistas acessam os fatos, isto é, como se pode saber que o conhecimento científico deriva deles. Com relação à natureza dos fatos, ele analisou três possibilidades: (a) os fatos revelam-se por meio dos sentidos aos observadores atentos, (b) os fatos são anteriores (fatos a priori) e independentes de teorias e (c) os fatos constituem um fundamento firme e confiável para o conhecimento científico. Não entraremos em mais detalhes sobre estas teses, apenas diremos que ele analisou profundamente a ilusão que os sentidos físicos podem causar à veracidade dos dados, nada sendo inquestionável, dando destaque ao sentido da visão e aconselhando sempre cautela aos observadores cientistas, quando afirma que, “Dois observadores normais que vêem o mesmo objeto a partir do mesmo lugar sob as mesmas condições físicas não têm necessariamente experiências visuais idênticas, isto mesmo que as imagens nas suas respectivas retinas possam ser virtualmente idênticas”. (3) A neurociência já provou isso em estudos sobre a ilusão dos sentidos. (6) Em outras palavras, é preciso ter em mira que as experiências perceptivas as quais os indivíduos têm no ato de ver, não são determinadas unicamente pelas imagens nas suas retinas mas, principalmente, pelo que a mente percebe como um todo. Esse fenômeno é conhecido como efeito autocinético e ocorre quando os músculos do olho tornam-se cansados. Muitos jogos de crianças e testes psicológicos baseiam-se neste fenômeno.

Vimos, então, que a prática científica de observação experimental dos fatos pode estar sujeita a falhas, isto é, expusemos a idéia de que aquilo que os observadores vêem ou as experiências subjetivas que têm quando estão observando um objeto ou diante de um cenário experimental, não é determinado unicamente pelas imagens nas suas retinas, mas depende, também, do efeito autocinético acima referido, da experiência, do conhecimento científico na área em que opera e nas expectativas do próprio observador. Enfim, é inquestionável e incontroverso que é preciso aprender a ser um observador competente na ciência. Não basta ter olhos para ver, é preciso saber enxergar de verdade e ser isento de qualquer preconceito.

É preciso também ficar muito bem entendido qual o significado lingüístico da palavra fato. É preciso distinguir o que é uma asserção ou afirmação do estado de coisas, que essa asserção descreve. Por exemplo, a teoria do Big Bang não pode ser considerada um fato, porque não foi provada e, parece pouco provável que algum dia venha a sê-lo, dada a natureza de que se reveste; porém, já há muita gente referindo-se a ela como se fosse um fato. Então, quando dizemos que o Universo formou-se a 14 bilhões de anos da forma como é descrita na teoria do Big Bang, não é e não pode ser uma asserção factual. O Big Bang é apenas uma das muitas teorias formuladas sobre o surgimento do Universo. O conhecimento sobre a Cosmogenia não passa ainda de mera teoria. O mesmo pode ser dito sobre a origem da vida na Terra: ninguém estava lá para ver e observar. Isso para citar apenas os dois magnos problemas que a Ciência ainda não resolveu. Aqueles que desejam defender que o conhecimento deriva de fatos precisam ter em mente asserções e não percepções ou descrições teóricas não comprovadas.

Tudo o que foi dito no parágrafo anterior serve para constatar que na ausência de qualificações, estas tornam-se imediatamente muito problemáticas. E, para que os fatos possam constituir uma base apropriada para ciência, eles têm de assumir a forma de asserções. Daí concluir-se que os fatos que nos são dados diretamente por meio dos sentidos, pode ser apenas uma verdade aparente ou parecer completamente errados. Portanto, embora sabendo que as percepções entram diretamente pelos sentidos, é absurdo pensar que as asserções factuais entram no cérebro exclusivamente pelos cinco sentidos físicos. Atualmente, há estudos mostrando que são dezoito a vinte os sentidos físicos e não apenas os cinco sentidos comumente referidos. (15, 16)

É necessário ter um bom conhecimento do assunto de que estamos falando ou experimentando e suas implicações com o que já se conhece, qualquer que seja o ramo da ciência em consideração. Isso é um pré-requisito para a formulação de asserções observacionais que possam constituir a sua base factual. Portanto, antes de poder formular uma asserção observacional, um observador tem que possuir conhecimento do quadro de referência conceitual apropriado e saber como aplicá-lo objetivamente ao caso em questão.

Diante do que foi exposto acima, podemos afirmar que os pré-requisitos básicos para colher resultados satisfatórios de uma experimentação, são um bom conhecimento prévio do ramo científico a que nos dedicamos e um uso adequado e correto de nossas percepções, isto é, de nosso estado de preparação e de nossas expectativas com relação às asserções observacionais, as quais devem assegurar um quadro de referência conceitual apropriado. Além disso, devemos estar atualizados em nossa área de atuação para que possamos contribuir significativamente para o progresso da ciência, isto é, identificar fatos relevantes para formular corretamente nossos questionamentos.

Fica, portanto, bastante claro que a afirmação de que a ciência deriva dos fatos e assenta-se numa base segura, implica em fatos sólidos progressiva e firmemente estabelecidos pela observação. Mesmo sabendo que as percepções são influenciadas pela experiência prévia e pelas expectativas do observador, o que faz com que aquilo que parece ser um fato observável para uma pessoa não o tenha de ser para outra, isso não constitui impeditivo para que se faça ciência. Não se deve, também, considerar como impeditivo os juízos sobre a verdade das asserções observacionais, que podem provir de conhecimentos anteriores ou pressuposto, tornando assim os fatos observáveis tão falíveis quanto os pressupostos que lhes serviram de base.

Até aqui temos falado de ciência mas, afinal, o que é ciência e para que ela existe? Os cientistas são pessoas fora do comum? O que significa ser cientista? Como buscar as verdades sem nenhuma linha demarcatória? É possível conciliar todas as verdades? É o que vamos tratar a seguir.

 

2.      Ciência

 

Há uma dificuldade imensa para definir algo tão complexo e abrangente como o que se entende por ciência. É um desafio que vem preocupando muitos filósofos e pensadores em geral. O que parece mais fácil é caracterizar as regras e ferramentas sobre as quais se apóia a ciência, dentre as quais citamos a necessidade da experimentação para provar teorias e hipóteses, a lei de causa e efeito ou o princípio da causalidade de Kant, o princípio da falseabilidade de Karl Popper, o método dedutivo, o princípio ou argumento indutivo, etc. Uma regra ou argumento que raramente é citado ou por ela se preocupam muitos cientistas, mas que está sempre presente, ainda que intuitivamente, é o princípio da repetitividade experimental, conforme bem o define o médico e filósofo, Alberto Mesquita Filho (1942-): (1) “Vejo a ciência como a área do conhecimento que se apóia não num método, mas sim na regra da repetitividade, a que eu tenho chamado de regra científica fundamental: Se em dadas condições, um determinado fenômeno, sempre que pesquisado, se repetiu, é de se admitir que em futuras verificações o mesmo suceda”.

Não devemos deixar de fora as regras ou critérios de utilidade, que não existe para muitos cientistas que se dedicam à pesquisa científica pura ou básica, onde a busca da verdade sobrepõe-se aos critérios de utilidade que se pretenda lhe dar. Outro ponto importante é não impor limites à ação da ciência. O ponto de vista de Kuhn (2) é que, a própria ciência impõe limites, até que, dentro dos limites criados pela comunidade científica, surja uma refutação muito séria, para a qual não haja saída: então, ocorre uma ruptura, com novas teorias que furam o bloqueio anterior e estabelecem novos limites (teoria dos paradigmas de Kuhn). Segundo ele, é essa ruptura interna corporis que ocasiona, aos saltos, o progresso da ciência. Contrariamente, temos os conceitos de Karl Popper, segundo o qual a ciência progride linearmente: “A ciência para Popper começa com problemas referentes à explicação do mundo ou do universo, mas para resolver estes problemas são formuladas hipóteses que posteriormente são postas de parte. Há, portanto, um crescimento contínuo e constante das ciências“. (2)

Ainda segundo a perspectiva de Kuhn, a ciência é construída por um processo de acumulação, dentro do qual, cada teoria aperfeiçoa a que lhe precedeu e é justamente este conceito cumulativo, que Kuhn questiona.

Para encerrar este assunto, vemos que o que é questionado é o conceito de verdade. Também não há dúvida de que na proposição de falseabilidade de Karl Popper, está implícito um pressuposto racionalista, já que este se traduz na preocupação da ciência em procurar a verdade, que deve ser a preocupação central e fundamental do objeto da ciência. Mas, paradoxalmente, não é fácil formular um critério definitivo de verdade – podemos até afirmar ser isso impossível. Nisso reside a sua contradição, daí resultando que a ciência será sempre aproximativa da verdade, não a própria verdade!

Então, após examinarmos alguns conceitos sobre os fundamentos da ciência, podemos nos aventurar a defini-la como sendo o conjunto de esforços empreendidos pelos cientistas, fundamentados em determinadas regras conhecidas, no seu conjunto, como o método científico, com o objetivo de alcançar a verdade.

 

3.      O Cientista

 

Afinal, o que é ser cientista? Para respondermos a essa questão, devemos nos firmar nas definições e conceitos que apresentamos sobre ciência. Assim, poderíamos dizer que cientista é a pessoa que pratica a ciência ou que é especialista em alguma ciência, ou em ciências em geral, o que equivale dizer que o cientista cultiva o conhecimento científico e adota e utiliza o método científico para obtê-lo, mas que muitas vezes precisa usar a teoria das probabilidades na apresentação de seus resultados para embasar suas conclusões.

Assim, o cientista cultiva a ciência, levando em conta dois grandes objetivos, a saber: primeiro, reunir, aplicar e transmitir os conhecimentos científicos já conhecidos e sistematizados que contribuíram para sua formação; e segundo, produzir e divulgar novos conhecimentos, tendo sempre por finalidade última contribuir para o progresso das ciências.

Dada a grande difusão da ciência, mormente pelos livros-textos e pela internet, de alguma forma, qualquer pessoa devidamente culta poderá absorver conhecimentos científicos, se assim o desejar. Se possuir talento para tal, pode até se comportar como um cientista, aventando hipóteses e criando teorias para serem testadas. Segundo Alberto Mesquita Filho, (1)

 

ser cientista não é possuir um rótulo, mas sim postar-se com uma atitude científica; por outro lado, mesmo aquele que se diz cientista, vez ou outra assume atitudes não científicas e penetra em terrenos apoiados em regras próprias ou, até mesmo, sem regras. O rótulo é freqüentemente utilizado quando queremos nos referir às pessoas que se utilizam de seus talentos científicos como meio de vida: seriam então os cientistas profissionais.

 

Nós preferimos substituir a palavra “rótulo” por “título” (mestre em ciência, doutor, professor). Passemos, então, à terminologia científica.

 

4.      Hipótese, Sistema, Teoria, Lei e Doutrina

 

Para melhor conhecermos a terminologia científica, começaremos por definir o que é hipótese. Hipótese é sempre uma suposição, uma conjectura que serve de argumento para iniciar-se uma investigação, como na Física, por exemplo, ou uma demonstração, como na Matemática. A hipótese é sempre um ponto de partida. Já a teoria é um conjunto de elementos ou hipóteses concatenadas racionalmente, mas que necessita corroboração real, caso em que pode vir a se transformar em lei, mas que também pode ser refutada por outra teoria, que melhor se ajuste aos dados da realidade. A teoria destina-se a “explicar, elucidar, interpretar ou unificar um dado domínio do conhecimento”. (3) Toda teoria científica apóia-se no método científico, o qual, por sua vez, tem base na observação e na experimentação. No caso das teorias científicas, o método científico é o conjunto de procedimentos (a práxis científica) que servem para testá-las. As teorias podem, ainda, ser testadas pelo princípio da falseabilidade de Karl Popper, sobre a qual falaremos mais adiante.

 Assim, não basta ter simplesmente um conjunto de hipóteses. Uma das finalidades da ciência é sistematizar teorias bem concatenadas e, se possível, principalmente as de amplo espectro, abrangendo várias áreas do conhecimento. Algumas teorias são de alta complexidade e exigem, por parte do cientista, pleno domínio da lógica e da matemática. Para aqueles que iniciam e que trabalham na área de ciências exatas, recomenda-se a leitura das obras de Bunge, Lacey e Bohm, relacionadas ao final deste capítulo.

O principal ponto de sustentação de uma teoria científica é, sem dúvida, a experimentação. Leve-se, contudo, em consideração que, a experimentação, isoladamente, pode falsear ou corroborar uma hipótese ou mesmo uma teoria. Por isso mesmo que Karl Popper (1) afirma que, uma “teoria será tanto melhor quanto mais for propensa a testes de falseabilidade pelos quais, obviamente, terá que passar. Ao passar por um teste de falseabilidade, dizemos que foi corroborada”.

É necessário ter sempre um enfoque crítico com relação ao uso do teste de falseabilidade, pois ele pode não ser convincente ou mesmo não ganhar um consenso. E quando isso pode acontecer? Sempre que a experiência, ainda que bem sistematizada e preparada, não incluir a totalidade dos fatores intervenientes. Nós sabemos que a teoria gravitacional de Isaac Newton chegou a ser “falseada”, pelo fato de se ter observado desvios inexplicáveis ocorridos na época, na órbita de planetas conhecidos por planetas ainda não descobertos pelos cientistas (o planeta Netuno, não conhecido ainda, influía na órbita de Urano). Na verdade, o que ocorreu foi uma falácia experimental e não um falseamento propriamente dito. Citamos este fato para mostrar que é preciso cuidado ao utilizar-se o princípio da falseabilidade para tentar refutar uma hipótese ou mesmo uma teoria.

Vamos tentar dissipar algumas confusões. Há uma tendência em confundir doutrina com sistema e teoria com doutrina. Doutrina é um conjunto de princípios, regras ou preceitos que servem de base a um sistema científico, filosófico, religioso, político, social, etc. Por sua vez, sistema é um conjunto de elementos, materiais ou ideais com o objetivo de ordenar e classificar segundo uma metodologia adequada o saber e o conhecimento científico, filosófico, etc. Vale a pena notar que, a interface entre Ciência e Filosofia, costuma ser mais nítida que entre Filosofia e Metafísica, das quais a Física se separou e adquiriu caráter independente. Assim, a Ciência considera alguns princípios filosóficos como meras hipóteses metafísicas ou, até mesmo, hipóteses científicas quando e se trabalhadas sob a ótica da Ciência. Daí que, para passar à categoria de teoria, essas hipóteses precisam passar pelo crivo do método científico, o que equivale dizer, serem experimentadas e testadas.

Até aqui, falamos de hipóteses fundamentais, mas devemos observar que existem as hipóteses secundárias ou até mesmo obviedades que podem ser usadas, mesmo que seja necessário tomá-las emprestadas da Filosofia, para suportar certos trabalhos de caráter científico, principalmente em um campo pioneiro. Geralmente, tais hipóteses têm caráter provisório, mas podem ser a chave do sucesso, quando se  pretende extravasar os paradigmas científicos e criar algo revolucionário, contestando “verdades” até então aceitas e bem firmadas. É isso que dá à Ciência o seu caráter evolutivo, já que toda verdade é provisória, nada pode ou deve ser consagrado. É isso que valoriza a Ciência!

Normalmente, observa-se que não se aprende a teorizar nas universidades científicas, pois a maioria desses conceitos provém da Filosofia. Nas universidades científicas, não há a intenção de fabricar-se gênios. Logo, pensar dessa forma leva a muitas improvisações e posturas ingênuas por parte de alguns pseudocientistas, incomodando a muitos cientistas sérios que ocupam cargos importantes nessas universidades. Porém, condenar outros que realmente desejam contribuir, é um erro que pode afastar muitos futuros cientistas em potencial. De fato, é de estímulo que muitos precisam, pois o gênio simplesmente emprega entusiasmo, devoção e persistência na busca da verdade.

Por último, algumas palavras sobre aquilo que se considera lei. Um conjunto de leis ou teorias corroboradas constitui uma doutrina, status que a Ciência pretende um dia alcançar. A lei decorre de uma teoria bem testada e corroborada. A palavra lei, abraça um amplo espectro de significados, em vários campos do conhecimento humano. As leis naturais são verdades imutáveis. A lei física da gravidade, de Isaac Newton, parece ser uma verdade natural e imutável e as teorias da relatividade de Albert Einstein, depois de quase 100 anos desde que foram pronunciadas, continuam resistindo a qualquer refutação e já são aceitas cientificamente como leis. Outro exemplo, são as leis de Kepler, bem mais antigas da mecânica clássica, vistas como incontestáveis. Então, as leis físicas têm um caráter mais duradouro, podendo algumas delas ser consideradas verdades definitivas.

 

5.      O método científico

 

René Descartes, no século XVII, foi o primeiro a ponderar e postular pela necessidade de estabelecer regras e condições para questionar os fatos e estabelecer conclusões aceitáveis pela razão humana, o que equivaleu a indicar um método para atingir a verdade. Etimologicamente, método tem o significado de caminho para se chegar a um determinado objetivo, qualquer que seja o objeto da investigação. Assim, por exemplo, quando se trata, especificamente, de uma investigação científica, o caminho percorrido pelo cientista ou investigador, em última análise, é chegar às verdades científicas. Estas, por sua vez, estão em função direta do próprio progresso da ciência como um todo, mas devemos observar que, ao falarmos em “verdades científicas”, estamos segregando estas de outras verdades possíveis, não é verdade? Então, como generalizar as verdades de todo e qualquer tipo com as verdades científicas?  Existe uma proposta ou método bem definido e aceito para desenvolver a ciência? Afinal, o que é o método científico?

Neste capítulo, ao apresentarmos os diferentes métodos de buscar as verdades, sejam elas rotuladas de científicas ou não, tentaremos responder algumas das perguntas formuladas, sabendo que não existem respostas únicas para elas, cabendo então formularmos conceitos abrangentes e válidos.

Foi no século XX que o método científico adquiriu importância, respaldado pelas propostas de Thomas Kuhn (1) e Karl Popper. (1) Estas propostas seguem abordagens diferentes na focalização do método científico e apontam para direções diferentes em suas conclusões. Karl Popper defende o método científico propriamente dito, adota uma regra metodológica em conexão com o seu método dedutivo de prova e rejeita o indutivismo com veemência, ignorando até mesmo a via indutiva, mas não deixa de propor a falseabilidade como critério a ser adotado pelos cientistas para o teste de suas teorias. Sua filosofia é mais abrangente que o método científico padrão, sendo partidário do livre pensar sem restrições de qualquer tipo. Thomas Kuhn, por sua vez, trata primordialmente do macrométodo científico e embasa as suas idéias em argumentos históricos. Partindo da evolução histórica das ciências, ele estabeleceu um tipo de comportamento padrão a ser seguido pelos cientistas. Kuhn, em sua análise, ponderou que a ciência é cíclica em seu comportamento: depois de passar “pelo que chama de “períodos de ciência normal”, nos quais os cientistas limitar-se-iam a se orientar pelos paradigmas vigentes, passa por “períodos revolucionários”, desencadeados pela falácia dos paradigmas até então aceitos como verdadeiros”. (1) Durante os períodos de ciência normal, as teorias científicas estão bem protegidas quanto à falseabilidade. Assim, “qualquer idéia proposta no sentido de falsear um paradigma deveria ser mal vista pela comunidade científica. O cientista, para Popper, deve adotar uma atitude revolucionária permanente, enquanto que, segundo Kuhn, ele deve acomodar-se aos dogmas vigentes, sob pena de ser alijado da comunidade científica. O corporativismo é inerente à filosofia de Kuhn. Decorre deste corporativismo, a adoção de “modismos”, a ênfase à pseudo-exatidão, a justificar a “falta de clareza” e o “autoritarismo do especialista”, temas estes excessivamente criticados por Popper”. (7)

Quando tratamos de descobrir as leis naturais que suportam um conjunto de coisas, fenômenos e eventos abrangentes e inter-relacionados como soem ser os encontrados na própria Natureza e no Universo, estamos diante de uma tarefa gigantesca e interminável.  Por isso, há necessidade de focalizarmos especificamente os assuntos em subconjuntos, sem perder de vista a noção do conjunto e como a parte situa-se dentro deste imenso conjunto. Foi com este enfoque, para obter resultados cada vez mais verdadeiros e mais precisos, que o conhecimento humano diversificou–se e, dessa diversificação surgiram os diversos ramos de especialização. Indiscutivelmente, porém, sem o método dificilmente chegaríamos a algum lugar.

De modo simplificado, o método científico é um programa para pesquisa que compreende quatro passos principais que, na prática, seguem mais uma ordem lógica do que cronológica, a saber, (4) primeiro, fazer observações; segundo, construir uma hipótese testável para explicar os dados das observações; terceiro, deduzir predições partir das hipóteses formuladas e quarto,  procurar confirmar as predições. Caso as predições não possam ser confirmadas, retorna-se, então, para o segundo passo, reconstruindo-se a hipótese. Na prática, os quatro passos são normalmente praticados ao mesmo tempo, visto que os cientistas estão constantemente fazendo e testando novas observações. A grande preocupação dos cientistas é ajustar a hipótese aos fatos com coerência e consistência.

 

i Indução

 

O argumento indutivista tem por fundamento o princípio da indução que pode ser enunciado da seguinte forma, adaptado de A. F. Chalmers por Alberto Mesquita Filho: (3) Se, em dadas condições, um determinado fenômeno, sempre que pesquisado, repetiu-se, em futuras verificações o mesmo sucederá”. É o princípio da repetitividade, muito criticado pelo próprio A. F. Chalmers. Por este princípio, o indutivista elabora leis e teorias, partindo de dados observados ou fatos adquiridos, omitindo o uso da dedução de hipóteses, mas admite o uso da dedução para, a partir das leis e teorias por ele elaboradas, fazer previsões e explicações. É um argumento simplista por meio do qual se pretende explicar enunciados universais ou leis usando observações mais ou menos singulares. É óbvio que não se trata de especulações e conjecturas infundadas, o que não seria próprio de um cientista, porém, muitas vezes não resultam em enunciados inquestionáveis. Newton dizia que não fazia hipóteses, mas isto foi num outro contexto, que pode não se repetir na maioria dos casos atuais.

O mal desse princípio ou regra metodológica é que ele afirma em vez de supor (hipótese), baseado em um número de observações escasso ou nem sempre bem definido, o que pode deixar de dar solidez às conclusões ou generalizações alcançadas, seja ela lei ou teoria. Apesar de se apoiar no princípio da causalidade – não há efeito sem causa – este princípio pode levar a conclusões ingênuas ou facilmente derrogáveis. Enfim, é um princípio mais norteador e orientador que metodológico, por ser restritivo.

Segundo este princípio, partimos de fatos adquiridos por meio da observação e pela indução, chegamos a estabelecer leis e teorias; estas, por dedução, levam o cientista às explicações e deduções.

 

i Dedução

 

O argumento dedutivista baseia-se no seguinte princípio: “Se em dadas condições, um determinado fenômeno, sempre que pesquisado, repetiu-se, qualquer afirmação decorrente desta premissa, para que seja hipótese, deverá ser passível de verificação observacional”. (3)  Ele parte das observações (do geral para o particular) e por meio da dedução levanta hipóteses, as quais, examinadas pela indução (que parte do particular para o geral) nos levam à elaboração de leis. Este princípio tem mais coerência interna que o princípio indutivista, já que utiliza o argumento da lógica, mas também está sujeito a críticas. É preciso ressaltar, embora pareça óbvio que, hipótese, como na matemática, é o que se pretende demonstrar, não o que já está demonstrado. Daí, ser necessário não confundir hipótese com evidência prévia. Convém assinalar que mesmo o uso do método dedutivo não nos permite garantir o surgimento de leis infalíveis. É o que nos afirma Karl Popper: (3) “Não há um método para determinar se uma hipótese é ‘provável’, ou provavelmente verdadeira”.Este princípio parte da observação e por dedução estabelecem-se hipóteses, as quais, por sua vez, submetidas à indução, conduzem o cientista às leis.

Se partirmos do enfoque que em ciência tudo é provisório e não há verdade absoluta, como acontece em qualquer área do conhecimento, não vemos problema algum no uso do método dedutivo. Se assim não fosse, como a ciência evoluiria? Então, partindo do enfoque das aproximações sucessivas, as verdades de hoje estão sujeitas a dois destinos: ou serão refutadas ou serão reformuladas e aperfeiçoadas. Para nos defrontarmos com uma verdade absoluta, que não consideramos impossível, algum dia, teríamos que admitir uma abrangência total válida para o mundo conhecido e desconhecido, isto é, ser uma lei universal.

Pode parecer um contra-senso termos criticado o argumento indutivista, se ele se torna necessário para probabilizar ou corroborar uma afirmação comprovada pelo raciocínio dedutivo. Estaríamos aqui introduzindo conceitos flutuantes como “aceitável”, “pouco aceitável” ou “muito aceitável” ou ainda, a expressão “grau de aceitabilidade” para significar uma corroboração relativa de uma determinada hipótese. Segundo Siegel, (3) “Efetuamos pesquisas a fim de determinar o grau de aceitabilidade de hipóteses deduzidas de nossas teorias”.

Enfim, apesar de algumas críticas e restrições, a ciência progride e as falhas são corrigidas para o bem geral da comunidade, cujos componentes têm a prerrogativa de debater os trabalhos em fóruns e seminários especiais com seus colegas da mesma área científica, não sendo, portanto, infensos à crítica construtiva. Os cientistas aceitam, sem relutância, que nem tudo é irrefutável. Desse princípio, Karl Popper teve o estímulo para criar a sua proposição do falsificacionismo, que veremos mais adiante.

Para encerrar esta parte, vamos citar aqui a seguinte afirmação (8), feita em 1994, que diz: “A pesquisa científica inicia-se sempre com a colocação de um problema solucionável. O passo seguinte consiste em oferecer uma solução possível por meio de uma proposição, ou seja, de uma expressão suscetível de ser declarada verdadeira ou falsa. A esta proposição dá-se o nome de hipótese. Assim, a hipótese é a proposição testável que pode vir a ser a solução do problema”.

 

i O procedimento científico

 

O procedimento científico constitui a práxis científica. A forma como se desenvolvem os raciocínios e sua aplicação a um determinado caso concreto de comprovação experimental, partindo-se dos fenômenos observáveis primários que podem ser adquiridos por observação direta de um fato da natureza ou por meio de uma idéia intuitiva, segue aproximadamente os seguintes caminhos:

 

  1. Por dedução se chega à hipótese

  2. A partir da hipótese, por análise se chega à experiência

  3. A partir da experiência, por indução se chega à lei

  4. A partir da lei, por síntese se chega à concretização

  5. A partir da concretização se reinicia o ciclo (repetitividade).

 

Normalmente, o processo intuitivo auxilia a formular um problema, visualizando-se, então, uma rota de raciocínio a ser adotada. Com essa rota, tem-se início a dedução de hipóteses, que são enunciados particulares correspondentes a um dado fenômeno observado e, portanto, mais geral. É característica desta fase a evolução do geral para o particular. O campo central indica o objeto em estudo, geralmente representado pela natureza.

Firmado o conhecimento de pelo menos uma hipótese, passamos à fase seguinte que é a análise. É por meio da análise que passamos aos procedimentos e aos detalhes. Aqui selecionamos os materiais, o instrumental, as variáveis a serem estudadas, o alcance das variáveis, etc., necessários para testar-se a hipótese e fazer a análise dos erros. O experimentador utiliza seu conhecimento e suas habilidades técnicas para tentar obter os melhores resultados possíveis.

Após concluir a parte experimental, ou seja, encerrada a fase de análise, passamos à fase seguinte que utiliza o raciocínio indutivo com o objetivo de corroborar a hipótese ou negá-la, se o teste for de falseabilidade. Se a hipótese for corroborada, partimos para o enunciado de uma lei particular ou geral, conforme o caso.

Finalmente, temos a etapa que nos permitirá efetuar a síntese de uma lei e compará-la com outras do mesmo gênero ou não. È dessa forma que a ciência adquire o conhecimento, o qual irá acumular-se no campo das concretizações ou repositório de conhecimentos no campo científico específico de nosso interesse, podendo daí em diante, a menos que contestado por outros cientistas, assumir o papel de fonte de observações secundárias. Como dissemos, ao longo do tempo, este cabedal poderá ser enriquecido por novas experiências ou refutado.

Vale destacar que os passos indução-dedução e análise-síntese são antagônicos e complementares, os primeiros levando do geral para o particular e o segundo do particular para o geral. No dizer de Alberto Mesquita Filho, (12), “A primeira dupla representa um par de operações mentais que, em determinadas etapas, exige certo grau de abstração; e a segunda, representa um par de operações mentais que exige a permanência no mundo real”.

 

6.      Evidência e Prova Científica

 

Sob o ponto de vista da Ciência, há uma grande diferença entre “evidência” e “prova”. O que se entende por evidência científica e prova científica? Já vimos que nada em Ciência é inquestionável e que ela também evolui. Portanto, a ciência não pode estabelecer “verdade” ou “fato” no sentido em que um enunciado científico pode ser inquestionável. Todo e qualquer conceito ou mesmo um enunciado científico, deve sempre estar aberto à reavaliação, na medida em que novos dados são adquiridos e novas tecnologias são incorporadas ao acervo científico. Daí podermos afirmar que uma “prova”, só existe no reino da matemática e de suas equações, ainda assim com certas reservas em muitos casos. Em alguns casos, mesmo quando fortemente suportada pela experimentação, a “prova” pode ainda não ser suficiente. Portanto, na grande maioria dos casos seria melhor ouvir o cientista dizer tratar-se de uma evidência, suportada por um grande número de experiências ou fatos.

Mesmo sabendo que a ciência formalmente não pode estabelecer uma verdade absoluta, é inegável que ela pode fornecer fortes evidências a favor de certas idéias, que podem não ser óbvias e, até mesmo confrontar com o senso comum. O senso comum guia-se muito pelas aparências e costuma ter noções ou tirar conclusões falsas sobre muitas coisas e muitos fenômenos que estão presentes em nossas vidas diárias. Portanto, senso comum não é ciência.

É óbvio que a ciência é o fórum para nos explicar uma imensidão de coisas e fenômenos que ocorrem na natureza, entre elas, coisas que não podemos observar e ver diretamente com os nossos olhos físicos. A ciência não precisa nos mostrar coisas que podemos ver com nossos olhos, a não ser para explicar melhor sua natureza e funcionamento. A partir do século passado, a grande maioria das descobertas científicas ocorreu ao nível do microcosmo, usando a observação indireta, incluindo estudos sobre a estrutura do núcleo dos átomos, elétrons, ondas de rádio, ondas de TV, microondas, raios X, luz ultravioleta, luz polarizada, raios laser, formas de energia, entropia, entalpia, fusão solar, vírus, bactérias, germes, genes, enzimas e o genoma humano.

No campo da Astronomia, basta pensarmos que, até 1961, ninguém tinha ainda observado diretamente a forma arredondada da Terra, até então tida como chata pelo senso comum. No entanto, desde 1600, isto é, desde a invenção do telescópio por Galileu, a hipótese de Copérnico de que a Terra é redonda e gira em torno do Sol tem sido reconhecida pela ciência, embora a observação direta pareça indicar o oposto. São inferências “invisíveis”, que foram elucidadas utilizando-se o método científico.

 

7.      A testabilidade das hipóteses e teorias

 

A testabilidade das hipóteses e teorias é um requisito fundamental em qualquer procedimento científico. É o grau de testabilidade que vai assegurar se uma hipótese é científica ou não. O conceito de “testável” implica dizer que as predições devem incluir exemplos do que deve e do que não deve ser observado se a hipótese for verdadeira. Ainda, segundo a referência :(4) “Uma hipótese que pode explicar todas as observações possíveis e os dados não são testáveis, não é científica. Uma boa hipótese científica deve rejeitar algumas possibilidades concebíveis, pelo menos em princípio. Além disso, uma explicação científica precisa fazer predições de risco – as predições deveriam ser necessárias se a teoria estiver correta e poucas outras teorias deveriam fazer as mesmas predições necessárias”.

Assim, uma determinada hipótese è válida e útil se e quando se enquadrar na rigidez do método científico e provar os fatos que lhe deram origem, ficando, todavia, sujeita à proposição de falseabilidade de Popper. Em outras palavras, uma hipótese bem sucedida tem que explicar os fatos observados e conhecidos, ainda que alguns fatos não tenham sido incluídos na experiência ou só venham ser conhecidos a posteriori. Então, “a melhor hipótese disponível é aquela que explica a maioria dos fatos com poucas suposições. É aquela que faz a maioria das predições que são confirmadas e aquela que é mais aberta a testes e refutações”. (4)

A Ciência considera como teoria, uma hipótese superior e bem suportada. Assim, uma teoria bem aceita é aquela que resistiu ao teste do tempo e a coleção de novos dados tende a torná-la um fato científico bem aceito como o exemplo do heliocentrismo do sistema solar, que na época de sua apresentação era uma mera hipótese. Uma série de exemplos de fatos científicos bem aceitos é encontrada na Física Quântica, embora nunca ninguém tenha observado diretamente um elétron, uma fusão estelar, ondas de rádio, entropia, etc. Como Stephen J. Gould dizia, um fato científico não é uma “certeza absoluta”, mas simplesmente uma teoria que tem sido “confirmada em tal grau que seria perverso reter o consentimento provisório”. (4)

Já mencionamos em outra parte deste texto que a própria teoria da gravidade de Newton foi contestada ou “falseada”, em virtude do movimento anormal de Urano, porque na época não era conhecido o planeta Netuno, responsável pelas anomalias observadas na órbita de Urano. Portanto, é bom ter em mente que as explicações alternativas para “anomalias”, devem ser tratadas como qualquer outra hipótese: devem ser pesadas, testadas e eliminadas ou confirmadas, mas uma hipótese não pode ser considerada refutada até que seus testes produzam muitas linhas de evidências positivas indicando que a hipótese anterior é realmente inconsistente com os dados empíricos.

O grau de sofisticação das investigações científicas atuais leva os estudiosos da área a se valerem da matemática estatística, para que a análise dos dados observados possa ser ajustada às predições de uma teoria. É por isso que se costuma dizer que as teorias científicas modernas são probabilísticas. Embora muitos cientistas detestem a matemática estatística, trata-se de uma ferramenta indispensável nos experimentos científicos atuais e deve ser usada sempre que a probabilidade está em jogo.

 

8.      Princípio da Falseabilidade

 

Introduzido por Karl Popper nos anos 30 do século XX, o princípio da falseabilidade (ou refutabilidade), tornou-se um conceito importante na filosofia da ciência (epistemologia). Para uma asserção ser refutável ou falseável, em princípio será possível fazer uma observação ou fazer uma experiência física que tente mostrar que essa asserção é falsa. Por exemplo, a asserção de que, “todos os cisnes são brancos”, poderia ser falsificada pela observação de um cisne não-branco. A escola de pensamento que coloca a ênfase na importância da falseabilidade como um princípio filosófico, é conhecida como o falsiabilismo. (12)

Popper, analisando os tipos de enunciados que ocorrem em ciência, reparou que dois tipos de enunciados são de particular valor para os cientistas. O primeiro tipo constitui-se de enunciados de observações, tais como “este cisne é branco”. Com base na lógica, chamamos a estes enunciados de enunciados existenciais singulares, uma vez que afirmam a existência de uma coisa em particular. Eles podem ser analisados na forma: “existe um x que é cisne e é branco”. (12)

O segundo tipo de enunciado de interesse para os cientistas categoriza todas as instâncias de alguma coisa, por exemplo “todos os cisnes são brancos”. Segundo a lógica, chamamos a estes de enunciados universais. Eles são normalmente analisados na forma: “para todos os x, se x é um cisne então x é branco”. (12)

“Leis” científicas (mais corretamente chamadas teorias), são normalmente tidas como sendo desta forma – enunciados universais.. Talvez a questão mais dificil na metodologia da ciência é, como é que podemos chegar às teorias partindo das observações? Como podemos inferir de forma válida um enunciado universal a partir de enunciados existenciais (por muitos que sejam)?

A metodologia indutivista supunha que se pode passar de uma série de enunciados singulares para um enunciado universal. Ou seja, que se pode passar de um “este é um cisne branco”, “ali está outro cisne branco” e, por aí adiante, para um enunciado universal como “todos os cisnes são brancos”. Este método é claramente inválido em lógica, uma vez que será sempre possível que exista um cisne não-branco que, por algum motivo, não tenha sido observado. Este era o problema da indução, já identificado por David Hume, no século XVIII  e cuja resolução é proposta por Popper, da forma como descrita.

Popper defendeu que a ciência não poderia ser baseada numa tal inferência. Ele propôs a falseabilidade como a solução do problema da indução. Popper viu que, apesar de um enunciado existencial singular como “este cisne é branco”, não pode ser usado para afirmar um enunciado universal, ele pode ser usado para mostrar que um determinado enunciado universal é falso: a observação existencial singular de um cisne negro serve para mostrar que o enunciado universal, “todos os cisnes são brancos”, é falso.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) FILHO, Alberto Mesquita. Teoria sobre o método científico. Disponível em: www.ecientificocultural.com/ECC2/artigos/metcien1.htm#Ret11. Acesso em: 04 set. 2005.

 2) MAIA, Isabel M Magalhães R. L. Santos. O desenvolvimento da ciência em Thomas Kuhn. Disponível em: https://www.consciencia.org/contemporanea/kuhnisabel.shtml#conclusao.Acesso em: 04 ago 2005.

 3) FILHO, Alberto Mesquita. Teoria sobre o Método Científico. Disponível em:      https://www.ecientificocultural.com/ECC2/artigos/metcien2.htm. Acesso em: 08/09/2005

 4) THEOBALD, Douglas. Prova Científica? Projeto Evoluindo - Biociência.org. Trad.: Rubens Pazza. [https://www.evoluindo.biociencia.org/prova.htm], 2004.

 5) CHALMERS, A. F. A ciência como conhecimento derivado dos fatos da experiência. Disponível em: https://www.criticanarede.com/cienciaefactos.html. Acesso em 07 set. 2005. Trad. de Pedro Galvão. In:_ CHALMERS, Alan. What is this Thing Called Science?, Open University Press, 1999..

 6) CARTER, Rita. O livro de ouro da mente (Mapping the mind). Trad. de Vera Paula Assis. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002. p. 208-210.

 7) FILHO, Alberto Mesquita. A práxis científica. Disponível em: https://www.ecientificocultural.com/ECC2/FilCien/referencia09#referencia09. Acesso em: 08 set. 2005.

 8) GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisas. São Paulo: Atlas, 1994. p. 35

 9) BUNGE, M.. Teoria e realidade. São Paulo: Perspectiva,1994.

10) LACEY, H.M. A linguagem do espaço e do tempo. São Paulo: Perspectiva,1972.

11) BOHM, D., ; PEAT, F. D.: Ciência, ordem e criatividade. Lisboa: Gradiva,1989.

12) WIKIPEDIA. Falseabilidade. Disponível em:  https://pt.wikipedia.org/wiki/Falseabilidade. Acesso em: 14 set. 2005.

13) POPPER, K. R. Acerca da inexistência do método científico www.ecientificocultural.com/ECC2/FilCien/filosien.htm  Acesso em  08/09/2005

14) WILKINS, John S. In evolution science, and what does “science” mean? Disponível   em: www.talkorigens.org/faqs/evolphil/falsify.html. Acesso em: 04 set. 2005.

15) HECK, J. G. Quantos sentidos temos realmente. 1997. Disponível em:https://www.watchtower.org/languages/portuguese/library/g/2003/3/8/article_01.htm. Acesso em 23/01/06.            

16) EDITORIAL. Revista Superinteressante, junho 2005.

17) RUIZ, João Álvaro. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1978. p. 48. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 5

 

 

VERDADE, REALIDADE E PARADIGMA

 

 

A.    VERDADE

 

De fato, a Filosofia, preocupada em garantir a diferença entre a mera opinião (“eu acho que”, “eu gosto de”, “eu não gosto de”) e a verdade (“eu penso que”, “eu sei que”, “isto é assim porque”), considerou que as idéias só seriam racionais e verdadeiras se fossem intemporais, perenes, eternas, as mesmas em todo tempo e em todo lugar. Uma verdade que mudasse com o tempo ou com os lugares seria mera opinião, seria enganosa, não seria verdade. A razão, sendo a fonte e a condição da verdade, teria também que ser intemporal.

Marilena Chauí – Convite à Filosofia. São Paulo, Ática, 2000.

 

As civilizações antigas – hebraica, grega e latina – são as melhores fontes para averiguar-se as concepções do que seja “verdade”. Muitas teorias foram desenvolvidas sobre o que seja a Verdade, mas para os propósitos dessa obra, largaremos a erudição de lado e nos firmaremos nos conceitos provenientes dos hebreus, gregos e romanos ao longo da História.

Em hebraico, a palavra verdade deriva de emunah, que significa confiança, palavra empenhada, pessoas que não traem a confiança e, portanto, cumprem a palavra dada ou um pacto feito. Com relação à entidade Deus, esta tem que ser verdadeira em si mesma. Assim, quem confia na verdade, espera que aqueles que com ela pactuam, serão fieis cumpridores de seus compromissos. Em outras palavras (1), “a verdade é uma crença fundada na esperança e na confiança, referidas ao futuro, ao que será ou que virá. Sua forma mais elevada é a revelação divina e sua expressão mais perfeita é a profecia”. Aqui o sentido religioso está sempre presente, significando que a verdade é um atributo de Deus herdado pelos homens.

Já em grego, a palavra aletheia significa não-escondido, não-oculto, não dissimulado, o que é evidente à razão, isto é, o verdadeiro é o que manifesta-se aos olhos do corpo e do espírito. Nesse sentido, a verdade é a manifestação daquilo que é ou existe tal como é. E o que se opõe à verdade? É o falso, o escondido, o dissimulado, o encoberto, enfim, o que parece ser e não é como parece. Trata-se de um conceito mais prático, não ligado ao sentido religioso. Por isso mesmo, o verdadeiro está nas próprias coisas, sendo delas uma qualidade. Assim, “conhecer é ver e dizer a verdade que está na própria realidade e, portanto, a verdade depende de que a realidade se manifeste, enquanto que a falsidade depende de que ela se esconda ou se dissimule em aparências”. (1)

Finalmente, em latim, a palavra veritas tem a ver com o rigor, a precisão e a exatidão de um relato. Ou seja, ela implica na descrição de algo, com detalhes e fidelidade do que aconteceu, está acontecendo ou vai acontecer. A linguagem do verdadeiro é sempre a narrativa do que é veraz, serve para enunciar fatos reais. E ainda, seu oposto é a mentira ou a falsificação. Aqui, diferente do conceito grego, a verdade depende do relato, da narração e do enunciado de quem fala e, portanto, está ligada à acuidade mental de quem fala, isto é, de sua subjetividade. Citando novamente (1), “as coisas e os fatos não são reais ou imaginários; os relatos e enunciados sobre eles é que são verdadeiros ou falsos”.

Em resumo, a nossa cultura atual com relação à palavra verdade e seu significado, está impregnada das três concepções, sendo delas uma síntese: emunah para significar confiança-esperança em relação às coisas futuras,  aletheia, para se referir ao que as coisas são (fatos presentes) e, veritas, para se referir aos fatos que foram, ou seja, aos fatos passados.

Daí, estarem associadas à palavra “verdade”, outras palavras tais como “averiguar” e “verificar”, indicando buscar a verdade; “veredicto”, significando um julgamento verdadeiro, um juízo veraz; “verossímil” e “verossimilhante”, usados para significar aquilo que é parecido com a verdade ou que seja semelhante a algo verdadeiro.

 

1.      Teorizando sobre a verdade

 

Teorizar sobre a verdade parece algo contraditório. Na verdade, queremos mostrar que o pensamento filosófico não tem limites e para o livre-pensador, nada lhe sobrepõe ao livre exercício das idéias e dos pensamentos. Dependendo do vínculo que venhamos adotar com relação às fontes acima expostas, estaremos frente a diferentes concepções filosóficas sobre a natureza do conhecimento verdadeiro.

Ao adotarmos a predominância hebraica do termo verdade, vemos que ela depende de um acordo ou de um pacto de confiança entre os pesquisadores. Nesse pacto, seus membros definem um conjunto de regras e convenções universais que serão adotadas no seu campo de investigação para adquirir o conhecimento verdadeiro, o qual deve sempre ser respeitado por todos. A esse pacto chamamos de paradigma, tema que será desenvolvido no final deste capítulo. Aqui, a verdade fundamenta-se, portanto, no consenso e na confiança recíproca entre os membros de uma comunidade de pesquisadores e estudiosos. Avançar, ainda que um pouco além das regras estabelecidas, pode levar à desqualificação do pesquisador e seu banimento do meio em que atua, com o risco de comprar uma longa briga de dificuldades e obstáculos aos seus trabalhos.

De acordo com a nossa referência já citada (1), o consenso se estabelece baseado em três princípios que serão respeitados por todos:

 

1. que somos seres racionais e nosso pensamento obedece aos quatro princípios da razão (identidade, não-contradição, terceiro-excluído e razão suficiente ou causalidade);

 

2. que somos seres dotados de linguagem e que ela funciona segundo regras lógicas convencionadas e aceitas por uma comunidade;

 

3. que os resultados de uma investigação devem ser submetidos à discussão e avaliação pelos membros da comunidade de investigadores, que lhe atribuirão ou não o valor de verdade.

 

Se adotarmos a predominância grega, nossa verdade derivará da realidade que está nas próprias coisas e nos fatos e o conhecimento verdadeiro será representado pela percepção intelectual e racional dessa verdade. Essa teoria é conhecida como o princípio da evidência, por estar na evidência o substrato do conhecimento verdadeiro. Trata-se de um enfoque intelectual e racional da realidade, tal como é em si mesma e essa verdade é obtida por meio de operações racionais da mente humana. Segundo essa teoria, uma idéia é verdadeira quando corresponde à coisa que é seu conteúdo e que existe fora de nosso espírito ou de nosso pensamento. Aqui o homem é simples observador, já que o critério da verdade é a adequação da nossa mente à coisa ou desta a nossa mente.

Já na vertente latina, a noção de verdade resulta do rigor e da forma como criamos e usamos as regras da linguagem, “que devem exprimir, ao mesmo tempo, nosso pensamento ou nossas idéias e os acontecimentos ou fatos exteriores a nós e que nossas idéias relatam ou narram em nossa mente” (1). Verificamos que a posição é inversa da anterior, pois aqui vemos que uma coisa não se diz verdadeira quando corresponde a uma realidade externa, mas se diz que ela corresponde à realidade externa porque é verdadeira. É o princípio da coerência ou do racional, em que o critério da verdade é dado pela coerência lógica das idéias e seu encadeamento, formado por meio do raciocínio de um observador. Essa coerência deriva da estrita obediência às regras e leis dos enunciados corretos, em que a marca do verdadeiro é a validade lógica de seus argumentos.

Finalmente, voltemos o nosso enfoque para o que acontece hoje em ciência, em que a verdade se distingue das demais teorias ou princípios já expostos, por definir o conhecimento verdadeiro por meio de um critério mais prático do que teórico. Trata-se da teoria pragmática, segundo a qual um conhecimento é verdadeiro por seus resultados e suas aplicações práticas, sendo verificável pela experimentação e pela experiência. Aqui, a marca do verdadeiro é a verificabilidade dos resultados. Verifica-se que esta versão coaduna-se com a versão grega – aletheia, que reúne realidade e pensamento, numa simbiose entre a coisa observada e o conhecimento que dela se tem, ainda que previamente só se tratasse de mera hipótese.

Numa análise simplificada, vemos que na primeira (emunah – princípio do consenso) e na terceira teoria (veritas – princípio da coerência), os enunciados, os argumentos e as idéias é que são julgados verdadeiros ou falsos; na segunda teoria (aletheia – princípio da correspondência), as coisas e as idéias são consideradas verdadeiras ou falsas; e, na quarta teoria (pragmática – princípio científico), são os resultados que recebem a denominação de verdadeiros ou falsos.

Em decorrência, podemos reafirmar que, tanto na segunda como na quarta teoria, a verdade é o acordo entre o pensamento e a realidade. Na primeira e na terceira teoria (1), “a verdade é o acordo do pensamento e da linguagem consigo mesmos, a partir de regras e princípios que o pensamento e a linguagem deram a si mesmos, em conformidade com sua natureza própria, que é a mesma para todos os seres humanos (ou definida como a mesma para todos por um consenso)”.

 

2.      Verdade – evidência ou correspondência?

 

Se refletirmos bem sobre a concepção grega da verdade (aletheia) observaremos que nela, as coisas ou o ser é o verdadeiro ou a verdade. Ou seja, a verdade ou o verdadeiro é o que existe e manifesta sua existência para o nosso pensamento por meio dos órgãos sensoriais da percepção. Sendo assim tão claro, os filósofos gregos perguntam como pode haver o erro, o falso e a mentira, ou seja, como podemos pensar naquilo que não é, não existe, não tem realidade, se é claro que o erro, o falso e a mentira só podem referir-se ao não-ser? Segundo a referência (1): “O ser é o manifesto, o visível para os olhos do corpo e do espírito, o evidente. Errar, falsear ou mentir, portanto, é não ver os seres tais como são, é não falar deles tais como são”.

É fácil entender que o erro, a falsidade e a mentira, provêm da aparência ilusória das coisas e dos seres e surge sempre que não conseguimos alcançar a essência das realidades. Se dissermos de alguma coisa ou de algum ser, aquilo que ela ou ele não é estaremos incorrendo em erro por estarmos lhes atribuindo propriedades e qualidades (predicados) que eles, de fato, não possuem. Há, portanto, necessidade de discernimento para evitar o erro e, como conseqüência dele, o mal. Desse sentir imperfeito, o erro, a falsidade e a mentira passam à linguagem e ao discurso: ele (o erro) decorre do juízo correto ou incorreto que fazemos dos predicados, já que estes, quando verdadeiros e só quando são verdadeiros, fazem parte das coisas ou dos seres. Tudo o mais é não-verdade ou inverdade.

Na linguagem lógica, o sujeito (observador) afirma ou nega o predicado que provém do ser ou da coisa. O predicado pode ser real ou falso; o problema é discernir qual é a realidade para se ficar do lado da verdade. Se algo não for predicado da coisa ou do ser, estaremos forçosamente incorrendo em erro, por não discernir corretamente ou por desconhecermos a essência da coisa ou do ser. Mas, se conhecemos a essência da coisa ou do ser e, ainda assim, estamos emitindo um juízo errado sobre ela, estaremos mentindo ou falseando a verdade.

Mas, afinal, o que é a verdade? Parece que o fulcro dessa questão reside no critério de evidência, que é a visão intelectual ou mental da própria essência de um ser, de uma coisa ou de um fenômeno. A partir daí, a verdade passa a ser a conformidade entre a nossa razão (pensamento e juízo) e as coisas pensadas e formuladas pelo juízo. Então, a condição necessária para formularmos um juízo verdadeiro é conhecermos a essência das coisas, dos seres e dos fenômenos, seja pela intuição, por dedução ou por indução. Fora disso, imperará a vontade mal direcionada que nos conduzirá ao erro, ao falseamento e à mentira.

E quais são os principais entraves ao conhecimento da verdade? Como a verdade é o conhecimento profundo da essência das coisas, dos seres e dos fenômenos, o que lhe assegura certo grau de universalidade, vislumbramos três grandes condições para que isso aconteça: primeiro, devemos nos libertar das aparências das coisas; segundo, devemos nos libertar das opiniões estabelecidas e dos preconceitos; finalmente, devemos nos libertar das ilusões de nossos órgãos dos sentidos.

Para alcançarmos a primeira condição, devemos tratar as coisas sérias da vida como coisas sérias e nos dedicarmos ao estudo e ao aprimoramento de nosso conhecimento e dos nossos valores. Só assim a ignorância, que leva à aceitação pura e simples do que é falso, irá desaparecendo.

A segunda condição nos leva a descartar opiniões descabidas que variam de pessoa a pessoa, de lugar para lugar e de cultura para cultura, isto é, precisamos dar ao nosso conhecimento condição de universalidade, evitando-se, dessa forma, a variabilidade e a inconstância das opiniões, ambas nos afastando da verdade.

A terceira condição exige que nos cerquemos de certos cuidados para não nos deixarmos enganar pelos órgãos dos sentidos, isto é, pelas nossas impressões sensoriais. A avaliação destas depende de muitos fatores individuais, tais como, o real estado do nosso corpo – cansaço, fadiga, estresse, bem como, das condições de nossos sentimentos e das disposições de nosso espírito para atuar e julgar com isenção de ânimo sobre o que, de fato, lhe informam o conjunto de suas percepções, não se esquecendo nunca de que as propriedades e as qualidades são inerentes à essência das próprias coisas e dos seres por fazerem parte da verdade delas e deles.

Todas as observações, experiências e fatos, são relatados e acumulados em forma de conhecimento e cultura, pelos meios de comunicação restrita ou ampla. Diante da terceira teoria da verdade (veritas), usamos a nossa linguagem comum, técnica, tecnológica, erudita, etc., para expressar nossas conclusões. Por isso, comparado com nossas considerações anteriores, observamos que o problema da verdade e do erro, do falso e da mentira, se deslocou diretamente para o campo da linguagem. Segundo a nossa referência já citada (1), “o verdadeiro e o falso estão menos no ato de ver (com os olhos do corpo ou com os olhos do espírito) e mais no ato de dizer. Por isso, a pergunta dos filósofos, agora, é exatamente contrária à anterior, ou seja, pergunta-se: Como a verdade é possível?”.

Ainda assim, a verdade é possível, mas devemos lembrar que ela será encontrada, ou não, no discurso ou na linguagem, não dependendo apenas do pensamento e das próprias coisas, mas também de nossa vontade para dizê-la, não dizê-la ou falseá-la. Por isso, dissemos acima que as coisas sérias precisam ser tratadas com seriedade, usando o nosso livre-arbítrio para o bem, o que equivale a não mentir nem falsear. Assim, vemos que a verdade depende não só da conformidade entre o fato e o relato, mas também da vontade de expressá-la como tal.

Chegamos aqui ao ponto crucial de nossa análise, que deve ser a um só tempo racional, científica e cristã, verdadeiros princípios que acompanham e orientam a espiritualidade humana no uso adequado e sério de seus principais atributos: consciência, vontade, inteligência, criatividade, imaginação e memória. Do equilíbrio correto no uso desses atributos sobressai-se a verdade e só com a verdade devemos comungar.

Já mencionamos nesse contexto e agora reenfatizamos a necessidade de liberar nossa consciência dos preconceitos, dos dogmas e das superstições introduzidas pela submissão pura e simples ao misticismo. Na verdade, a consciência representa, configura ou desconfigura a ação da Força Inteligente que é o nosso Espírito que, quando lúcido, não compartilha com o erro, a falsidade e a mentira. Em última instância, é o Espírito que é o sujeito do conhecimento e a ele cabe alcançar, comunicar e compartilhar as evidências próprias da verdade, utilizando os recursos da intuição, da dedução e da indução.

 

3.      Ponderações finais

 

Da análise que fizemos do que seja a verdade segundo os quatro princípios ou teorias, podemos inferir as seguintes “verdades” sobre a verdade aceitas parcialmente ou no seu conjunto, por filósofos, livres-pensadores e cientistas modernos. Esta síntese, com as modificações que introduzimos, deriva da referência citada (1):

 

i o conhecimento da verdade se faz pela evidência, obtida por meio da intuição, dedução ou indução;

i o conhecimento da verdade pela expressão de um juízo, cuja  idéia deve estar em conformidade com a essência das coisas, dos seres e dos fatos;

i a contradição da verdade está no erro, na falsidade e na mentira, sempre presentes quando  afirmamos de uma coisa algo que não pertence à sua essência ou natureza, ou quando lhe negamos algo que pertence necessariamente à sua essência ou natureza;

i o erro e o falso são causados pelo uso indevido que se faz das opiniões preconcebidas, dos maus hábitos ou dos enganos da percepção sensorial e da memória;

i o erro, o falso e a mentira podem, também, ser causados pela uso indevido do livre-arbítrio (vontade), que muitas vezes se sobrepõe ao pensamento, mas que precisa ser controlada por ele;

i a verdade sempre se refere à essência das coisas ou dos seres, sendo sempre universal e necessária ao contrário da aparência, que é sempre particular, individual, instável e mutável;

i o pensamento se submete a uma única autoridade: a dele própria com capacidade para o verdadeiro.

Vamos arrematar este tema sobre a verdade, reafirmando que ela é a conformidade ou a correspondência entre a idéia e a coisa e entre a coisa e a idéia ou ainda, entre a idéia e o que é ideado. Devemos ponderar que os conceitos de idéia, coisa, ser, juízo e fato são auto-explicativos, mas vale a pena enfatizar que idéia não é a coisa, da mesma forma que o mapa não é o território, mas uma representação dele. Portanto, pela idéia, conhecemos a estrutura das coisas na sua essência, bem como os nexos que duas ou mais coisas ou seres ou fenômenos, mantêm entre si. Assim, a idéia não passa de um ato intelectual e o que é ideado, constitui uma realidade externa conhecida pela mente.

 

B. REALIDADE

 

“Nosso conceito prático de realidade parece, portanto, que precisa de revisão, e tanto é assim, que a literatura comum e diária começa a incluir os conceitos de “super” e “supra” em seu horizonte mental. Estou de pleno acordo com isto, porque nossa imagem do mundo contém alguma coisa que não está inteiramente certa, ou seja: na teoria nos recordamos muito pouco, e na prática, por assim dizer, quase nunca, de que a consciência não tem uma relação direta com qualquer objeto material. Percebemos apenas as imagens que nos são transmitidas indiretamente, através de um aparato nervoso complicado”.

 Carl Gustav Jung , psicólogo (2)

 

Segundo o enfoque puramente materialista, a realidade encerra tudo o que precisamos saber, pois é real tudo aquilo que age e atua, sensibilizando os nossos sentidos físicos. Segundo esse conceito materialista, “se não age, não podemos dar-nos conta de sua presença e, por conseguinte, não conhecemos nada a seu respeito” (2). Diante desse conceito, ficam de fora as coisas e fenômenos irreais, supra-reais ou sub-reais e, com eles, a supra-realidade e a sub-realidade, limitando largamente o conceito de realidade, que fica incompleto, fragmentado e não abrangente. É a esta limitação que chamamos de realidade material ou concreta dos objetos percebidos pelos cinco sentidos. Ela baseia-se no princípio latino que diz nihil est in intellectu quod non ante fuerit in sensu, ou seja, nada existe no intelecto que antes não tenha passado pelos sentidos e isto, a despeito do fato de haver uma imensidade de coisas e fenômenos imateriais, invisíveis por sua natureza intrínseca ou por suas pequeníssimas dimensões. É de nossa razão perceber que esta limitação foge ao senso comum, não é racional.

Vemos aqui duas dificuldades para conciliar e abranger um sentido mais amplo para realidade. Uma é de natureza biológica e se relaciona ao mecanismo da percepção, principalmente a visual, que utiliza os terminais nervosos dos órgãos dos sentidos e a sensação que aparece na nossa mente. Por exemplo, entre estes dois extremos intercala-se um processo inconsciente que transforma o fato físico da luz, que é vibração, em uma “luz” – imagem em nossa mente. Sem este complexo processo inconsciente de transformação, a percepção não ocorre. A outra dificuldade decorre da própria linguagem, que cunhou o termo realidade para significar, de preferência, o que os nossos sentidos indicam, ou seja, apenas uma representação do mundo material.

No exemplo do sentido da visão, o que entendemos, então, como realidade imediata? Na verdade, consiste em imagens cuidadosamente elaboradas pelos nossos sentidos e interpretadas pela mente, o que nos leva a viver diretamente em um mundo de imagens. E ainda, pela limitação do próprio sentido da visão, para determinar aproximadamente a real natureza das coisas materiais, os físicos e os químicos se valem de complicada aparelhagem e instrumentação sofisticada, que servem para ajudar o intelecto humano a ver um pouco mais profundamente a realidade que existe além da matéria. Isto nos leva a concluir, cientificamente, a existência do mundo invisível que, na sua essência, se constitui de Força e Matéria e, estabelecer que o nosso principal sentido físico, a visão, é insuficiente para abarcar toda a realidade ou a realidade total.

Faço minhas as palavras de Carl Gustav Jung (2), retiradas do texto compilado do seu livro: A Dinâmica do Inconsciente, Itens 742 a 748:

 

Longe, portanto, de ser um mundo material, esta realidade é um mundo psíquico que só nos permite tirar conclusões indiretas e hipotéticas acerca da verdadeira natureza da matéria. Só o psíquico possui urna realidade imediata, que abrange todas as formas do psíquico, inclusive as idéias e os pensamentos “irreais”, que não se referem, a nada de “exterior”. Podemos chamá-las de imaginação ou ilusão; isto não lhes tira nada de sua realidade. De fato, não existe nenhum pensamento “real” que, às vezes, não possa ser posto de lado por um pensamento “irreal” que, assim, se mostra mais poderoso e mais eficiente do que o primeiro. Maiores do que todos os perigos físicos são os efeitos tremendos das idéias ilusórias às quais nossa consciência mundana nega qualquer realidade.

 

Nossa tão decantada razão e nossa vontade desmedidamente superestimada às vezes são impotentes diante do pensamento “irreal”. As potências cósmicas que regem os destinos de toda a humanidade, tanto para o bem como para o mal, são fatores psíquicos inconscientes, e são elas também que produzem a consciência, criando, assim, a conditio sine qua non para a existência de um mundo em geral. Nós somos subjugados por um mundo que foi criado por nossa psique.

Isto nos permite julgar as proporções do erro que nossa consciência ocidental comete ao atribuir apenas uma realidade derivada de causas materiais. O Oriente é mais sábio, porque encontra a essência de todas as coisas fundadas na psique. A realidade do psíquico, isto é, a realidade psíquica, aquela única realidade que podemos experimentar diretamente, se acha entre as essências desconhecidas do espírito e da matéria.

Ainda dentro do conceito puramente materialista que endeusa os sentidos físicos e a aparelhagem científica, a realidade é uma palavra que não admite conceito absoluto. Então, sob esse enfoque, temos que considerá-la dentro de uma visão relativística. Em primeiro lugar porque, em virtude do adágio popular bem conhecido, “cada cabeça, cada sentença”, torna-se muito difícil encontrar duas ou mais pessoas com o mesmo entendimento ou mesma visão sobre um mesmo ser, ou sobre uma mesma coisa ou fenômeno. Imagine quão mais difícil é, se estivermos analisando algo que tenha um alcance de natureza transcendental. Por essa e outras razões de natureza metodológica, se torna necessário refletir sobre as variadas facetas da realidade, principalmente quando tivermos que examinar a essência de certos conceitos não igualmente aceitos da mesma forma por parte de pessoas diferentes, que se submetem a paradigmas diferentes.

Quando estamos tentando devassar, ou melhor, trazer à luz conhecimentos que não estão disponíveis em nenhum lugar, quando assumimos a índole de um visionário, temos que nos valer de vários recursos. Entre esses recursos estão a introspecção, a intuição, a indução, a dedução e a lógica. Quando for o caso de colocarmos em evidência aos nossos sentidos físicos, elementos de convicção tão comuns nos trabalhos científicos devemos incluir também, a experimentação.

Vamos, portanto, examinar partindo do geral para o particular, de que forma poderíamos conceituar e apreender o verdadeiro sentido das palavras realidade, realidade objetiva e realidade subjetiva, além de outras criadas para lançar luz nessa tremenda confusão de idéias sobre o mundo em que vivemos.

É lamentável que não se consiga trabalhar apenas com um conceito de realidade, já que estamos ainda muito longe do conceito de realidade total ou realidade absoluta. Daí a necessidade de apresentarmos e definirmos vários tipos de realidade que variam em função de vários fatores. Esta lista pode não estar completa.

Primeiramente, devemos ter em mente que consciência e percepção são duas coisas diferentes. Precisamos saber essa distinção para que não haja a mínima possibilidade de confusão entre estes dois conceitos. Só assim poderemos correlacionar realidade com conhecimento.

Vejamos, então, os diversos tipos e noções de realidade, a seguir:

 

1.      Realidade cognitiva ou cultural


Mesmo com a globalização, em que se sobressaem os meios de comunicação, há ainda no planeta Terra, muitas culturas ditas selvagens ou primitivas, que têm os seus próprios meios de comunicação e linguagem – sinais especiais, gritos, gestos, assobios, códigos, toques de tambores, sinais com fumaça e fogo, etc. Estes povos, vivendo em regiões isoladas, não têm o menor conhecimento da existência de nossos modernos meios de comunicação, baseados nas ondas de rádio ou de TV (ondas hertzianas), que nada têm a ver com seus métodos primitivos de comunicar. Para eles, estes meios não existem e, portanto, não fazem parte da sua realidade, são irreais. Quem tentar explicar-lhes que estas coisas existem têm-no como mentiroso ou até mesmo louco. São ignorantes desse contexto cultural que não faz parte de sua realidade. No entanto, para nós, as ondas hertzianas existem, fazem parte do contexto real de nossa existência cotidiana. Logo, podemos concluir que, elas fazem parte daquilo que consideramos como sendo a realidade e, para os selvagens, fazem parte da irrealidade.

Podemos agora conceituar a realidade cognitiva, como sendo aquela que provém de nossos conhecimentos atuais, consolidados na sua utilidade e uso comum, dentro de determinada cultura ou grupo. Ainda assim, é difícil coletivizar qualquer conhecimento em virtude da sua grande diversidade, isto é, do conhecimento individual, fazendo até mesmo sentido falar de uma realidade cognitiva individual e uma realidade cognitiva coletiva.

 

2.      Realidade sensorial ou perceptiva

 

Esta realidade é aquela que resulta do uso de nossos sentidos físicos, em que a visão tem papel preponderante. Entretanto, nossos sentidos físicos não são perfeitos e estão sujeitos a distorções, falhas e erros. Podemos exemplificar com as ilusões de ótica, como a que é apresentada no livro, O livro de ouro da mente, de Rita Carter, (Ediouro, 1999, p. 258) (3). Nela, pode-se ver um cálice branco sobre um fundo preto ou ver dois rostos pretos recortados sobre um fundo branco, tudo dependendo de que parte dessa figura sua mente seleciona como plano de fundo. Após saber e conhecer este fundamento, fica mais fácil fazer persistir em sua retina uma ou outra imagem.

Fundamentados nas imperfeições de nossos sentidos físicos, os ilusionistas ganham a vida nos palcos de todo o mundo, aproveitando suas habilidades naturais e desenvolvidas por meio de um longo e persistente treinamento. E na multidão de espectadores, sempre há pessoas crédulas e simplórias que até acreditam que muitos desses truques são verdadeiros e até se exaltam quando lhes dizemos que elas se deixaram enganar.

Poderíamos citar muitos exemplos do nosso cotidiano e mesmo do anedotário humano de todas as épocas e regiões, que não deixam dúvidas de que os nossos sentidos, todos eles, podem nos iludir, não sendo de todo confiáveis. A falta de conhecimentos, a prevenção, a distração e o nervosismo, muitas vezes nos levam a fazer julgamentos distorcidos sobre a realidade. Não há dúvida de que esse é o tipo de realidade em que estão. Dela não saem de jeito nenhum, os desinformados, os cabeças-duras, os céticos e os fanáticos, que só acreditam naquilo que vêem. A isso chamamos de realidade sensorial, que pode ser obtida sem muito ou nenhum esforço mental e racional.

 

3.      Realidade abstrata

 

Embora pareça absurdo, em nossas atividades cotidianas lidamos, com freqüência, com situações e fatos enquadrados dentro da sensibilidade abstrata. Curioso é que ela provém tanto de fatos e eventos materiais, como de nossas sensações e sentimentos. Por exemplo, muitas pessoas consideram o mapa de uma região como se fosse o território, o que certamente é um absurdo. Para se viajar a um país estrangeiro, é necessário tirar um passaporte, que é o documento que comprova sua nacionalidade, vale dizer, que você é um cidadão de um país qualquer, bem definido no documento. Mas, “nacionalidade não pode ser medida, não pode ser contada, não tem comprimento nem cor, mas existe; enfim, estamos tratando de uma coisa abstrata”. (4)

Assim também, são todas as palavras e atitudes que indicam os sentimentos, como saudade, ira, amor, amizade, medo, altruísmo, etc. Todas estas palavras são substantivos abstratos, algo que não tem existência física ou material, mas existe. Aqueles que vivem no mundo das ilusões, também vivem numa realidade abstrata. Então, podemos conceituar a realidade abstrata, como sendo aquela que é imaterial e está fora do alcance de nossos sentidos físicos.

 

4.      Realidade psicológica ou psíquica

 

A realidade psicológica ou psíquica decorre de situações de medo e traumas ocorridos em algum momento da vida de certas pessoas que, mesmo diante de uma situação concreta no presente, similar àquela que vivenciou no passado, leva essas pessoas a imaginar como real uma situação irreal e ameaçadora. Diante de tal situação, desencadeia-se uma reação de medo ou de desespero, que pode até se manifestar de forma traumática. Os consultórios dos psicólogos e psiquiatras estão cheios de pacientes cujos casos se enquadram neste tipo.

Mas há, também, situações que podem ser classificadas como realidade psicológica, que derivam de certas ocorrências positivas havidas no passado, em que a pessoa parece fora de si, revivenciando mentalmente eventos agradáveis, como um recital de música que tenha assistido, o aroma de certas iguarias ou flores, etc., embora estejam, no momento, em ambiente ou situação bem diferente.

 

5.      A realidade científica

 

Os cientistas, principalmente os físicos, que estão vivenciando o paradigma da física quântica, estão mais que acostumados a estudarem coisas invisíveis, imperceptíveis para os nossos sentidos físicos, como o elétron, o núcleo atômico e suas partículas, os diversos tipos de ondas eletromagnéticas, a força da gravidade, etc., que chamamos de realidade científica.

Nesta mesma linha, se enquadram os biólogos, que examinam as células dos organismos vivos e seus componentes e os geneticistas e todos os pesquisadores que lidam com o microcosmo. Eles tomam conhecimento da existência de tais eventos e objetos por meio de uma aparelhagem científica super sofisticada, existente nos melhores laboratórios de todo o mundo. A realidade científica, portanto, é bem diferente daquela que o homem comum tem das coisas e eventos, cujas crenças, muitas vezes, o faz se posicionar em sentido oposto ao adotado pelos cientistas, pois nem sempre o senso comum percebe as sutilezas da realidade científica.

 

6.      Realidade transcendental

 

Há, com certeza, uma série muito grande de fatos e eventos que constituem o campo de estudo da Metafísica, da Parapsicologia, do Espiritismo, do Espiritualismo e até mesmo de todas as religiões e seitas que têm fundamento no misticismo. Esses fatos são considerados transcendentes e decorrem de estados especiais de percepção, que a Psicologia classifica como estados alterados da consciência e, também, de experiências individuais ou coletivas consideradas fora do âmbito científico. São desse tipo as intuições, a mediunidade, as comunicações telepáticas, as comunicações espirituais, as experiências de quase-morte (EQM), as experiências fora do corpo (EFC), enfim, tudo que está ligado ao pensamento e à consciência e que deriva, direta ou indiretamente, da existência do mundo espiritual.

Precisamos ser livres-pensadores, sem preconceitos de qualquer espécie, para não negarmos estes fatos a priori, quer seja sob o efeito do misticismo, quer sob o efeito de pretensa ciência. Não devemos, também, ficar galvanizados por qualquer intrujice que se nos apresentam. Melhor será que investiguemos, à luz da razão e do raciocínio elevado, a verdadeira natureza de tais fatos, ainda que seja para tirar conclusões pessoais, de acordo com seu nível de espiritualidade. Negar sistematicamente o alcance desse conhecimento, como vem fazendo muitos cientistas de renome, é prestar um grande desserviço à ciência que representam perante a Humanidade.

É preciso conferir imparcialidade no exame de tais fatos e eventos, dar a essa realidade transcendente foro de realidade definitiva e total, na medida em que novas evidências venham surgindo. É claro que, a adesão dos cientistas ao rumo dessas pesquisas, adaptando sua metodologia de modo a torná-la segura e convincente na busca e reconhecimento de tais fenômenos, é muito desejável. Com isso, muito teria a lucrar espiritualmente a Humanidade.

Segundo Victor J. Stenger, Ph.D. (6), todas as declarações, seja da ciência, seja da literatura, não passam de narrativas e os significados dos textos são criados pelo leitor de acordo com seu meio e sua cultura. Ele infere então, que: “As conclusões são então conduzidas de modo que nenhuma narrativa pode ter validade universal e que a ciência “ocidental” não é uma exceção”.  E, mais adiante que: “A ciência não tem certeza de nada sobre o mundo e deve sempre expor seus resultados em termos de probabilidades ou indícios. Freqüentemente, a escolha entre teorias científicas competitivas é baseada na preferência, moda ou noções subjetivas de simplicidade ou apelo estético”.

Mas, devemos admitir que cientistas tenham dificuldade em assegurar a certeza da “veracidade” de muitas de suas teorias, porém, frequentemente, elas podem estar próximas da certeza, dentro do que é possível na aplicação do método científico. Se as previsões forem fidedignas, eles podem concluir ou até mesmo provar que os conceitos nos quais as referidas teorias estão fundamentadas, devem ter alguma validade universal, isto é, as coisas devem parecer como realmente são. Um exemplo clássico e fácil de provar na vida prática é a lei da gravidade de Newton, pelo menos nos seus aspectos qualitativos e daí concluir que o conceito de gravidade é “real”. Disso ninguém mais duvida.

 

7.      Implicações derivadas das realidades

 

Assim, do que foi exposto, podemos inferir que, ao ouvirmos uma afirmação ou asserção qualquer, precisamos saber do que se trata e a que realidade ela se refere. Por exemplo, ao travarmos conhecimento com pessoas que utilizam conceitos filosóficos, temos que pensar como os filósofos pensam. Isto é, de acordo com o paradigma vigente neste ramo.

Um bom exercício para entendermos os diversos tipos de realidade é introduzirmos um amplo conceito de ser abrangendo todos os objetos, animados e inanimados dos reinos da natureza, sejam eles observáveis ou não, direta ou indiretamente, pelos nossos sentidos físicos. Partindo-se dessa conceituação de ser e dos diversos tipos de realidade que vimos, podemos ter (4):

 

i Seres inorgânicos ou minerais - rocha, pedra, água, mesa, porta, etc.;

i Seres organizados - qualquer ser vivo, como uma ameba, um vegetal, um homem, uma mulher, etc.;

i Seres abstratos - amizade, amor, saudade, os sentimentos de modo geral;

i Seres imaginários ou mitológicos - sereias, fadas, duendes, etc.;

i Seres fictícios - pertencem ao mundo da literatura: Romeu, Julieta, Flash Gordon, Superhomem, etc.;

i Seres arquétipos - seres que pertencem à realidade psicológica, tais como: a Criança, a Mãe, o Pai, o Herói, a Persona, etc., todos possíveis alter-egos de cada um de nós. Estes arquétipos costumam aflorar nos pacientes dos psicólogos, isto é, são assumidos pelos seus alter-egos e se comportam como tais;

i Seres transcendentes - almas, espíritos, etc. Sua existência não é aceita pela grande maioria dos físicos, acostumados que estão ao mundo da matéria. É o reino do transcendente.

 

Se ainda duvida da existência de outras dimensões físicas, além de nossas conhecidíssimas três dimensões, leiam o livro do físico inglês, Stephen Hawking, intitulado, “O Universo Numa Casca de Noz”, onde você verá, praticamente desde a primeira até a última página, todo o progresso da Física, de 1980 até os dias atuais, com relação ao tão discutido assunto das dimensões universais.

Existem fenômenos, genericamente batizados de Fenômenos Psikapa pelos parapsicólogos, que são profundamente estudados e dissecados pela Parapsicologia, nos dias atuais e nenhum parapsicólogo tem a menor sombra de dúvida sobre a sua existência. E acrescentam: somente os desinformados os desconhecem e são capazes de negá-los.

 

B.      PARADIGMA

 

A tudo isso se soma a crença a ela associada que o novo é melhor e substitui o velho, e que a tecnologia suprirá todas as nossas carências. A ênfase é na técnica, no conhecimento, no poder sobre a natureza, na manipulação, não na harmonia, muito menos na sabedoria que ficou deslocada a algum lugar no passado. O conhecimento ficou intrinsecamente ligado ao poder. Daí a crença e tentativa de manipular o fenômeno paranormal.

Jalmir Brelaz- Paradigma em ciência e parapsicologia (5)

 

Ouve-se muito falar-se em paradigma. Por isso, precisamos entender e compreender muito bem o que isso seja para entendermos as profundas colocações que vamos fazer na segunda parte de nosso livro. Em primeiro lugar, o paradigma restringe o campo de atuação de um determinado campo do saber onde ele é aplicado e nos leva a direcionar esforços de forma reducionista, fragmentária. É óbvio que o estudo dos fenômenos que ocorrem fora da matéria ou além da matéria feitos pela Psicologia, Parapsicologia, Espiritismo e Espiritualismo, são afetados e afetam as transformações de paradigmas que estão ocorrendo no campo social e no campo científico em particular.

 

1.      Entendimento e compreensão

 

A palavra paradigma é originária do grego e significa modelo. Portanto, podemos conceituar paradigma científico como sendo uma série de parâmetros que norteiam as atividades, valores, crenças e técnicas que formam a cultura exercida no seio da ciência em determinado momento ou período de sua evolução. Além do paradigma científico, podemos estender o conceito a outros ramos do conhecimento como economia, educação, medicina, parapsicologia, etc. A observação e a experimentação com seus métodos e técnicas desempenham papel importante no caso da Física, da Química, da Biologia e outras ciências de vanguarda. Não se deve descartar, também, a necessidade social e a utilidade como fatores importantes para a sua aceitação.

As óticas ou enfoques de ver e sentir o mundo variam de acordo com o paradigma adotado. Já tivemos no passado, mudanças nos enfoques de um paradigma como o renascentista, o industrial e atualmente o epistêmico, que já está levando em conta a importância da ecologia. Este último traz no seu bojo uma ampla transformação cultural, que implica, inclusive, na introdução de novos termos em nossa linguagem para expressar certos fenômenos sob uma nova ótica pois, do contrário, corre-se o risco de tornar os resultados da ciência incompreendidos ou mesmo não aceitos pelas crenças vigentes e nos moldes científicos atuais. Jalmir Brelaz (5) expressou isso da seguinte forma:

 

Sabe-se que o paradigma é vital para o desenvolvimento e solidificação das ciências, maximizando e otimizando os seus resultados, determinando o que é, mas também, e especialmente, o que não pode ser aceito como integrante dele. Sua influência é tanto normativa quanto cognitiva, contendo afirmações a respeito da natureza e da realidade, definindo, inclusive, também o campo de problemas permissíveis, os métodos e técnicas de abordagens, e os critérios (que podem ser usados como) padrão de solução. Isso garante o sucesso rápido da ciência normal, reduzindo o problema a uma escala trabalhável, sendo sua seleção guiada pelo paradigma vigente.

 

Não há como separar, com absoluta clareza, o fato científico de um paradigma: eles se acham intimamente interligados, da mesma forma que subjetividade e objetividade. Dessa forma, torna-se necessário deixar claro que os “dados puros de observação estão longe de representar a percepção pura, os estímulos não devem ser confundidos com percepção e sensações, pois estas estão condicionadas pela experiência, educação, linguagem e cultura” (5), do mesmo modo que um mapa não deve ser confundido com o território que representa. E, ainda, convém frisar que não existe uma linguagem neutra de observação, baseada exclusivamente nas impressões fixadas pela retina. Torna-se claro que, as imagens levadas ao cérebro pelo nervo ótico, bem como, todo e qualquer estímulo dos órgãos sensoriais e das suas múltiplas inter-relações, quando conduzidas ao cérebro para a devida interpretação, nos revela a necessidade de uma provável teoria da percepção e da mente humana.

Do que acima foi exposto, infere-se que a objetividade científica não é tão “objetiva” como pretendem e o que observamos não é o mundo que existe “objetivamente”, mas uma representação dele, um mundo que é criado no processo do conhecimento. O que vemos depende da maneira como olhamos, ou seja, não existe objetividade sem subjetividade, mas a recíproca dessa afirmação não é verdadeira; daí então, podermos afirmar que a subjetividade tem prevalência sobre a objetividade.

No passado, muitas descobertas científicas foram feitas aleatoriamente ou intuitivamente, sem seguir nenhuma metodologia de pesquisa. Temos o exemplo da descoberta da lei da gravidade, por Isaac Newton, que ocorreu desta forma. Daí dizer-se que a condição de consistência, que exige que uma nova hipótese esteja de acordo com as hipóteses já aceitas, pode se tornar irracional e até mesmo contraproducente, pois dispensa a própria hipótese, não porque esteja em desacordo com os fatos, mas porque está em conflito com outra teoria que lhe antecedeu. Se o método científico utilizasse exclusivamente esta condição, poder-se-ia cair no erro de que jamais uma hipótese pudesse vir a ser refutada por outra que lhe sucedesse.

Cada ciência tem o seu conjunto de regras que caracteriza o seu sistema científico específico, baseada em certo número de afirmações a respeito da realidade, conhecidas como axiomas, que são considerados auto-evidentes. E muitos desses axiomas são descobertos via intuição direta, não pela razão ou pela lógica. Citando ainda, Jalmir Brelaz (5): “O que queremos mostrar é que fatos, observações e até critérios são paradigmas dependentes, as propriedades formais mais importantes de uma teoria são relevantes pelo contraste, não pela análise. Em ciência, a razão não pode ser universal e o inexplicado não pode ser inteiramente excluído”. Em resumo, cada ciência possui o seu paradigma, suas inter-relações e limitações, o que denota o seu caráter de mutabilidade e constante adaptação à evolução das ciências.

 

2.      Principais Paradigmas

 

A moderna concepção científica, que utiliza o método científico, resultou de um forte redirecionamento cultural, que culminou com a revolução industrial, mas teve sua origem com Galileu e Isaac Newton que, pela primeira vez utilizaram modelos matemáticos para compreender e explicar a realidade física ou objetiva. No início do século XX, Einstein também utilizou abstrações matemáticas para explicar suas equações da relatividade, isto é, as elaborações mentais (subjetividade) contribuíram de maneira precisa para descrever as coisas (objetividade) que se observa no mundo exterior em termos de idéias que elaboramos interiormente. Esse tipo de enfoque matemático contribuiu para se firmar a crença de que o Universo era regido por leis absolutas e passar a imagem de um universo-máquina, sincronizado, de percepção dual envolvendo sujeito-objeto. Para a ciência, tudo precisa ser quantificado.

Daí, a ciência ter fragmentado quase tudo na busca de uma objetividade sustentada por mecanismos, leis básicas, estruturas e propriedades fundamentais na forma de “blocos de construção básicos”, “equações fundamentais” e “princípios fundamentais”. Esta dinâmica de forças e mecanismos interagia para dar lugar às leis básicas para tratar o “todo” como resultado da somatória das “partes”. Procurou-se fragmentar tudo mediante a quantificação das partes, como resultado das tais leis básicas.

Teria esse procedimento da ciência sido um mal? Não, porque a ciência capitalizou os seus resultados básicos em uma pulsante tecnologia, que no século XX levou ao progresso material dos povos em quase todas as culturas. Verdadeiras maravilhas tecnológicas acham-se à disposição de qualquer um, a preços acessíveis. Basta considerarmos os avanços da física (meios de comunicação, astronáutica, cosmologia, etc.) e da medicina (modernos e mais precisos meios não-invasivos de diagnósticos).

Atualmente, a tecnologia digital e a informatização (a revolução da terceira onda, segundo Alvin Tofler) conquistaram os mercados. Como conseqüência dessa difusão tecnológica, surgiram também alguns fatores adversos. Estes, embora aparentemente resolvidos pela forte padronização (programas de controle da qualidade e qualidade total), continuam causando problemas em nossa agitada época científica, levando a uma maior e mais complexa especialização na medicina, exigindo sincronização de resultados, concentração, maximização e centralização, complicando muitas atividades humanas. Ainda, no dizer de Jalmir Brelaz (5):          

 

A tudo isso se soma a crença a ela associada que o novo é melhor e substitui o velho, e que a tecnologia suprirá todas as nossas carências. A ênfase é na técnica, no conhecimento, no poder sobre a natureza, na manipulação, não na harmonia, muito menos na sabedoria que ficou deslocada a algum lugar no passado. O conhecimento ficou intrinsecamente ligado ao poder. Daí a crença e tentativa de manipular o fenômeno paranormal.

 

Vemos assim que o direcionamento do enfoque atual recai na crença de que é possível quantificar todos os fenômenos, na expectativa auto-afirmativa de que o conhecimento científico pode alcançar a certeza absoluta das coisas e dos fenômenos. A ênfase recaiu e vem recaindo na objetividade em busca de leis básicas e mecanismos que expliquem as leis que regem a Natureza e o Universo. A expectativa dos cientistas é que o conhecimento dos mecanismos das “partes” e de suas leis básicas, leve ao conhecimento do “todo”. Embora este conjunto de crenças tenda a se exaurir, ainda estamos muito longe disso. Enquanto tudo se ajustar, ainda há muito que pesquisar e descobrir no mundo material, mas as causas ocultas, imateriais, aí estão a desafiar a ciência e os cientistas. É dessas causas que vamos tratar na segunda parte desse livro.

Certos conhecimentos como os ensejados pela Psicologia, Parapsicologia, Espiritismo e Espiritualismo que enfocam o subconsciente e seus fenômenos e também, a existência da vida fora da matéria, não podem ser tratados exclusivamente à luz do paradigma científico atual, que prima pelo “quantitativo” em detrimento do “qualitativo”. A aplicação do paradigma científico atual a estas atividades, que são ao mesmo tempo filosofia e ciência, necessita de uma ampliação no seu conceito, ajustando-se a condições outras em que o subjetivismo, representado pela “experiência direta”, passe a ter acentuado predomínio sobre o objetivismo e assim possa desaparecer a desconfiança gerada pelos fenômenos paranormais, que são tipicamente qualitativos e muitas vezes racionalmente incompreensíveis, porque ainda não são de todo explicáveis à luz da ciência materialista.

Devemos reconhecer que a definição de um paradigma específico ou de um paradigma científico estendido, para comportar tais atividades, é uma necessidade indispensável e urgente. Isso viria reforçar a credibilidade e a respeitabilidade em trabalhos, aos quais se deseja dar foro de ciência, como soem ser os mencionados no parágrafo anterior. Muito cuidado é preciso ter, para afastar o misticismo fundamentado em crenças e superstições de doutrinas enganosas, dando-se a seriedade que tais atividades merecem. Aderir, portanto, a um esforço neste sentido seria muito desejável, para disso resultar um modelo geral, mais abrangente, ampliado ou expandido do modelo científico que nos levasse a um conhecimento mais abrangente do mundo, do Universo e de suas leis naturais e imutáveis.

Devemos, também, reconhecer que a Parapsicologia tem feito um esforço muito grande no sentido de se adaptar ao enfoque quantitativo e estatístico-matemático do modelo científico, iniciado por Rhine na década de 30, na Universidade de Duke, USA. O resultado disso foi que, em 1969, a Parapsichological Association foi admitida e aceita como membro da American Association for The Development of Science. Foi um primeiro passo, ainda que sacrificasse o desenvolvimento da própria Parapsicologia, que ficou submissa ao paradigma quantitativo vigente, deixando-a inatacável do ponto de vista metodológico ao utilizar rigorosos métodos empregados por outras ciências, limitando-a, porém, no que diz respeito a uma elaboração e objetivando criar uma teoria da paranormalidade.

 

 Mudanças de paradigmas

 

Há uma resistência muito grande em mudar o paradigma científico existente, porque o mundo moderno passa por mudanças profundas, introduzidas pela tecnologia massificada em alta escala e a conseqüente mudança de valores a ela associada. Aí está toda uma parafernália de equipamentos eletrônicos que invadiu as empresas, governos e lares e faz dos mais fantasiosos sonhos uma realidade acessível às crianças de hoje. O maravilhoso, materialmente falando, já é uma realidade: transmissão e recepção de imagem e voz à distância, o uso da realidade virtual e, a comunicação global via rede de computadores e via satélite. Mas, os valores éticos e morais da família e das sociedades em todas as culturas foram relegados a um segundo plano, deixando o viver terreno muito conturbado. Desapareceram a simplicidade e a harmonia da vida de antigamente.

Fritjof Capra, eminente pesquisador físico norte americano, em seu livro O tao da física (7), tratando da necessidade de mudança de paradigmas, apresenta e analisa seis critérios que, se aceitos e adotados, muito contribuiriam para um novo mundo de relacionamentos, conhecimentos e conquistas para a humanidade, nos campos da Ciência, Psicologia, Parapsicologia, Espiritismo e Espiritualismo. Não nos deteremos nesses critérios, mas resumidamente são os seguintes:

 

i Mudança da Parte para o Todo. As propriedades das partes só podem ser entendidas a partir da dinâmica do todo. Ou seja, a ênfase está no Todo não mais nas partes, numa inversão de perspectiva.

 

i Mudança de estrutura para o processo. É o processo que cria a estrutura e não a estrutura que cria o processo. Há aqui inversão do enfoque. Nesse enfoque o processo é a totalidade das relações.

 

i Mudança de ciência objetiva para ciência epistêmica, o entendimento do processo do conhecimento tem de ser explicitamente incluído na descrição dos fenômenos naturais. Não há leis fundamentais. Os métodos de observação e técnicas têm de “entrar” na teoria. Esse é o paradigma epistêmico.

 

i Mudança de construção para rede enquanto metáfora de conhecimento. Não há algo que seja mais fundamental que qualquer outra coisa. Não há dentro ou fora, nem acima nem abaixo, mas uma rede à qual tudo está interligado. As teorias holográficas são um passo nessa direção.

 

i Mudança da certeza do conhecimento para descrições aproximadas. Isso implica em reconhecer que todos os conceitos e todas as teorias científicas são limitadas e aproximadas e por isso, transitórias e sujeitas às mudanças.

i Mudança de intenção e de atitude de controlar e dominar a natureza para uma atitude de cooperação e de não-violência perante a natureza e entre os homens de modo geral. Trata-se de uma postura ao mesmo tempo ética, moral e ecológica.

 

Sem nos estendermos muito mais sobre este assunto podemos concluir dizendo que já está havendo uma mudança de atitudes em relação à formação de novos paradigmas e, tal movimento representa uma revolução cultural bastante significativa, que não ocorrerá da noite para o dia, mas demandará tempo, talvez várias décadas ou até mesmo um ou mais séculos. Mas, uma coisa pode se ter como certo que é a permanência e o fortalecimento da metodologia racional e científica analítica com suporte nos elementos intuitivos (via direta sintética ou subjetiva do conhecimento) e na experimentação (via indireta do conhecimento por meio da experimentação).

 

3.      Um novo paradigma

 

Torna-se necessário estabelecer-se um paradigma geral, mais abrangente, que permita conhecer o homem em toda a sua inteireza, seja ele chamado holístico, cibernético ou pluralístico. É necessário conhecer certos fenômenos tidos como produtos da imaginação, como os casos de doenças mentais e de obsessão, que não podem mais ser adiados. Conhecer a verdadeira natureza dos fenômenos paranormais, dos fenômenos de experiência de quase-morte (EQM), dos fenômenos de experiências fora do corpo (EFC) e de tantos outros fenômenos, como telecinesia, telepatia, premonição, mediunidade intuitiva, mediunidade de incorporação, mediunidade de vidência, mediunidade olfativa, a existência do espírito e da consciência, do pensamento, da aura, do livre-arbítrio e as conseqüências do seu bom e mau uso estão sendo protelados pela ciência por falta de um paradigma que englobe a Força Inteligente em atuação sobre a matéria. Estão nessa vertente os campos de estudo da Psicologia, Parapsicologia, Espiritismo e Espiritualismo. Quem sabe poderia haver uma união ou unificação dessas áreas de estudo com as ciências físicas e biomédicas para levar avante estudos científicos dessa natureza.

Nós acreditamos que os físicos poderão investigar cientificamente estes campos com grande benefício para a humanidade, se de fato assim o desejarem, descobrindo todo um mundo invisível onde predomina a Força Inteligente, intangível e invisível aos olhos da matéria. Basta, para isso, fazerem uma abordagem sistêmica séria e adequada do assunto, sem preconceitos. Primeiro é preciso descobrir e entender tais fenômenos – queiram chamá-los de metafísicos, paranormais, psíquicos, extra-sensoriais ou transcendentais – e sua “real” natureza para compreender que eles não podem ser controlados ou “domados” ao bel prazer do experimentador, como é o caso da “dupla personalidade” do elétron onda-partícula e do princípio da incerteza da física quântica, aceita pelos físicos. Com os conhecimentos sugeridos nesse parágrafo e no anterior, poderá então a ciência compreender de onde viemos, o que estamos fazendo aqui na terra e para onde iremos após a morte física do corpo, bem como o verdadeiro sentido da vida, questões essas que vêm sendo abordadas, sem solução, desde o início da humanidade.

Infelizmente, porém, parece que as ciências, a sociedade e as instituições estão adormecidas para enxergarem que precisamos ultrapassar este ponto de inflexão paradigmático para que tenhamos uma nova visão do mundo e de nossa relação com ele, visto que inerentemente fazemos parte do processo num sistema dinâmico e universal fechado ou aberto, no primeiro caso se o Universo for finito e no segundo caso, se for infinito. Assim, parece-nos que a Física e os físicos, estão numa posição privilegiada para estudar de forma mais cabal a consciência humana e o destino da humanidade em direção a um modelo mais profundo do ser humano, onde certos fenômenos simplesmente “são”. Para terminar, citamos ainda as palavras do parapsicólogo Jalmir Brelaz (5):

 

Talvez a nossa maior dificuldade paradigmática, seja reconhecer o racional como limitado, pois o postulamos como capacidade infinita de entendimento sobre tudo, se não é possível o conhecimento no modelo de agora racionalmente o será em um modelo no futuro.

Vivenciamos a superestimação da racionalidade do homem. Concordamos, nos termos de Prigogine, que a idéia de uma racionalidade limitada exprima melhor nossa condição. Vivemos num mundo pluralístico e devemos aceitá-lo com uma racionalidade limitada.

À medida que a sociedade passe a adotar valores mais qualitativos, humanísticos, poderemos ter mais recursos para o estudo das potencialidades humanas, dentro de modelos que não sejam nitidamente organicistas, e daí se possa avançar a respeito da independência psi sobre espaço e tempo, da mente extrapolar o cérebro, da psi existir nos processos básicos de organização dos seres vivos, se há nova força da natureza no PK, qual a fonte energética, quais os fatores que afetam a intencionalidade e a seletividade dos fenômenos paranormais.

 

Com certeza, após avançar nessa direção, a ciência será muito mais útil à humanidade, respondendo com convicção tantas e tantas questões que são atualmente abordadas de maneira incorreta e até falsamente por muitas religiões, charlatães, místicos, etc.

Como observado anteriormente, a Parapsicologia já deu o primeiro passo no sentido de coexistir com a Física. Já vimos também que a Física separou-se da Filosofia por volta de 1750, mas já é hora de voltarem-se uma para a outra. Com relação ao Espiritismo e ao Espiritualismo, os físicos não querem nem ouvir falar em espírito, quer seja por medo, quer seja por preconceito ou por qualquer outro motivo, mas um dia, mais cedo ou mais tarde, terão que encarar a existência da vida espiritual dentro (no homem) e fora da matéria (no espaço-tempo, em mundos espirituais).

 

Referências deste capítulo:

 

 1. BRELAZ, Jalmir. Paradigma em ciência e em parapsicologia. Disponível em: https://www.parapsicologia.org.br/artigo08.htm Acesso em 22/10/05.

 2. CAPRA, Fritjof. O tao da física. São Paulo: Cultrix, 1983, p. 244-248.

 3. CARTER, Rita. O livro de Ouro da Mente. Rio de Janeiro: Ediouro, 1999, p. 258.

 4. CHAUÍ, Marilena. A Verdade e as concepções da verdade. Disponível em: https://www.armazem.literario.nom.br/autoresarmazemliterario/eles/martinhocarloshost/filosofia/22_modulo22.htm . Acesso em 27 jan. 2005. Ver, também,

 5. CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, [s/d].

 6. https://www.panoramaespirita.com.br/artigos/artigos_04/real_supra_real.html. Acesso em: 23 out. 2005

 7. JUNG, Carl Gustav.  O Real e o Supra Real. Disponível em: https://www.panoramaespirita.com.br/artigos/artigos_04/real_supra_real.html. Acesso em 23/10/05.

 8. MILHOMENS, Newton. O misticismo à Luz da Ciência. São Paulo: Ibrasa, 1997, p. 27-38. Disponível em:  https://www.kirlian.com.br/info_por_0014_2e.asp.  Acesso em: 15 out. 2005.

 9. STENGER, 6) Victor J. Stenger.  Ataques “pós-modernos” a ciência e a realidade. Disponível em: https://www.geocities.com/quackwatch/realidade.html. Acesso em 23/10/05.

 

 

 

 

SEGUNDA PARTE:

 

UMA REALIDADE MAIS ABRANGENTE

CAPÍTULO 6

 

 

O SURGIMENTO DO ESPIRITISMO

 

É  dever dos homens de ciência – que aprenderam as formas corretas de trabalhar e pesquisar – examinar fenômenos que atraíam a atenção do público, para confirmar se eram genuínos ou, se possível, explicar as ilusões e os truques realizados por aqueles que pretendiam enganar as pessoas. (6)

Sir William Crookes - 1854

 

 

A partir da segunda metade do século XIX, observou-se, na Europa, principalmente na França e nos Estados Unidos, um movimento desusado de fenômenos inexplicáveis, atualmente conhecidos pela Ciência como fenômenos paranormais. Essa outra série de fenômenos invisíveis (mediunidade, manifestação de forças ocultas, etc.), desafiava o entendimento humano. Estamos nos referindo aos fenômenos que, embora tidos como importantes e transcendentais pouca atenção obtiveram dos cientistas, registrando-se, contudo, algumas raras exceções, como William Crookes, na Inglaterra e Charles Robert Richet, na França. Por isso, julgamos importante resgatar as evidências de tantos casos estudados por esses cientistas e outros pesquisadores honrados e ilustres, respeitabilíssimos nas sociedades em que viveram, há cerca de 160 anos.

Enquanto isso ocorria, a Ciência, já separada da Filosofia desde meados do século XVIII, buscava seu próprio caminho, estudando e explicando uma grande quantidade de fenômenos físicos, também invisíveis, de variada natureza (eletricidade, magnetismo, eletromagnetismo, campos de força, etc.).

Os fenômenos paranormais, designação dada por Charles Robert Richet, passaram a ser cientificamente estudados por uma nova ciência – a Parapsicologia, visto que o estudo dos referidos fenômenos escapam às explicações das leis físicas comuns. Paralelamente, fora da comunidade científica, pesquisadores de outra formação também se interessaram pelo estudo de tais fenômenos, em especial na França, cujos trabalhos culminaram com o surgimento do Espiritismo de Allan Kardec, em 1857. Neste capítulo, vamos apreciar os esforços de Charles Richet e seguir os passos de Allan Kardec e de alguns de seus seguidores, que até hoje receberam pouco ou nenhum reconhecimento e mérito pelos seus trabalhos por parte da ciência oficial.

Posteriormente, já no início do século XX, no Brasil, com ênfase filosófico-espiritualista, surgiu o Espiritismo Racional e Científico Cristão, em 1910, atualmente denominado Racionalismo Cristão (1). Dedicaremos o capítulo seguinte ao estudo e apresentação dos conhecimentos difundidos pelo Racionalismo Cristão.

Nós examinamos, nos capítulos dessa obra, contidos na primeira parte – Nossa Realidade Objetiva, a evolução das pesquisas científicas, ocorridas desde Isaac Newton, com base na observação e na experimentação. A Física, a Química e a Biologia realizaram, neste período, grandes proezas. Os benefícios colhidos pela sociedade em termos de tecnologia foram enormes. A Cosmologia, ciência que derivou da Astronomia, recebeu um impulso fora do comum a partir dos conhecimentos gerados por aquelas ciências e pela tecnologia delas derivadas, principalmente da Física, a ponto de terem surgido, na segunda metade do século XX, mais de uma dezena de novas teorias na tentativa de explicar o Universo, sua origem e por que existe da forma que existe. Desde há cinqüenta anos e agora, já no limiar do século XXI, os físicos buscam uma “Teoria do Tudo”, com o objetivo de explicar aquelas grandes questões e unificar as quatro forças da física conhecidas como gravidade, força nuclear forte, força nuclear fraca e eletromagnetismo em uma única equação matemática. Para isso, eles continuam apoiando-se nas duas leis da relatividade – a Teoria da Relatividade Especial e a Teoria da Relatividade Geral e na Teoria Quântica.

É verdade que essas teorias abriram os horizontes para um melhor conhecimento da natureza, do Universo e do átomo e suas leis. Mas não devemos esquecer de que elas têm alguns paradoxos indigestos, que tiram o sono de muitos físicos. São do físico e astrônomo Marcelo Gleiser (2), em seu livro, A dança do universo, estas palavras:

 

Como um pequeno aperitivo do que iremos discutir adiante, eis aqui sete conseqüências “estranhas” da nova física: 1)um objeto em movimento sofre uma contração de seu comprimento na mesma direção em que ele se move; 2)um relógio em movimento bate mais devagar; 3)massa e energia podem ser convertidas entre si; 4)não podemos determinar se os constituintes da matéria são ondas ou partículas, a famosa dualidade onda-partícula; ao observarmos um sistema físico, influenciamos o seu comportamento; não existe uma separação clara entre observador e observado; 6)a presença de matéria deforma a geometria do espaço e altera o fluxo do tempo; 7)não podemos determinar a localização de um objeto – apenas a probabilidade de ele estar aqui ou ali. Ou seja, devemos abandonar uma descrição estritamente determinista dos fenômenos naturais, pelo menos na escala atômica. E assim por diante.

 

São fenômenos que fogem ao bom senso e de difícil entendimento pela maioria das pessoas comuns, por exigirem o conhecimento de uma matemática avançada. No entanto, são tidos como verdadeiros, embora não haja unanimidade para alguns deles por parte da comunidade dos físicos. Nem por isso deixam de ser respeitados, até que uma outra teoria ou fatos apresentem melhor explicação e venha destroná-los. A ciência é assim mesmo, caminha por uma séria sucessiva de aproximações verdadeiras mediante intuição, teorização e experimentação. Mais adiante, o mesmo Marcelo Gleiser (2) diz: “À primeira vista, fenômenos relativísticos ou quânticos parecem bizarros porque estão muito além de nossa realidade imediata, inacessíveis aos nossos sentidos; eles não fazem parte dos fenômenos abarcados pelo nosso ‘bom senso’”.

De outro lado, a classe de fenômenos de que estamos tratando (fenômenos psíquicos, intuição, materialização, etc.) requer outros sentidos de captação que não os nossos simples cinco sentidos físicos. Então, temos que apelar para uma sensibilidade mais elevada, utilizando médiuns ou inventar instrumentos elétricos, eletrônicos e magnéticos ou uma combinação de todos sensibilíssimos, além de instrumentos óticos e fotográficos digitais. Há todo um campo aberto para isso.  E é disso que estamos tratando neste livro.

Passemos, portanto, ao exame histórico do conhecimento já acumulado de fenômenos psíquicos e paranormais desde os trabalhos realizados por esses pioneiros sob as mais adversas restrições e desconfiança por parte da Ciência e da humanidade, em geral. A apresentação abaixo aparece na ordem cronológica do nascimento de seus autores.

 

1.      Allan Kardec (1804-1869)

 

Allan Kardec, pseudônimo de Hippolyte Léon Denizard Rivail, nasceu em Lyon, França, de uma família antiga cujos antepassados se distinguiram na advocacia e magistratura. Mas Allan Kardec, desde cedo, inclinou-se para o estudo das ciências e da filosofia. Seu pseudônimo foi adotado em 1855 por sugestão intuitiva.

Na juventude foi para Yverdun (Suíça), onde estudou na Escola de Pestalozzi (Johan Heinrich Pestalozzi, 1746-1827, o paladino que reformulou os métodos de educação) e tornou-se um destacado discípulo e colaborador, levando seus conhecimentos para a França, onde difundiu seu sistema de educação, o qual exerceu grande influência sobre a reforma do ensino na França e na Alemanha. Tendo aprendido a língua alemã, Kardec traduziu para esse idioma, diferentes obras de educação e de moral, inclusive as obras de Fénelon (3).

De 1835 a 1840, fundou e ofereceu, em sua casa, cursos gratuitos de Química, Física, Anatomia e Astronomia, entre outros. Sempre se preocupou com o ensino e a educação dos jovens tendo sido, nesse período professor, pedagogo e autor de livros educacionais.

A partir de 1855 foi levado por um amigo a conhecer as famosas experiências com mesas girantes, fenômeno que era promovido por pessoas magnetizadas (mesmerismo) e, também, em sessões em que participavam médiuns. Depois de várias sessões e posta em foco a questão das manifestações dos espíritos, Allan Kardec se entregou a fazer observações perseverantes sobre esses fenômenos, cogitando principalmente de lhes deduzir as conseqüências filosóficas, já que para ele tratavam-se de fatos inexplicados contrários às leis da natureza, que sua razão repelia. Dessa forma, “[...] entreviu, desde logo, o princípio de novas leis naturais: as que regem as relações entre o mundo visível e o mundo espiritual. Reconheceu, na ação deste último, uma das forças da Natureza, cujo conhecimento haveria de lançar luz sobre uma imensidade de problemas tidos por insolúveis e lhe compreendeu o alcance, do ponto de vista religioso”. (4)

No período que vai de 1857-1868, Kardec escreveu e publicou suas principais obras com o objetivo de consolidar um corpo de doutrina sobre o Espiritismo:

 

i O livro dos espíritos (1857)

i O livro dos médiuns (1861)

i O Evangelho segundo o Espiritismo (1864)

i O céu e o inferno, ou a justiça divina segundo o Espiritismo (1865)

i A gênese, os milagres e as predições (1868)

i O que é o Espiritismo (1869)

i Obras póstumas

 

Em 1858, fundou a Revista Espírita, jornal mensal de estudos psicológicos. Passada a fase experimental, fundou, ainda em 1858, a primeira instituição espírita regularmente constituída, sob a denominação de Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, a fim de institucionalizar o Espiritismo como filosofia de vida e religião e, tendo por objetivo, o estudo dos fenômenos psíquicos que pudessem contribuir para o progresso da nova ciência.

Allan Kardec foi muito atacado pelos seus oponentes, defendendo-se pela imprensa, com argumentos bem fundamentados, alegando que coisa alguma havia escrito sob a influência de idéias preconcebidas ou sistemáticas. Foi um homem de caráter sereno e calmo, preocupado com os fatos de suas observações, das quais deduziu as leis que os regem. Foi o primeiro a apresentar uma teoria relativa a tais fatos.

É inegável que, até então, os fenômenos experimentais espiríticos observados nos Estados Unidos e na Inglaterra eram fatos esparsos, de alcance restrito e apresentados mais como curiosidades de casas de espetáculos ou de laboratório, tendo sido Allan Kardec o primeiro a transformá-los em um corpo de doutrina, iniciada de fato com a publicação de seu primeiro livro – O livro dos espíritos, em 1857.

 

As provas materiais que o Espiritismo apresenta da existência da alma e da vida futura tendem a destruir as idéias materialistas e panteístas. Um dos princípios mais fecundos dessa doutrina e que deriva do precedente é o da pluralidade das existências, já entrevista por diversos filósofos antigos e modernos. (4)

 

Dele promana a explicação de todas as aparentes anomalias da vida humana, de todas as desigualdades intelectuais, morais e sociais, facultando ao homem saber de onde vem, para onde vai, para que fim se acha na Terra e por que aí sofre. As idéias inatas se explicam pelos conhecimentos adquiridos nas vidas anteriores; as simpatias e antipatias pela natureza das relações anteriores. (4)

 

O Espiritismo de Kardec tem como divisa: “Fora da caridade não há salvação, isto é, a igualdade entre os homens perante Deus, a tolerância, a liberdade de consciência e a benevolência mútua”. E mais adiante, o autor acrescenta: “Não há fé inabalável, senão a que pode encarar face a face, a razão em todas as épocas da Humanidade. À fé, uma base se faz necessária e essa base é a inteligência perfeita daquilo em que se tem de crer. Para crer não basta ver, é preciso, sobretudo, compreender (O Evangelho segundo o Espiritismo).” (4)

 

2.      William Crookes (1832-1919)

 

No século XIX, por volta de 1854, com o caso das irmãs Fox em Hydesville, nos USA, os fenômenos espiritualistas começaram a ganhar evidência no mundo e a despertar o interesse de muitos pesquisadores. Neste contexto, Sir William Crookes constituiu peça fundamental na investigação experimental dos fenômenos psíquicos.

William Crookes foi um dos mais notáveis cientistas da segunda metade do século XIX, tanto no campo da Física como no campo da Química. Formado em engenharia elétrica, autodidata em Química e Física, tendo herdado uma grande fortuna de seu pai, tornou-se um pesquisador científico com grande liberdade de trabalho. Em 1855, tornou-se professor universitário de Química na Universidade de Chester. Em 1861, descobriu o elemento químico tálio e, em 1875, inventou o radiômetro – instrumento usado para medir a intensidade dos raios luminosos e calóricos. Em 1878, desenvolveu o tubo de raios catódicos, conhecido como “tubo de Crookes”, que veio constituir a base das válvulas eletrônicas (usadas nos aparelhos de rádio e mais tarde substituídas pelos transistores), dos aparelhos de Raios X, precursor das modernas lâmpadas fluorescentes, dos tubos de TV e monitores de computador. Ainda como pesquisador científico, introduziu melhorias nos processos de análises espectrográficas e desenvolveu numerosas formulações para produção de chapas fotográficas. Pelos seus meritórios trabalhos, Crookes recebeu o título honorífico de Cavalheiro, em 1897, das mãos da Rainha Vitória e a Ordem do Mérito, em 1910, das mãos do Rei James VII. Foi membro da Royal Society de Londres e também seu presidente de 1913-1915 (5, 6).

Além disso, teve um papel fundamental no desenvolvimento das pesquisas científicas relativas aos fenômenos psíquicos ou paranormais. Ele é considerado, juntamente com Charles Robert Richet, o iniciador do período científico da Metapsíquica, que posteriormente passou a ser chamada de Parapsicologia. Crookes sempre refutou todos os ataques que recebeu ao longo de sua vida, sem qualquer alteração em seus pontos de vista, uma vez que ele sempre esteve certo de ter realizado as experiências com a abordagem e os controles científicos corretos. “Em 1898, ele escreveu que, apesar de terem se passado trinta anos desde que realizou e publicou os resultados de suas primeiras experiências, ele não tinha nada de que se retratar e nada que alterar”. (6)

Podemos afirmar que nenhum cientista foi tão combatido nos fenômenos que estudou e teve sua reputação tão atacada como Sir William Crookes, mas ele se manteve firme e honesto em suas convicções durante todo o tempo.

A partir de 1854, na Europa e nos Estados Unidos, vários médiuns começaram a se apresentar demonstrando inúmeros fenômenos como materializações, levitação e muitos outros, para os quais não existia uma explicação física. De grande destaque, em 1854, foram os fenômenos acontecidos com as irmãs Fox. Foi nessa época que Sir William Crookes, com sua reputação internacional de cientista, entrou em cena para verificar cientificamente os chamados “fenômenos espiritualistas”. Inicialmente, ele se mostrou muito cético a respeito de tais fenômenos. Mas, afirmava ele, ser “dever dos homens de ciência – que aprenderam as formas corretas de trabalhar e pesquisar – examinar fenômenos que atraíam a atenção do público, para confirmar se eram genuínos ou, se possível, explicar as ilusões e os truques realizados por aqueles que pretendiam enganar as pessoas”. (6)

Cerca de uma dezena de médiuns foram investigados por William Crookes, trabalhos esses realizados entre 1869 e 1875, envolvendo médiuns famosos como Daniel Dunglas Home, Florence Cook, Mary Marshall, Kate Fox, Charles Edward Williams, Annie Eva Fay, Stainton Moses e outros.

Logo que ele começou a realizar experiências com Daniel Dunglas Home, um dos mais famosos médiuns da época, seu ceticismo desapareceu, convencendo-se de que Dunglas possuía uma força psíquica poderosa. Ao mudar a sua opinião pela evidência dos fatos, passou a receber uma oposição ferrenha e uma rejeição muito forte por parte da comunidade científica, que esperava que Crookes viesse rejeitar a realidade dos fenômenos. Sua manifestação a favor das evidências que colheu em suas experiências chocou os seus colegas cientistas e custou-lhe muito caro.

Crookes informou que, com Daniel Dunglas Home, pelo menos 100 casos de levitação bem verificados foram produzidos. Citou, também, fenômenos do tipo luminosos e de materialização parcial, ocorridos na presença de muitas pessoas diferentes e até mesmo em plena luz. Foram também, verificados fenômenos de telecinesia (movimentação de objetos, como uma flor, uma mão, etc.). Procurou sentir a temperatura de uma mão materializada e declarou que em alguns casos era fria, em outros, quente. Em uma oportunidade, Crookes tentou segurar a mão e ela simplesmente desmaterializou-se aos seus olhos. As experiências com este médium constam dos arquivos da Society for Psychical Research, a famosa SPR, de Londres. Suas experiências descrevem, também, efeitos físicos como a movimentação de corpos pesados, sem contato e sem esforço mecânico do médium. Crookes chegou a construir aparelhos para medir os fenômenos, como alavancas, dinamômetros e aparelhos para registros gráficos.

Contudo, suas experiências mais famosas foram as realizadas com a médium Florence Cook. Nessas experiências, Crookes obteve um total de 44 fotografias de materialização espiritual. Se as experiências anteriores chocaram a comunidade científica, essas provocaram uma verdadeira hostilidade e ele chegou a ser acusado de agir em cumplicidade com Florence Cook (6).

Em julho de 1869, investigou o caso de Mary Marshall (1842-1884), no qual ocorriam fenômenos como batidas na mesa (raps), levitação e movimentação de mesa, escrita direta em quadro negro, etc. Em dezembro do mesmo ano, ele assistiu às sessões do médium J.J.Morse (1848-1919), o maior médium psicofônico da época.

 Em julho de 1870, investigou os fenômenos produzidos por meio de Henry Slade, episódio esse que foi noticiado com antecedência pela imprensa local por meio de um artigo chamado “Spiritualism viewed by the light of modern science” (“O espiritualismo visto à luz da ciência moderna”), publicado no Quartely Journal of Science, de Londres. Neste artigo, ele declarava que não tinha opiniões preconcebidas a respeito do assunto e que a experiência tinha sido sugerida “por um eminente homem que exercia grande influência no pensamento do país”. E, acrescentou: “[...] o crescente emprego dos métodos científicos produzirá uma geração de observadores que lançará o resíduo imprestável do espiritualismo, de uma vez por todas, ao limbo desconhecido da magia e da necromancia” (3). Diante de tal declaração, a comunidade científica ficou na expectativa por um resultado negativo das experiências, mas Crookes declarou que o resultado fora positivo, confirmando a existência dos fenômenos e a veracidade do espiritualismo (6). Daí ter nascido uma aversão das elites pelo espiritualismo como ciência e filosofia. Acreditamos que muito dessa aversão ao espiritualismo é creditada ao positivismo de Auguste Comte, doutrina materialista, que na época estava em voga por toda a Europa. Um relatório publicado pela London Dialectical Society (Sociedade Dialética de Londres), em 1870, que concluía que os fenômenos ligados ao espiritualismo eram verdadeiros, teve uma péssima repercussão, tanto na imprensa quanto entre os cientistas, apesar de apresentar experiências realizadas por pessoas acima de qualquer suspeita. (6)

Continuando, Crookes passou a investigar a sensitiva Kate Fox. Os resultados das experiências foram publicados no Quarterly Journal of Science, em 1871 e provocou uma série de cartas e artigos na imprensa local atacando o seu trabalho. Crookes refutou, ponto por ponto, nos mesmos veículos de comunicação todos os ataques recebidos.

Em 1874, a médium Florence Cook (1856-1904), após ter passado por um incidente durante uma apresentação pública em que se materializou o espírito de Katie King, por sua iniciativa, procurou Crookes, que realizou os trabalhos com essa médium sob o mais rigoroso controle. Katie King dizia-se ser o pseudônimo do espírito de Annie Owen Morgan. O que os assistentes presenciaram e as várias fotografias tiradas por ocasião dessa demonstração não deixaram dúvidas.

Posteriormente, as sessões foram organizadas no laboratório de Crookes e foi nesse local, que ocorreram as melhores fotografias que mostraram, ao mesmo tempo, a materialização e a médium. Na narração de Crookes: “[...] Voltando ao meu posto de observação, Katie apareceu de novo e disse que pensava poder mostrar-se a mim ao mesmo tempo em que a sua médium. Abaixou-se o gás (da iluminação) e ela pediu-me a lâmpada fluorescente. Depois de ter se mostrado à claridade durante alguns segundos, restituí-me, dizendo: ‘Agora entre e venha ver a minha médium’. Acompanhei-a de perto à minha biblioteca e, à claridade da lâmpada, vi a srta. Cook estendida no canapé, exatamente como eu a tinha deixado; olhei em tomo de mim para ver Katie, porém ela havia desaparecido”. (6).

Hernani Guimarães (7) deu mostra do reconhecimento que Crookes recebe hoje em dia ao dizer que “[...] após mais de um século, a extraordinária figura de William Crookes emerge límpida e majestosa, desafiando serenamente aqueles que ainda tentam, em vão, enlamear-lhe a imagem. A obra deste sábio extraordinário tem resistido aos embates do tempo e aos ataques mesquinhos de seus adversários gratuitos, unicamente porque é toda ela límpida e cristalinamente apoiada sobre uma granítica base de fatos. Quem estuda, sem má-fé e sem preconceitos, os trabalhos de William Crookes, impressiona-se pela pureza, simplicidade e clareza meridiana de seus relatórios. Dos seus trabalhos, transpiram a sinceridade, a firme convicção e a serenidade de um sábio que tranqüilamente proclama a verdade, sem inquietar-se com o julgamento dos demais, por achar-se seguro de que o erro está com aqueles que negam a evidência dos fatos”.

William Crookes acreditava que existia uma “força”, exercida por uma inteligência diferente da inteligência comum “dos mortais e que o conhecimento científico não conseguia perceber”. Em um de seus importantes textos a respeito dos fenômenos que estudou, Crookes disse ser “[...] absolutamente verdadeiro que uma conexão foi estabelecida entre este mundo e o outro”. Numerosas outras referências foram consultadas (8, 9, 10, 11 e 12), dada a importância dos trabalhos de William Crookes.

O que se espera é que os atuais pesquisadores sigam o exemplo desse cientista, pesquisando sem preconceitos, mas ao mesmo tempo obedecendo aos critérios necessários para que as experiências não sejam colocadas sob suspeita de fraude. E sempre considerando que é absolutamente necessário estar com a mente aberta para receber e publicar os resultados das investigações, quaisquer que eles sejam.

 

3.      Gabriel Delanne (1857-1926)

 

Gabriel Delanne era filho de família humilde e comerciante. Nascido na França, formou-se em engenharia técnica, tendo trabalhado pouco tempo na empresa de eletricidade local. Seus pais tinham acabado de se tornar espíritas kardecistas pouco antes de ele nascer. Seu grande mérito foi trabalhar para o desenvolvimento das bases científicas do Espiritismo, a partir de 1880. Em 1883, afirmou em uma conferência que Jesus Cristo não possuía nenhuma natureza divina e especial, mas era dotado de notável inteligência e evolução. Foi Vice Presidente da União Espírita Francesa (1885) e Vice Presidente da Sociedade Francesa de Estudos dos Fenômenos Psíquicos (1898), instituição que ajudou a fundar. Observe-se que aqui já foi retirado o nome “espírita” da instituição, mostrando o seu intento de se afastar do misticismo espírita. (13)

Em 1919 fundou a Federação Nacional dos Espíritas da França, dela se tornando o seu primeiro Presidente, sociedade essa que incorporou a Sociedade Francesa de Estudos dos Fenômenos Psíquicos da qual era Vice Presidente. Fez algumas pesquisas acompanhando Charles Robert Richet (Prêmio Nobel de Medicina de 1913, sobre anafilaxia). Delanne fez muitas conferências sobre Espiritismo na França e, em 1900, no Congresso Internacional Espírita e Espiritualista, em que participou. Em 1905, participou, também, de outro congresso promovido pela mesma instituição, em Liège, França, ocasião em que fez uma conferência sobre o pensamento, que teve grande repercussão. Em 1906, tornou-se paralítico dos membros inferiores (usava duas bengalas) e, em 1918, passou a usar cadeira de rodas para se locomover (14).

Seu primeiro livro foi publicado em 1885 e o último em 1924. Delanne deu ao mundo sete obras (sendo uma em dois volumes), todas objetivando livrar o Espiritismo do seu misticismo evangélico e procurando dar-lhe cunho de ciência. Somente duas de suas obras não foram traduzidas para o português. Na sua primeira obra, O Espiritismo perante a ciência (1885), tratou de aprofundar-se no estudo do perispírito. Na segunda obra, O fenômeno espírita (1896), tratou da mediunidade, materialização e telecinesia,. Na terceira obra, A evolução anímica (1897), tratou da memória, loucura, hereditariedade, universo, etc. No seu quarto livro, A alma é imortal (1899), que teve grande repercussão, tratou da imortalidade, do perispírito, do desdobramento espiritual, da ponderabilidade e das fotografias espíritas. No quinto livro, Pesquisas sobre mediunidade (1902) – só editado em francês – tratou da evolução cósmica e terrestre, da mediunidade e da pluralidade dos mundos. Na sua sexta obra, em dois volumes, que não foi traduzida para o idioma português e que poderia ter recebido o título As aparições materializadas dos vivos e dos mortos (1909 e 1911), expõe tudo que até então se aprendeu sobre o Espiritismo, desde a mais remota antiguidade. Finalmente, em 1924, escreveu o seu último livro com o título Documentos para servir de estudos à desencarnação, traduzido para a língua portuguesa com o título de Desencarnação, que trata da memória espiritual (15).

Uma visão desinteressada de sua trajetória evolutiva, mesmo para quem não leu os seus livros, fazendo comparações do muito que se escreveu sobre ele e suas obras, leva-nos a concluir que, realmente, Gabriel Delanne fez um esforço muito grande procurando aproximar o Espiritismo da ciência.

 

4.      Léon Dennis (1846-1927)

 

Temos aqui um grande idealista e espiritualista. Trabalhou quase que exclusivamente as idéias filosóficas do espiritualismo; suas conferências enchiam os auditórios. Em 37 anos produziu e proferiu cerca de 300 conferências (1873-1910)!

Em seu livro, Depois da morte, Léon Dennis deu um tratamento filosófico de fácil entendimento da vida e da morte face ao materialismo reinante, para fazer face à idéia do nada que se espalhou entre os seres durante o início do século XX. Alguns trechos desse livro nos expõem as suas idéias: (16)

 

O estudo do mundo invisível exige muita prudência e perseverança. Somente ao fim de muitos anos de reflexão e de observação é que se adquire o conhecimento da vida, é que se aprende a julgar os homens, a discernir o seu caráter, a resguardar-se dos embustes de que está semeado o mundo. Mais difícil ainda de obter é o conhecimento da ‘humanidade’ invisível que nos cerca e paira acima de nós. (p. 189)

 

A educação, baseada numa concepção exata da vida, transformaria a face do mundo. Suponhamos cada família iniciada nas crenças espiritualistas sancionadas pelos fatos e incutindo-as aos filhos, ao mesmo tempo em que a escola laica lhes ensinasse os princípios da Ciência e as maravilhas do Universo: uma rápida transformação social operar-se-ia então sob a força dessa dupla corrente. (p. 312)

 

O Espiritismo esclarece o passado, ilumina as antigas doutrinas espiritualistas e liga sistemas aparentemente contraditórios. Abre perspectivas novas à Humanidade. Iniciando-a nos mistérios da vida futura e do mundo invisível, mostra-lhe sua verdadeira situação no Universo; faz-lhe conhecer sua dupla natureza - corporal e espiritual - e descortina-lhe horizontes infinitos. (p. 325-6)

 

Considerai que esses fenômenos vão suscitar maior revolução do que as que têm sido registradas na História, abrindo a todos os povos a perspectiva ignorada das vidas futuras. (p. 328)

 

No livro, O problema do ser, do destino e da dor, ele nos revela sua agudeza de espírito para estas cruciantes questões. Aqui ele revela um pouco de sua vida e das vicissitudes por que passou principalmente já no final de sua existência.

No livro, Cristianismo e Espiritismo, ele tece considerações sobre moral e sobre o antagonismo ciência-religião, conforme se vê, a seguir:

 

o novo Espiritualismo fará surgir, aos olhos dos que pesquisam e dos que sofrem, a portentosa visão de um mundo de eqüidade, de amor e de justiça, onde tudo é regulado com ordem, sabedoria, harmoniosamente. (p. 13)

 

No livro O grande enigma, ele trata da dificuldade em se aliarem o espiritualismo e a ciência oficial. Veja-se esse trecho: “O Espiritismo será o que dele fizerem os homens”. (Introdução, p. 9). Eis mais alguns trechos:

 

É com desgosto que observamos a tendência de certos adeptos no sentido de menosprezar a feição elevada do Espiritismo, a fonte dos puros ensinamentos e das altas inspirações para se restringirem ao campo da experimentação terra-a-terra, à investigação exclusiva do fenômeno físico.

Pretender-se-ia acomodar o Espiritismo no acanhado leito da ciência oficial; mas esta, inteiramente impregnada das teorias materialistas, é refratária a essa aliança. Com os estudos espíritas, uma nova ciência se vai formando lentamente, mas é preciso aliar ao espírito de investigação científica ‘elevação do pensamento’, sentimento, os impulsos do coração, sem o que a comunhão com os seres superiores se torna irrealizável.

Não há possibilidade de êxito, nem garantia de resultado sem a assistência e proteção do alto, que se não obtém senão mediante a disciplina mental e uma vida pura e digna. (p. 10)

A boa mediunidade se forma lentamente, no estudo calmo, silencioso, recolhido longe dos prazeres mundanos e do tumulto das paixões. (p. 62)

 

A mediunidade é uma delicada flor que, para desabrochar, necessita de acuradas precauções e assíduos cuidados. Exige o método, a paciência, as altas aspirações, os sentimentos nobres, e, sobretudo, a terna solicitude do bom Espírito que a envolve em seu amor, em seus fluidos vivificantes. Quase sempre, porém, querem fazê-la produzir frutos prematuros e desde logo se estiola ao contato dos Espíritos atrasados. (p. 67)

 

Do livro No invisível, para arrematar, transcrevemos o seguinte trecho:

 

Encontram-se, em ambos os sexos, excelentes médiuns; é à mulher, entretanto, que parecem outorgadas as mais belas faculdades psíquicas. Daí o eminente papel que lhe está reservado na difusão do novo Espiritualismo. (p. 75)

 

5.      Charles Robert Richet (1850-1935)

 

Charles Robert Richet, foi um homem exclusivamente dedicado à ciência. Foi o fundador da Metapsíquica. Seu papel foi fundamental no processo de desvendar o desconhecido mundo dos fenômenos anímicos. Formado em Medicina (1869) e em Ciências (1878) pela Faculdade de Medicina de Paris, tornou-se professor titular de fisiologia dessa faculdade aos 37 anos de idade. Em 1913, recebeu o prêmio Nobel pelas suas pesquisas sobre anafilaxia. Durante 24 anos editou a revista Revue Scientifique (1878-1902) e, em 1917, foi co-editor do Journal de Physiologie e de Patologie Générale, de Paris. Foi o descobridor da soroterapia. Em 1905, então presidente da Pshychical Research Society – Sociedade de Investigações Psíquicas, de Londres, propôs o nome de Metapsíquica a este conjunto de conhecimentos, em que incluiu a criptestesia, a telecinesia e a ectoplasmia (17).

Fora de sua especialidade, no campo da Filosofia e da Psicologia, deixou-nos algumas obras, mas a sua obra mais importante foi o Tratado de metapsíquica. Nessa obra, Richet incluiu numerosos fatos e descrições pormenorizadas de experiências psíquicas, descrições históricas e classificatórias que muito colaboraram para o entendimento dos fenômenos psíquicos em geral. Mas, a sua maior contribuição foi no estudo do ectoplasma (fluidos materializantes emanados do médium) e que, segundo ele, era a substância responsável pela viabilidade dos fenômenos ditos objetivos. Fez experiências de materialização com as médiuns Eusápia Paladino e Marthe Béraud, que despertavam os curiosos de sua época. Com esta última, contou com a colaboração de Gabriel Delanne, ocasião em que conseguiu com que a “materialização” soprasse por um canudo o “ar de seus pulmões”, o que veio a turvar o líquido, revelando a presença de gás carbônico (propriedade da respiração dos organismos vivos) (17). Ainda relacionados com essa área de conhecimentos, Richet escreveu vários livros, a saber: A grande esperança, O sexto sentido, A porta do mistério, O homem e a inteligência, além de outras dentro de sua especialidade de medicina científica.

Richet classificou a história da fenomenologia psíquica em quatro períodos, a saber:  1°) Período Mítico, que vai das origens históricas até Mesmer, (1776); 2°) Período Magnético, que vai de Mesmer às irmãs Fox, (1847); 3°) Período Espirítico, que vai das irmãs Fox, passando por Allan Kardec, a William Crookes (1872); 4°) Período Científico, que vai de Crookes até a atualidade. (17)

Os fenômenos metapsíquicos foram classificados por Charles Richet em dois grupos gerais: 1)fenômenos subjetivos, que ocorrem exclusivamente na área psíquica, sem nenhuma ação dinâmica sobre os objetos materiais, fenômenos aos quais Allan Kardec denominou, anos antes, de inteligentes; e 2)fenômenos objetivos, cuja manifestação envolve ação física sobre os objetos materiais, na linguagem espírita, chamados de fenômenos físicos. Esta classificação ainda é usada atualmente pela Parapsicologia. (17)

Charles Richet desvendou um caminho distinto, estritamente científico, sem nunca ter-se tornado espírita. Na verdade foi um continuador experimental dos experimentos de Sir William Crookes e de Gabriel Delanne. Enxergamos aqui, com isenção de ânimo, uma certa incompatibilidade entre os trabalhos rigorosamente científicos de Richet e a doutrina de Kardec que, até os dias de hoje, não conseguiu se livrar do “ranço” místico dos evangelhos, o que mais a aproxima de uma religião do que de uma doutrina filosófica e científica. Crítica semelhante foi feita por Arthur Conan Doyle, famoso escritor inglês, criador de Sherlock Holmes como investigador policial científico, em seu livro A história do espiritualismo. Observa-se que, na época, o movimento espírita francês já estava totalmente dominado pelos ritos, excetuando-se, neste tempo, apenas Gabriel Delanne, que, muito doente, insistia com a sua Sociedade Francesa de Estudos de Fenômenos Psíquicos e suas publicações na revista Le Spiritisme. Era natural que Richet, que se tornara amigo de Delanne, fosse rígido quanto à metodologia científica, pois foi isso que lhe valeu o Prêmio Nobel de fisiologia, em 1913.

No mesmo campo de trabalho, encontramos seu contemporâneo Gustavo Geley e Ernesto Bozzano, sendo que este último escreveu o livro Metapsíquica humana. Em algumas ocasiões Richet e Bozzano divergiram em suas opiniões, mas sem invalidar a contribuição de cada um deles aos estudos a que se dedicaram.

 

Referências deste capítulo:

 

 1. MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 43.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2004, p. 20.

 2. GLEISER, Marcelo. A dança do Universo. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 251-252.

 3. ALLAN KARDEC. Disponível em: https://www.universoespirita.org.br/allankardec/kardec_biografia_inicial.htm.Acesso em 01/08/05.

 4. KARDEC, Allan – FB – Transcrito de Obras Póstumas – 16.ed.  Disponível em: www.cvdee.org.br/ak.asp.Acesso em 01/08/05.

 5. SHROEDER, Gilberto. Sir William Crookes. Revista Espiritismo e Ciência.  Centro Redentor:RJ.2004, v. 2, n. 8, 38/44,

 6. ROLL, Michael. Sir William Crookes Proved Continuing Life Scientifically. Disponível em: https://www.rense.com/general32/proved.htm. Acesso em 26/07/05.

 7. ANDRADE, Ernani Guimarães. William Crookes. Revista de Espiritismo, n. 35, julho-agosto-setembro 1997. Disponível em: https://www.espírito.org.br/portal/artigos/fep/william-crookes.html. Acesso em 24/08/05.

 8. INGLIS, Brian. Sir William Crookes (Transcrição pela Sir William Crookes Spiritist Society). Disponível em: https://www.sirwilliam.org/html/Sir%20_William.htm. Acesso em 26/07/05.

 9. WILLIAM CROOKES. Disponível em: https://www.kardec.com/bio/williamcrookes.htm. Acesso em 26/07/05.

10. NANDOR, Fodor. How Sir William Crookes came to Believe in Spirits: History of Florence Cook. Disponível em: www.survivalafterdeath.org/experiments.htm. Acesso em 26/07/05.

11. ROLL, Michael. Tawdry New Efforts to Attack Sir William Crookes. Disponível em: https://www.rense.com/general27/will.htm. Acesso em 26/07/05.

12. HINSHELWOOD, Cyril Norman. William Crookes Biography – Dictionary of National Biography. Disponível em: https://www.sirwilliam.org/html/Sir%20_William.htm. Acesso em 26/07/05.

13. REGIS, Marcelo Coimbra. Gabriel Delanne. Disponível em: https://www.espiritnet.com.br/Biografias/biogabr.htm. Acesso em 30/07/05.

14. GABRIEL DELANNE. Disponível em: https://sgny.org/main/Biographies/bio_GD.htm. Acesso em 24/08/05.

15. GABRIEL DELANNE, APÔTRE DU SPIRITISME.  Disponível em https://spirite.free.fr/csl-delanne.htm. Acesso em 20/07/05.

16. PIRES, J. Herculano. Leon Dennis, apóstolo do Espiritismo. Disponível em https://www.universoespirita.net/edicoes/1999/ed36/p4.html. Acesso em 24/08/05.

17. CHARLES ROBERT ROCHET. Disponível em: Disponível em: www.terraespiritual.locaweb.com.br/Espiritismo/biografia28.html. Acesso em 30/07/05.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 7

 

 

O ADVENTO DO RACIONALISMO CRISTÃO

 

 

Distinguir o falso do verdadeiro é o único meio de ver claras as ações e de caminhar, com segurança, nesta vida. Um perfeito conhecimento de todas as coisas de que o homem pode ter é tão necessário para regular os nossos costumes, como o uso dos olhos para guiar-nos os passos. Trabalhar para bem pensar, eis o princípio da moral (1).

René Descartes, filósofo e cientista.

 

 

Os fenômenos da vida fora da matéria, sempre causaram e vêm causando estranheza a todos aqueles que não se mostram interessados em averiguar e investigar a sua verdadeira natureza, olhando com perplexidade e até descaso tais fenômenos.

O conhecimento da vida fora da matéria é tão velho quanto o mundo. Filósofos e cientistas de elevada evolução, desde as mais remotas épocas e em vários países, lançaram as sementes de tão necessário conhecimento. Mas, a ação de espertalhões e poderosos de todos os tempos vêm retardando a difusão desses tão necessários conhecimentos. São pessoas que, preocupadas apenas com seus interesses materiais, sempre se opuseram a essas idéias, tirando proveito apenas para si e as minorias que conseguem reunir torno de si.

No passado distante, ensinamentos espiritualistas de alto valor, de natureza ética e moral, foram difundidos em regiões e países da Ásia (Índia e China), Oriente Médio (Palestina), África (Egito) e Europa (Grécia e Itália). Krishna, na Índia, há cerca de 2.300 anos antes de Cristo, já proclamava a existência da Inteligência Universal e a imortalidade da alma por meio de múltiplas reencarnações: “o corpo é finito, porém a alma que o habita é invisível, imponderável e eterna (1)”. Na China, vamos encontrar Buda, que, há mais de 2.500 anos, propagou seus nobres ensinamentos. No Alto Egito, vamos encontrar Hermes Tresmegisto, que proclamou que “a Inteligência Universal é a única Força Criadora de tudo quanto existe no Universo e que os seus atributos são a imensidade, a eternidade, a independência, a vontade toda poderosa e a vontade sem limites (1)”. Na Grécia antiga vamos encontrar Sócrates e Platão, cerca de 300 anos a.C., com seus ensinamentos, que nos deixaram essa grande verdade: “A ignorância da Verdade é um dos maiores males que afligem o mundo” e Jesus, na Palestina, secundou-os, quando disse “que só a verdade poderá libertar a humanidade da ignorância e prepará-la para o cumprimento do dever (1)”. Cícero, em Roma, por volta do ano 50 d.C., proclamava os seus quatro princípios: perspicácia do espírito ou ponderação, justiça, valor ou grandeza de ânimo e moderação (1). Avançando até o século XVIII, vemos René Descartes, na França, em 1750, afirmando: “Distinguir o falso do verdadeiro é o único meio de ver claras as ações e de caminhar, com segurança, nesta vida. Um perfeito conhecimento de todas as coisas de que o homem pode ter é tão necessário para regular os nossos costumes, como o uso dos olhos para guiar-nos os passos. Trabalhar para bem pensar, eis o princípio da moral” (1).

No capítulo anterior, tratamos dos pioneiros cientistas e pesquisadores, livres-pensadores, que se dispuseram, na segunda metade do século XIX e início do século XX, a enfrentar a opinião alheia bastante adversa tanto do público como da ciência oficial ao estudo dos fenômenos psíquicos.

No Brasil, em 1910, surge o Espiritismo Racional e Científico Cristão, uma doutrina eclética com fundamentos científicos, filosóficos e espiritualistas, que atualmente tem o nome de Racionalismo Cristão, com o objetivo de espiritualizar a humanidade.

É dos fundadores e do consolidador dessa doutrina que vamos tratar nesse capítulo, fazendo um ligeiro exame histórico de suas personalidades. A apresentação abaixo aparece na ordem cronológica do nascimento desses desbravadores do indevassável mundo espiritual. 

 

1.      Luiz de Mattos (1860-1926)

 

Luiz José de Mattos Chaves Lavrador (2, 5), que assinava simplesmente Luiz de Mattos, nasceu em Chaves, Portugal e veio para o Brasil em 1873, com 13 anos de idade, onde completou seus estudos no Colégio São Luiz, no Rio de Janeiro.

Terminado os seus estudos, estabeleceu-se posteriormente, em Santos – São Paulo, destacando-se como comerciante no ramo de compra e exportação de café nesta praça e no Rio de Janeiro, onde fundou uma filial de seu negócio. Destacou-se como empreendedor, também, com outros negócios no Rio de Janeiro no ramo de coleta de lixo e distribuição de carnes.

Durante sua vida de comerciante, granjeou grande respeito da sociedade santista, tendo fundado várias empresas. Desde cedo esteve sempre voltado em ajudar o seu semelhante. Ainda moço, realizou numerosos trabalhos humanitários, fundando a Sociedade Humanitária dos Empregados do Comércio e o Real Centro da Colônia Portuguesa de Santos. Ainda nesta cidade, recuperou e tornou-se Presidente da Real Sociedade Beneficente de Santos e foi um dos grandes benfeitores do Asilo da Infância Desvalida de Santos.

Luiz de Mattos foi um grande abolicionista e amigo dedicado de José do Patrocínio, Júlio Ribeiro, Campos Sales, Bernardino de Campos, Luiz Gama e tantos outros, todos grandes abolicionistas, causa pela qual se bateu até a promulgação das leis de libertação dos escravos. Convidado para participar da política, declinou. Em 1887, foi designado Vice-Cônsul de Portugal, em Santos. Recebeu vários títulos honoríficos, inclusive o de Comendador. Com relação a títulos honoríficos, dizia: “É preferível não tê-los e merecê-los, do que tê-los e não merecê-los”.

Na vida privada, foi um homem dedicado à sua família. Nessas horas de repouso, entregava-se à leitura de obras de grandes pensadores de todos os cantos do mundo, já que tinha uma biblioteca volumosa, estando sempre agarrado a um livro, a devorar-lhe os ensinamentos. Foi, também, um grande precursor do movimento ecológico, tendo sido um grande admirador da Natureza, refugiando-se no campo sempre que podia. Suas filhas eram tratadas com austeridade, mas com uma bondade sem limites, dando-lhes a educação formal e ensinando-lhes a boa moral cristã. Enfim, era austero, metódico e disciplinado e tinha horas para tudo.

Luiz de Mattos não tinha religião alguma. Materialista que foi até aos 50 anos, estudou e analisou as diversas religiões, através da história e concluiu que as que não eram filhas da mitologia eram animalizadas. Dentre as cerca de oito mil seitas e religiões que uma estatística de Barcelona relatava, destacava ele a religião católica, mas não concordava com o tratamento que essa religião atribuía a Jesus Cristo. Dessa forma era um livre pensador, materialista honrado, criando para si a religião da família e do dever, para os quais vivia.

Luiz de Mattos, a essa época, foi acometido de um colapso cardíaco, esteve às portas da morte, mas acabou recuperando-se dessa crise. Nessa ocasião, foi-lhe sugerido pelo seu médico que procurasse conhecer o Espiritismo. Ele abominava o Espiritismo ao ponto de fazer suas filhas copiarem obras contra o mesmo e resistiu aos conselhos recebidos. Mas, de tantas e tantas insistências por parte de seus amigos, inclusive de Luiz Alves Thomaz, também comerciante, cuja minibiografia se descreve mais abaixo, acabou por decidir conhecer os trabalhos do Espiritismo.

Certo dia, lá foram ele e seus amigos até chegarem à porta de um “casebrezinho”, onde estava instalado o centro espírita. Ali chegando, foi convidado a presidir os trabalhos, o que lhe causou grande estranheza, mas diante da insistência dos presentes, acabou aceitando. O que então presenciou levou-o a muito refletir sobre os fenômenos espirituais, examinando com muito cuidado a escrita mediúnica (psicografia). Este foi o início do seu raciocínio sobre a Força fora da Matéria.

No dia seguinte, assumindo Luiz de Mattos novamente a presidência da sessão, é transmitida uma comunicação, dada e registrada em francês legível, livre de erros. Este fato causou sério espanto a Luiz de Mattos, o qual chegou a perguntar, após a sessão, se o médium tinha instrução, pedindo-lhe para escrever alguma coisa em francês, a fim de se certificar se era verdade e se não estava sendo vítima de alguma mistificação. Informado das condições morais, materiais e intelectuais do médium, ficou convencido de que um fenômeno importante ali se passara.

Conversando com Luiz Alves Thomaz e seus outros amigos, disse-lhes que o que vinha observando causava-lhe grande espanto, forçando-o a meditar sobre a causa dos efeitos que observava. Luiz de Mattos sempre esteve interessado nas causas, para obter uma explicação sensata e aceitável ou não sobre os efeitos produzidos.

E assim continuou. Na sessão seguinte, outros fenômenos maravilhosos ocorreram. Houve uma manifestação em inglês, que ele analisou, verificando estar claramente legível. Ficou também, sabendo que seus filhos, que estavam muito enfermos, acometidos de tuberculose, doença sem cura na época, já estavam tratando com remédios da flora brasileira mediante receita mediúnica, alcançando sensível melhora de que resultaria a cura definitiva da doença, o que de fato aconteceu. No final da sessão, manifesta-se o espírito de Inácio de Loyola, jesuíta que desafia e insulta barbaramente Luiz de Mattos. Este, desconhecendo ainda em profundidade os fenômenos psíquicos e, diante de uma situação bastante realista, leva a mão ao bolso num gesto comum de quem deseja sacar um revólver. Padre Antônio Vieira, presidente astral, intervém e doutrina Luiz de Mattos, informando-o de sua missão como doutrinador:

 

— Acalma-te! Quando para cá vieres, deixa lá isso em casa. Pois então, não vês que o médium é um simples porta-voz dos espíritos? Como querias agir por essa forma, se no espírito não podias atirar, nem matar? Tenha paciência estuda, eu te ajudarei; porém, é a ti que compete doutrinar, não só esse, como tantos milhares de outros que te irão aparecer e assim precisa ajudar-me a limpar a atmosfera da Terra dos jesuítas que nela se têm quedado para a prática, ainda mais desenvolvida, de crimes, que também já praticavam quando encarnados. Acordaste tarde; era para aos 26 anos teres iniciado comigo estes trabalhos, mas já que despertaste agora e foi preciso que te sacudisse o ataque cardíaco para te lembrares que a vida não desce à sepultura e sim ascende ao Espaço, a ligar-se a outras vidas, não podes mais perder tempo. Ajuda-me, pois, meu filho, estuda e outros a ti se juntarão para levar por diante a bela doutrina de Cristo. Esse espírito que acabou de manifestar-se é Inácio de Loyola, teu e meu companheiro em diversas encarnações. Há 400 anos que ele se queda na atmosfera da Terra, como terrível obsessor e chefe de grandes falanges. Cabe a ti doutriná-lo e mostrar-lhe o erro em que vive”. Aqui Luiz de Mattos foi inteirado de sua verdadeira missão!

 

Após esse episódio tão marcante e, encerrada a sessão, não mais faltou Luiz de Mattos aos trabalhos, nesse Centro, pobre materialmente falando, mas riquíssimo de luz, de inteligência, de saber, enfim.

Na sessão seguinte, novamente se manifesta Loyola e, prevenido que estava Luiz de Mattos pelo Presidente Astral Padre Antônio Vieira, deixou Loyola falar à vontade. De súbito, Luiz de Mattos entra numa longa dissertação da Natureza, referindo-se a Deus, não à semelhança do homem, mas como Inteligência Universal, a irradiar por toda a parte onde existe vida. Loyola espanta-se do que ouve do seu ex-companheiro jesuíta, quando Frei Bernardo ou São Bernardo e mantém um longo diálogo, sendo esclarecido por Luiz de Mattos para ascender ao seu mundo de origem. Deixamos de reproduzir o longo diálogo havido e remetemos o interessado à leitura da referência (2), de onde retiramos todas essas informações.

Mais tarde, seus companheiros presentes àquela sessão disseram a Luiz de Mattos que estavam impressionados com o que dele ouviram ao que ele respondeu não mais se recordar do que dissera e que tudo aquilo lhe viera de momento, não sabendo mesmo explicar como se prestara a definir a Inteligência Universal, sendo até então, materialista e cético, não acreditando no endeusamento da figura de Cristo pelas religiões. Agora, porém, analisando a sua obra, concluía ter sido ele um homem lutador, valoroso e apto a reagir a todos os insultos no terreno da luta.

Luiz de Mattos, entretanto, ressentia-se ainda, da prevenção que tinha contra o baixo Espiritismo e, como via todos que nele se metiam acabar na miséria, pensava na família, pensava no que era preciso despender com a criação de uma instituição à altura de tão bela Doutrina e receava não poder arcar sozinho com tamanha responsabilidade. Muitos outros fenômenos foram precisos para que a alma investigadora de Luiz de Mattos não mais vacilasse. E assim, por insistência e assistência do Astral Superior, levou ele ano e meio em consecutivos estudos até que viesse a tomar, juntamente com Luiz Alves Thomaz, que assumiu a parte material, a decisão de capitanear a implantação de tão bela Doutrina.

Assim foi iniciado o Racionalismo Cristão, em 1910, na cidade de Santos, com o nome de Espiritismo Racional e Científico Cristão. Hoje a Doutrina, com o nome de Racionalismo Cristão, acha-se implantada e em franco crescimento, em 20 países, com cerca de 160 filiais.

 

2. Luiz Alves Thomaz (1871-1931)

 

Luiz Alves Thomaz (3, 5) nasceu em Portugal e aos 15 anos veio para o Brasil à procura de melhores condições de vida, como fizeram tantos imigrantes portugueses. Pela vontade de vencer, aliada à capacidade de trabalho, conseguiu emergir da pobreza à riqueza com dignidade e valor, pela sua larga visão na criação e direção de seus negócios.

Este grande homem, extremamente simples, de personalidade forte, enérgico, operoso, controlado e determinado, dedicou toda a sua profícua existência ao trabalho, para que seus largos ganhos fossem revertidos em beneficências, em auxílio de asilos, hospitais, escolas e instituições assistenciais.

Seu nome é perpetuado na história do Racionalismo Cristão ao lado do vulto maior, o codificador da Doutrina Racionalista Cristã, Luiz de Mattos.

Após o reconhecimento dos fatos e fenômenos presenciados, nas primeiras sessões de cura no centro espírita onde iniciaram os estudos sobre o Espiritismo, seguindo as intuições recebidas das Forças Superiores, já conscientes da vida além da matéria e, firmados nos mesmos ideais, uniu-se a Luiz de Mattos e fundaram o Espiritismo Racional e Cientifico Cristão.

Luiz Thomaz foi um amigo incondicional de Luiz de Mattos, desdobrando o seu patrimônio para que não faltasse nada a Luiz de Mattos na codificação e implantação da. Doutrina. Luiz Alves Thomaz, simboliza a virtude da amizade. Espelhamo-nos, nos exemplos de desprendimento desse grande espírito, pelo que foi como ser humano e pelo que representou para a fundação do Racionalismo Cristão. Foi e continua a ser uns dos pilares do pensamento racionalista cristão, servindo como diretriz a toda criatura esclarecida, não só pelo conteúdo da sua história, mas também pelas oportunas mensagens que nos transmite.

 

3. Antonio do Nascimento Cottas (1892-1983)

 

Antonio do Nascimento Cottas (4, 5) nasceu em Sirvuzelo, Portugal e veio para o Brasil ainda jovem, tendo assumido a direção do Racionalismo Cristão, no Rio de Janeiro, em 1926, como sucessor de Luiz de Mattos. Exerceu a profissão de comerciante no Rio de Janeiro e depois se formou em Direito, exercendo, durante alguns anos, a profissão de advogado. Libertado completamente de seus compromissos materiais e profissionais, dedicou-se de corpo e alma à divulgação e expansão da doutrina Racionalismo Cristão.

Antonio Cottas – esse era o seu nome abreviado, tinha um temperamento obstinado, pela energia do seu espírito e a fortaleza de um organismo privilegiado pela vida metódica e disciplinada que o mantinha livre de vícios, e tudo o mais que compromete a saúde, o caráter e a conduta do ser humano neste plano Terra. Suas virtudes eram latentes e cedo desabrocharam, revelando amor ao trabalho e fidelidade no cumprimento dos seus deveres. Antonio Cottas foi sempre respeitador e respeitado por todos. Por isso seu caráter cintilava, enquanto se mantinha discreto e sempre despido de qualquer vaidade, de qualquer sentimento de prepotência, mas sabia se impor nas suas ações e idéias. Antonio Cottas era severo, verdadeiro e não alimentava sentimentos discriminatórios. Lembramos que, no ambiente de trabalho sempre recebia todos que o procuravam com muito respeito e humildade e isso era feito com satisfação e simplicidade.

Assim é o perfil dos homens que se destacam na complexidade da existência humana, onde uns vivem mergulhados na ganância do poder e da ostentação, enquanto espíritos luminosos como Antonio Cottas era avesso a promoções, honrarias, títulos, etc. com que foi muitas vezes agraciado.

Antonio Cottas foi um baluarte do Racionalismo Cristão nos anos difíceis de sua implantação, tendo presidido a doutrina durante 57 anos, no período 1926-1983. Deixou a todos com quem conviveu exemplos inequívocos de administração profícua, laboriosa e exemplar sempre voltada para o bem geral e o engrandecimento da Doutrina, sendo por isso admirado e respeitado por todos.

 

4. Visão de Futuro - Conclusão

 

Todos nós sabemos que nem a ciência nem a filosofia nem nenhuma doutrina pode ser considerada acabada. A humanidade evolui e com ela as sociedades e as culturas que as acompanham. Allan Kardec, em A gênese, escreveu: “Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrarem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará”. Igualmente, Charles Richet admitiu que “seu primeiro Tratado de metapsíquica irá ter a sina comum e ficará para trás e cairá em desuso, porque os progressos desta nova ciência serão rápidos”.

Assim como Kardec e os metapsiquistas acreditavam num rápido progresso das ciências psíquicas, também o Racionalismo Cristão, que é uma doutrina científico-filosófico-espiritualista, tendo um de seus pilares no evolucionismo, continua esclarecendo as pessoas e os povos sobre as coisas sérias da vida.

Na verdade, pesquisadores espiritualistas do quilate de Allan Kardec, William Crookes, Richet e Luiz de Mattos já não aparecem com tanta freqüência. Observamos que os cientistas atuais desviaram as pesquisas psíquicas para a parte material do ser, na expectativa de que na matéria encontrarão as explicações para os numerosos fenômenos de atuação da Força Inteligente – o Espírito. Daí, nos depararmos com tantos trabalhos na área da Metapsíquica – “ciência que tem por objeto fenômenos mecânicos ou psicológicos, devido a forças que parecem inteligentes, ou a poderes desconhecidos, latentes na inteligência humana” e na área da Parapsicologia, como os do professor J. B. Rhine, da Universidade de Duke, nos Estados Unidos e outros que lhe seguiram os passos.

Numerosas questões como qual é a natureza da Força Inteligente, o que é consciência, qual o centro de nossas memórias, de onde viemos, para onde vamos, o que estamos fazendo neste planeta, o que é a evolução espiritual, qual foi o início do universo e tantas outras, permanecem sem resposta por parte da Ciência. Não basta estudar, classificar e ensinar, é preciso realmente entender e compreender o que é o ser e a vida e o que fazer dela em proveito da espiritualização dos povos.

Esperamos que no presente século, esta situação se modifique e novas luzes venham a ser lançadas cientificamente sobre todas ou, pelo menos, algumas das questões transcendentais do homem, para acelerar o seu progresso material e espiritual no planeta.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. Centro Redentor – 43.ed. Rio de Janeiro: Casa Publicadora , 2004, p. 20.

 2) COTTAS, Antonio do Nascimento. Assim surgiu o Racionalismo Cristão. Racionalismo Cristão. Disponível em: https://www.racionalismo-cristao.org.br. Acesso em 02/08/05.

 3) GOMES, João. Luiz Alves Thomaz. Jornal A Razão. Cidade,  dia?, Agosto, 2004, p.1.

 4) GOMES, Maria Teresa. Antônio do Nascimento Cottas, um rastro luminoso. Jornal A Razão. Junho, 2005.

 5) COTTAS, Antônio Nascimento. Prática do Racionalismo Cristão.  12.ed.Rio de Janeiro. Casa Publicadora, ano, p. 31-34.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 8

 

 

A FORÇA INTELIGENTE

 

Deve existir um mundo invisível do espírito que faz com que ocorram mudanças no mundo da matéria; e a evolução deste planeta deve receber orientação e auxílio externo de inteligências superiores e invisíveis, às quais o homem é suscetível enquanto ser espiritual. Além disso, essas inteligências muito provavelmente existem em seres de grau superior a nós.

               World of Life - Alfred Russel Wallace

               (contemporâneo de Charles Darwin)

 

Ciência baseada unicamente na matéria organizada, não é Ciência.

A matéria é efeito e não causa. A causa, o principal objeto, o principal fim, é o Espírito, a Força que incita e movimenta a Matéria. Os homens procuram estudar minuciosamente aquilo que os olhos vêm, as mãos apalpam, mas não o que o espírito sente e precisa saber.

Estude-se o que se vê, estudando também o que se sente. Procurar estudar e compreender a vida fora da matéria organizada é dever de todo homem estudioso, inteligente e sagaz.

Trecho de uma manifestação do espírito de Carlos Chagas no Racionalismo Cristão – médico e cientista.

 

1. Traços Gerais

 

No capítulo sobre Evolução, chegamos a tratar da ação da Força em cada um dos reinos da natureza, mas não enfatizamos os atributos dessa Força, responsável pela difusão da vida em todos os reinos da natureza, inclusive nas primitivas estruturas atômicas e moleculares do reino mineral. Trata-se da Força Inteligente, que é autogovernável, autoexpressante e automanifestante em todas as formas de vida observáveis. Neste capítulo, vamos nos aprofundar um pouco mais sobre a natureza e a evolução da Força Inteligente.

Quando mencionamos que há uma causa inteligente, não estamos nos referindo ao Deus das religiões, nem às idéias dos religiosos de todas as religiões sobre Deus, muito menos de um Deus supramatemático (o Acaso da teoria das probabilidades), ou do infinito do cálculo infinitesimal ou do Infinito Universal. Nós estamos nos referindo a uma outra forma de compreender essa causa inteligente. Estamos falando de causas ou agentes ainda não conhecidos pela Ciência oficial, causas que são supragalácticas ou entre galácticas, não sobrenaturais, porque o natural não é só o que se vê com os nossos pobres olhos aqui na Terra.

Estes vêem os objetos e as coisas que refletem apenas a luz visível, uma ínfima fração de todo o amplo espectro eletromagnético. Os cientistas falam muito de realidade e endeusam este conceito como se ele se aplicasse apenas ao mundo material. Como seria essa realidade, por exemplo, se nossos olhos físicos enxergassem uma porção maior do espectro eletromagnético, por exemplo, se tivéssemos olhos penetrantes como os Raios X? O que queremos dizer é que toda realidade, seja ela objetiva ou subjetiva, é sempre relativa. Isso significa que a evolução não se limita apenas às formas materiais e materializadas, mas também à Força, à essência, ao Espírito.

A Força (gênero), que abrange o Espírito (espécie superior da Força), evolui sempre e essa evolução começa nos átomos, desde o mais simples (hidrogênio) até ao mais complexo elemento químico natural (o urânio) tanto no reino mineral, como no vegetal e animal, porque afinal todos os corpos são átomos que vão se estruturando em formas cada vez mais complexas, sob a ação da Força, ao longo dessa evolução, conforme vimos no capítulo 3 em que tratamos da Evolução. Afinal, o Universo e tudo o que nele existe tem uma história e essa história está longe, muito longe de ser completamente conhecida pelo Homem. Talvez, nós, como seres humanos, estejamos passando por uma super evolução, sem que nos possamos dar conta, pois a evolução é um processo demasiadamente lento e seus efeitos, apesar da aceleração da evolução hominal, só serão observados em longo prazo. Daí não sermos visionários, ao pensar numa evolução para uma “superespécie” humana, capaz de usar, por exemplo, a telepatia como elemento biológico de recepção e transmissão do pensamento, mas o uso da telepatia neste atual estágio da evolução humana traria implicações sociais enormes e, por isso mesmo, não deverá acontecer da noite para o dia.

O Homem, como espírito e corpo (Força e Matéria), é um eterno viajante cósmico e tem uma trajetória evolutiva a cumprir aqui na Terra, participando da Evolução de todo o conjunto cósmico. Força e Matéria são os componentes básicos de tudo quanto no Universo existe. Estes componentes estão presentes em toda a parte, no Universo inteiro, em seus componentes primordiais ou sob a forma organizada. É a Força Inteligente que plasma a Matéria, em um processo incessante e complexo de agregação e desagregação. Por meio desses processos, a Força organiza e transforma o meio ambiente para proporcionar a evolução de suas partículas inteligentes que, em suas numerosas formas aparentes, estão constantemente agindo sobre os organismos dando-lhes vida, particularmente no Homem.  A partir de 1910, Luiz de Mattos (1) já proclamava em sua obra, Pela Verdade a ação do espírito sobre a matéria, às páginas 231-233, como se processa a ação da Força sobre a Matéria:         

 

A Força, a Inteligência Universal, é o elemento vital criador de tudo quanto existe. Essa Força, parcelada, facilmente se observa:

 

a) nos corpos sólidos, como no cristal, que se refaz, quando fragmentado, obedecendo às linhas geométricas da sua espécie, o que denota a ação de um elemento inteligente e diretor;

 

b) nos vegetais, na sua variadíssima e delicada constituição, desde as gramíneas, as flores, as portentosas árvores, [...].

 

c) no reino animal, irracional, desde o animal doméstico mais meigo, mais dócil, aos ferozes;

 

d) no movimentar, agir, pensar, falar, rir e chorar do ser humano [...].

 

Cada corpo vivo contém uma partícula da Força em evolução, em ascensão, e daí o princípio de que não existem duas coisas ou seres iguais na natureza [...].

 

Não é preciso recorrer ao milagre, ao sobrenatural, ao bizarro, ou às várias doutrinas, fontes de teorias absurdas e inteiramente contrárias à verdade e às leis comuns e naturais que tudo regem, para se ter a certeza da existência real da Força, da inteligência e da matéria; é bastante cada ser dominar-se a si próprio, colocar-se em condições de bem raciocinar, para assim tudo observar, ver, sentir e convencer-se [...].

 

Os diversos estados, ou categorias da força, estão sempre em evolução, em ascensão, embora lentamente, porque tudo progride e nada retrograda nem estaciona. Mas este progresso é somente em relação à Força, à inteligência, porque a matéria já existe, tal qual deve ser e é necessária, nos seus diversos estados [...].

 

E, mais adiante, na mesma obra (1), afirma que:

 

 A Força é também denominada Inteligência Universal, Luz, fonte da vida de todos os seres, e que, parcelada no mundo físico, organiza, incita e movimenta todos os corpos dos reinos da natureza.

Essa Força, essa Inteligência Universal que também se denomina Grande Foco, pode ser observada nos diferentes reinos da natureza, e sentida pelo ser humano em si próprio, a todos os momentos, como adiante se verá; ela não é da Terra, aqui vem, em partículas de diversos graus, e fica sujeita às leis do progresso de todos os seres.

 

Em virtude dessas leis comuns, naturais e imutáveis, é que essa Força parcelada incita e movimenta os corpos visíveis e mesmo os que os olhos armados não vêem, mas que existem, em volta de nós [...].

 

Ao longo e durante toda essa interminável trajetória evolutiva, a Força percorre todos os reinos da natureza - o mineral, o vegetal e o animal. Durante todo esse longo percurso, acumula sempre e sempre mais Força e mais Inteligência, passando por experiências e vivências múltiplas e diferenciadas, até alcançar um grau suficiente de “informação”. A partir daí, a Força se habilita a evoluir na forma humana, circunstância em que já dispõe de consciência e uma inteligência básica, desenvolvida em todos os estágios anteriores e, pela primeira vez, capaz de poder usar o atributo do livre-arbítrio, que nada mais é do que a vontade própria. Com este atributo ou faculdade, a Força Inteligente passa a ter a denominação de Espírito, que é a Força individualizada no homem, podendo, então, entre tantas e tantas opções, fazer escolhas inteligentes e assumir a responsabilidade de suas ações, o que não acontece no mundo animal.

Do que foi exposto, é intuitivo que o Espírito é, na criatura humana, a Força Inteligente individualizada e autodeterminada, isto é, que possui o atributo do livre-arbítrio. Desse fato marcante, a evolução realiza-se a um ritmo mais rápido, podemos até dizer acelerado, o que está comprovado quando se compara a presença dos ancestrais do homem na Terra há apenas cerca de dois milhões de anos contra uma história evolucionária de três e meio bilhões de anos. Na linha do tempo evolucionário, isso representa apenas 0,06% de todo o tempo evolutivo na Terra. O que teria influído tão decisivamente na velocidade de seu progresso? Fica claro que foi o uso do seu livre-arbítrio, aliado a três outros importantíssimos atributos do espírito ­– a inteligência, o raciocínio e a criatividade. Mais surpreendente, ainda, fica essa comparação quando observamos que ao segmentarmos a linha do tempo da evolução humana nos últimos trezentos anos, a evolução do conhecimento humano tornou-se centenas ou até milhares de vezes mais rápida, enquanto que a evolução biológica no homem nem de perto acompanhou esse ritmo! Essa é uma constatação para se refletir sobre a preponderância do espírito sobre a matéria.

Mas é bom ter sempre presente que, o livre-arbítrio é uma arma de dois gumes, podendo ser usado para o bem ou para o mal, conforme o aproveitamento que o ser humano fizer das lições da vida. É isso que deu e continuará dando ao ser humano condições de avançar mais rapidamente ou não em direção à perfeição máxima que não pode ser conseguida neste plano da existência. É óbvio que, usando o seu livre-arbítrio para o mal, vai atrasar a sua evolução, perdendo um tempo precioso absorvido nas sensações da matéria. Fica também, fácil de entender porque a evolução da inteligência emocional, que em última análise consiste na eliminação dos instintos animalescos e depuração dos sentimentos não pode ser conseguida em uma única vida ou encarnação, levando centenas e até milhares delas, sob as mais diversas circunstâncias e até penosas condições para aprender, compreender e entender o que poderia ter sido feito em poucas dezenas de vidas.

De outro lado, o ser humano evolui também em grupos, sociedades e culturas das mais diversas. É também intuitivo perceber que, na evolução dos seres humanos feita em grandes grupos, muitos indivíduos se tornam retardatários recalcitrantes, pelo mau uso que fizeram de seu livre-arbítrio ou pelo esmorecimento no esforço próprio ao qual devia aplicar-se. Assim, ao longo de muitas vidas, tais indivíduos começam a perder contato com aqueles com quem iniciaram suas escaladas evolutivas rumo à perfeição plena. Podemos fazer uma analogia bem racional, observando que, por exemplo, quando um aluno é reprovado numa determinada série escolar e vê seus demais colegas tomando-lhe a dianteira, ele sente uma sensação de frustração, permanecendo estacionado. E, como todos estão ligados por laços afetivos devidos às experiências comuns pelas quais passaram ao longo de suas muitas vidas, sente uma dor enorme nessa separação ou afastamento. Seu desejo seria acelerar mais ainda o seu aprendizado para alcançar o grupo a que pertence.

É desse estímulo e impulso oculto, que resulta a grande força que temos no sentido de preservar a vida, esforçando-se o indivíduo para ultrapassar as barreiras e obstáculos, aplicando uma vontade muito grande no sentido de superar seu próprio atraso. A fim de reiniciar um novo curso, pois a Terra é um mundo-escola, participa de novas experiências que o habilitam a superar seu atraso e alcançar maior evolução, de preferência junto ao seu grupo evolutivo. Aqueles que, ao reingressar em uma nova vida, desviam-se das condições e disposições por si mesmo estabelecidas e continuam criando novos atrasos, perdem tempo e, não se recuperando, vão ficando para trás, porque a evolução não pára e todo o grupo necessita continuar. É por isso que muitos levam mais tempo para chegarem à perfeição plena.

Esta visão evolutiva global é o oposto da visão corrente adotada pelos cientistas. Estes estabeleceram que tudo que existe é feito de matéria e tudo pode ser reduzido às partículas elementares da matéria – os assim chamados impropriamente de blocos ou tijolos de construção do universo. E, em função das interações, os átomos são formados e, a partir destes, formam-se as moléculas e nesta causação ascendente, forma-se o DNA, o ácido desoxirribonucléico (a dupla hélice) componente dos genes, que por sua vez estão contidos nas células. Tudo bem que assim seja e, materialmente falando, assim é, mas onde está a força vital, a força inteligente? Chegam ao ponto de re-examinarem os conceitos de geração espontânea, derrubada no século XIX pelo eminente médico e pesquisador francês Louis Pasteur. Onde ficam o livre-arbítrio, a inteligência, a consciência, os pensamentos, os sentimentos, etc., que são elementos imateriais e todos atributos próprios do espírito? O que pretendem achar no cérebro, que é matéria, além de neurônios, sinapses e neurotransmissores? A que fica relegado o livre-arbítrio, mola mestra da evolução hominal?

Essas e outras numerosas questões serão examinadas ao longo deste e dos próximos capítulos da segunda parte dessa obra, adotando-se um ponto de vista oposto ao da ciência oficial. Por esse enfoque aqui explanado, estabelece-se que foi a Força Inteligente que deu “os primeiros passos” na Terra por meio da evolução nos reinos da natureza e, finalmente o Espírito, que deu continuidade à evolução no próprio homem. Nós gostaríamos de fazer, desde já, uma distinção básica: a evolução da Força nos reinos da natureza se fez e continua sendo feita por meio das formas, isto é, a Força evoluiu e continua evoluindo para aperfeiçoar os corpos que ela animou e anima; já no reino hominal, a evolução da forma quase cessou e deu lugar para a evolução do espírito por meio do conhecimento acumulado durante muitas vidas e guardado no perispírito – o subconsciente dos psicólogos. O que nós estamos querendo deixar claro é que a Força Inteligente precede à Matéria e a anima em uma incalculável variedade de formas em tudo quanto existe no Universo. E aí está um campo muito grande para a pesquisa dos cientistas, mormente físicos, biólogos, médicos, neurocientistas, psicólogos, parapsicólogos, e, porque não dizer também, os filósofos, qualquer que seja a religião que professam.

 

2.      A Inteligência Universal

 

De todos os numerosos sentimentos negativos e positivos herdados do instinto animal e que constituem a inteligência emocional do homem moderno, destacamos o egoísmo que gera a prepotência. Na luta pela sobrevivência, o homem continua carregando essa nociva herança. Por isso mesmo que o egoísmo, fruto direto dos instintos, dos maus hábitos e das imperfeições, leva o homem a assumir uma falsa idéia de poder que está eivado de orgulho e prepotência. Trata-se de um poder presunçoso, onde não cabe a humildade dos verdadeiros sábios.

Além desse sentimento de poder, derivado do instinto animal e da má compreensão de si mesmo como Força e Matéria, o homem primitivo, era também cercado de medo por todos os lados, uma vez que não compreendia as forças da natureza e seus efeitos, muitas vezes catastróficos, o que ainda hoje é observado. Assim, foi natural que sentisse a necessidade de imaginar ou criar um ser supremo, superior a todos os homens, feito à sua semelhança, conforme o seu intelecto e a sua vontade, ao qual pudesse se dirigir nos seus momentos de fraqueza, de medo, de aflição e de sofrimentos físicos e a quem pudesse entregar os seus destinos. Daí à idolatria, invenção de ídolos pelos povos selvagens e dos deuses do paganismo, foi um passo. Até mesmo, decorridos muitos milênios, no Egito e na Grécia e até mesmo na Roma antiga, muitos eram os deuses cultuados e adorados.

Apesar de quase todas as seitas e religiões (são cerca de 8.500 em todo mundo) serem atualmente monoteístas, os religiosos continuam venerando e adorando os seus ídolos ou santos, mantendo assim uma tradição herdada do politeísmo. É fácil, portanto, entender porque a fé e a adoração ficaram arraigadas no culto de quase todas as religiões, que adotam a idéia de (2) “um ser supremo materializado, que, depois de muitas denominações, passou a firmar-se mais em uma só: na do “Deus todo-poderoso”, mas, ainda assim, à imagem de cada povo”. E, ainda hoje, é assim que acontece em muitas religiões, cada povo tendo o seu Deus, variando o nome e os cultos. Seria difícil imaginar que, por exemplo, um povo da raça negra, pudesse ter o seu Deus com feições da raça branca ou que o povo chinês apresentasse seus Deus ou deuses com feições da raça branca.

Mas, de outro lado, há aqueles que, em muito menor proporção, religiosos ou não, sentem a necessidade de se ligarem ao Todo imaterial e imponderável que o ser humano não vê e não pode apalpar, mas pode sentir em toda a sua suprema grandeza, como Força Criadora ou Inteligência Universal, que permeia todas as coisas e seres em todo o Universo e lhes dá Vida. Isso é exatamente o contrário da “idéia de adorá-lo, tomando, como tal, o que foi inventado pelo instinto, pelo hábito e pelos desejos desordenados de todos os seres ignorantes, limitando tudo à sua imagem, ao seu “Eu”, já que Deus devia ser uma figura de homem ou outra que tivesse forma física terrena, superior ao homem, surgindo, por essa errada idéia, a materialização da Força” (2).

Diante da visão espiritualista proposta por Luiz de Mattos de que no Universo só existe Força e Matéria, é na Força que se encontra a explicação de todos os fenômenos transcendentes e que ainda não foram explicados pela ciência. Visto sob este enfoque, é fácil entender e compreender intuitivamente o que seja a Inteligência Universal, Força Criadora ou Grande Foco tal como é, não o Deus inventado pelas religiões, porque tal não existe. A Força Criadora, como o próprio nome está dizendo é o Primeiro Princípio, a Alma Mater de tudo quanto existe e vida tem no Universo inteiro.

 

3.      Visão Científica da Inteligência Universal

 

Com o advento da Física Quântica, muitos fenômenos trouxeram grandes embaraços aos seus descobridores. Estes, acostumados a tudo explicarem com base na Matéria e seus fundamentos, passaram a dispor de um vasto campo para estudo, advindo do conhecimento do núcleo atômico e suas partículas. Apesar disso, nem sempre tiveram êxito e muitos paradoxos ainda existem desafiando as inteligências dos melhores cientistas. Nós vamos examinar aqui as principais idéias que foram propostas por alguns deles sobre a Inteligência Universal ou Inteligência Cósmica, sem nos preocuparmos em criticá-las. Como as principais teorias para explicar o Universo e como surgiu a Vida na Terra e sua inter-relação com o Universo derivam da Física Quântica, nós vamos começar com o paradoxo levantado pela experiência de Alain Aspect.

 

i Alain Aspect e sua Fantástica Experiência Quântica

 

As primeiras idéias que levaram ao conhecimento da Física Quântica tiveram início por volta de 1900. A partir de 1925, quando foram descobertas as equações da Mecânica Quântica, a Física Quântica tornou-se aceita como fonte da verdade para os cientistas. Daí em diante, o conhecimento da intimidade da matéria e das forças físicas que atuam no interior do núcleo atômico tem sido o principal objeto da atuação dos físicos. Muitas teorias foram confirmadas experimentalmente em laboratórios sofisticados e caríssimos, enquanto outras permanecem insolúveis ou mesmo representam verdadeiros paradoxos inexplicáveis. Em 1982, Alain Aspect e seus colaboradores (3), na Universidade de Paris – França executaram experimentos que verdadeiramente indicavam a noção do intangível e, particularmente, a noção de transcendência no mundo subatômico. Em anos anteriores a essa data, a física quântica vinha dando indicações de que devia haver níveis de realidade além do nível material. Inicialmente, partículas como o elétron, por exemplo, pareciam ora se comportar como onda e ora como partícula (matéria), isto é, pareciam ter dupla “personalidade”, ou fisicamente dizendo, possuíam um duplo caráter.  Dessas observações, Heisenberg inferiu a sua “teoria da incerteza”, que nos diz que não se pode estabelecer ao mesmo tempo a posição e a velocidade do elétron num dado momento. Não se trata de uma onda ordinária, mas de uma onda em potencial. Foi quando Einstein ridicularizou essa teoria dizendo que “Deus não joga dados”. O potencial dessas ondas quânticas passou a ser considerado como extrapolando a matéria, ou seja, tinham um caráter transcendente.

Até a experiência de Aspect, este conceito não ficou muito claro e era até renegado por muitos. Então, o experimento de Aspect veio confirmar que tal fato não é apenas uma teoria, pois realmente existe este caráter de transcendentalidade em potencial, ou seja, as partículas realmente têm conexões com o espaço e tempo exterior. O que essa experiência demonstrou é que quando um átomo emite dois quanta de luz, chamados fótons, disparados em direções inversas, de alguma forma estes fótons afetam instantaneamente o comportamento de um ao outro à distância, sem trocarem qualquer sinal por meio do espaço.

Ora, nós sabemos, conforme Einstein havia demonstrado no início do século XX, com a sua teoria da relatividade restrita, que dois objetos não podem afetar um ao outro instantaneamente no espaço-tempo, porque isso levaria um certo tempo para um alcançar o outro, ainda que o espaço que os separasse fosse percorrido à velocidade máxima da luz, que é constante e igual a aproximadamente trezentos mil quilômetros por segundo. Esta é a idéia de “localidade” que deriva do fato de que qualquer sinal é local no sentido que ele deve levar um certo tempo para se deslocar no espaço até outro ponto qualquer. E, apesar disso, se os fótons emitidos pelo átomo na experiência de Aspect (4) influenciam um ao outro, à distância, aparentemente sem trocar sinais, é porque esse fenômeno está acontecendo instantaneamente e, portanto, a uma velocidade maior que a da luz. Então, devemos reconhecer que esta influência deve pertencer ao “domínio transcendente da realidade”. Esta marcante experiência mostrou aos físicos que algo muito importante está subjacente às partículas subatômicas e nada tem a ver com a realidade material, de que tanto se ufanam, indicando novos rumos para a pesquisa física, além de estabelecer o conceito de não-localidade para tudo que pode ser considerado instantâneo, conforme veremos abaixo nas idéias de Amit Goswami e, também,  no capítulo em que trataremos do pensamento.

A essa altura, cabe citar trecho da entrevista que Amit Goswami deu, conforme a referência (4):

Henry Stapp, que é um físico da Universidade de Berkeley, na Califórnia, afirma, em um de seus trabalhos, escrito em 1977, que as coisas “fora do espaço-tempo afetam as coisas dentro do espaço-tempo”. Não há nenhuma dúvida que isso ocorre no substrato da física quântica, em que você está tratando com objetos quânticos. Agora, naturalmente o x da questão é que nós estamos sempre tratando com objetos quânticos porque está fora de dúvida que a física quântica é a física de cada objeto. Seja ele submicroscópico ou macroscópico, a física quântica é uma só e se aplica. Assim, embora seja mais aparente para os fótons, para os elétrons, para objetos submicroscópicos, acreditamos que tudo isso é realidade e, que toda realidade manifestada e todo o mundo da matéria é governado pelas mesmas leis. E, se assim é, então o experimento de Aspect está nos dizendo que nós devemos mudar nosso ponto de vista, porque nós também somos objetos quânticos.

 

i David Bohm e sua Teoria da Ordem Implícita

 

Falecido em 1992, David Bohm (3) foi um dos principais físicos americanos com profundos conhecimentos da Teoria Quântica no século XX. Atuou na Universidade da Califórnia (Berkeley), no Instituto Princeton de Estudos Avançados e como professor de Física Teórica na Faculdade de Birkbeck, da Universidade de Londres. Durante seus primeiros anos de estudo adquiriu, também, conhecimentos de Historia da Filosofia e da Ciência.

Para David Bohm, o Universo se encontra em um processo de evolução contínua, ponderando que a aceitação de sua teoria levaria a implicações muito grandes para a humanidade. Bohm escreveu vários livros, mas o principal é Wholeness and the implicate order (O Todo e a ordem implícita). Outros livros foram escritos com a colaboração de B. J. Hiley, J. Krishnamurti e F. David Peat. Além disso, publicou numerosos artigos de divulgação em revistas científicas.

Desenvolvida na década de 80, sua teoria do Universo é conhecida como teoria da Ordem Implícita. Ela tem por objetivo explicar o comportamento bizarro de partículas subatômicas, que os físicos da teoria quântica não conseguiam explicar. Basicamente, duas partículas subatômicas que tenham reagido entre si “respondem instantaneamente aos movimentos de uma em relação à outra, qualquer que seja distância e o tempo que as separem”, fato esse comprovado pela experiência de Alain Aspect, que foi posterior à sua teoria.

Bohm sugeriu que forças subquânticas e partículas ainda não observadas pela ciência parecem estar agindo no limiar da matéria. Esta força subjacente podia ser o reflexo de uma dimensão mais profunda da realidade. Sua crença era de que o espaço-tempo podia, realmente, fazer parte de uma realidade objetiva mais profunda ainda, que ele denominou de Ordem Implícita. Dentro da Ordem Implícita tudo está interligado. Então, segundo essa teoria, as partículas subatômicas estariam agindo como se fossem amplificadores da “informação” contida em uma onda quântica. A partir dessas observações, construiu uma teoria nova e controversa do Universo, um modelo novo de realidade.

Bohm fundamentou sua teoria nos conhecimentos científicos da holografia, que se baseia na interferência de ondas: se duas fontes de luz são de freqüências diferentes elas interferirão uma na outra criando um padrão de interferência. Basicamente, um holograma é o registro detalhado do comprimento de onda da própria luz, isto é, um repositório denso de “informação”. Assim, em um holograma, cada pedacinho do filme holográfico revela a forma representativa de um objeto tridimensional inteiro. Por analogia, Bohm concluiu que a Ordem Implícita se comporta de modo semelhante a um holograma.

Com esse entendimento, Bohm estendeu a sua teoria a uma visão cósmica ultra-holística, na qual todas as coisas estão conectadas entre si. De acordo com esse princípio, qualquer elemento individual pode revelar ou conter “informações detalhadas sobre qualquer outro elemento no universo”. O tema subjacente central da teoria de Bohm é que “o todo indivisível da totalidade da existência faz parte de um movimento indivisível sem fronteiras”. Sua teoria nos diz, portanto, que tudo está envolvido com tudo. Assim se expressa Bohm (3):   

 

A ordem real (Ordem Implícita) foi gravada no movimento complexo dos campos eletromagnéticos, na forma de ondas de luz. Tal movimento de ondas de luz está presente em toda a parte e em princípio envolve o Universo inteiro de espaço e tempo, em cada região. O dobramento e o desdobramento tomam lugar não somente no movimento do campo eletromagnético, mas também, nos outros campos (eletrônico, protônico, etc.). Esses campos obedecem às leis da Mecânica Quântica dando origem às propriedades de descontinuidade e não-localidade. A totalidade do movimento de dobramento e o desdobramento pode se estender imensamente além do que se revela às nossas observações. Nós chamamos esta totalidade pelo nome de ’holomovimento’.

 

Segundo sua teoria, o holomovimento atua dentro de uma “realidade multidimensional”, que se desdobra em subtotalidades independentes (tais como, os elementos físicos e as entidades humanas), com relativa autonomia. Para ele, o holomovimento representa essa “totalidade indescritível e desconhecida”, sendo a “base fundamental de toda a matéria”.

De outro lado, o mundo manifestado é parte do que Bohm chamou de a ”ordem explícita”, em contraposição à ordem implícita, dela derivando ou fluindo e, portanto, ela é secundária. Dentro da Ordem Implícita, há “uma totalidade de formas, as quais possuem uma espécie aproximada de recorrência (mudança), estabilidade e separatividade”. São estas formas que se apresentam como nosso mundo físico.

Bohm sugere que, em vez de se pensar em partículas como realidade fundamental, o foco deve ser posto em discretos quanta de energia, semelhantes às partículas num campo contínuo. Com base neste campo quântico, Bohm, partindo do microcosmo para o macrocosmo, desdobra a Ordem Implícita em três níveis e os explica usando os conceitos de campo quântico e campo contínuo. Dentro desses campos e em suas interfaces se faz a transferência de “informação” do mais simples para o mais complexo e, vice versa, do Todo para o mais simples, para animar, guiar e organizar o campo quântico original, ou seja, é este holomovimento que dá condições energéticas para as partículas atuarem no mundo tridimensional da matéria.

A Ordem Implícita permeia tudo. Tudo que é e será neste universo está envolvido dentro da Ordem Implícita. Há um movimento cósmico especial que movimenta o processo de dobramento (enfolding) e de desdobramento (unfolding), na forma da ordem explícita. Este processo do movimento cósmico, em ciclos de realimentação, cria uma variedade infinita de formas e mentalidade. Bohm é de opinião que a Inteligência Cósmica fundamental está envolvida neste processo de experimentação e criação infindável. Este Ente, a Mente Cósmica, está se movendo ciclicamente sempre e sempre para frente, resultando uma infinidade de seres experientes (evoluídos).

O modelo cósmico estrutural esboçado por Bohm inclui um exame detalhado dos seguintes temas: a Base de Toda Existência, a Matéria, a Consciência e o Ápice Cósmico. Vamos resumir, nos parágrafos seguintes, o seu pensamento sobre os referidos temas, centro do seu modelo da Ordem Implícita:

Para Bohm, a base de toda a existência é uma energia especial que ele chama de “plenitude”, uma “imensa fonte original de energia”. A energia dessa fonte concentra-se em um movimento total e absoluto que é o “holomovimento”. A Ordem Implícita decorre do holomovimento. Por sua vez, é da Ordem Implícita que emana a ordem em cada aspecto perceptível do mundo (harmonia universal) e, ao final, todos os aspectos se integram no holomovimento indefinível e incomensurável e, também, dele estão emergindo todos os novos conjuntos. É o fluxo da matéria manifestada e interdependente em direção à consciência.

Com relação à matéria animada e inanimada, Bohm considera a partícula como sendo o mais essencial bloco de construção da matéria. Para ele, a partícula é, fundamentalmente, uma “abstração que se manifesta aos nossos sentidos”. O Universo inteiro é feito de matéria, manifestada por meio de uma totalidade de conjuntos. Estes conjuntos “agem e interagem segundo uma série ordenada de estágios de dobramento e o desdobramento que, em princípio, permeiam e interpenetram um ao outro por meio de todo o espaço”, mas enfatiza sempre que a ordem explícita é sempre derivada e secundária. Exemplifica a realidade dimensional, mostrando a relação de duas imagens televisadas de um aquário em que um peixe é visto de frente numa das imagens e de lado na outra. O que é visto é uma “relação entre as imagens que aparecem nas duas telas”. Nós sabemos, assinala Bohm, que as duas imagens do aquário são atualidades que interagem, mas elas não são duas realidades que atuam independentemente. “Ao contrário, elas se referem a uma única atualidade, que é a base comum de ambas”. Para Bohm, esta única atualidade é de uma dimensionalidade mais elevada, porque as imagens da televisão são meras projeções em duas dimensões de uma realidade que existe em três dimensões e que “contém estas duas projeções dimensionais dentro dela”. Estas projeções são apenas abstrações, mas a “realidade tri-dimensional não “é” nenhuma destas, ao contrário, é alguma coisa diferente de ambas as imagens, algo como uma natureza real que existe além de ambas”.

Com relação à evolução no Universo, a teoria de Bohm afirma que ela existe “porque as diferentes escalas de dimensões da realidade já estão implícitas em sua estrutura”. Bohm utiliza a analogia da semente sendo “informada” para produzir uma planta viva. O mesmo pode ser dito de toda matéria viva. “A vida está envolvida na totalidade e, mesmo quando ela não se manifesta de alguma forma ela está implícita”. O holomovimento é a base tanto da vida como da matéria. Não há dicotomia.

Com relação à consciência, Bohm conceitua que consciência é mais que informação e cérebro; ao contrário, ela é a informação que entra no cérebro. Para Bohm, a consciência “envolve ciência, atenção, percepção, o ato do entendimento e talvez até mais”. Continuando, diz: a consciência pode ser “descrita em termos de uma série de movimentos”. Basicamente, “um movimento dá lugar ao próximo, em cujo contexto ele estava implícito e agora se explicita, enquanto que o conteúdo do (movimento) anterior se tornou implícito”. A consciência é um intercâmbio: ela é um processo de retroalimentação (feedback) que resulta em uma acumulação crescente do conhecimento. Bohm trata também da consciência coletiva, denominando-a de consciência coletiva da humanidade e dá a ela maior significação do que à consciência individual. Valorizando a consciência coletiva, a humanidade, na medida em que realiza com sucesso sua espiritualidade, caminhará íntegra em direção a uma maior dimensão da realidade – a Plenitude Cósmica. Afirma que o Homem tem um destaque especial no Universo e que este seria incompleto se não houvesse o Homem para validá-lo (antropocentrismo). 

Com relação à Plenitude Cósmica, o nível mais elevado no Universo, Bohm refere-se a ela como sendo a fonte do não-manifestado, do Sutil Não-Manifestado, alguma coisa semelhante a espírito, um movente, mas ainda matéria no sentido em que ela é uma parte da Ordem Implícita. Para Bohm, o Sutil Não-Manifestado é uma “inteligência ativa” superior a qualquer “energia definida pelo pensamento”. Bohm afirma diretamente: “há uma verdade, uma atualidade, um ser superior que pode ser alcançado pelo pensamento e isso é inteligência, o sagrado, o santo”.

Há certos atributos que podem ser discernidos do modelo cósmico de Bohm. São eles: a Ordem, a Inteligência, a Individualização, a Criatividade e o senso de Perfeição. Em sua obra Wholeness and the implicate order (O Todo e a ordem implícita), já citada anteriormente, Bohm estuda pormenorizadamente esses atributos. Nós os apresentamos, a seguir, resumidamente:

A ordem é a lei universal que mantém tudo interligado. É a própria energia cósmica que ele, também, denomina de lei do holomovimento. Seu ponto de vista é a do Todo que propicia novos “todos” ou sistemas interdependentes.

A inteligência é “puramente ativa”, nada mais sendo que a consciência filtrada, por meio da qual se obtém o discernimento. Bohm considera o pensamento como sendo basicamente uma operação mecânica. É a inteligência que torna relevante o processo mecânico do pensamento. Ele acredita que, se a inteligência é um “ato de percepção não condicionado”, então a inteligência não pode ser encontrada em “estruturas tais como células, moléculas, átomos e partículas elementares”. Segundo Bohm, a operação da inteligência deve estar além de quaisquer fatores que podem ser incluídos em qualquer lei conhecida. A “base da inteligência deve estar no fluxo indeterminado e desconhecido, que também é a base de todas as formas não definidas da matéria”. Para Bohm, a inteligência sempre esteve no âmago da Ordem Implícita.

A individualização não recebe muita atenção de Bohm, sendo a este respeito um tanto reservado. Para ele, supor que cada ser humano é uma realidade independente que interage com outros seres humanos e com a natureza é uma simples projeção, mas dá ênfase na coletividade, isto é, valoriza a ação coletiva da sociedade como um todo.

Com relação à  criatividade, ele a chama de o “Ente do Processo Cósmico”, sendo pura energia. Este “ente” é inteligente, consciente, criativo e é, também, uma pessoa!  Isso nos parece uma definição mais apropriada ao conceito de espírito.

Sobre a perfeição, Bohm a define como um “ser além do que o nosso pensamento possa imaginar”, nomeando o Sutil Não-Manifestado de “perfeito” no sentido de que ele é o Todo. É uma presença com energia cósmica. O modelo cósmico de Bohm sugere também que esta “perfeição” existe desde a criação do cosmo. Ela está presente no processo cíclico do universo. Ela é pura inteligência ativa, a partir da qual tudo que é manifesto, do cosmo provém. Ela age por meio de uma intromissão na consciência. Ela absorve informação em muitos níveis da consciência, em todas as formas de vida. É a Ordem Implícita que é a Base de Toda a Existência.

Bohm trata, também, do conceito de peregrino cósmico, título dado à Humanidade em geral. A Humanidade é a peregrina de um processo cósmico. Sobre a condição humana e sobre os males resultantes da desordem (que causam sofrimento) e morte, Bohm acredita que não existe desordem ao nível da universalidade não-humana; ao contrário, ela reside no nível da humanidade, principalmente por causa da ignorância. A Natureza deu à humanidade o poder da luxúria para fazer erros, porque a humanidade deve ter a “possibilidade de ser criativa”. É o nosso poder de escape nesse processo cósmico que nos coloca nestas circunstâncias de escolha e possível caos. A desordem e o conseqüente sofrimento prevalecerão enquanto todos os diferentes elementos (de qualquer sistema dado, seja o de um ser humano ou da sociedade humana) “crescerem caótica e independentemente um do outro, não trabalharem em conjunto”.

Bohm considera o mal da Ignorância um problema de mente fechada. Ele a considera “a escuridão do cérebro humano”. É o problema do “ego” humano fechado à Mente Universal, à suprema inteligência que se comunica na forma de intuição, que é a percepção pura. Por causa do baixo nível de desenvolvimento de nosso ego (manifestado pela nossa vaidade, nossos medos e pressões emocionais, nossos pontos de vista ignorantes e nossa super extroversão), a intuição é freqüentemente desviada por uma mente fechada. O oposto de uma mente fechada é a abertura para a interioridade. Os seres humanos precisam olhar para si mesmos para serem receptivos à intuição.

A visão global de Bohm sobre o destino humano é simples e direta, pois para o cientista, “a consciência da humanidade é única e não verdadeiramente divisível”. Cada pessoa tem a responsabilidade para alcançar isso e nada mais, uma vez que “não há outra saída. É absolutamente isso que tem que ser feito e nada mais pode funcionar”.

Bohm acredita que apenas por meio de uma cooperação coletiva pode o homem atingir o alto grau de energia necessária para “alcançar o todo da consciência da humanidade – a Plenitude”.

Teoria holográfica aplicável ao cérebro – Karl Pribam

 

David Bohm não foi único a adotar as idéias de um universo holográfico.  Karl Pribam (5, 6), neurofisiologista e pesquisador na Universidade Stanford (USA), também convenceu-se da natureza holográfica da realidade e aplicou esse modelo para examinar como e onde as memórias são armazenadas pelo cérebro. Principalmente durante a segunda metade do século XX, muitos pesquisadores de renome convenceram-se de que não havia um lugar específico no cérebro para armazenar memórias. Já na década de 1920, o neurocientista Karl Lashley, realizou trabalhos com cérebros de ratos e concluiu pela não-localidade da memória, mas não chegou a apresentar explicações teóricas sobre os resultados obtidos. Somente a partir da década de 1960, Karl Pribam trouxe à luz suas explicações baseadas na teoria holográfica, e, a partir de então, vem recebendo apoio dos homens de ciência que pesquisam o cérebro. Pribam acredita que as memórias acham-se codificadas não em neurônios ou pequenos grupos de neurônios, como muitos pesquisadores ainda acreditam, mas sim em padrões decorrentes de impulsos nervosos que se entrecruzam em todo o cérebro, da mesma maneira que os padrões de interferência de luz laser entrecruzam uma área inteira de um filme contendo uma imagem holográfica. Em outras palavras, Pribam acredita que o próprio cérebro é um holograma. A teoria de Pribam explica também como o cérebro humano pode armazenar tantas memórias em um espaço tão pequeno. As melhores estimativas referem-se a uma capacidade de armazenamento da ordem de 10 bilhões de bits de informação durante a vida média do homem atual, o que corresponde ao armazenamento de seis coleções da Enciclopédia Britânica.

Curioso é que, nos experimentos holográficos, esta formidável capacidade de armazenagem da informação varia em função do ângulo com que os dois raios de laser incidem sobre um filme fotográfico, nos indicando que muitas diferentes imagens podem ser armazenadas na mesma superfície. De outro lado, usando-se o conceito holográfico, torna-se mais simples entender a fantástica velocidade, praticamente instantânea, com que a informação é recuperada de nossas memórias, bem como, entender as numerosas associações de idéias e imagens que têm lugar nas nossas operações mentais. Segundo Pribam, uma das coisas mais significativas do processo do pensamento humano é que cada parte da informação parece cruzar instantaneamente com qualquer outra parte da informação, característica esta que é extrínseca e comum a um holograma. Trata-se, talvez, de um exemplo supremo da natureza, que utiliza um sistema cruzado correlacionado, pois, cada porção de um holograma é infinitamente interconectado com qualquer outra porção de todo o holograma.

Pribam afirma, ainda, que as semelhanças não param por aí. A armazenagem de memória não é o único quebra-cabeça neurofisiológico a ter uma explicação mais aceitável à luz de sua teoria do modelo do cérebro. A outra questão é como o cérebro decodifica a avalanche de freqüências que ele recebe via sentidos físicos (freqüências luminosas, sonoras, olfativas ou ósmicas, etc.) em um mundo concreto de percepções. Codificar e decodificar freqüências é precisamente, o que um holograma sabe fazer. Ele funciona como uma espécie de lente, um mecanismo de tradução capaz de converter borrões de freqüências aparentemente sem significado em uma imagem coerente. Pribam afirma que o cérebro, também, comporta-se como se fosse uma lente e usa os princípios holográficos para converter matematicamente as freqüências que ele recebe por meio dos sentidos no mundo interior de nossas percepções. Muitos pesquisadores que lhe seguiram estão convencidos dessa interpretação, entre os quais o pesquisador italiano-argentino Hugo Zucarelli, o psicólogo Stanislav Grof e o psicólogo Keith Floyd. Várias descobertas foram feitas, provando, por exemplo, que nossos sistemas visuais são sensíveis às freqüências sonoras, que parte do nosso sentido olfativo é dependente das chamadas freqüências ósmicas e, que mesmo as células do nosso corpo, são sensíveis a uma ampla faixa de freqüências. Tais descobertas sugerem que é apenas no domínio holográfico da consciência que tais freqüências são classificadas em percepções convencionais.

Mas, o mais perturbador aspecto do modelo holográfico do cérebro acontece quando ele é colocado face à teoria de Bohm, pois, se a concretude do mundo é apenas uma realidade secundária e o que “existe” é realmente um borrão holográfico de freqüências e, se o cérebro é, também, um holograma e seleciona apenas algumas das freqüências deste borrão e matematicamente as transforma em percepções sensoriais, o que acontece com a realidade objetiva? Respondendo de uma maneira simples, ela deixa de existir, é uma ilusão. Embora pensemos que sejamos seres físicos movendo-nos por meio de um mundo físico, isto também é uma ilusão.

Dessa forma (5, 6), “nós somos simples “receptores” flutuando por meio de um oceano de freqüências e o que extraímos desse oceano e transmudamos em realidade física é apenas um canal dentre muitos, extraídos do superholograma”.

Combinadamente a teoria de Bohm e Pribam passou a ser chamada de paradigma holográfico, conceito que tem atraído a atenção de muitos físicos. Um pequeno, mas crescente, grupo de pesquisadores acredita que este paradigma é o modelo de realidade mais perfeito que a ciência já apresentou até o momento; mais do que isso, alguns acreditam que ele poderá resolver alguns mistérios que nunca antes fora explanado pela ciência e, até mesmo, estabelecer o fenômeno paranormal como parte da Natureza. Numerosos pesquisadores, inclusive Bohm e Pribam notaram que muitos fenômenos paranormais tornam-se muito mais compreensíveis à luz do paradigma holográfico.

Um dos mistérios é a telepatia, fenômeno que existe, mas não de forma generalizada. Num universo em que os cérebros individuais são realmente porções indivisíveis de um holograma maior e tudo está infinitamente interligado, a telepatia é explicada pela teoria de Pribam como sendo meramente o acesso de níveis holográficos semelhantes. Torna-se muito mais fácil entender como o pensamento pode viajar instantaneamente do indivíduo “A” para o indivíduo “B” em qualquer distância e ajudar a entender alguns quebra-cabeças ainda não explicados pela psicologia. Segundo Grof (5, 6), que faz experiências com psicologia transpessoal, relacionadas com os diversos estados da consciência, desde 1960, “se a mente é realmente parte de um continuum, de um labirinto que está conectado não apenas a cada mente que existe ou existiu, mas também, a cada átomo, organismo e a regiões da imensidão do espaço e tempo, o fato de que é capaz, ocasionalmente, de fazer incursões no interior deste labirinto e ter experiências transpessoais, não parece mais tão estranho assim”.

O paradigma holográfico tem, também, implicações na Biologia. Keith Floyd, um psicólogo do Virginia Intermont College, ponderou que, se a concretude da realidade é apenas uma ilusão holográfica, não é mais verdade dizer que o cérebro produz a consciência. Ao contrário, é a consciência que cria a aparência do cérebro – assim como o corpo e tudo o mais em torno de nós que interpretamos como sendo físico. Tal reviravolta no modo de vermos as estruturas biológicas está levando os pesquisadores a indicar que a medicina e nosso entendimento do processo de cura poderia também, ser transformada pelo paradigma holográfico. Se a estrutura física aparente do corpo não é mais que uma projeção da consciência, torna-se claro que cada um de nós é muito mais responsável pela nossa saúde do que a sabedoria médica admite. O que agora vemos como curas miraculosas de certas doenças podem realmente provir de mudanças na consciência que, por sua vez, efetua mudanças no holograma do corpo. Similarmente, novas técnicas controversas de cura, tais como visualização, podem responder tão bem porque, no domínio holográfico do pensamento, as imagens são, afinal, tão reais como a “realidade”.

 

i Amit Goswami e o seu Universo Autoconsciente ou Teoria do Idealismo Monístico

 

Amit Goswami é um físico natural da Índia e radicado nos Estados Unidos. É professor de Física na Universidade do Oregon e Doutor pelo Instituto de Ciências Abstratas de Sausalito, Califórnia. O que vamos apresentar está contido no seu livro O universo autoconsciente – como a consciência cria o mundo material e também na referência (4), uma de suas entrevistas designada por O que é o esclarecimento, dada a Craig Hamilton de WMT.

Amit Goswami, estudando o comportamento das partículas subatômicas dentro do domínio da Física Quântica, afirma que é nesse contexto que a realidade não-material se revela aos olhos dos cientistas. Ele sustenta que a força criadora de toda a realidade física é consciência, isto é, ela é a base de todo o ser e a partir dela retirou a idéia da causação descendente, em contraposição à teoria materialista e reducionista da causação ascendente. Segundo ele, ambas ocorrem, mas a causação descendente é a base do seu idealismo monístico, diferente do dualismo Força e Matéria. Na visão de Goswami, o livre-arbítrio tem um papel de destaque na explicação dos fenômenos e do mundo.

Embora reconhecendo o pioneirismo da obra do físico Fritjof Capra (11), intitulada O Tao da Física, que admite o aspecto espiritual dos seres humanos, Goswami chega ao ponto de enfatizar que tudo nela ainda se baseia exclusivamente no aspecto material da realidade. Assim, ele se considera pioneiro por sugerir, no seu entender baseado em uma explicação rigorosamente científica, que a consciência é a base do ser, excetuando apenas as idéias da psicologia transpessoal. Assim, ele insiste que a aplicação de suas idéias e conceitos sobre a consciência como base fundamental do ser resolveria todos os paradoxos da física quântica. Admite, ainda, que se forem aceitas suas idéias, haverá uma mudança radical de paradigma na integração da ciência com a espiritualidade. Acentua, também, que suas idéias são diferentes das idéias de Capra e Zukov, pois por trás das idéias destes físicos permanece a causalidade derivada da matéria. Apesar destes pesquisadores reconhecerem a importância da consciência e da espiritualidade, consideram a consciência apenas como um epifenômeno ou fenômeno secundário, resultante de interações químicas e hormonais no cérebro. Mas, esta não é a espiritualidade pregada por Jesus, nem admitida pelos espíritas e espiritualistas sérios e místicos de tantas religiões ocidentais, como o Budismo, o taoísmo, etc. Assim, este conhecimento não levará a nenhuma mudança de paradigma no pensamento científico por não estimular a ciência ao estudo sério da consciência.

Segundo Goswami, outros autores vêm trazendo luz sobre o assunto e pondo mais lenha na fogueira, afirmando que (4):

 

[...] a ciência atual revelou os paradoxos quânticos, mas também, tem mostrado sua real incompetência em explicar fenômenos paradoxais e anômalos, tais como, os fenômenos paranormais estudados pela parapsicologia e até mesmo a criatividade. Mesmo assuntos tradicionais, como a percepção e a evolução biológica, ainda não foram devidamente explicadas pelas teorias materialistas. Para dar um exemplo, em Biologia há o que chamamos de “equilíbrio pontuado”. O significado disso é que a evolução não é apenas lenta, como Darwin reconheceu, mas também há períodos de evolução rápida, que são conhecidos como “marcas pontuais”. Mas, a Biologia tradicional não tem explicações adequadas para isso.

 

Contudo, se fizermos ciência com base na consciência, sob o primado da consciência, então, poderemos ver criatividade neste fenômeno, criatividade real, derivada da consciência. Em outras palavras, podemos verdadeiramente ver que a consciência está atuando criativamente tanto na Biologia como na evolução das espécies. E, assim, podemos preencher estas falhas que a Biologia convencional não pode explicar, por derivarem essencialmente de idéias de ordem espiritual, tais como a consciência como criadora do mundo.

 

Colocar a consciência, dizemos nós – o espírito, como força criadora do mundo material é uma realidade que os físicos não desejam e não querem ouvir por ser radical demais, mas através dessa realidade torna-se fácil explicar porque na física quântica as partículas não são vistas como coisas definidas, como estamos acostumados a ver na vida real, isto é, na forma como nos ensinou a física clássica de Newton, objetos que podem se mover em todas as direções e com trajetórias bem definidas. A física quântica não vê os objetos (partículas) dessa maneira, ela os vê como possibilidades, ondas de possibilidade. Então, resulta a pergunta: o que converte possibilidade em realidade, já que, quando vemos, nós vemos eventos e coisas reais? Quando você vê uma mesa, você vê uma mesa real, não uma possibilidade de mesa. Na física quântica, este é o “paradoxo da medição quântica”. Segundo Goswami, o que está por trás desse paradoxo da matéria é a força criadora da consciência.

Segundo os materialistas, o corpo humano e com ele o nosso cérebro, tudo é, na sua essência, constituído de átomos e partículas elementares. Então, segundo a teoria quântica, como pode esse cérebro converter as ondas de possibilidade que residem nele mesmo (o cérebro real), se falta aí a eficácia da causalidade? Ele próprio (o cérebro) é feito de ondas de possibilidade e partículas elementares, portanto, teoricamente, ele pode converter suas ondas de possibilidade em ondas de realidade, mas não o faz. Então, o que converte onda de possibilidade em realidade? É a consciência, responde Goswami, porque ela não obedece à física quântica: por não ser constituída de matéria e ser de natureza transcendental, o mundo material é manifestado por meio dela. Essa mesma discordância, mudando-se consciência por espírito, é a mesma que existe entre ciência e espiritualismo.

Tanto no seu livro, como na entrevista em referência, Goswami se estende em explicações sobre o Universo e também sobre o “princípio antrópico”, adotado por astrônomos e cosmologistas, que afirmam que o universo tem um propósito. Essa crença decorre do fato de que existem tantas coincidências, há tantos ajustes finos, que os levam a crer que o Universo tem um propósito – o de servir aos seres vivos, principalmente ao homem. Não deixa de mencionar, também, as chamadas curas quânticas, nas quais o pensamento tem papel relevante.

Finalmente, devemos destacar a importância do “princípio da não-localidade”, a fim de podermos entender as idéias de Goswami. Segundo ele, é a consciência não-local que tudo penetra e permeia e, não estando contida em lugar algum, está contida em todos os lugares. É por meio dessa consciência não-local que se pode entender e perceber a conexão que existe entre todas as coisas do Universo. Ele passa-nos a idéia de que, por trás da realidade do mundo material que vemos e observamos, existe algo como uma matriz, um molde de tudo que é criado. É esse molde ou teia que permeia tudo que existe e que conecta tudo com tudo.

 

i Sheldrake e o campo morfogenético

 

Rupert Sheldrake (1942 – atual) é filho de uma tradicional família inglesa. Estudou fisiologia vegetal e filosofia, em Cambridge e Harvard (12). Como membro pesquisador da renomada Sociedade Real (Royal Society), desenvolveu um projeto científico sobre o envelhecimento de células. Foi também docente convidado na Alemanha, nos EUA e na Malásia. Viveu vários anos na Índia, onde dirigiu uma equipe que pesquisou a evolução das plantas úteis tropicais e, nesse período, absorveu conhecimentos da filosofia Indiana.

Seu primeiro livro, A New Science of Life (Uma Nova Ciência da Vida), foi publicado em 1981. Neste livro, que caiu como uma bomba sobre o mundo científico, Sheldrake apresentou o fundamento teórico para uma visão nova e revolucionária da gênese morfológica – o surgimento das formas no mundo orgânico e inorgânico. Das publicações científicas, os comentários e reações extravasaram para os jornais e para a mídia radiofônica e televisiva. O establishment científico o baniu, queimando simbolicamente o seu livro e obstou o mais que pôde o acesso de Sheldrake às revistas científicas importantes, como a Nature, que chamou o seu livro de um “tratado aborrecedor” e as suas teorias de “esdrúxulas aberrações científicas”.  Mas, à época, teve os seus seguidores, como Arthur Koestler, que classificou as suas teorias de “incrivelmente estimulantes e desafiadoras”. De outro lado, a revista Sunday Times, apesar de elogiar a sua linguagem como sóbria e clara, afirmou que ele não apresentava provas científicas de suas teses.

Dez anos depois, as disputas sobre suas teorias não perderam o calor das primeiras horas. Sua nova e abrangente obra, lançada em 2001, The Presence of the Past (A Presença do Passado), suscitou e vem suscitando novas controvérsias.

Sua tese principal trata da capacidade de aprendizagem da “criação” e a interação entre o espírito e a matéria. É uma tese que ele mesmo sabe ser difícil comprovar definitivamente. Apesar disso, é tão inacreditável quanto simples. Segundo ele, além dos campos energéticos conhecidos pela ciência, como o gravitacional e o eletromagnético, a natureza possui campos morfogenéticos. Esses campos são definidos por Sheldrake como “estruturas invisíveis e organizadoras, capazes de formar e organizar cristais, plantas e animais, determinando até o seu comportamento”. Como biólogo, ele afirma que estes campos morfogenéticos contêm a soma de toda a história e de toda a evolução, como se fosse algo semelhante ao inconsciente coletivo de C.G. Jung.

Ainda, pela hipótese de Sheldrake, “tudo que vier acontecer, num determinado momento, terá sua conseqüência no futuro, em processos similares. No processo de aprendizagem, por exemplo, o fato de alguma coisa ser aprendida por alguém implica no fato de ela vir a ser aprendida por outrem mais facilmente, onde quer que ele esteja”. Várias experiências levadas a efeito com relação ao processo de aprendizagem e memorização apresentaram evidência e conclusões a favor da hipótese de Sheldrake.

Sheldrake estende o seu conceito da ressonância mórfica a todo o Universo, ao supor que “estruturas similares podem estar em comunicação, no espaço e no tempo”, por meio de seus campos morfogenéticos. Verifica-se, assim, que “o que está em jogo na “bomba” lançada por Sheldrake é, nada mais nada menos, do que uma hipótese científica, que, caso fosse comprovada, derrubaria toda a concepção materialista do Universo”. É essa cosmovisão, que parece surrealista, que pretende colocar uma pá de cal no materialismo científico.

No seu segundo livro, The Presence of the Past (A Presença do Passado), citado anteriormente, ele avança mais um pouco e conjectura a hipótese de a natureza possuir uma memória, com caráter cumulativo. Em virtude disso, essa memória se amplia em cada repetição, a tal ponto que, podemos dizer, as características das coisas provêm de um processo de habituação. Os hábitos não só seriam capazes de construir a natureza de todos os seres vivos, mas também dos cristais, dos átomos das moléculas e, enfim, de todo o cosmo.

A provocação singular desse novo livro, que causou uma verdadeira “tormenta”, poderia ser expressa da seguinte forma: “nossos hábitos pessoais poderiam ser derivados da influência acumulada de nosso comportamento passado, com o qual mantemos uma comunicação por ressonância. Se isto for verdade, nossas experiências passadas não teriam que estar armazenadas de uma forma física em nosso sistema neurossensorial. Isto será válido quando lembrarmos de uma canção, ou de algo que tenha acontecido no ano passado. Seria viável termos acesso ao passado por via direta. Talvez nossa memória nem esteja gravada no cérebro, como pressupomos tão naturalmente”. Nesse sentido, Sheldrake fala de sugestões plausíveis, de possibilidades que ainda estão por ser comprovadas, em termos científicos.

Para comprovar sua hipótese de que a memória não se encontra no cérebro, Sheldrake usa o exemplo da televisão, dizendo que os biólogos e geneticistas que defendem a memória materialista agem como se pretendessem explicar o funcionamento do televisor exclusivamente por meio de conceitos mecânicos e restritos à caixa do aparelho receptor. Todo mundo sabe que as informações que reproduzem as imagens são provenientes de determinados circuitos, localizados dentro do aparelho. Porém, cada televisor recebe suas imagens de uma fonte distante e central, ou seja, dos estúdios de uma emissora de televisão, que as emite por meio de sua estação de transmissão, de um campo invisível capaz de gerar o som e as imagens. Por conseguinte, ainda segundo Sheldrake,

 

nosso cérebro funciona como um aparelho de televisão e os campos morfogenéticos nos transmitem informações de maneira semelhante, não-espacial e não-mecânica. Nosso cérebro, então, seria mais comparável ao aparelho de televisão do que ao programa transmitido. Em outras palavras, aquilo que lembramos não se encontra no nosso cérebro, assim como o comentarista não se encontra dentro da TV.

 

Não é, pois, de se admirar que Sheldrake tenha sido declarado um inimigo da ciência, especialmente do materialismo e teve sua teoria intitulada de “Cavalo de Tróia” pois, “tentava reintroduzir, sorrateiramente, a metafísica no mundo de hoje, depois que a ciência natural a tinha banido definitivamente”.

Talvez a mais radical e séria questão refira-se aos conceitos e leis naturais. Para os cientistas são as leis naturais e imutáveis que fundamentam a ciência; mas, apesar de não discordar desta verdade, para Sheldrake, o cosmo acha-se em constante transformação e evolução, não considerando conceitos e leis como atemporais e imutáveis, afirmando que o que chamamos costumeiramente de “leis naturais”, talvez não passe de costumes da criação. Este parece ser o cerne da questão.

Podem chamar Sheldrake de metafísico, místico hermético ou agnóstico, mas ele é, sobretudo, empírico. O experimento é decisivo, esforça-se em esclarecer. Embora suas hipóteses surjam da intuição, ele se submete ao experimento científico. A ele, Sheldrake se submete.

 

i O Projeto Inteligente (Intelligent Design)

 

O Projeto Inteligente (Intelligent Design) é uma teoria proposta por Michael Behe (6, 7), professor associado de bioquímica da Universidade de Lehigh e autor do livro A caixa preta de Darwin (Darwin´s black box) – The Free Press, 1996. Segundo o Projeto Inteligente, causas inteligentes seriam responsáveis pela origem do universo e da vida, em toda a sua diversidade. Os seguidores dessa teoria, entre os quais se encontra William Dembski, autor de Intelligent design: the bridge between science and theology (O projeto inteligente: a ponte entre a ciência e a teologia) – Cambridge University Press, 1998, sustentam que ela é científica e que oferece provas empíricas da existência de Deus. Ambos são fundadores e diretores do Discovery Institute de Seattle (USA), patrocinado e sustentado por fundações cristãs. Estes autores e seus seguidores acreditam que a Natureza é um livro aberto que demonstra a ação do projeto inteligente nos sistemas vivos, mas, estes autores, em vez de oferecerem indícios positivos para seus pontos de vista, tentam principalmente encontrar fraquezas na teoria da seleção natural de Darwin. No entanto, mesmo que encontrassem fortes e bem sucedidos argumentos contra a seleção natural, não tornaria o Projeto Inteligente mais provável. Atuam fortemente nos Estados Unidos e já conseguiram, em alguns estados americanos, por força de mudanças nas leis estaduais, o ensino dessa teoria nas aulas de ciências para ser uma alternativa à teoria científica da seleção natural de Darwin.

Um grande número de oponentes, cientistas e céticos, alegam que o ID (Intelligent Design) visa criar argumentos que seriam usados pelos criacionistas defensores da Bíblia, dos quais já falamos no capítulo 3 – Os caminhos da evolução – quando confrontamos Evolução versus Criacionismo. Eles rejeitam a teoria da evolução ferrenhamente e até mesmo a vêem como um empecilho muito grande à religiosidade, como, por exemplo, alega o Professor Johnson, Professor de Direito da Universidade de Berkeley.

Para o Professor Phillip E. Johnson, a teoria da seleção natural de Darwin estabelece três posicionamentos, a saber: primeiro que Deus não existe; segundo, que a seleção natural somente poderia ter acontecido aleatoriamente e por acaso e, terceiro e último posicionamento, seja o que for que tenha ocorrido por acaso ou aleatoriamente, não poderia ter sido projetado por Deus. Acreditamos que Johnson não entendeu ou parece não querer entender completamente a teoria da seleção natural de Darwin.

Mas não vamos comentar ou rebater uma corrente ou outra aqui, apenas constatar que ambas se engalfinham em uma luta de morte, em vez do entendimento. Tudo gira em torno da polêmica religião versus ciência em torno da existência ou não de Deus, da origem da vida e da duração do processo de evolução na Terra. Os religiosos e os pseudocientistas desprezam a teoria da evolução pela seleção natural, à qual Darwin dedicou 27 cuidadosos e disciplinados anos de sua vida para gerar o seu tão controvertido livro, publicado com o título simplificado de Evolução das Espécies.

Comentamos apenas que qualquer livre-pensador, cientista ou não, poderá conjecturar algumas hipóteses sobre a evolução da vida na Terra. Por exemplo, Deus poderia ter criado vidas super inteligentes que fazem experiências com seleção natural em outros planetas ou planos existenciais do Universo e transferido o resultado de tais experiências para a Terra, ou mesmo qualquer hipótese que nossa fértil imaginação pudesse sonhar. O que não se pode negar é que a seleção natural existe!

Michael Behe, o autor da teoria do Projeto Inteligente, argumenta que “sistemas irredutivelmente complexos,” como o olho e seus componentes, não poderiam funcionar caso faltasse apenas uma de suas várias partes. Ele afirma que “sistemas irredutivelmente complexos, não podem evoluir de uma maneira Darwiniana” e que, o Projeto Inteligente deve ser responsável por esses sistemas irredutivelmente complexos. Atualmente, este assunto vem merecendo muitos debates de cientistas e biologistas independentes com aqueles comprometidos com o Projeto Inteligente de Behe. O principal contra-argumento dos biologistas é que sistemas biológicos complexos e interdependentes não evoluem como peças individuais, mas sim no seu conjunto e por meio de modificações gradativas ao longo de milênios de evolução. Sempre que Behe se vê encurralado ele se refugia na teologia, dizendo (6): ”Deus pode fazer qualquer coisa que quiser”, ou “Nós somos incompetentes para julgar a inteligência segundo os padrões de Deus”.

Apesar de todo esse debate, o próprio Darwin escreveu: “Caso pudesse ser demonstrado que exista qualquer órgão complexo que não possa ter se formado através de ligeiras modificações, numerosas e sucessivas, minha teoria [da seleção natural] certamente cairia por terra”. Charles Darwin, The Origin of Species. E isso ainda não foi demonstrado!

O próprio DNA é uma estrutura macromolecular complexa. Esta complexidade cresce nas organizações celulares desde as mais simples às mais complexas, gradativamente, ao longo de bilhões de anos de evolução, submetida às leis naturais e imutáveis, das quais as leis da física derivam. Segundo Victor J. Stenger (8):

 

[...] a probabilidade de que o DNA se organize por acaso é de 1040.000 para uma [segundo Fred Hoyle, Evolution from Space [Evolução vinda do espaço], 1981]. Isso é verdadeiro, mas altamente enganoso. O DNA não se organizou puramente por acaso. Agrupou-se devido a uma combinação do acaso com as leis da física. Sem as leis da física, como as conhecemos, a vida na Terra como a conhecemos não teria evoluído no curto prazo de seis bilhões de anos. Foi necessária a força nuclear para ligar os prótons e elétrons ao núcleo dos átomos, o eletromagnetismo para manter átomos e moléculas juntos e a gravidade para manter os ingredientes da vida resultantes presos à superfície da Terra.

 

Possam estas fascinantes idéias inspirar muitos físicos a reexaminarem seus pontos de vista no sentido de voltarem, também, seus estudos para a transcendentalidade, ampliando assim o escopo da ciência e colocando suas brilhantes inteligências a serviço da humanidade.

 

4.      O Mundo invisível

 

Quando dizemos que o mundo invisível é muito maior do que se pensa, tal afirmação vale não apenas em relação à diversidade apresentada pela matéria nas suas diversas formas, inclusive as plasmáticas e plasmáveis, mas também, em relação às forças de todo tipo e de todas as espécies, sejam elas puramente físicas ou transcendentes, isto é, de natureza espiritual.

Com relação à matéria, toda ela é invisível quando considerada na sua essência estrutural como moléculas individuais, quer sejam formadas pela junção de dois ou mais átomos idênticos (substâncias puras) ou pela combinação dos diversos átomos entre si para formar as mais diversas substâncias compostas da Natureza. O que de fato dá visibilidade à matéria é a sua aglomeração em volume e massa superior ao comprimento das radiações luminosas nela refletidas.

Ainda como matéria, salvo pouquíssimas exceções, todos os gases (forças de coesão menores que as forças de repulsão), mesmo aglomerados em grandes massas, são invisíveis. Assim, o hidrogênio, o oxigênio, o nitrogênio, todos os gases nobres (argônio, neônio, xenônio, criptônio e radônio), misturas de gases (como o ar), gases combinados, como o monóxido de carbono, o dióxido de carbono, etc., são todos eles, quando puros, completamente invisíveis, nas condições normais de temperatura e pressão. Já as substâncias no estado líquido (força de coesão igual à força de repulsão) ou no estado sólido (força de coesão maior que a força de repulsão) são todas visíveis; um exemplo clássico de uma substância que pode existir no três estados mencionados é a água – ela tanto pode se apresentar no estado sólido (gelo ou neve), quanto no líquido (água comum) ou no vapor (vapor de água, umidade).

Resta-nos mencionar, ainda, o chamado quarto estado da matéria, o plasma, que é constituído por gases ionizados existentes a altíssimas temperaturas. O estado plásmico ou plasmático apresenta-se na forma de um movimento térmico muito grande, envolvendo os seus íons positivos e negativos, tendo propriedades diferentes da matéria básica da qual proveio, seja ela sólida, líquida ou gasosa. Por exemplo, a água acima de 2000ºC a qualquer pressão passa ao estado plasmático, cessando toda e qualquer possibilidade de reação química e a 5000ºC se decompõe totalmente em seus elementos – o hidrogênio e oxigênio, ambos então, no estado plasmático. Encontramos exemplos de gases no estado plasmático na atmosfera incandescente do sol e nas estrelas, em geral. No seu conjunto, o plasma é neutro, já que contém uma quantidade igual de partículas carregadas positiva e negativamente, mas a interação destas cargas dá ao plasma uma grande variedade de propriedades diferentes das dos gases e, embora neutro, suas partículas são suscetíveis aos campos eletromagnéticos, reorientando-se as suas cargas de acordo com a lei da atração física. A física do plasma é um dos ramos mais adiantados do progresso científico. Quanto à visibilidade, o quarto estado da matéria é invisível, ou visível apenas em condições especiais.

Há ainda uma nova matéria, a matéria escura, que se admite existir por toda a parte, representando 90% ou mais da massa total do Universo. Esta matéria se interpõe no espaço sideral e intergaláctico, sem a qual seria difícil explicar as forças gravitacionais que mantêm a ordem no Universo e contrabalança a sua expansão. Este é um assunto do mais alto interesse dos físicos em nosso tempo.

Finalmente, há um tipo de matéria, o fluido cósmico, que a Física não cogita ou não estudou ainda, mas que é intuitivo e cujo conceito é facilmente admitido pelos espíritas e espiritualistas. Trata-se da matéria plasmável pela Força Inteligente, em que a coesão entre as moléculas é baixíssima, tornando-a uma espécie de matéria sutil, de baixíssima densidade. Trata-se, evidentemente, de matéria invisível e impalpável, quase imponderável tão tênue ela é. Assim como o vapor de água pode se rarefazer e tornar-se invisível (vapor seco) ou condensar, formando água que com ele fica em equilíbrio e se torna visível, o fluido cósmico é, também, dotado de expansibilidade e condensação. Sua natureza e composição são próprias e dela nada sabemos. Esse tipo de matéria não possui as propriedades da matéria tangível, tal como é conhecida pela ciência oficial e, ainda, não foi submetida à análise química. Um exemplo material que se assemelha à existência desse fluido seria a cabeleira ou a cauda dos cometas, visível apenas porque se acha carregado de poeira cósmica. Seria a matéria escura dos cientistas o fluido cósmico dos espíritas e espiritualistas?

Admite-se que o fluido cósmico possa existir em dois estados distintos: o de tenuidade ou imponderabilidade, que pode ser considerado o estado normal ou primitivo e o de condensação, em que sua materialidade se torna perceptível. Isso equivale a dizer que o fluido cósmico pode passar de matéria intangível ao estado de matéria tangível, da mesma forma que o vapor de água invisível pode condensar-se em água, visível. 

É fácil de compreender que cada um desses dois estados (tenuidade e condensação) necessariamente dá lugar a fenômenos diferenciados. No estado de condensação, ele seria responsável pelos fenômenos do mundo visível, enquanto que no estado de tenuidade ele daria lugar aos fenômenos do mundo invisível. Os primeiros chamados fenômenos materiais são do campo da Ciência propriamente dita; os outros, invisíveis, são qualificados de fenômenos paranormais ou espirituais, porque se ligam à existência do espírito. É óbvio que o estudo de um dos estados não seria completo, sem o estudo do outro, inclusive para se saber como um interage com o outro.

 

5.      A parapsicologia e os fenômenos inexplicáveis

 

O termo Parapsicologia surgiu pela primeira vez em 1889 e é atribuído ao estudioso alemão, de Stuttgart, Max Dessoir e veio para englobar o estudo de fenômenos inexplicáveis – os chamados fenômenos ocultos, que não eram tratados nem pela psicologia clássica nem por qualquer das ciências naturais existentes, pretendendo imprimir-lhe foro de ciência. Segundo Robert Amadou (9): “A parapsicologia não se confunde com uma teologia; não se confunde com uma religião, como o Espiritismo, nem com uma filosofia, como o ocultismo; a parapsicologia aspira a ser uma ciência”. Contudo, decorridos mais de 100 anos, só recentemente foi reconhecida como ciência e a maior parte dos fenômenos que engloba continua sem explicação e poucos foram aceitos pela ciência. A esses fenômenos, a Parapsicologia aplica, atualmente, a denominação genérica de fenômenos paranormais.

Embora não sendo o objetivo de nossa obra fazer um ensaio crítico dos conhecimentos da Parapsicologia, vale a pena notar que, durante o século XX, três correntes subsistiram (9): a primeira das três, a corrente francesa, conservadora, representada por Robert Amadou, manteve a dicotomia natural-sobrenatural; a segunda, a corrente russa, sob o comando de L. L. Vasiliev, se interessou pelos aspectos práticos da telepatia; e por último, a corrente americana da escola de Joseph Banks Rhine, da Universidade de Duke, postulando que era necessário “o avanço dessa ciência na área do sobrenatural, para reduzi-lo ao natural”, isto é, procurou dar um tratamento segundo uma perspectiva histórico-científica. Houve progressos também na Inglaterra (Soal, Price e Watheley Carington), que desenvolveram teorias sobre a sobrevivência mental ou psíquica do homem e na Alemanha (Rudolphe Tischner), que fez o mesmo que os pesquisadores ingleses. É de se notar que a escola de Rhine atingiu os mais amplos resultados, mas a partir de 1965, suas pesquisas foram interrompidas, sob a alegação da direção da Universidade Duke que “suas pesquisas não atingiram objetivos práticos”. Daí, em seguida, Rhine ter criado a sua Foundation for Research of the Nature of Man (Fundação para a Pesquisa da Natureza do Homem).

Com a realização do Primeiro Congresso Internacional de Parapsicologia – Utrecht, em 1953, Robert Thouless e B. P. Wiesner (10) propuseram a troca da denominação de tais ocorrências paranormais para fenômenos PSI, provocados pela função PSI (do grego, psykhê = alma). Esta função foi subdividida em duas classes: a primeira delas é chamada de função psi-gamma, responsável pelos fenômenos de natureza subjetiva como a telepatia, clarividência, precognição e pós-cognição, etc. e, a segunda, de função psi-kappa, responsável pelos fenômenos de natureza objetiva, nos quais se observam movimento, alteração, modificação ou quaisquer outras operações sobre os objetos materiais, como a psicocinesia, fantasmas, ectoplasmias, mesas giratórias, etc.

Thouless e Wiesner formularam uma hipótese de trabalho acerca da origem da “função PSI”. Admitiram a existência de uma entidade psíquica que opera não só nas atividades cognitivas normais e paranormais, como também é capaz de interagir tanto com os objetos e cérebros externos como com o cérebro e o sistema nervoso do indivíduo em cujo corpo ela se situa. Deram a essa curiosa entidade o nome de shin, cuja pronúncia corresponde à vigésima primeira letra do alfabeto hebraico. Segundo eles, “shin” seria a causa de todas as funções psíquicas normais e paranormais, enquanto que, como efeito, teria a “função PSI” para designar o conjunto das funções paranormais, na qual psi-gamma é a função subjetiva (ESP, segundo Rhine) e psi-kappa é a função objetiva (PK, segundo Rhine). Afinal de contas, tudo isso como artifício para (10) “contornar o velho problema do espírito, cuja conotação religiosa e metafísica constitui o maior percalço para a sua aceitação pela ciência oficial”.

Atualmente, de modo geral, usa-se a nomenclatura de J. B. Rhine: ESP (extrasensorial perception) ou em português, PES (percepção extra-sensorial) e para designar os fenômenos objetivos, usa-se a denominação PK (psychokinesis = psicocinese).

Um grande número de fenômenos, como sonhos premonitórios, os casos de avisos de morte, os de transmissão de pensamento (telepatia), de influências à distância e de percepção extra-sensorial de alguns fatos que ocorrem a pequenas e grandes distâncias foram cautelosamente estudados pela Parapsicologia, que já admite a realidade de tais fatos, classificando-os como “fenômenos paranormais”. Mas a ciência, embora se mostre aparentemente aberta aos fatos novos, mantém rigorosa cautela a respeito de questões que parecem envolver problemas ligados à natureza espiritual do homem.

Estaria uma “mente” exterior agindo sobre tais objetos? Ou seja, seria a ESP uma resposta a um estímulo exterior, sem o concurso dos cinco sentidos físicos normais? É válido imaginar-se, como hipótese, uma “mente” imaterial capaz de agir direta e mecanicamente sobre os objetos materiais, para explicitar os fenômenos objetivos do tipo PK - psicocinese?  São questões ainda não resolvidas pela ciência.

Todos os fenômenos que ocorrem no mundo invisível, sob a ação de uma Força Inteligente, são e continuarão sendo inexplicáveis pela ciência oficial, enquanto ela não tiver um melhor conhecimento do que seja a Força Inteligente. Para os espíritas e espiritualistas, tais fenômenos têm o nome genérico de fenômenos anímicos ou fenômenos psíquicos e têm a ver com a variação dos campos biopsíquicos do homem, por ação da Força Inteligente.

Segundo esse enfoque, podemos classificar tais fenômenos em dois tipos: fenômenos mediânicos e fenômenos mediúnicos. Nos primeiros, a Força Inteligente atua sobre objetos materiais, dando-lhes movimento ou, então, materializam de alguma forma, os fluidos (matéria tênue e invisível ao nosso sentido da visão). Já nos fenômenos mediúnicos, a Força Inteligente interage de alguma forma diretamente com pessoas ou entre pessoas.

Entre os primeiros fenômenos podemos citar a psicografia, as materializações, as fotografias mediânicas, as mesas giratórias, o caimento de pedras, aparições, etc.

Entre os segundos podemos incluir a mediunidade em suas diversas formas e graus, como a mediunidade intuitiva ou intuição, a mediunidade olfativa, a mediunidade auditiva, a mediunidade de vidência, a telepatia. Como fenômeno misto ou global, encontramos a incorporação mediúnica.

A admissão dessa Força Inteligente explicaria, também, os fenômenos anímicos desenvolvidos por Mesmer – daí o nome de mesmerismo a esses fenômenos, do qual o sonambulismo é uma modalidade, bem como o hipnotismo ou transe hipnótico, cujo conhecimento, também deriva do mesmerismo, originalmente tido como magnetismo humano ou força vital. Mesmer, Charcot e outros seguidores deram os primeiros passos.

 

6.      Visão Espiritualista da Força Inteligente

 

Na visão espiritualista, todo o Universo se constitui de Força e Matéria, sendo esta última a formar todas as substâncias e corpos e a primeira a animá-los. Mas aqui o conceito de Força vai muito além do conceito ensinado pela Física, conforme mostrado no Capítulo 2 – Força e Matéria, que apresentamos na primeira parte dessa obra.

A Força Inteligente está presente em todo o Universo e permeia todo e qualquer tipo de matéria, seja ela inorgânica, orgânica ou organizada, bem como todas as células vivas individualmente e, no seu conjunto, em cada ser vivo. Ela é o agente ativo que, atuando sobre a matéria, que é o agente passivo, subjaz à estrutura atômica da matéria e, nos seres vivos (plantas e animais), subjaz às células, dando-lhes vida. Aqui, precisaríamos estender o conceito de vida também aos minerais, conforme já adiantamos quando tratamos da Evolução, na primeira parte desse livro. Assim, segundo Luiz de Mattos (2), teríamos: “            1) no reino mineral – força inteligente incipiente, resultante da vibração atômica e molecular na matéria amorfa e dos arranjos cristalinos nos cristais; 2) no reino vegetal – força inteligente e vida incipiente, fixa, sem mobilidade apreciável; 3) no reino animal – força inteligente, vida plena e inteligência, com mobilidade;”

No homem, temos: a força inteligente, a vida plena e inteligência plena, com livre-arbítrio e demais atributos da força, que, a partir daqui, recebe o nome de espírito.

Ainda, segundo Luiz de Mattos (2), “Não se deve inferir, daí, a inexistência de vida no reino mineral nem a de inteligência no reino vegetal. Apenas se menciona a predominância dos atributos fundamentais apontados, para facilitar a compreensão do leitor, dada a transcendentalidade do assunto”. E mais adiante: “[...] Força e Matéria são o princípio e o fim, são unidades que se tocam nos seus extremos, que correm paralelas e que, na sua incomensurabilidade, abrangem o infinito e envolvem o Universo”.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) MATTOS, Luiz de. Pela Verdade – a Ação do espírito sobre a matéria. – 9.ed, Rio de Janeiro: Centro Redentor, 1983. p 216

 2) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 43ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2004. p. 50 e 51.

 3) BOHM, David. The Implicate Order. Artigo de autoria desconhecida.  Disponível em: https://www.bizcharts.com/stoa_del_sol/plenum/plenum_3.html.  Acesso em: 25 out. 2005. Tradução e adaptação de Caruso Samel.

 4) GOSWAMI, Amit. An interview with Amit Gosvami: the self aware universe. Disponível em https://twm.co.nz/goswam2.htm. Acesso em 15/09/05.

 5) TALBOT, Michael. The universe as an hologram. Disponível em: https://twm.co.nz/hologram.html . Acesso em: 28 nov. 2005.

 6) BOHM, David. The holographic universe. Disponível em: https://twm.co.nz/gozwam2.html. Acesso em: 28 nov. 2005.

 7) Intelligente Design Network. Intelligent Design. Disponível em: https://www.intelligentdesignnetwork.org. Acesso em: 28 nov. 2005

 8) STENGER, Victor J. Intelligent Design. Disponível em: https://www.talkorigin.org/faqs/sosmo.html . Acesso em: 28 nov. 2005.

 9) AMADOU, R. Parapsicologia – um ensaio histórico e crítico. São Paulo: Mestre Jou, 1966, p. 29

10) ANDRADE, Hernani Guimarães. O que é psi? . Revista de Espiritismo, São Paulo, n. 27, 2. trim. 1995. Disponível em: https://www.espírito.org.br/portal/artigos/fep/o-que-eh-psi.html.  Acesso em 26 nov. 2005.

11) CAPRA, Fritjof. O Tao da Física. 2.ed. São Paulo: Cultrix, 1983.

12) SHELDRAKE, Rupert. Sheldrake e os campos mormogenéticos. Disponível em: https://www.pfilosofia.pop.com.br/03_filosofia/03_07.leia_tambem/09.htm. Acesso em: 18 dez. 2005.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 9

 

 

A PRIMAZIA DO ESPÍRITO

 

O espírito é luz, é inteligência, é vida, é poder criador e realizador. Nele não há matéria em nenhum dos seus estados. É, portanto, imaterial. Partícula individualizada, assim se conserva em toda a trajetória que faz no processo da sua evolução.

 

Ele é indivisível, eterno, e evolui para o aperfeiçoamento cada vez maior. Como partícula do Todo, é inseparável dele e subsiste a qualquer transformação, nada havendo que o possa destruir.

 Luiz de Mattos, Codificador do Racionalismo Cristão.

 

 

1.      Natureza do Espírito

 

Vimos, no capítulo anterior, como a Força Inteligente percorre todos os reinos da natureza criando, organizando, dirigindo, direcionando e acompanhando a Evolução das Espécies, apresentada no capítulo 3. Aqui, nós vamos tratar do Espírito e sua evolução, com fundamento nos conhecimentos espiritualistas. Na literatura filosófica e científica, mais nesta última, há muita confusão sobre o que seja o espírito e a consciência. Atualmente, milhares de trabalhos e ensaios vêm sendo escritos por psicólogos e neurocientistas com embasamento nas pesquisas sobre a consciência cognitiva, de cunho exclusivamente comportamental e materialista, que nada tem a ver com a natureza do espírito e seus atributos, confundindo-se espírito com consciência, esta que é tão somente um de seus atributos ou faculdades.

Vimos, também, no capítulo 6, num relance histórico, como surgiram os pioneiros do Espiritismo e seus experimentos e, no capítulo 7, apresentamos os codificadores do moderno espiritualismo nas figuras de Luiz de Mattos, Luiz Alves Thomaz e Antônio do Nascimento Cottas, personalidades ainda pouco conhecidas pela ciência oficial, que lançaram as bases de uma filosofia para o nosso tempo, doutrina praticada através do Racionalismo Cristão (1).

Durante a segunda metade do século XX, numerosos casos de reencarnação comprovados foram estudados por Ian Stevenson (3) e colaboradores. Seguiram-se os estudos e pesquisas sobre os fenômenos de experiência fora do corpo (EFC ou OBE – out-of-body experience, em inglês) e experiências de quase-morte (EQM ou NDE – near-death esperience, em inglês), trazidas ao conhecimento de toda gente por Raymond A. Moody, Jr. (4). Estes pesquisadores, desde 1966, vêm revelando centenas de casos comprovados, reforçando as evidências da existência do espírito e do processo reencarnatório, isto é, expondo a existência da vida do espírito após a sua desencarnação. Sobre estes e outros assuntos, trataremos agora e nos capítulos seguintes.

Nas duas últimas décadas do século XX e durante o início deste século, alguns psicólogos e psiquiatras de renome estabeleceram as bases analíticas para a terapia dos fenômenos de regressão às vidas passadas, nos relatos do psicólogo Patrick Drouot (5, 6) e do psiquiatra Brian Weiss (7, 8), cujas experiências, relatadas em seus livros, trouxeram muitos indícios e novas evidências sobre a existência da alma (espírito) e sua imortalidade, expondo ao público um grande número de fenômenos, até então, exclusivamente do domínio do Espiritismo e do espiritualismo. Além dos pesquisadores citados, numerosas outras experiências foram relatadas por dezenas de autores e pesquisadores em centenas de livros de ampla divulgação na atualidade, em todo o mundo, e, também por meio de artigos divulgados via Internet.

Mas, afinal o que é o espírito? Ao longo de toda a historia humana sempre houve especulação filosófica e metafísica sobre a existência de uma força, associada ao corpo humano, presente na vida de todas as pessoas. Após percorrer todos os reinos da natureza, a partir de seu último estágio como animal, a Força Inteligente, depois de adquirir os atributos da consciência e do livre-arbítrio, além de outros, passa a ser conhecida como Espírito e, daí em diante, começa a atuar em corpo humano. Sobre o Espírito, que tem um longo caminho evolutivo pela frente, o Racionalismo Cristão assim se expressa, desde 1910, à página 85 da obra citada (1):

 

O espírito é luz, é inteligência, é vida, é poder criador e realizador. Nele não há matéria em nenhum dos seus estados. É, portanto, imaterial. Partícula individualizada, assim se conserva em toda a trajetória que faz no processo da sua evolução. Ele é indivisível, eterno, e evolui para o aperfeiçoamento cada vez maior. Como partícula do Todo, é inseparável dele e subsiste a qualquer transformação, nada havendo que o possa destruir.

 

E ainda, mais adiante, sobre o campo de abrangência do espírito, quando desencarnado, a mesma referência assim se expressa (1):

 

No espaço indimensionável do Universo, em que a Inteligência vibra, sem interrupção, acusando permanente ação consciente e constantes demonstrações de vida, agita o espírito a sua força intranuclear que se exprime, em todas as atividades, por movimentos vibratórios. Esses movimentos são irradiados de um núcleo de Força, que é o espírito, no oceano de uma essência idêntica, que é o Todo, assinalando o poder atrativo que faz com que atributos desse Todo convirjam para o núcleo, desenvolvendo-o e dando-lhe maior potencialidade.

 

Trata-se de uma antevisão intuitiva e esclarecedora sobre a existência da Vida fora da Matéria (2), título de outro livro esclarecedor publicado na década de 20 do século passado. Este livro tem o enfoque de esclarecer as pessoas sobre os fenômenos psíquicos, através de numerosas e magníficas gravuras em policromia, realizadas por um artista com visão mediúnica, sob a orientação de Luiz de Mattos, fundador e codificador do Racionalismo Cristão.

Estes dois livros citados (1, 2) constituem a base dos ensinamentos espiritualistas prodigalizados pelo Racionalismo Cristão, totalmente desprovidos de qualquer tipo de misticismo. Embora correndo o risco de sermos omissos, procuramos gerar, a seguir, um texto menos completo, mas bastante simples. Nele, o leitor encontrará uma exposição clara sobre o que é o espírito e seus atributos, bem como, sobre a sua encarnação desencarnação.

 

2.      Principais Atributos do Espírito

 

É de fácil compreensão entender que os atributos do espírito são suas faculdades e constituem seus predicados. São incontáveis os atributos do espírito; segundo (1), eles “aumentam e se desdobram na razão direta do seu crescimento como ser evolucionário”. Todos esses atributos são inerentes ao espírito, que no homem constitui a sua força ativa ou força vital, partícula individualizada da Inteligência Universal, imaterial, invisível e dissociada da matéria, mas que com esta, constitui o nosso corpo físico.

A título de esclarecimento para aqueles que não estão habituados a pensar nessa dualidade Força e Matéria, como vimos explicando e defendendo ao longo dessa obra, vamos iniciar expondo os principais atributos do espírito, a saber: a força de vontade, a consciência de si mesmo, a inteligência, a capacidade de percepção, o raciocínio, o poder criador, o equilíbrio mental, o domínio de si mesmo, a lógica, a sensibilidade e a firmeza do caráter. Sobre o pensamento, dada a sua vital importância nas atividades humanas, tanto as de natureza puramente intelectual, como também, as de natureza meramente finalistas, como ocorre no cotidiano de cada um de nós, vamos dedicar o capítulo 10. O mesmo faremos com relação ao livre-arbítrio e à intuição, em capítulos próprios.

 

i Força de vontade

 

É um dos mais marcantes atributos do espírito. Através dessa poderosa faculdade o espírito exerce o seu poder de querer, para alcançar na vida o que deseja realizar. É ela que imprime determinação às realizações da criatura humana, dotando-a de força para vencer os obstáculos e resolver os problemas que se lhe antepuzerem. Com sua ação, os obstáculos desfazem-se, no limite da capacidade e conhecimento de cada um, superando-os.

Através desse super atributo, conscientemente dirigido para o Bem, o ser humano realiza maravilhas, subjuga todas as paixões, todos os vícios e não se deixa levar por desejos malsãos, realizando o seu progresso material e espiritual. Suas vitórias são progressivas e, os resultados sucessivos reforçam os próximos passos com a certeza de serem bem sucedidos, mesmo nos embates mais árduos da vida. Como expressão de valor a força de vontade é (1) “uma fortaleza inexpugnável para o espírito”.

É preciso não confundir a vontade com o desejo, pois não são a mesma coisa e, muitas vezes assumem posições contrárias. Quando isso acontece, principalmente quando se trata de afastar desejos inferiores de qualquer espécie, a vontade deve intervir com suficiente força para afastar os malefícios que poderiam surgir de uma má ação.

 

i Consciência de si mesmo

 

É por meio da consciência de si mesmo (consciência subjetiva), que o espírito é rigoroso consigo próprio, vez que ninguém melhor do que ele conhece os limites de suas possibilidades e, portanto, só ele pode livremente medir as energias de que dispõe, sem dispersá-las em nenhum momento.

E o que significa isso? Significa saber avaliar a si mesmo, fazendo uma auto-apreciação do verdadeiro sentido daquilo de é capaz. Assumindo atitudes ponderadas e justas, aprende a não dar guarida à vaidade nem à falsa modéstia e passa a agir naturalmente, dentro do que é real e de acordo com o bom senso.

Esse predicado, aliado ao auto-respeito, leva o espírito a respeitar, também, os seus semelhantes de igual para igual, tratando a todos com equanimidade, ou seja, sem empáfia ou arrogância, mas com simplicidade, sabedor que é de que todos têm a mesma origem e o mesmo curso evolutivo a cumprir.

Num sentido mais amplo, é preciso não confundir a consciência com o espírito; deve-se sim considerar a consciência como sua principal inerência, pois é ela que individualiza o espírito e imprime-lhe responsabilidade por seus atos.

É preciso, também, saber diferenciar a consciência de si mesmo ou subjetiva com a consciência objetiva, esta última relacionada com a ação de nosso livre-arbítrio e responsável pela avaliação de nossos erros e acertos durante a nossa vida terrena. Mas, em última instância, a consciência objetiva está sempre subordinada à consciência subjetiva, sendo esta a predominante.

 

i Inteligência

 

Este atributo caracteriza marcadamente a atuação do ser humano em todas as atividades lógicas e criativas do espírito, constituindo a sua principal atividade. Além disso, a inteligência interage e até interfere em outras atividades relacionadas com a percepção sensorial, na forma de inteligência emocional, contribuindo para tornar sua ação sempre efetiva.

A inteligência propugna sempre pelo conhecimento e o aperfeiçoamento do espírito humano e tem o propósito de despertar o ser para as coisas sérias da vida. Por isso mesmo, o espírito, mediante o uso de sua inteligência, está sempre em busca da perfeição em todas as atividades que busca realizar, procurando corrigir as suas falhas e erros. Além disso, da própria inteligência dependem outros atributos espirituais que “se criam, expandem, crescem, ampliam e aprimoram, de acordo com a evolução do espírito (1)”.

É a inteligência que alimenta o raciocínio, suprindo-lhe as idéias necessárias, qualquer que seja o contexto, para que haja os devidos desdobramentos nos processos de discernimento sobre o que é errado e o que é certo para poder fazer as melhores escolhas nas atitudes que o ser humano vier assumir.

 

i Capacidade de percepção

 

É pela capacidade de percepção que o espírito capta, do meio em que vive, as informações de que precisa, sendo este um atributo diretamente ligado ao grau de espiritualidade que o espírito já alcançou no seu processo evolutivo. A capacidade de percepção é, pois, o canal através do qual os recursos de inspiração ou intuição atuam livremente, reforçando as idéias próprias do pensamento e influindo no uso de muitos outros atributos espirituais e nas próprias ações humanas voltadas para o Bem.

Nesta capacidade, intervêm numerosos fatores psicológicos para os quais a linguagem comum encontra dificuldades em definir com precisão, ainda que representem valores reais e facilmente reconhecíveis e aceitáveis. Ela serve tanto nas atitudes arrojadas que a pessoa venha tomar como naquelas em que a cautela ou prudência não deve faltar.

Entre os muitos atributos derivados ou intimamente ligados à capacidade de percepção destacam-se o poder de penetração, a agudeza, a finura, a perspicácia e a sensibilidade do espírito. Todos esses atributos são coadjuvantes da capacidade de percepção e exercem cada um, de per si ou no seu conjunto, poderosa influência no campo observacional do indivíduo, revelando-lhe aquilo que as conveniências tantas vezes escondem, completando a sua base de informação para as tomadas de decisão, que precisará fazer com freqüência. O ser pode, assim, acertar mais e errar menos.

             

i Poder do Raciocínio

 

Com este atributo o ser analisa os fatos e os problemas da vida, oferecendo-lhe condições seguras para tirar as melhores lições de tudo que lhe acontece espontaneamente ou não em sua vida.

Ele se vale da observação, da indução e da lógica para fazer deduções acertadas dos obstáculos e dos eventos difíceis da existência terrena de modo a torná-los mais óbvios, claros e compreensivos.

É através do raciocínio sempre alerta que o espírito se norteia durante a sua trajetória evolutiva por esse mundo. Ele é um instrumento poderoso que serve para a criatura não se deixar levar por falsas idéias, crenças, superstições e, inclusive, pelo misticismo. Todos nós sabemos que este último é responsável pela “cegueira da fé e outras subordinações indicativas de formas agudas ou amenas de avassalamento”. (1)

 

i Poder Criador

 

É do poder criador ou faculdade de concepção que derivam as criações do pensamento de todo gênero, o gênio inventivo nas ciências, nas letras e nas artes, enfim, a ele devem ser creditadas todas as realizações, os melhoramentos e as transformações decorrentes da atividade humana.

Ele é a mola mestra e o elemento propulsor de todo o desenvolvimento cultural e científico da humanidade, nos mais diferentes níveis, raças e culturas, levando os povos ao progresso material e ao desenvolvimento espiritual.

É de se notar que quando o poder criador se desenvolve aliado com os nobres sentimentos de desprendimento, abnegação e renúncia, grandes benefícios resultam para a humanidade em geral.

 

i Equilíbrio Mental

 

Nenhum outro atributo é tão relevante para a criatura humana como o equilíbrio mental. Este deriva da rigorosa “apuração dos sentidos, do temperamento bem ajustado às realidades da vida, da serenidade, da compreensão exata das possibilidades e da justa apreciação dos fatos”. (1)

Quem não se controla, torna-se fácil vítima da perturbação reinante no mundo Terra, que pode trazer graves conseqüências à saúde mental e física dos seres.  Muitas filosofias de auto-ajuda cuidam desse importante aspecto, no sentido de passarem aos seres, calma, serenidade, moderação, atitudes ponderadas e moderadas, reflexão, critério de justiça e bom senso. São recursos expressos por todos aqueles que têm equilíbrio mental e, portanto, desejados por qualquer pessoa para poder ter segurança em suas ações e evitar erros comuns e nocivos ao seu bem-estar e ao convívio com seus semelhantes.

Não há espiritualidade redentora sem a lapidação desse atributo, o qual deve merecer constante esforço e cuidados por parte de todos aqueles que buscam uma vida melhor e superior, com alta significação para o seu processo evolutivo.

 

i Lógica

 

É a lógica que suporta o raciocínio lúcido, através da coerência que o ser exerce no desempenho de suas atitudes, ajudando-o a dar o ordenamento necessário aos pensamentos e o embasamento formal às construções das idéias pela linguagem própria do local onde encarnou.

Invariavelmente, o desenvolvimento da lógica resulta do constante estudo, principalmente da matemática e da filosofia, além da observação dos fatos, permitindo assim o aprimoramento espiritual do ser. Portanto, a educação é o seu baluarte, permitindo a formulação racional das idéias e a transformação de hipóteses em teorias com bases firmes, certas, claras, reais e bem aceitas pelas outras pessoas.

O resultado bem fundamentado da lógica, em todas as atividades da vida, demonstra um espírito inteligente, arguto em suas argumentações, capaz de infundir confiança e aceitação de suas idéias por parte de todos.

 

i Domínio de si mesmo

 

Devemos perguntar a nós mesmos: quem está no controle? É por meio do domínio de si mesmo que o espírito assegura o pleno controle de seus atos. Quando bem usado este atributo, a criatura evitará assumir atitudes impulsivas e praticar atos impensados, não cometendo desatinos de qualquer natureza, dos quais venha se arrepender mais tarde, como acontece na maioria das vezes.

Para assegurar o pleno controle de si mesmo o ser humano precisa manter-se sempre consciente de seus atos e policiar-se constantemente. Seu espírito está incessantemente vibrando, atraindo e repelindo correntes de pensamentos favoráveis e desfavoráveis que cruzam o espaço em todas as direções. São estas vibrações que lhe propiciam progresso material e bem-estar espiritual, quando bem atraídas e usadas.

Disso resulta que o ser humano tem o atributo do autodomínio para não se deixar influenciar pelas vibrações adversas e negativas, procurando entrar em sintonia exclusivamente de acordo com a sua vontade, posta a serviço do Bem.

 

i Sensibilidade

 

Sem precisarmos entrar nos meandros da natureza da sensibilidade, podemos afirmar que ela é uma faculdade ou atributo pelo qual o espírito confere ao ser a capacidade de sentir e perceber as vibrações do meio ambiente em que atua. Ela é muito mais que os impulsos causados aos nossos cinco sentidos físicos (visão, audição, olfato, paladar e tato) pelas percepções sensoriais. Por isso mesmo, nós estamos nos referindo aqui à sensibilidade extra-sensorial, que nos permite perceber o que está por detrás das aparências.

A sensibilidade constitui o cerne da inteligência emocional, abrangendo centenas de sentimentos e emoções que dela provém. A empatia, por exemplo, que irmana os seres, sem que haja nenhuma explicação científica para esse nobre sentimento, se revela pela sensibilidade, pelos sentimentos afins, por idênticos ideais e pelas aspirações comuns.

O que se dirá, então, somente para citar mais um exemplo, do sentimento de amor sincero e verdadeiro, que revela a compaixão pelos sofrimentos e dores de nossos semelhantes como se fossem nossos? E os sofrimentos morais, que quando bem compreendidos e juntamente com as dores físicas, despertam o espírito para o verdadeiro sentido da vida?

i Firmeza de Caráter

 

Os melhores e mais nobres sentimento de retidão, dignidade, honestidade e generosidade que permeiam e fundamentam nossas melhores atitudes, derivam diretamente da firmeza de caráter. Esses sentimentos, inequivocamente, contribuem para acelerar a evolução espiritual do ser humano. Aqueles que alimentam a firmeza de caráter em sua forma mais plena dão os mais admiráveis exemplos de valor em todos os atos de sua vida.

Este atributo está sempre vibrando em conjunto com os demais atributos, formando uma combinação harmônica que caracteriza os espíritos de escol. Ele revela todo o amadurecimento espiritual, dando ao ser humano condições de efetiva ascensão aos mundos superiores do espírito alcançando classes evolutivas mais elevadas.

 

3.      Os Mundos Espirituais

 

Apresentamos, no capítulo 1 – O Universo, uma breve descrição do espaço infinito e seus componentes - as galáxias, as estrelas, os planetas, os satélites, os cometas e outros astros de transição, todos de natureza material, uns luminosos, outros não. Esse é o conhecimento científico do Espaço e do Universo que nos é ensinado pela Astronomia e pela Cosmologia.

De acordo com o enfoque espiritualista, levando em conta a evolução da Força Inteligente e, também, do Espírito ao longo de sua trajetória evolutiva pelo Universo, os mundos estão organizados de acordo com sua finalidade e, nesse sentido,  dividem-se em duas grandes categorias: mundos de estágio e mundos de escolaridade, conforme se descreve a seguir.

 

i Mundos de estágio

 

Estes mundos estão organizados para manterem os espíritos em classes ou séries e lhes servem de moradas evolutivas, sendo espiritualmente organizados em trinta e três classes, de acordo com o grau de evolução dos espíritos que contêm. Estas classes são aqui mencionadas apenas – tal a importância da matéria – para facilitar a compreensão dos leitores.

 Após desencarnar, o espírito que foi cumpridor de seus nobres deveres, deixa a atmosfera da Terra e se dirige ao mundo de estágio ou de origem a que pertence, isto é, retorna ao mundo de onde veio quando encarnou, de acordo com o seu grau de evolução. Cada classe de mundos contém apenas espíritos da mesma classe ou grau, como numa escola, sendo lenta, porém segura, a sua evolução nesses estágios. Os espíritos que fazem a sua evolução no planeta Terra pertencem às dezessete primeiras classes, de uma série de trinta e três.

O espírito encarna e reencarna até atingir a décima sétima classe encarnatória. Quando o espírito reencarnante, que já alcançou essa última classe encarnatória (décima sétima), após reencarnar tantas vezes quantas necessárias for, por mérito próprio, ele regressa à mesma décima sétima classe e percebe que não é mais necessário reencarnar, ele se transporta à décima oitava classe. Dizemos, então, que ele terminou o seu Curso aqui na Terra. Dessa classe em diante, o espírito, na condição de Espírito Superior, não necessita mais reencarnar e passa a fazer sua evolução em corpo astral. Daí em diante, só eventualmente, um ou outro espírito encarna no planeta Terra, não por exigência da sua evolução, mas em missão especial para auxiliar a humanidade a levantar-se espiritualmente, numa bela e espontânea manifestação de abnegação e desprendimento.

Há uma categoria de espíritos que, embora pertencentes a certas categorias das classes reencarnantes, não encarnam e se dedicam a auxiliar de forma astral o progresso dos seus semelhantes menos evoluídos, encarnados neste planeta. Estes espíritos, que estagiam nas classes dos mundos opacos, perderam muitas encarnações na Terra sem progredirem e se dispõem a recuperarem o tempo perdido em plano astral, trabalhando sob a tutela de Espíritos Superiores da décima oitava classe em diante (mundos diáfanos e mundos de luz puríssima).

Os mundos espirituais ou astrais estão classificados, como dissemos segundo uma série de trinta e três classes, onde os espíritos se acham distribuídos de acordo com o grau de desenvolvimento de cada um e fazem a sua evolução partindo da seguinte ordem de mundos:

                         

mundos materializados                        espíritos da   1ª à   5ª classe

mundos opacos                         espíritos da   6ª à 11ª classe

mundos brancos                                   espíritos da 12ª à 17ª classe

mundos diáfanos                                  espíritos da 18ª à 25ª classe

mundos de luz puríssima                     espíritos da 26ª à 33ª classe

 

É intuitivo que os espíritos da vigésima sexta à trigésima terceira classe, designados como sendo de luz puríssima, não mantêm mais contato com a Terra. Os espíritos da trigésima terceira classe encontram-se na plenitude de sua evolução e são oniscientes e onipotentes.

Nos mundos de estágio, o espírito toma conhecimento do que se passa nos mundos das classes inferiores à sua, mas ignora o que ocorre nas superiores. Os espíritos das classes inferiores, especialmente os das cinco primeiras, encarnam sob a orientação de outros mais evoluídos das classes superiores à sua. Esses espíritos precisam ser tutelados, como acontece com as crianças que precisam ser levadas à escola.

 

i Mundos de escolaridade

 

Os mundos de escolaridade são aqueles que apresentam condições de vida como as que conhecemos aqui na Terra, com o espírito encarnado em corpo físico. No planeta Terra há uma grande diversidade de espíritos encarnados, provenientes das primeiras dezessete classes vistas acima. Tal propósito ocorre para que os espíritos promovam, entre si, a troca de conhecimentos intelectuais, morais e espirituais. Dessa forma, a evolução dos espíritos se processa mais rapidamente do que em seus mundos próprios, onde não existe nenhuma diversidade para impulsionar o conhecimento.

Sendo a Terra um mundo de escolaridade, em que encarnam espíritos das dezessete primeiras classes, da série de trinta e três, aqui os espíritos encarnados promovem a sua evolução, partindo da primeira classe e chegando à décima sétima. O número de encarnações varia com o desempenho moral e espiritual de cada espírito em cada uma de suas passagens pela Terra (vida terrena). O tempo total de todas as encarnações somadas varia de espírito para espírito, mas se eleva, sempre, a milhares de anos.

A evolução ou ascensão espiritual se faz sempre de uma classe a outra imediatamente superior, sem privilégios nem proteções. Na evolução do espírito impera o princípio de justiça, que se funda na lei da igualdade. Todos os espíritos têm de enfrentar idênticas dificuldades e chegar ao triunfo pelo próprio esforço e mérito.

Inapelavelmente, quando uma encarnação é mal aproveitada resulta a necessidade de repeti-la, tendo o espírito que passar pelas mesmas atribulações da encarnação anterior até conseguir dominar os vícios, as fraquezas e os maus sentimentos e recuperar o tempo perdido. Na medida em que o espírito constata as enormes vantagens da ascensão a classes mais elevadas, ele vive sob o incontido desejo de passar para frente, a fim de alcançar novos conhecimentos e conquistar os mais amplos atributos espirituais.

No mundo correspondente à sua classe, o espírito planeja a sua nova encarnação (reencarnação), da forma como deseja ardentemente, a fim de aproveitá-la ao máximo. Tem como meta, transformar o seu desejo em realizações terrenas e perder o mínimo de tempo aqui na Terra, cumprindo com seus deveres. O seu eventual fracasso poderá tornar inútil o sacrifício de sua encarnação.

Durante suas numerosas encarnações nos mundos de escolaridade, o espírito estará submetido a um grande número de sentimentos e emoções que fazem parte da vida cotidiana. Todos os habitantes do planeta terão que passar por tais experiências, indistintamente. Além disso, todos terão que passar pelas sensações de pobreza e fortuna, alternativamente, para que se complete o quadro de tais emoções. Esse despertar é necessário para que se consolide o verdadeiro sentido da vida espiritual, levando ao esclarecimento do espírito.

O conhecimento alternado da vida em um mundo de escolaridade, como é a Terra e nos mundos de estágio, através de numerosas encarnações, conduz o espírito ao esclarecimento e a um melhor e mais perfeito conhecimento das leis naturais e imutáveis do Universo. É bem verdade que na Terra há muita coisa que se aprender, mas é intuitivo que o campo de trabalho e estudo no Universo é incomensuravelmente maior, conforme nos afirma (1):

 

Para o espírito o Espaço oferece um campo magnífico de trabalho e experiência. O Universo, porém, representa a evolução em marcha. Prendem-se umas às outras – como elos de uma só corrente – estas três expressões: Espaço, Universo e Evolução. Pesquisar o Espaço, por isso, é estudar o Universo e reconhecer a Evolução. Há um dever que a todos atinge por igual: trabalhar para evoluir. Cada qual precisa ocupar o seu lugar e esforçar-se por dar conta das suas atribuições, certo de que tem no Espaço uma posição definida e insubstituível. Milhões de espíritos encarnados no Planeta sentem-se apreensivos por falta de uma bússola norteadora.

 

Este conhecimento, exclusivamente de natureza subjetiva para o espírito enquanto ser encarnado beneficiará milhões e milhões de seres ainda encarnados que precisam concluir o curso na Terra para exercer as suas atividades noutras regiões superiores do Espaço.

 

4.      Encarnação do Espírito

 

Vimos, na apresentação do item anterior, que os espíritos possuem seus mundos próprios e estão distribuídos por classes, de acordo com a evolução já alcançada por cada um. E, também, que os espíritos que evolucionam neste planeta provêm das primeiras dezessete classes, separadas umas das outras, no espaço, na ordem da sua importância.

Os planetas de escolaridade, como a Terra, não são moradas permanentes de nenhum espírito. Pelo enfoque da evolução espiritual, o planeta Terra é um mundo-escola, um verdadeiro laboratório de trabalho e aprendizagem. Nele, o espírito (1) “se instrui, se aperfeiçoa, se desenvolve em tempo mais ou menos longo e em ambiente adequado a produzir a sua evolução”. Porém, os mundos de escolaridade não devem ser moradas temporárias ou permanentes para nenhum espírito desencarnado. Este deve regressar ao seu mundo de origem tão logo desencarne e, não o fazendo, estará usando mal o seu livre-arbítrio em desrespeito às leis naturais e imutáveis.

A heterogeneidade ou diversidade dos habitantes da Terra decorre da intensa mistura dos espíritos encarnantes para a formação dos povos, cada um trazendo, na sua bagagem espiritual, as suas vivências e experiências de encarnações anteriores.  Nesse imenso contexto encarnatório, não é difícil perceber porque (1) “os que sabem mais, os que dispõem de maior tirocínio e de maior lastro de experiência, ensinam aos que sabem menos aquilo que, por seu turno, aprenderam de outros. Exatamente por esse fato é que se vêem, com freqüência, seres de espiritualidade bastante diferente em uma mesma família”. Pois é na família que as pessoas possuem maior proximidade e intimidade para dar largas aos seus melhores e piores sentimentos, sem muitas restrições. Assim, para as pessoas aprenderem as lições da vida, no melhor sentido evolutivo, precisam encontrar no seu semelhante qualidades e conhecimentos que ainda não possuem.

Já sabemos que o espírito é imaterial, invisível e eterno. No entanto, o seu corpo astral ou perispírito, também conhecido como corpo anímico é material, matéria essa tênue, da mesma natureza da substância fluídica do seu mundo de estágio, isto é do mundo de onde provém para encarnar aqui na Terra. Quanto mais adiantados forem os mundos de estágio mais tênue, mais diáfana é a matéria de que se compõem os corpos astrais. A substância é idêntica (o mesmo fluido universal), porém, os perispíritos são tanto mais diáfanos quanto maior for a sua classe ou categoria.

Seguindo a lei da evolução, enquanto estiver abaixo da décima oitava classe, o espírito está sempre determinado a reencarnar. Trata-se de cumprir uma de suas mais importantes missões de acordo com uma das leis naturais e imutáveis – a da reencarnação.

 

5.      Composição do ser humano

 

Uma vez determinado a encarnar o espírito (1) “assiste e acompanha a formação do seu corpo físico durante a gestação, até completar a evolução fetal, quando dele toma posse inteira, absoluta, à natalidade, ficando unido, ligado ao mesmo por cordões fluídicos”. Mediante esse processo, o corpo carnal em formação vai sendo envolvido, molécula a molécula, célula a célula, pelo corpo fluídico do espírito, que fica atuando do lado de fora do corpo da gestante até o momento do corpo da criança vir à luz, quando dele se apossa inteiramente o espírito juntamente com o seu perispírito. Durante a vida do novo ser, o espírito fica apoiado no seu perispírito ou corpo astral e justaposto ao corpo carnal. Daí em diante, durante a sua vida terrena, o novo ser é constituído de três corpos e assim permanece até a desencarnação do espírito (morte do corpo físico):

 

i corpo mental (espírito, do mundo de estágio)

i corpo astral ou perispírito (matéria fluídica, do mundo de estágio)

i corpo carnal ou material (matéria organizada composta, da Terra)

 

De acordo com a nossa fonte (1): “o corpo mental, para o qual estão voltadas as atenções dos estudiosos, é o agente vivo e inteligente que governa os outros dois corpos – o astral e o material – sendo, portanto, responsável por todas as manifestações da vida”. Ele não está submetido à lei da transformação da matéria, sendo indestrutível, imutável e eterno em sua essência.

 

O corpo astral ou perispírito é o elemento que liga os corpos mental e carnal. Ele está preso, partícula por partícula, ao corpo mental, em virtude da vibração permanente que deste recebe. Ele (1) ”envolve todo o corpo carnal, ao qual está unido por cordões fluídicos”. O corpo astral sempre acompanha o corpo mental ou espírito. Assim, por exemplo, durante o sono, quando o espírito se afasta do corpo, ele o faz acompanhado do corpo astral (1), “o qual continua a transmitir o calor e a vida através dos cordões fluídicos já mencionados”. Não há barreiras nem limites para o espírito afastar-se do corpo, pois a ligação perispírito-corpo não se interrompe, devido à (1) “natureza dos cordões fluídicos que se distendem sem limites”. A única exceção é no momento da desencarnação (morte) quando (1) “os corpos mental e astral deixam definitivamente o carnal”.

De acordo com o espiritualismo o corpo carnal pode ser apresentado como uma perfeita e acabada peça escultural (1):

O corpo carnal é uma admirável máquina concebida pela Inteligência Universal para proporcionar ao maquinista – o espírito – os recursos, os elementos, os meios com os quais leva a efeito no planeta Terra um curso de aperfeiçoamento em múltiplas, em inumeráveis encarnações, indispensáveis à sua ascensão a ambiente de maior espiritualidade, num plano mais alto de evolução.

 

6.      Vivência terrena do espírito

 

Nos tempos atuais, a Medicina dispõe de uma parafernália instrumental jamais vista e muitos enigmas materiais do passado deixaram de ser mistérios. Grandes progressos vêm sendo feitos pela neurociência no conhecimento do cérebro e suas numerosas funções. Muitos médicos e pesquisadores já admitem que um grande número de desordens físicas no organismo humano tem causa psíquica. Em decorrência disso, a etiologia de numerosas anormalidades e doenças não apresenta mais segredos para eles, destacando-se entre elas as perturbações emocionais como o estresse, a ansiedade, fobias, etc. Muitas especialidades surgiram em decorrência dessa tendência, de modo que a visão de conjunto dos antigos médicos que exerciam clínica geral foi ficando para trás, com algum prejuízo no enfoque médico global. Atacando exclusivamente os males do corpo, a Medicina continua muito distante de conhecer o ser humano na sua totalidade psicofísica, isto é, como Força e Matéria, procurando no cérebro a presença da consciência e de outras funções psíquicas.

Após a encarnação, o espírito não tem lembranças das vivências de suas encarnações anteriores, delas se isolando por completo, porém, retém no seu subconsciente o registro das experiências e provas pelas quais passou. E, além disso, ele dispõe e pode acessar as tendências viciosas resultantes que trouxe de suas vidas passadas, decorrentes do mau uso que fez do seu livre-arbítrio. Este manancial de informações vai aflorando em sua mente, à medida que dela necessita na vida presente, para corrigir seus erros e maus hábitos.

A lógica intuitiva nos vem dizer que isso representa um grande bem para o espírito. Em primeiro lugar, este esquecimento proposital de fatos ocorridos em suas vidas anteriores, encobertos pelo véu da matéria, impede que venham reconhecer, na presente encarnação, antigos desafetos, que podem estar bem próximos dele, até mesmo dentro da própria família. Isso cria condições para que haja reconciliação entre eles, aproximando-os sem ressentimentos ou malquerenças. Em segundo lugar, sendo privado da visão de seus erros do passado, pode agir livremente em cada nova existência que passar na Terra. Com isso, evita-se ter que passar por eventuais sofrimentos morais, tais como, humilhações, vergonha, arrependimento e outros que alienam a vontade e poderiam tornar sua nova vida insuportável e de pouco proveito evolutivo para o espírito.

De outro lado, o espírito conserva, para sempre, tudo de bom que adquiriu com seu esforço e trabalho. Essa conquista constitui o seu acervo moral e virtuoso, que reforça seu caráter e “presta valiosa colaboração em cada encarnação facilitando a aquisição de novos conhecimentos, de novas qualidades e de melhor apuração de seus atributos“. (1)

Constituem princípios de moral e ética, esta de acordo com a cultura de cada povo, o espírito encarnado cumprir com seus deveres e respeitar as leis próprias de cada nação. Entre os seus deveres, que variam com a idade da pessoa, mencionamos o auto-respeito, o respeito aos seus semelhantes, o amor próprio e o amor sincero por seus semelhantes, a amizade, a educação (moral, cívica e cultural), o trabalho honesto, os exemplos de honradez e honestidade, as ações meritórias em benefício do próximo, o aperfeiçoamento intelectual, o desenvolvimento da inteligência mental e emocional, a luta contra os maus hábitos e contra o medo, a elevação de todos os sentimentos positivos e o abandono dos sentimentos negativos, o zelo pelo trabalho, a eficiência, a convivência familiar e em sociedade em termos civilizados, a integridade de seu caráter, a busca pela verdade dos fatos e das coisas e tantos outros.

Finalmente, é dessa forma que bilhões de espíritos procedem em suas trajetórias evolutivas através de uma longa série de encarnações para promoverem a sua evolução.

 

7.      Desencarnação do Espírito

 

O que é a desencarnação do espírito? A desencarnação do espírito é o afastamento definitivo deste, do seu corpo físico, ou seja, é o fenômeno da morte como nós a conhecemos. A desencarnação não passa de um fenômeno natural na vida dos seres humanos. Na verdade, ela representa o oposto da encarnação ou nascimento. Vimos que o espírito encarna quando se apossa do corpo físico no momento em que o nascituro vem à luz e desencarna no exato momento em que abandona definitivamente esse corpo, isto é, quando o espírito desliga os laços fluídicos que o prendiam ao corpo físico, dele se afastando definitiva e juntamente com seu corpo astral.

Retirando-se o espírito definitivamente do seu corpo físico, este nada mais é do que matéria organizada inerte, sem a sua fonte de vida. Nada pode reverter esse processo. Em conseqüência, o corpo entra imediatamente em decomposição química e biológica, de acordo com leis químicas e biológicas, desfazendo-se em suas moléculas básicas, podendo, inclusive, compor os corpos de outros organismos vivos inferiores, como vermes, minhocas, etc. No caso de cremação do corpo, a decomposição é tipicamente química (combustão), resultando gases na forma de gás carbônico e cinzas, proveniente dos ossos.

 

8.      Encarando o medo da morte

 

Foram as religiões que deram ao momento da morte, na verdade, da passagem do espírito desta vida para a vida espiritual, o significado de enorme tragédia, representada por um grande sentimento de perda. Citando Luiz de Mattos (1): “É natural o sentimento dos que ficam diante da ausência dos que partem O sentimento, sim, o desespero, não. A saudade é compreensível e se admite. A mortificação, jamais”.

Daí a real importância do esclarecimento a respeito de como se processa a evolução do espírito, a sua encarnação, a vida na Terra e a sua desencarnação. É este conhecimento que permite ao ser humano encarar, com naturalidade, a desencarnação, como um processo evolutivo tão normal quanto a encarnação e que tão perfeitamente serve ao desdobramento da vida. Assimilada essa grande verdade, desaparece o medo da morte, tida como algo misterioso e sobrenatural. Desaparece, também, o medo que muita gente tem de ouvir falar em espírito e só por isso, tantas pessoas se afastam desse conhecimento.

Enfocado do ponto de vista do espírito desencarnante, este não sente a separação como os encarnados, pois a realidade espiritual lhe permite “ver” e “sentir” tudo quanto ocorre com os amigos que ficaram como fazia antes. Embora não possa falar com eles, o espírito pode usar o atributo telepático de que dispõe e transmitir-lhes pensamentos (intuições), que os recebem como se fossem seus. Assim também acontece com todos os sentimentos, bons e maus.

No entanto, neste último aspecto reside um grande mal, que leva um grande número de espíritos desencarnantes a quedarem-se na atmosfera da terra, submetidos às influências terrenas, onde preponderam ainda, devido ao estado evolutivo do planeta, muitos sentimentos doentios, perniciosos, obcecantes e obsedantes.  Por isso, é tão necessário que os seres encarnados auxiliem com pensamentos elevados, dignos e honestos os espíritos de seus entes queridos para que possam regressar aos seus mundos de estágio sem problemas, “onde a vida é sentida realisticamente, sem as influências perturbadoras do plano terrestre”. (1)

 

9.      Desencarnações prematuras

 

Normalmente, a desencarnação do espírito ocorre na velhice após a criatura passar pelas quatro fases convencionais da vida terrena: infância, juventude, madureza e velhice. Mas para que isso aconteça é preciso cuidar da saúde física e mental, sempre. Quando isso não acontece, ocorre a desencarnação prematura do espírito. Muitos fatores podem levar o espírito à desencarnação prematura, mas quase todos eles são conseqüências do desrespeito às leis naturais e imutáveis. A violação dessas leis pode causar profundas alterações no ritmo natural da vida, acarretando para o espírito profundos sofrimentos.

Contribuem para a desencarnação prematura das pessoas, os fatores decorrentes da própria evolução do planeta, como terremotos, maremotos, tufões, vendavais, tormentas, mudanças bruscas de temperatura, etc. Além desses fatores, temos a poluição do ar e a insalubridade, surtos epidêmicos, os abundantes meios de contaminação, fatores relacionados ao abuso da tecnologia, a exposição aos riscos por vontade própria ou de terceiros, descuidos no cumprimento do dever e os vícios, estes últimos decorrentes do mau uso do livre-arbítrio. Há, ainda, a considerar os conflitos sociais, a violência urbana, as guerrilhas e as guerras de conquista territorial que ceifam tantas vidas na flor da idade. Essa listagem ficaria incompleta se deixássemos de mencionar os atos tresloucados e a insânia dos malvados e perversos que ocorrem principalmente nas grandes cidades. Todos esses fatores contribuem para a desencarnação prematura das criaturas.

Qualquer que seja o motivo para uma desencarnação prematura, ela corresponde a uma interrupção na trajetória evolutiva do espírito e só pode ser reparada mediante reencarnação para corrigir e retomar o plano evolutivo. Mas, “esta reencarnação não é problema fácil. Os candidatos a reencarnar são numerosíssimos, ultrapassando as possibilidades existentes. Daí, a necessidade de espera. Para não perderem tempo, muitos espíritos decidem encarnar em meios desfavoráveis, dispostos a enfrentar quaisquer dificuldades”. (1)

Há casos excepcionais em que o espírito poderá desencarnar antes de se completarem as quatro fases da existência terrena, sem lhe acarretar qualquer prejuízo evolutivo. É o que ocorre quando um espírito pertencente a uma classe superior a décima sétima decide encarnar, dentro de um planejamento global, para trazer algo de muito especial à humanidade ou contribuir com transformações de ordem moral que venha acelerar o ritmo da evolução na Terra.

 

10. Número de encarnações

 

Há espíritos que por se esforçarem mais e saberem melhor aproveitar o tempo de suas encarnações ascendem mais depressa a uma classe superior. Isso não deixa de causar sofrimento aos recalcitrantes e retardatários, pelo fato de não poderem acompanhar velhos amigos e deles se distanciarem na jornada evolutiva. Tal constrangimento decorre do fato de muitos espíritos encarnarem em grupos e, ainda, em seus mundos de estágio, determinada classe de espíritos poderem observar a sua e as classes que lhes precedem, mas não as que lhe são superiores. Segundo nossa referência (1): “Os que ficam para trás e os que estacionam, perdem o contato com os seus velhos e queridos amigos, companheiros de longas jornadas em muitas e muitas encarnações e sofrem por isso, a dor igual à que sentem os que vêem na Terra desencarnar os entes queridos”.

Contudo, esse contato poderá ser restabelecido, conforme é do conhecimento dos seres nos seus planos espirituais. Comparando com as condições aqui na Terra, é natural que, se uma pessoa anda mais devagar que outra esta se distanciará da primeira. Como a que segue à frente nem sempre está disposta a reduzir os seus passos, a que se atrasou terá que adiantar os seus, se desejar alcançá-la. Dessa lógica intuitiva, pode-se inferir que muitos espíritos decidem encarnar em condições as mais precárias, enfrentando enorme sofrimento na vida terrena, que sabem ser passageiros, para se enriquecerem de conhecimentos e valores morais que os habilitem a ascender à classe imediata. Assim, “com redobrado esforço, conseguem recuperar o tempo que perderam e reaproximar-se, fraternalmente, dos que lhes haviam passado à frente”. (1)

 

11.    Nem céu, nem inferno

 

O ser humano precisa abandonar certas crenças infundadas. Nos mundos espirituais a vida é compreendida e sentida em toda a sua grandeza e inteira realidade, por ser completa a lucidez do espírito e este ter plena consciência da necessidade de evolução e da eternidade da vida. O espírito não tem como se enganar nem enganarem-se uns aos outros. Assim, por exemplo, constatam que não existe céu nem inferno e muito menos julgamento divino. Tudo isso são fantasias inventadas pelas religiões.

Em seus mundos de origem, libertos dos fatores de confusão e perturbação, os espíritos analisam os seus feitos terrenos, o que fizeram de bem e, com verdadeiro pesar, as suas ações condenáveis. Compreendem que todos têm por meta o Astral Superior que é (1) “para onde se dirigem todos os espíritos libertos de suas ligações com a matéria e das influências fluídicas originárias das emoções inferiores de que este planeta está saturado”.

 

12. O lado obscuro da vida

 

Agora que já sabemos como se passa a desencarnação, precisamos saber o que se passa logo que o espírito deixa definitivamente o seu corpo físico, isto é, quando ocorre a morte física do corpo. Os indivíduos, em sua grande maioria, acostumados aos enganos provenientes das crenças que absorveram pela prática religiosa, levaram uma vida exclusivamente materialista e se entregaram a uma vida desregrada e viciosa. Esses espíritos, quando desencarnam, por não possuírem esclarecimentos a respeito da vida espiritual e estarem tão impregnados das emoções causadas pela vida material, nem sequer se apercebem de sua nova realidade. Sua movimentação ou locomoção é função dos seus corpos astrais, a tal ponto que muitos deles se movem passo a passo, como se encarnados estivessem, já que os seus perispíritos se acham impregnados de elementos grosseiros e miasmas obtidos pela conduta viciosa que tiveram.

Nesse estado, com o corpo astral ou perispírito entorpecido e “pesado”, o que lhe dá a impressão de ainda terem o seu corpo físico, vê-se de repente, vagueando pela superfície da Terra (1), “andando como qualquer transeunte, aborrecido com a falta de atenção dos encarnados que não se apercebem, é claro, da sua presença. Não lhes faltam, porém, oportunidades para fazer relações com outros espíritos desencarnados, em situação idêntica”.

Porém, para aqueles que levaram uma vida menos materializada e cumpriram com seus deveres ética e moralmente, seus espíritos deslizam-se na atmosfera da Terra de acordo com a densidade de seus corpos astrais, impulsionados pela ação do pensamento. Mas, por faltarem-lhes, ainda, o conhecimento espiritual, só regressam aos seus mundos de estágio com ajuda espiritual.

Enquanto isso não acontece e, ainda que esses espíritos compreendam com relativa facilidade o fenômeno da desencarnação, continuam perambulando pela atmosfera da Terra e se aproximando dos encarnados segundo a lei da afinidade de pensamentos, atraindo-se os que são afins e repelindo-se os que são contrários. Esse processo causa danos tanto aos espíritos desencarnados como aos encarnados, pela influência astral que exercem muitas vezes seguido de maldades e perversidades de todo gênero.

Apesar de esses espíritos compreenderem, com certa facilidade, o fenômeno da desencarnação, milhões de espíritos desencarnados que estão com seus pensamentos voltados aos acontecimentos da vida terrena continuam sentindo as mesmas emoções e os prazeres que sentiam quando encarnados. Esses pensamentos saturados de materialidade levam tais espíritos a atuarem, por intuição e indução, sobre os seres encarnados, a tal ponto que essa atuação, quando persistente, acaba por tornar-se obsessiva. Conforme a referência (1): “É esse o desejo que os leva a permanecer na atmosfera da Terra, numa atividade semelhante à que tiveram como encarnados. Os que foram médicos, por exemplo, procuram exercer as suas atividades onde encontram mediunidade desenvolvida e desprotegida da disciplina racionalista cristã”.

Os espíritos desencarnados que permanecem na atmosfera da Terra, em desacordo com as leis espirituais, não dispõe de meios para ampliar os seus conhecimentos e não podem nos ensinar, nada além do que já sabiam quando encarnados estavam. Não sabem como se livrar de influências maléficas e deletérias de outros espíritos que estão em idênticas situações, mas que por terem formado falanges podem subjugá-los, cooptando-os para com eles se enfileirarem. Daí, serem sempre prejudiciais as práticas mediúnicas, sem o conhecimento espiritual adequado e sem rigorosa disciplina, qualquer que seja o grau de evolução que tenha alcançado o médium, pois tais comunicações isoladas estarão sujeitas a mistificações quando recebidas em ambientes não apropriados.

 

13.  Astral Inferior – o pior dos mundos

 

Enquanto que Astral Superior se compõe dos mundos de estágios ou de origem (mundos espirituais), onde estagiam os espíritos antes de encarnarem, o astral inferior é uma condição espiritualmente irregular e antinatural abrangida pelo planeta Terra (mundo de escolaridade) e sua atmosfera, onde atuam desenfreadamente os (1) “espíritos que estavam encarnados em todas as classes sociais e que na sua vida de encarnados se deixaram empolgar pelas emoções materiais”. No ambiente do astral inferior impera o misticismo religioso e também não faltam as emoções de baixo nível. Nele, estão presentes todos aqueles que iludiram os seus semelhantes com promessas de céu e ameaças de inferno. E, ainda, segundo (1): “É o paraíso de todos os materialões e gozadores”.

É de fundamental importância saber que nenhum espírito encarna ou reencarna tendo como ponto de partida o astral inferior. Primeiro, ele precisa passar do astral inferior ao mundo espiritual correspondente à sua classe e aí ele se refaz para planejar uma nova encarnação. É, ainda, no astral inferior que os espíritos constatam que não há Deus, nem santos, nem céu, nem inferno. Muitos desses espíritos se tornam zombeteiros e se comprazem em rirem-se dos erros dos encarnados. Aí, os que foram materialistas apegam-se mais ainda a essa idéia, pois o meio não lhe favorece o raciocínio para compreender sua nova realidade e mudar de idéia.

Mais complexa ainda é a situação dos religiosos. Estes, educados no regime do temor infundido pelos dogmas e pelos chamados “livros santos”, se acovardam, inicialmente ao penetrar no astral inferior, impregnados que estão com as idéias do purgatório e do inferno. Assim que constatam que ludibriaram suas legiões de fieis e foram ludibriados, em condição de completa desorientação e perplexidade, perdem a noção do seu atual estado puramente espiritual e se dirigem às igrejas à procura de uma tábua de salvação, que certamente não encontram. Nesses locais, vão encontrar muitos de seus parentes e companheiros de religião, encarnados e desencarnados, piorando a situação de todos. Assim se expressa Luiz de Mattos (1):

 

Não é sem decepção e sofrimento que muitos vêem ruir e desfazer-se o castelo de fantasias que construíram na mente com o abundante material sugestivo da mística religiosa.  Mesmo assim, é tal o apego a santos e aos deuses e tão grande, tão profundamente enraizado o temor de serem castigados, que nem mesmo nesse estado de semiconsciência espiritual são capazes de fazer funcionar o atrofiado raciocínio, para a libertação que tantos benefícios lhes proporcionaria. É relativamente pequena a transformação que o desencarnado observa, ao penetrar no astral inferior: vê que possui um corpo igual ao carnal e enxerga o quadro da vida material terrena como sempre o conheceu.

 

Dá para perceber o grande mal causado pela ignorância espiritual. Sócrates, Platão e, posteriormente, Jesus Cristo já diziam: “a ignorância é o maior mal que assola a humanidade”. A acomodação do desencarnado no astral inferior é nefasta para o espírito, que tem a sua evolução paralisada e, para os encarnados que com ele mantém condições de afinidade de pensamentos. Menciona-se, ainda, que em função da atividade a que se entrega nesse ambiente de baixa espiritualidade, o espírito terá um maior ou menor encargo moral a resgatar em futuras encarnações.

 

14. Vícios e contaminações

 

Um dos aspectos mais nocivos do ação dos espíritos do astral inferior sobre os encarnados reside na expansão aos vícios de toda espécie, aspectos estes que passam despercebidos aos encarnados. Aqueles que foram viciados, quando encarnados, acompanham os viciados de hoje, do mesmo tipo e os induz a intensificarem seus vícios, seja da droga, do fumo, da bebida, da jogatina e até vícios morais relacionados como, por exemplo, a maledicência. Trata-se de dar expansão aos desejos malsãos. Mais freqüentemente, são os obsessores viciados que acompanham as criaturas, que as induzem e as intuem para saciá-los em seus vícios. Não quer isso dizer que o encarnados não têm culpa pelos seus vícios, apenas estamos acentuando que existe aqui uma enorme simbiose de desejos entre os encarnados e desencarnados.

Mas, há outras formas de influências, por igual, muito nocivas aos seres humanas e à humanidade em geral. Quando o ser humano se sujeita às más influências intuitivas do astral inferior, mediante o mau uso que faz de seus pensamentos e sentimentos, resultam desatinos, obsessões, conflitos domésticos, ressentimentos infundados, desentendimentos com a família, prevaricações e infidelidades.

Ocorrem, ainda, muitos acidentes e desastres motivados pelo estado de perturbação em que os espíritos do astral inferior se encontram e podem causar aos seres humanos a mesma perturbação. Até mesmo muitas doenças infecciosas podem ser ocasionadas ou agravadas pelos espíritos do astral inferior, muitas vezes levando tantas criaturas à desencarnação. Nada impede que tais espíritos (1) “colham nos focos de matéria pútrida, os miasmas contaminadores e os depositem no corpo da vítima, aproveitando-se das lesões ou ferimentos expostos, da debilidade do paciente e de todos os elementos favoráveis à propagação ou desenvolvimento do mal”.

Nem tudo de mau, porém, que possa acontecer deve ser atribuído exclusivamente à intuição dos espíritos da astral inferior. E isso porque, cada pessoa possui tendências próprias, temperamento mais ou menos desajustado, pontos de vista próprios, individualidade e livre-arbítrio para fazer suas escolhas e tomar suas próprias decisões. Portanto, a cada indivíduo cabe a responsabilidade pelos sucessos ou fracassos que venha ter na vida, decorrentes de boa ou má ação.

 

15.  Perversidade sem Limites

 

Nós sabemos que um grande contingente de pessoas pauta suas vidas pelos caminhos do mal, da violência, das transgressões legais, agindo como verdadeiros criminosos recalcitrantes. Quando desencarnam, essa perversidade quase ilimitada é retida pelos espíritos do astral inferior que por ação deletéria, induzem e causam tantas e tantas desgraças à humanidade, por intermédio daqueles que se encontram encarnados nas mesmas condições, inclusive quase todos os casos de suicídio. Novamente, aqui temos a aplicação automática da lei das afinidades de pensamentos e sentimentos.

Essas ações nefastas e atrocidades são atenuadas ou até mesmo evitadas por ação do Astral Superior, quando este dispõe de correntes vibratórias fortemente direcionadas para o bem, decorrentes das vibrações do pensamento de seres encarnados e esclarecidos sobre os seus deveres espirituais. São pessoas que conseguem se manter calmas, seguras e capazes de conservar suas mentes limpas e em condições de reagir às investidas de qualquer influência maléfica.

Nós estamos dizendo que a luta do bem contra o mal ocorre, também, em nível espiritual por ser necessária, devido à existência de milhões de espíritos estacionados no astral inferior por pura ignorância dos seus deveres espirituais e por terem vivido uma vida demasiadamente voltada para a matéria, para o crime e para os prazeres fugazes. Valendo-nos, ainda, da referência (1):

 

Os espíritos do astral inferior não ignoram que todos os seres humanos, sem exceção, possuem mediunidade intuitiva e aproveitam desse fato para incutir no mental dos mesmos, idéias absurdas e disparatadas. Daí a razão de andarem certos indivíduos com mania de perseguição, de verem outros as coisas sempre pelo lado negro e de muitos se suporem vítimas de doenças diversas.

 

Tudo isso se efetiva mediante a ação de pensamentos afins, que servem a dois propósitos, de acordo com o pensamento de cada um. De um lado, as forças do astral inferior são atraídas e intervêm na vida das criaturas causando os mais diversos males já relatados ou agravando os já existentes. De outro, é também verdade que os seres humanos podem se defender dessas mesmas forças do mal, usando o vigoroso poder de sua vontade e do pensamento.

 

16. Formação de Falanges

 

Entre os milhões de obsessores que perturbam o equilíbrio da vida terrena há os que possuem grande inteligência, porém foram céticos ou desconhecedores dos deveres próprios da vida espiritual e viveram uma vida demasiadamente desregrada e materializada. Entre estes, temos reis megalomaníacos, presidentes impatrióticos, ministros envaidecidos, magistrados venais, etc. No outro extremo, há os que possuem baixíssima intelectualidade como os mistificadores, os charlatães, as cartomantes, os corruptos de todo tipo, etc. Todos, porém, estão com suas consciências obnubliadas e necessitam de ajuda espiritual para abandonar a atmosfera da Terra e se dirigirem aos seus mundos de estágio.

É intuitivamente lógico que os espíritos que estão no astral inferior também se organizam para, com a união de suas forças vibratórias, realizarem o que melhor lhe aprouverem. Eles procuram clonar suas atividades terrenas. Só que não possuindo o corpo físico e só podendo se materializar em condições muito especiais e com a co-participação de encarnados, agrupam-se e formam as falanges, verdadeiras quadrilhas astrais, para obterem seus fins. Por exemplo, indivíduos que na Terra foram governantes, chefes de empresas, políticos de renome, etc., se não agiram com tirocínio, equidade, altruísmo, justiça e bondade, enfim, com um sentido nitidamente espiritualista em seus cargos, quando desencarnam ingressam no astral inferior, conservando as mesmas inclinações e tendências de mando e prepotência. Outros, os que foram comandados ou o povo em geral, mansos como cordeiros, conservam as inclinações de obediência.

Portanto, nada mais natural que estas falanges sejam dirigidas por um chefe. A afinidade de pensamentos e sentimentos é o elemento de união. Quanto mais perverso o chefe, mais perversos são os seus comandados. É, também, fácil compreender que, não dispondo de seus corpos físicos, as falanges coordenam suas atividades em sintonia com as dos encarnados que se entregam à prática do mal e, também, com os que exercem as atividades de magia negra, candomblés, umbanda e baixo espiritismo.

Há uma infinidade de falanges operando na Terra, com maior ou menor grau de perversidade, em função do grau de inferioridade espiritual dos seus membros, sempre em conluio consciente ou inconsciente com os encarnados que alimentam idênticos sentimentos. O leitor poderá inferir, por si mesmo, as conseqüências da ação do astral inferior sobre os encarnados, através das intuições que os encarnados recebem desses malfeitores astrais. Segundo a referência (1):

 

As falanges que se dispõem a colaborar, nos mais requintados atos de selvageria, assistem aos indivíduos encarnados mais violentos e perversos, do mesmo modo que outras, de instintos menos agressivos, intuem os médiuns de sentimentos idênticos: os macumbeiros, os adivinhadores, os trapaceiros, os oráculos, os arrumadores de negócios, as cartomantes e todos os indivíduos que mercadejam com a credulidade e a ignorância alheia.

A grande maioria dos suicídios, dos casos de loucura, das desavenças, das arruaças, dos conflitos, das agressões, das discussões, das desordens, das intrigas e das convulsões por paixão política, é provocada pela interferência das forças do astral inferior.

Os espíritos que ali estagiam estão todos envolvidos em fluidos densos e grosseiros impregnados de correntes vibratórias malsãs como a inveja, o ciúme, a corrupção, o ódio, a mentira, a ingratidão, a hipocrisia, a traição, a falsidade e outros sentimentos equivalentes.

 

Um grande número de tais espíritos, com o objetivo de melhor enganarem suas vítimas, agem freqüentemente com muita manha e brandura, usando, capiciosamente, expressões de amor ao próximo, palavras doces e melosas nas sessões de baixo espiritismo, como se estivessem exprimindo os mais puros sentimentos. Daí, a necessidade dos incautos procurarem se esclarecer para não se deixarem cair nas malhas desses malfeitores astrais. Lembrem-se: eles conseguem ler os pensamentos de suas vítimas através de suas auras e tiram bom partido disso.

Um aspecto relevante e que passa despercebido a muitas doutrinas espíritas, baixo espiritismo, umbanda, etc. é que os espíritos quedados na atmosfera da Terra e, portanto, estagiados no astral inferior, estão descumprindo a lei espiritual de retorno aos seus mundos de estágio, após desencarnarem. Assim se acham impedidos de cumprir os deveres que lhes são afetos, já que o meio fluídico existente no planeta Terra não lhes é propício. E dessa forma, continuam angariando mais débitos morais pela (1) “submissão aos vícios, pela atrofia e embrutecimento do sentido espiritualista e pela expansão das tendências inferiores vindas de encarnações passadas, que não se interessaram por extinguir”. São ainda da mesma fonte (1):

 

Em tal ambiente, os espíritos estão completamente iludidos a respeito da vida, na dependência de serem despertados para ela. E esse despertar não é fácil, se levarmos em conta a influência dos fluidos perturbadores que os envolvem.

 

Sem a lucidez indispensável ao clareamento do embotado senso do dever, vegetam numa situação inferior à que mantinham quando encarnados, por não disporem no astral inferior de nenhuma possibilidade de melhorar o seu estado espiritual.

 

Enganosos aspectos da vida material podem enlear o espírito, mas apenas enquanto encarnado ou na atmosfera terrestre.

 

Mas este planeta está – como já foi dito – preparado para receber espíritos de dezessete classes diferentes que aqui se misturam, se auxiliam, se confraternizam, trocando conhecimentos.

Não é necessário salientar, mais uma vez, o papel que essa desigualdade de valores representa no processo evolutivo da humanidade. Ela é tão importante, tão valiosa, tão necessária, que até os membros de uma mesma família são, em regra, de espiritualidade diferente.

 

17.  Espíritos bem-intencionados

 

Do que foi exposto nos itens anteriores não se deve inferir que todo o astral inferior se dedica a promover a maldade e a perversidade. Nele, há também espíritos bem intencionados, que quando encarnados tiveram a intenção de serem boas criaturas, mas que não chegaram a despertar para a espiritualidade, para a prática do amor, da justiça e do bem. Não souberam usar o seu raciocínio com inteligência e deixaram se levar pelos enganadores de toda espécie sobre as coisas sérias da vida. Nessas condições, desencarnam em completa inconsciência e ignorância do que seja a vida espiritual e, desnorteados, quedam-se no astral inferior com grande prejuízo para a sua evolução.

Mesmo assim, enquanto esses espíritos bem-intencionados aí permanecerem, continuam estacionados e nada podem fazer de útil à humanidade. É fácil entender a razão disso (1): “as melhores intenções desses espíritos são neutralizadas pela ação fluídica do ambiente, acabando por produzir males cuja intensidade varia de acordo com o seu grau de espiritualidade”.

Mesmo os espíritos bem-intencionados que permanecem na atmosfera da Terra consideram que a vida de desencarnado nesse ambiente é melhor do que a dos encarnados, pois não têm uma série de encargos que tinham quando encarnados e se movimentam com mais facilidade com seus corpos astrais bem mais leves que seus corpos físicos. Convencidos disso se esforçam para levarem os amigos e parentes que deixaram na Terra à desencarnação, não os movendo qualquer sentimento de animosidade. Porém, nos casos de desencarnação prematura, conforme vimos, ocorre um grande atraso à evolução do espírito.

Ressaltamos, novamente, que nenhum espírito reencarna diretamente a partir do astral inferior. Antes terá que regressar aos mundos espirituais próprios à sua classe, quando então, se refaz completamente das perturbações que adquiriram na atmosfera da Terra e, em plena lucidez, faz um exame completo de sua consciência, para só então, programar uma nova encarnação, o que em certas circunstâncias pode levar tempo. É fácil de compreender que, por menor que seja esse tempo, a reencarnação jamais ocorrerá em tempo menor do que a de uma gestação humana bem sucedida.

 

18.  Ascensão aos Mundos de Estágio

 

Muitos espíritos que desencarnam, por se diferenciarem no seu grau de espiritualidade e pela vida regrada e consciente que levaram, não estagiam um só momento no astral inferior e ascendem diretamente aos seus mundos de estágio. São espíritos que souberam viver material e espiritualmente, que se dedicaram ao trabalho honrado e digno, que exerceram pensamentos e ações puras e límpidas, dando exemplos de vida aos seus semelhantes.

É fácil entender isso porque (1), “os que assim vivem e pensam atraem, freqüentemente, as Forças Superiores que os assistem, principalmente no momento da desencarnação, auxiliando-os a transladar-se para os seus mundos”. Para isso, os espíritos do Astral Superior contam com vários pontos de apoio na Terra, através de pessoas altamente espiritualizadas, que agindo disciplinarmente, facilitam o seu trabalho de limpeza astral do planeta. Contam, também, com o apoio das “correntes superiores” organizadas nas Casas Racionalistas Cristãs. Esse arrebatamento de obsessores dos mais pacatos aos mais agressivos quedados no astral inferior é um trabalho de relevância transcendental e representa um grande bem para a humanidade e para os espíritos arrebatados.

Ensina-nos a referência (1): “O primeiro dever do espírito, depois que desencarna, é ascender ao mundo a que pertence, sem se deter na atmosfera da Terra”. Porém, para cumprir esse dever é preciso estar preparado espiritualmente, o que infelizmente não acontece, pois a maioria dos espíritos que desencarnam, acham-se (1) “envoltos na névoa embriagadora das sensações materiais, agravada pelas fantasias criadas pelas místicas religiosas e passam assistidos por obsessores, a engrossar as hostes dos que estagiam na atmosfera da Terra”.

Mas, há também, espíritos desencarnantes que cumpriram com seus deveres espirituais e encararam a vida com grandeza e elevação, achando-se preparados para, no momento da transição ascender diretamente aos seus mundos de estágio sem passar pelas correntes impuras do astral inferior. E isso ocorre porque essas criaturas souberam compreender que todos os acontecimentos se desenrolam dentro de condições naturais, sujeitos ao desenvolvimento espiritual de cada um. Essas criaturas, durante suas vidas terrenas, não se mortificaram nem se deixaram abater pelas amarguras e pelo desespero a que tantas outras se entregam.

 

19.  Evolução nos Mundos Espirituais

 

Ficaria incompleto esse capítulo se deixássemos de, pelo menos, nos referir a alguns aspectos da vida no espaço superior. São condições de vida inacessíveis a nós encarnados. O que o leitor encontra, a seguir, foi revelado intuitivamente aos codificadores do Racionalismo Cristão ou transmitido pelos espíritos da Plêiade do Astral Superior nas sessões públicas e particulares do Racionalismo Cristão, nos últimos noventa e seis anos. Essas informações constituiriam dezenas de livros, se publicadas fossem!

 

20.  O real sentido da vida

 

O conceito de vida tal como é conhecido na Terra é muito limitado. De uma maneira ampla e estendida ao espírito, vida é ação e esta deve ser conduzida com fundamento no cumprimento do dever. A dinâmica da vida ocorre (1) “sem interrupções, os deveres que recaem sobre o espírito estão sempre presentes e o seu cumprimento representa uma imposição inadiável que no Astral Superior é cumprida rigorosamente”.

Nos mundos de estágio, onde não intervém a matéria na forma como a conhecemos na Terra, mas tão somente a matéria fluídica, (1) “os espíritos não conhecem o cansaço, a preguiça, a indolência ou a displicência, nem deixa para depois o que deve ser feito no momento exato. A fadiga resulta de trabalhos materiais que não atingem o espírito”.

Outro aspecto relevante é que (1) “no Espaço Superior não existe o dia e a noite. A luz que o ilumina e o satura permanentemente é a Força Inteligente em ação no oceano infinito do Universo”.

O espírito uma vez chegado ao seu mundo de estágio ou origem, por estar livre das influências terrenas, “vê” sua vida real se descortinar com toda lucidez, envolvendo todas as encarnações porque já passou. Como se expressa na referência (1): “Nele toda a Verdade prevalece e os deveres têm uma só interpretação, sem sofismas, pontos de vista, alternativas, situações dúbias, vacilações, dúvidas ou incertezas. Dever firmado e dever cumprido são princípios que se confundem numa só consumação”.

Outro aspecto importante é que, no mundo correspondente à sua classe, o espírito não encontra, até a décima sétima classe, condições para evoluir rapidamente. È intuitivo entender isso, pois ali praticamente todos possuem o mesmo nível intelectual e praticamente o mesmo acervo moral e, por conseguinte quase idêntico grau de desenvolvimento e espiritualidade, nada podendo ensinar um ao outro. E, como têm ainda muito que aprender e evoluir, corrigindo as suas imperfeições trazidas de encarnações passadas, tem um desejo incontido de voltarem a encarnar e o fazem de acordo com as leis naturais e imutáveis do Universo.

 

21.  Registro das vidas passadas

 

Em qualquer que seja o mundo de estágio a que pertença e tão logo o alcança, o espírito tem plena clarividência de todas as suas vidas passadas. Então, ele examina e revê essas vidas (1) “detida e minuciosamente faz confrontos, observa as encarnações perdidas, calcula o tempo que desperdiçou nas parcialmente aproveitadas, raciocina, analisa e estuda a posição em que se encontra, com o fim de estabelecer um novo plano para a encarnação seguinte”. Ele deplora, intimamente, todo o tempo que perdeu e o mal que praticou se, indevidamente, estagiou no astral inferior. Dentro do espírito de justiça e eqüidade que caracterizam a vida do espírito, é óbvio que suas más ações influenciarão negativamente no seu novo plano encarnatório.

Suas ações e suas memórias acham-se gravadas na matéria fluídica que lhe serviu de perispírito enquanto encarnado estava e elas são cumulativas. Daí, não escapar às faculdades do espírito nenhum detalhe, nenhum movimento, nenhum fato referente à sua vida pregressa. Essa gravação se fez pela ação vibratória do pensamento, com a mais absoluta fidelidade e alcança toda a sua vida pretérita, desde a sua origem e continua gravando-a eternamente. Assim, todos os atos da vida de cada ser humano acham-se gravados na matéria fluídica como se fosse um CD-ROM interminável, cujos sons e cenas podem ser acessadas e vistas pelo espírito em qualquer época e qualquer momento de sua vida espiritual. É difícil para nós humanos fazer uma idéia precisa do que significa esse incomensurável registro.

 

22.  Pólos de Atração

 

Já foi mencionado, linhas atrás, neste mesmo capítulo, que os espíritos realizam a sua evolução mediante numerosas encarnações neste mundo Terra, até alcançarem o décimo oitavo grau de evolução. A partir da décima oitava classe, a evolução é processada no Espaço Superior, denominado Astral Superior. Assim como todos nós encarnados temos deveres a cumprir, os espíritos do Astral Superior também os têm, inclusive o de contribuir para o progresso dos seres encarnados, respeitando, em regra geral, o livre-arbítrio destes.

Contudo, este trabalho seria impossível aos espíritos do Astral Superior caso não se dispusesse de pólos de atração suficientemente fortes aqui na Terra para atraí-los. Segundo a referência (1): “Para isso, além dos seres esclarecidos que neste planeta lhes servem de instrumentos, contam com o concurso dos espíritos dos mundos opacos que estão a seu serviço”.

Torna-se necessário esclarecer que os espíritos que estagiam nos mundos opacos (da sexta à décima primeira classe), que normalmente fazem a sua evolução reencarnando, têm a alternativa de trabalharem em corpo astral, auxiliando os espíritos do Astral Superior em sua ação saneadora na atmosfera da Terra. Escolhem esta opção livremente, porque tantas foram as encarnações perdidas e tão grande os sofrimentos porque passaram, sem proveito, que decidiram trabalhar no espaço, embora sujeitos a uma progresso espiritual mais lento, porém seguro. Assim, não perdem tempo, como na Terra, onde estariam submetidos às mais baixas paixões mundanas e se deixariam dominar pelos falsos prazeres da vida material, fatos esses acentuados por estarem privados das memórias das suas vidas passadas, o que, se assim não fosse, poderia influenciar negativamente a sua evolução.

 Assim, os espíritos dos mundos opacos não perdem o precioso tempo de suas encarnações. Possuindo corpos astrais constituídos de matéria fluídica mais ou menos densa, podem locomover-se, facilmente, na superfície da Terra. São espíritos rigorosamente disciplinados pelas Forças Superiores e já que podem penetrar em quaisquer ambientes, por piores que sejam,  sua atividade é valiosa na limpeza astral da atmosfera do planeta. Estes espíritos ajudam, também, nas sessões de desdobramento espiritual para limpeza psíquica realizadas pelo Racionalismo Cristão.

 

23. Espaço e Tempo

 

Para o espiritualismo, espaço e tempo são duas relatividades terrenas desconhecidas no Astral Superior, onde a realidade é absoluta e se desenrola em outras dimensões. O campo de vista do ser humano é restrito às três dimensões. A ciência terrena conhece a velocidade da luz (trezentos mil quilômetros por segundo), mas nada sabe, ainda, sobre o pensamento e sua infinita velocidade, por vivermos num mundo de três dimensões. Nada sabemos, também, com relação à velocidade com que se movem os espíritos do Astral Superior, por não ser de interesse dos habitantes do planeta Terra.

Se nos abstrairmos das condições da relatividade, Espaço e Tempo são duas expressões que se confundem numa só. O intelecto humano ainda não está em condições de exercitar toda a sua faculdade dedutiva, imaginativa e analítica, para alcançar essa compreensão. Quando isso acontecer (1), “então, o aspecto do Universo mudará por completo e o problema das grandezas imensuráveis passará a ter nova significação. É justamente sob tal modalidade de vida que se movimentam os espíritos do Astral Superior, que têm por campo de ação extensões que escapam aos limites de compreensão existentes no horizonte do mental humano e por deveres, em decorrência, atribuições que não se assemelham às do viver terreno. As minudências da vida do Astral Superior apenas interessam aos que se encontram naquele plano. Ao espírito encarnado, nenhuma contribuição poderá, por enquanto, oferecer”.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 43. ed.  Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2004. p. 71-82, 85-91, 95-106, 117-136.

 2) MATTOS, Luiz de. A Vida fora da matéria. 21.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, s.d.

 3) STEVENSON, Ian. Twenty cases suggestive of reincarnation. 2nd. Edition. Charlottesville: University Press of Virginia, 1974.

 4) MOODY Jr., Raymond A. A vida depois da vida. São Paulo: Buterfly, 2004.

 5) DROUOT, Patrick. Somos todos imortais. Rio de Janeiro: Nova Era, 1996.

 6) DROUOT, Patrick. Reencarnação e imortalidade. 7.ed. Rio de Janeiro: Nova Era, 1998.

 7) WEISS, Brian L. Muitas vidas, muitos mestres. Rio de Janeiro: Salammandea Consultoria Editorial, 1991.

 8) WEISS, Brian L. Muitas vidas, uma só alma. Rio de Janeiro: Sextante, 2005.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 10

 

 

A IMPORTÂNCIA DO PENSAMENTO

 

Não nos deixemos aprisionar pelos nossos pensamentos para sermos,

de fato, os criadores de nosso futuro.

Autor desconhecido.

 

1.      Conceito

 

Vamos iniciar este capítulo citando Luiz de Mattos (1): “o pensamento é vibração do espírito, manifestação da inteligência, poder espiritual”. E mais: “pensar é raciocinar, é criar imagens, conceber idéias, construir para o presente e o futuro. É pelo pensamento que a criatura resolve, soluciona, descobre e esclarece os problemas da vida”.

Tudo passa pelo pensamento, antes que qualquer coisa aconteça. Se olharmos ao nosso redor, excetuando-se a própria Terra e toda a natureza que nela existe tudo o mais foi construído pelo Homem e passou antes pelo seu pensamento. Ele é, assim, o sustentáculo, o fundamento de toda a evolução natural, cultural e psíquica do Homem, desde os primórdios das eras primitivas até o presente estágio de desenvolvimento.

Portanto, não é exagero afirmar-se que o pensamento é tudo na vida da criatura. A criatura que não se dá ao trabalho de pensar por indolência ou por falta de vontade, não evolui, estaciona, fica para trás.

 

2.      Formação do Pensamento

 

Os pensamentos são captados (1):

 

de correntes que se cruzam em todas as direções, tendo como fonte alimentadora os próprios seres encarnados e desencarnados que os emitem. E ainda, os pensamentos ficam ligados à sua fonte de origem enquanto permanecer o sentimento que os gerou. Eles estabelecem verdadeiros climas ambientais proporcionadores de saúde ou de enfermidades, de alegria ou de tristeza, de triunfo ou de fracasso, de bem ou mal-estar.

Além do que ficou dito (1), “muitas dessas correntes são, além de doentias, terrivelmente avassaladoras. Elas chegam mesmo a exercer acentuada predominância sobre as benéficas, pela grande inferioridade espiritual de que está saturada a atmosfera deste planeta”.

Fica claro, então, que todos os nossos pensamentos nos chegam de fora e provêm de vibrações geradas por outras criaturas também encarnadas ou de seres desencarnados (espíritos). Entre os últimos, há que se distinguir os pensamentos provenientes de espíritos do astral inferior dos que nos chegam a partir dos espíritos do Astral Superior. Não será difícil entender que aqueles que vibram na mesma freqüência entram em sintonia de pensamentos, de acordo com a lei das afinidades: pensamentos positivos atraem pensamentos positivos e pensamentos negativos atraem pensamentos negativos, ou, generalizando: pensamentos similares atraem pensamentos similares. Para se colocar em sintonia com as vibrações dos espíritos do Astral Superior, precisamos de um esforço maior, representado pelos propósitos elevados, dignos e nobres.

 

3.      Utilização do Pensamento

 

É também da referência (1): “O espírito imprime ao pensamento a própria força de que é dotado. Como o som e a luz, ele também faz todo o seu percurso em ondas vibratórias que ficam registradas no oceano infinito da matéria de que é provido o Universo e, com facilidade, pode tornar-se conhecido de todos os espíritos, desde o instante em que é emitido. Daí a impossibilidade de ser alterada a verdade na vida espiritual”. Luiz de Mattos refere-se aqui à matéria cósmica ou fluido cósmico universal.

Esta afirmação é da mais alta relevância e nos diz que o espírito se identifica com o padrão do seu pensamento, isto é com a intensidade ­– que corresponde à amplitude das ondas vibratórias – e com a freqüência – alternância de ciclos por segundo das mesmas ondas vibratórias.

 

4.      Bem pensar para bem agir

 

Ainda de acordo com Luiz de Mattos (1): “Todo processo da evolução está fielmente impresso no Livro da Vida”. As boas e as más ações, os pensamentos inferiores, como os elevados, ali se encontram gravados indelevelmente. Os pensamentos antecedem as ações. Assim, tudo o que é feito, todos os atos dignos ou indignos são o resultado de pensamentos também dignos ou indignos. “Quem mal faz para si o faz” – dizem as leis espirituais – e com que razão o dizem!

É intuitivo que os pensamentos modulados para o mal produzam correntes vibratórias que vêm causar sérios danos, tanto psíquicos como físicos, estes últimos causados pela somatização de suas vibrações deletérias no corpo humano. É também, intuitivo que o ser humano tanto transmite como capta as vibrações do pensamento que se harmonizam com os seus. Este é o princípio do fenômeno telepático, que existe incipiente nas pessoas.

A boa condução de nossos pensamentos decorre da educação para a vida terrena e da força de vontade, atributo fundamental do espírito. O fortalecimento da vontade significa fortalecer-se a si mesmo com sentimentos saturados de valor, através dos quais o ser criará em torno de si uma rede fluídica protetora, que serve de barreira à aproximação e, até mesmo, à ação maléfica dos espíritos obsessores.

A forma racional e otimista de pensar deve predominar sempre para bloquear ou, até mesmo, remover os impedimentos mais sérios. O ser deverá se policiar a todo o tempo, conscientizando-se de suas boas ações. Não deve deixar-se tomar pela indecisão, bem como nunca vacilar quando tiver que fazer suas escolhas para a ação. É claro que a ocorrência de temores e indecisões levará a criatura ao fracasso. Por isso, pensar com altivez, ter pensamentos de coragem e valor levará a criatura a ser firme e decidida para atrair pensamentos da mesma natureza, harmônicos entre si, criando um ambiente que leva ao sucesso.

 

5.      Cultura e Pensamento

 

Parece não haver dúvida da parte de quem quer que seja que a cultura influi diretamente na qualidade dos nossos pensamentos. É preciso dar livre curso aos nossos pensamentos, respaldado na inteligência e na conduta moral de cada um, pois que, a conduta é um reflexo direto do pensamento, havendo, nesse processo, uma retroalimentação dinâmica pensamento–conduta–pensamento. Um pensamento forte é força motriz do espírito, o que equivale dizer que ele tem uma prodigiosa capacidade para superar os obstáculos que a vida nos antepõe. A força do pensamento é função direta da educação da vontade, já que esta sustenta o pensamento vigoroso.

Raciocinando pelo lado oposto estão os pensamentos fracos, que não se fortalecerão onde houver indolência, vontade fraca e indecisão. Tudo se torna mais crítico ainda, quando a criatura emite pensamentos de inveja, rancor, malquerença, ingratidão e perversidade, entorpecendo a sua mente e a dos semelhantes a quem tais sentimentos são dirigidos. Tudo isso decorre do fato de ser o pensamento, bom ou mau, vibrações ondulatórias.

 

6.      Saber Pensar

 

O pensamento é um dos principais atributos do espírito, ou seja, é inerente ao espírito, dele fazendo parte indissociável. E, como o espírito está sempre vibrando, estamos sempre pensando. É fácil de perceber que não podemos pensar em duas coisas ao mesmo tempo, o que nos deixa a possibilidade de controlá-lo, embora nem sempre seja fácil. Segundo nossa referência (1) “O pensamento se cultiva, se aperfeiçoa, se aprimora e fortalece pelo poder consciente da vontade. Pensamentos fortes são claros, refletidos e bem definidos”.

Com esses conhecimentos percebe-se que, quando se sabe pensar firmemente, torna-se fácil concretizar qualquer ideal, colocando-se a força de vontade em ação com toda a energia de que o ser dispõe.

De modo geral nossos pensamentos são fugazes. Por isso, o pensamento precisa ser bem exercitado, para podermos aprender a sua forma de ação e bem controlá-lo. Há uma quantidade muito grande de aspectos e condições que interferem no pensamento. Somente através de exercícios individuais, que envolvem atenção e concentração, pode-se chegar ao completo domínio do pensamento.

O segredo da boa concentração é exercer um severo controle sobre si mesmo, o que se consegue aprendendo a não desviar a atenção, não deixar-se distrair ou cair em devaneios. Pense como se o seu pensamento atuasse como uma câmera fotográfica que necessita focalizar-se no objeto a ser fotografado para obter os melhores resultados. Estando focalizado, procure perceber os detalhes do objeto ou das cenas focalizadas. No caso dos pensamentos abstratos, procure utilizar a lógica acompanhada de um raciocínio lúcido para poder penetrar fundo e compreender além do que as aparências indicam. Ao pensar, livre-se dos pensamentos egoístas, enciumados e prepotentes para não distorcer os resultados desejados, evitando assim as conclusões falsas e deformadas, que levam ao fracasso.

Para ter pensamentos aguçados, progressistas, realizadores e orientados para o bem geral procure emitir pensamentos límpidos, altruísticos, libertos de deformidades espirituais. O método e a disciplina no viver terreno proporcionam aos seres condições para bem pensar e agir de forma correta e independente de opiniões incutidas por terceiros.

Quando e se tiver que agir em conjunto com outras pessoas, procure aliar-se aos que tiverem pensamentos afins e interesses comuns. Procure tirar dessa união toda a força que ela permite injetar no seu ânimo e nas suas ações, em benefício comum, pois que a união faz a força, tanto material como espiritualmente falando. Lembramos, contudo, de outro ditado bem conhecido que nos diz que “uma ovelha ruim põe o rebanho a perder”, para mostrar que, se apenas um de nossos aliados emitir pensamentos (vibrações) perniciosos, o sucesso de qualquer empreitada poderá ser comprometido.

Outro grande segredo para obter sucesso com seus pensamentos é aprender a se preparar mentalmente (1), “sempre que tiver de penetrar em qualquer mau ambiente. Esse preparo consiste no pensamento vibrado com sabedoria, elevação, consciência e confiança em si mesmo. O vigor do pensamento emitido por criatura mentalmente sã e esclarecida cresce na medida das necessidades do momento, amplia-se, expande-se e supera qualquer corrente de pensamentos inferiores, pela atração que exerce da Força afim universal, cujo poder é infinito”.

 

7.      Força do Pensamento

 

A força do pensamento depende diretamente do nosso grau de evolução. Segundo a referência (1): “A força do pensamento tem como medida o grau de evolução do ser humano e como limite a capacidade que este possui de utilizar-se do seus atributos espirituais”.

Uma das razões por que evoluímos reside no desenvolvimento do pensamento. É na força do pensamento que o ser encontra o instrumento seguro para fazer crescer a consciência de si mesmo, que como já vimos é outro fantástico atributo espiritual. É através dessa força que identificamos as demais faculdades latentes, todas necessárias à realização de nossos objetivos espirituais, morais e materiais e que, na prática, protegem a nossa saúde física e mental. Isso explica a cura de inumeráveis casos de doenças graves, enumeradas pela Medicina, que ocorrem de forma inesperada, que se deveram mais à ação mental dos próprios doentes do que aos remédios propriamente ditos.

O uso adequado do pensamento imprime-lhe força para sublimá-lo, voltando-se o ser para propósitos mais elevados e que, por força da lei da atração e repulsão dos pensamentos, lhe permite o acesso a uma felicidade relativa, proporcionando-lhe bem-estar interior.

Tudo passa pelo pensamento. Este primeiro cria as idéias e as imagens e só depois as materializa em seus projetos com um objetivo específico. Essa é a mecânica conhecida, por exemplo, para engenheiros e arquitetos, que finalmente transformam os projetos em obras e, até mesmo pelos escritores e artistas. Tudo é primeiro concebido mentalmente com todos os seus pormenores, antes de concretizar-se. É no projeto, que se corrigem os erros, pois devemos circunscrever os erros à pequena escala, antes de realizar as obras que se lhes corresponde, quando se torna mais difícil e mais custosa sua correção.

Podemos, pois, concluir que tudo que na Terra existe que não tenha sido criado pela Natureza, o foi pelo espírito inventivo e criador do Homem, sem exceção, dando-nos um atestado do imenso poder de nosso pensamento. Com mais razão, ainda, no Espaço Superior isso não é diferente, nele permanecendo a capacidade criadora.

Vimos enfatizando, ao longo de vários capítulos dessa obra, que é pela evolução que o espírito humano exerce o seu poder criador, que resulta ampliado em cada encarnação por que passa na vida terrena. É intuitivo que, quanto mais evoluído o espírito, mais poderoso torna-se o seu pensamento e sua capacidade criadora. Esse poder, que cresce a cada encarnação, precisa ser usado sempre para o Bem, pois do contrário, poderia causar um efeito destruidor muito grande em todos os campos em que o homem exerce suas atividades e no conjunto delas.

Segundo nossa referência (1), “se isto é possível num mundo tão modesto, de tão reduzida evolução espiritual, imagine-se a imensa força criadora, o extraordinário poder de realização dos espíritos altamente evoluídos cujas atividades são exercidas em planos mais elevados”.

O fortalecimento do espírito representa, pois, o fortalecimento do pensamento, de onde conclui-se que, de um espírito forte emana um pensamento vigoroso. É através desse pensamento vigoroso que a criatura trabalha para melhorar cada vez mais o seu progresso material e a sua personalidade psíquica. Há aqui uma retroalimentação espírito – pensamento – espírito em benefício de sua evolução rumo ao ápice da Força Criadora ou Inteligência Universal.

Ainda, segundo a referência (1):

 

É na ordem deste progresso que crescem o poder do pensamento e a capacidade de conceber, de criar, de realizar obras, cada qual mais importante. O grande repositório da sabedoria não está na Terra, mas no Espaço Superior. Os progressos da moderna tecnologia não seriam ainda conhecidos, se muitas das suas parcelas não tivessem sido transmitidas aos seres humanos pela via da intuição, vale dizer pela força do pensamento, diante da qual todas as distâncias se anulam.

 

Das riquezas espirituais que a criatura tem forçosamente de conquistar neste planeta, assume papel de excepcional relevo a faculdade do pensamento, de cujo poder concentrado e abrangente depende a racional solução de todos os problemas da vida.

 

8.      Processo de Formação do Pensamento

 

Cumpre-nos agora examinar como se forma o pensamento. Para isso é preciso considerar o pensamento nos seus vários aspectos, a saber: motivos para pensar, recursos para pensar, fatores de confusão, métodos para pensar e resultados do pensamento. Examinaremos cada um de per si.

 

i Motivos para pensar

 

O pensamento, como qualquer outro atributo derivado do espírito não funciona automaticamente. Ele necessita ser ativado pelo poder da vontade, que é o dínamo do espírito. Depois de ativado, o pensamento busca algum motivo para pensar, deflagrado com uma velocidade compatível com o assunto objeto do pensamento, podendo atingir uma rapidez incrível. Seu motivo principal é aclarar as idéias, convencer a si mesmo de sua validade e partir para a ação. 

O pensamento busca os motivos para pensar em uma ou várias das fontes a seguir enumeradas: sentimentos, emoções, idéias, intuições, necessidades, responsabilidades, ambientes, iniciativas, ambições, interesses, consciência, etc.

Os dois primeiros, sentimentos e emoções, constituem o que modernamente se convencionou chamar de inteligência emocional. Eles servem de ponto de apoio para a geração de pensamentos aplicáveis ao relacionamento com nosso semelhante e refletem a conduta moral compatível com a espiritualidade já alcançada pelo ser. Tais pensamentos ocupam a maior parte do tempo do nosso viver cotidiano.

Das idéias e intuições brotam nossas atividades intelectuais propriamente ditas, intimamente relacionadas com a inteligência e o poder criador. Elas estão presentes de forma intensa na vida dos cientistas, filósofos, escritores, empreendedores, artistas e intelectuais em geral. De idéias e intuições, também, se alimenta o pensamento abstrato, tão necessário ao entendimento do transcendental e dos problemas inerentes à Metafísica na busca da Verdade.

As necessidades e responsabilidades demandadas pela nossa vida de relações com o mundo exterior, vale dizer, com o nosso semelhante e com a sociedade como um todo, nos levam a pensar nos direitos e deveres que nos cabem, a todo o momento, ajudando-nos a firmar posições na defesa daquilo que nós julgamos moral, ético e justo.

Os estímulos que decorrem dos ambientes, sejam os criados pelo homem, sejam os naturais, nos levam a exercitar o pensamento no sentido da preservação de tudo aquilo que nos pertence (sentimento de posse e de apego) ou, no segundo caso, na preservação ambiental, em defesa da natureza e suas maravilhas.

Ambições e interesses alimentam intensamente os pensamentos progressistas, quando não levados aos limites extremos do exagero. Eles são imprescindíveis na vivência bem sucedida nos negócios de todo gênero e de todo tipo da nossa vida material.

Finalmente, a consciência estará sempre presente em todos os pensamentos, qualquer que seja a sua natureza, pois deles é indissociável. Nós estamos falando de uma consciência sã, não deturpada ou corrompida ao longo da vida. É ela que dá suporte aos nossos ideais de justiça, alcançada através da ética e da moral.

 

i Recursos para pensar

 

Entre os recursos para pensar estão: inteligência, sentimentos, vontade, observação, experiência, conhecimentos, estudos, provas, superação.

Sobre a inteligência, os sentimentos e a vontade já tratamos neste capítulo, sendo todos eles, também, recursos utilizados para gerar ou auxiliar na criação de nossos pensamentos.

A experiência, sob todos os aspectos, é fundamental para o exercício do pensamento. Há um ciclo necessário: estudos – experiência – pensamento – consolidação da experiência, que serve sempre para ganharmos o conhecimento das coisas e dos fenômenos e assim, entendermos melhor o mundo físico em que vivemos. Este recurso constitui a base dos experimentos científicos – da Física, da Química, da Biologia, etc. De outro lado, novos conhecimentos realimentam o citado ciclo, numa busca incessante pelas verdades relativas e pela Verdade eterna das leis naturais e imutáveis.

Finalmente, agrupamos os recursos da prova e superação, considerando os recursos de pensamento cabíveis para remover dúvidas e indefinições referentes aos resultados encontrados racional e mentalmente de muitas questões com as quais nos deparamos no nosso dia-a-dia. As conclusões precisam ser sempre apresentadas de forma inteligente e persuasiva.

 

i Fatores de confusão

 

Durante toda e qualquer atividade pensante, precisamos estar seguros de termos removido todos os fatores de confusão que possam alterar a clareza de nossas idéias ou que venha a nos desviar dos ideais pelos quais lutamos e damos a vida. Entre os fatores de confusão, nós colocamos o preconceito, a intolerância, a superstição, o misticismo, as crenças infundadas, os temores, o excesso de amor-próprio, a vaidade, o orgulho, a inveja, a ansiedade, a sensualidade, o nervosismo, as doenças e o materialismo desenfreado.

Dispensamo-nos de tecer considerações mais profundas sobre a influência nociva desses fatores na arte de formação do pensamento, bastando mencionar que alguns deles nos tiram a liberdade de bem pensar (preconceito, intolerância, superstição, misticismo, crenças infundadas, temores); outros, nos desviam e absorvem sobremaneira a nossa atenção (amor-próprio, vaidade, orgulho, inveja); e, há aqueles que (ansiedade, sensualidade, nervosismo e doenças), devido ao mal-estar emocional e físico que nos causam, bloqueiam as nossas idéias, toldando-as por inteiro.

Finalmente, o materialismo exagerado bloqueia o uso do pensamento e do raciocínio abstrato e transcendental, relacionados aos problemas do ser como ser, para investigar as mais velhas questões do mundo: de onde viemos, quem somos e para onde vamos. 

 

i Métodos para pensar

 

Os métodos para bem pensar e tirar o melhor proveito dos resultados obtidos foram tratados no capítulo 4 dedicado à metodologia. Ali foram considerados os métodos utilizados pela filosofia e principalmente pela ciência, que considera as diferentes formas de investigação. Neles preponderam o pensamento e o raciocínio lógico, utilizando, conforme o caso, técnicas de análise e síntese, mediante definição do problema, seleção de condições, classificação de fatores intervenientes, investigação, experimentação, indução, dedução, etc. Falamos, também, no mesmo capítulo sobre o princípio da irrefutabilidade. Em última instância, a finalidade é sempre poder alcançar a verdade dos fatos e estabelecer teorias e leis válidas para melhor compreensão do mundo em que vivemos.

 

i Resultados do pensamento

 

Ao analisarmos os resultados do pensamento, temos duas vertentes: os resultados positivos ou certos e os resultados negativos ou errados. São resultados positivos, dentre outros: progresso, soluções, benefícios, fraternidade, amizades, compreensão, serenidade, confiança, coragem, melhoramentos, aperfeiçoamentos, segurança, economia, generosidade, alegria; dentre os negativos ou errados, temos: estagnação, dificuldades, preconceitos, conflitos, guerras, desorientação, nervosismo, desconfiança, fracasso, rotina, incerteza, esbanjamento, cobiça, covardia e tristeza.

Resolver essa quantidade enorme de situações constitui o desafio presente e futuro a demandar as melhores inteligências e esforços de cada um de nós e da humanidade em geral. Com certeza, qualquer que seja o caminho seguido, o pensamento estará sempre presente na vanguarda com o objetivo de convergir soluções apropriadas à evolução humana.

 

9.      Mapeamento do pensamento

 

Desde a última década do último século, o estudo do cérebro vem passando por um progresso extraordinário, mediante o uso de técnicas de alta resolução espacial, aplicadas através de uma aparelhagem ultra sofisticada, como é o caso de imagens e técnicas tomográficas. As imagens por ressonância magnética, usada nas clínicas radiológicas permitem fazer o estudo da estrutura neurofisiológica do cérebro.

Nos dias de hoje, com o uso dessa mesma técnica, é possível mapear aspectos funcionais do cérebro, o que equivale dizer, rastrear o pensamento através das redes neuronais. O desenvolvimento da ressonância magnética tornou possível comparar imagens obtidas com o cérebro ativo e durante o repouso, estabelecendo-se correlações entre ditas imagens, as quais são objeto de interpretações meticulosas. Os sinais elétricos provenientes das redes de neurônios existentes no neocórtex são interpretados como representações neurais, os quais se traduzem como (2) “percepções, sentimentos, atos motores, comportamentos, relógios biológicos, produção de fatores de liberação de hormônios e pensamentos. A atividade elétrica de conjuntos de neurônios que se expressam em pensamento, produz variações de propriedades magnéticas do tecido, que podem ser visualizadas pela ressonância magnética funcional”.

Analisado sob o ponto de vista da medicina oficial, o pensamento é uma atividade mental organizada, com alto grau de liberdade, estendida aos aspectos do mundo metafísico. O principal é que se trata de um processo organizado de representação neural que (2) “forma um modelo mental para o planejamento, definição de estratégias, previsões e soluções de problemas. Este processo envolve a correlação e a integração de eventos críticos no tempo e no espaço”. Estas são atividades comuns a qualquer ser humano.

É na fase de planejamento que a pessoa analisa as idéias em possíveis interpretações e tendências e daí define o melhor ou mais efetivo curso de ação a tomar.

A fase de previsão tem lugar quando o ser analisa toda uma seqüência de eventos com o objetivo de verificar a lógica e coerência dos fatos, analisar e verificar hipóteses e refletir sobre os cursos alternativos de ação, procurando projetar, formal ou abstratamente, o resultado de suas ações no futuro.

Iniciado o processo a que um determinado pensamento deu lugar, chega a fase em que a criatura define uma estratégia de ação e por meio de um exercício mental examina as alternativas e opções de cada fase do processo. Assim, durante a execução de uma idéia ou projeto, estará preparado para resolver os problemas que sempre aparecem, exercitando alternativas e soluções reais de acordo com os riscos que visualizar e os resultados efetivos que pretender colher.

Dependem, ainda, do pensamento, os estudos e a racionalização que a pessoa faz sobre a realidade da vida em família, na sociedade e no conjunto dos países deste planeta.  Ressalta-se, ainda, que o pensamento é importante para a comunicação e entrosamento entre indivíduos, para a análise de todo e qualquer evento e introspecção metafísica.

 

10.  Classificação psicológica

 

Do ponto de vista da Psicologia, quanto à sua natureza, o pensamento pode ser analítico, verbal, simbólico ou abstrato. É através do pensamento analítico que a pessoa se utiliza da lógica e dos modelos logicamente estabelecidos para tirar suas conclusões ou obter resultados práticos. Já no pensamento verbal, a criatura parece ouvir e vivenciar as suas próprias idéias e as transfere a terceiros através das palavras próprias de cada idioma, no contexto de uma linguagem adequada aos seus ouvintes. O pensamento simbólico ou abstrato é exercido através de símbolos ou modelos formais, como na matemática, no desenho, nos projetos, na música, na linguagem corporal, etc. O pensamento abstrato é sempre livre e desvinculado do mundo físico. Nele, a intuição prepondera sobre a lógica no processo de avaliação dos modelos mentais.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) ATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 43.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor.  cap 8, p. 139-145, 2004.

 2) GATASS, R. et al. O Pensamento – mapeamento de imagens por ressonância magnética nuclear funcional. Disponível em: https://www.cerebromente.org.br/n10/mente/pensamento1.htm. Acesso em 28/12/2005.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 11

 

 

A AURA, ESPELHO DA ALMA

 

 

É a aura humana que, pela grande variação de cores, apresenta maior complexidade de análise pois, além de revelar o estado de evolução de cada indivíduo, retrata as suas tendências, a índole, o grau de inteligência, a capacidade de raciocínio, a sensibilidade de consciência e, finalmente, a natureza dos seus pensamentos. Luiz de Mattos – Racionalismo Cristão, 1910.

 

 

Conforme veremos neste capítulo, a aura é formada por matéria tênue, subtil e invisível, ionizada sob a forma de uma emanação ou bioplasma e ativada pela força do pensamento. Ela forma assim, um campo energético vibracional que circunda o corpo das pessoas, sendo mais densa e mais perceptível ao redor da cabeça. Ela é o espelho da alma, através da qual revela-se a natureza dos pensamentos, sentimentos e emoções que emitimos. Pode ainda, a aura, captar ou repelir as vibrações de outros pensamentos, sentimentos e emoções, de acordo com a lei das afinidades, segundo a qual, os pensamentos afins (positivos ou negativos) atraem-se e pensamentos contrários repelem-se.

Há cerca de cento e cinqüenta anos a aura vem sendo estudada por pesquisadores e cientistas sérios da Europa, Estados Unidos e Brasil, com o objetivo de identificar sua verdadeira natureza e função, bem como, no sentido de torná-la visível e fotografável. Há, também, muitos estudos que mostram o seu efeito no aparecimento de numerosas doenças psicofísicas. Neste capítulo, tratamos da aura sob um enfoque científico e espiritualista.

1.      Aspectos Gerais

 

A aura é uma emanação que provém da vibração da Força atuando sobre a Matéria. Ela envolve todos os corpos vivos encontrados nos reinos da natureza, variando em extensão, cor e intensidade em função do grau de desenvolvimento da Força Inteligente que atua nestes corpos.

Nas pessoas ela pode ser observada ao longo de todo o corpo, sendo mais densa junto à periferia, diafanizando-se gradativamente à medida que se distancia do corpo em direção a sua parte externa. A aura pode ser observada por todas as pessoas que tiverem a faculdade mediúnica de vidência bem desenvolvida e apurada, bem como, naturalmente, por todos os espíritos desencarnados, sejam eles do astral inferior ou Astral Superior.

O desenvolvimento da visão astral nas pessoas que a possuem inicia-se pela percepção da porção da aura de maior densidade, isto é, aquela que se encontra mais próxima do corpo. À medida que essa notável capacidade mediúnica se desenvolve e se apura ela é vista por inteiro, nas suas diversas camadas, principalmente junto à cabeça das pessoas.

As cores da aura apresentam-se de tamanho e formas diferentes. Nos minerais, ela é uma representação da vibração molecular, cada mineral tendo sua própria aura de acordo com a composição e a complexidade de sua estrutura amorfa ou cristalina, esta última mais constante e perfeita. Não se trata aqui do fenômeno da radioatividade, conhecido dos cientistas.

Nos vegetais, a Força Inteligente excita seus corpos com uma força vital mais forte que nos minerais e das plantas emana uma aura já indicando graus de evolução variável e crescente até a espécie mais evoluída. É de se notar que há uma diferença, por exemplo, entre a aura de uma folha viva, ainda presa à planta ou árvore e a da folha destacada dessa árvore, onde o processo da morte física da folha se inicia, mostrando a transformação pela qual passa.

No reino animal, a variação das cores da aura aumenta na razão direta de sua evolução, além de ser, também, função do seu estado de saúde, das condições de sua alimentação e do maior ou menor estado de irritabilidade em que se encontram.

No homem, última escala da evolução animal, além das condições de saúde e nutrição, outros fatores como a idade, as atitudes perante a vida, os estados emocionais e os sentimentos –­ todos influindo no seu pensamento influem também na coloração e tamanho de suas auras. No livro Racionalismo Cristão (1), encontramos:

 

É a aura humana que, pela grande variação de cores, apresenta maior complexidade de análise, pois, além de revelar o estado de evolução de cada indivíduo, retrata as suas tendências, a índole, o grau de inteligência, a capacidade de raciocínio, a sensibilidade de consciência e, finalmente, a natureza dos seus pensamentos.

 

Ainda que pareça uma única, são três, na realidade, as auras humanas: a do espírito, a do corpo fluídico e a do corpo físico, cada uma das quais correspondendo à natureza do corpo de que emana.

 

A aura do corpo físico, que é a emanação de todas as partículas da matéria organizada nele contidas, pode ser observada durante o sono sem a interferência das outras duas, quando o espírito e o corpo fluídico dele se afastam.

Verifica-se, então, ser ela esbranquiçada e transparente, como se constituída de fios de cabelos esticados, se o corpo estiver são, e curvos e caídos, se enfermo.

 

Aos estudiosos desse tema, indicamos um livro maravilhoso, editado pelo Racionalismo Cristão na segunda década do século passado, intitulado, (2) A vida fora da matéria, que conforme o nome indica, além de mostrar a ação espiritual inferior e superior e sua influência na vida das pessoas, mostra a existência da aura nos reinos da natureza e no homem, em gravuras coloridas em tricomia, conforme observado por médiuns videntes evoluídos, em diversas situações da nossa vida cotidiana.

 

2.      Investigações científicas

 

As pesquisas sobre a emanação ódica, como era conhecida das tradições do Antigo Egito (3000 a. C) e da Grégia antiga (700 a. C), só tiveram lugar a partir de meados do século XIX, com as ocorrências das manifestações mediúnicas na Europa e nos Estados Unidos, das quais surgiram o Espiritismo e, na década de 1910, o Espiritismo Racional e Científico Cristão, este hoje conhecido como Racionalismo Cristão, ambos descritos em outros capítulos desta obra.

 

i Antes de Kirlian

 

Em 1679, o médico escocês W. Maxwell foi o primeiro a escrever a respeito das “radiações humanas”. Cerca de cem anos mais tarde, Anton Mesmer, médico vienense (Austria) retomou os estudos de Maxwell, designando o fenômeno caracterizado por um fluido magnético luminoso com o nome de “magnetismo animal”. As atividades objetivando a cura de certas moléstias mediante a manipulação desse fluido, ficaram conhecidas na Europa dessa época com o nome de “mesmerismo”.

Em 1855, o barão Karl Von Reichenbach, doutor em Ciências Naturais em Tubingen, realizou trabalhos experimentais iniciais sobre as emanações emitidas e recebidas por sensitivos especiais no campo da mineralogia e geologia. Foram, também, iniciados trabalhos mediúnicos, citados por alguns autores como W. C. Leadbeater, Paul Joire e outros.

Foi Reichenbach quem deu o nome de eflúvios ódicos às citadas emanações. A palavra ódico deriva da palavra sânscrita od, que significa “o que penetra tudo”. Os eflúvios ódicos eram observados em torno dos seres humanos por algumas pessoas “sensitivas”, principalmente a partir das ex­tremidades dos membros de animais e até objetos inanimados, como de um ímã. ­Reichenbach realizou estas experiências durante vinte anos, tendo como colaboradores mais de quinhentos sensitivos provenientes de diversos países da Europa.

 Esses sensitivos, em experiências realizadas em uma sala escura e sem janelas, completamente fechada, observavam, ao final de uma hora ou mais, certos fenômenos luminosos inexplicáveis. Nesses trabalhos, em volta das mãos, aparecia uma espécie de nuvem cinzenta esbranquiçada, seguido de uma luminosidade azul celeste do lado direito e alaranjado do lado esquerdo. Saiam radiações da boca e do nariz e, mais intensas ainda, dos olhos.

O Comandante Darget, em 1882, fez registros fotográficos envolvendo duas placas fotográficas separadas e isoladas por papel preto uma da outra, sendo que, numa delas, colocou uma folha de papel branco com várias figuras desenhadas. Estas duas chapas, com a chapa contendo as figuras foram envolvidas por outra folha de papel preto e colocadas sobre a barriga de uma pessoa durante duas horas. Revelada a placa superior, nela foram encontradas as figuras que estavam na placa de baixo junto à barriga. Darget afirmava que as figuras foram sensibilizadas pela passagem das emanações ódicas da pessoa. Mas, esta experiência bastante simples, teve seus opositores (Guillaume de Fontenay, Warcollier e Saint Albin), que alegaram que o resultado era obtido por intermédio de reações químicas da tinta ao calor e às secreções da pele.

Em 1897, foi Jules Bernard Luys (1828-1897), médico e neurologista francês, Diretor do Asilo Lunático de Ivy, quem inventou uma nova forma de fazer o registro fotográfico da aura. Ele mantinha os dedos durante 10-20 minutos sobre o lado gelatinoso de uma placa fotográfica mergulhada em uma solução de hidroquinona, obtendo registros com certa luminosidade. Os registros eram variáveis, em função de cada pessoa e do seu estado psicofísico. Este método, também, recebeu muitas críticas dos céticos com explicações que teriam a ver com a ocorrência de calor, secreções da pele, erros metodológicos e até a ocorrência de uma “luminescência remanescente”.

Mas, estas técnicas foram depurando-se e refinando-se através dos trabalhos de numerosos pesquisadores, no final do século XIX, entre eles, Henry Baraduc, O.C. Lichtemberg, o polonês Lodco-Narcovitz e até mesmo o cientista padre brasileiro Roberto Landau de Moura, com sua teoria do perianto (aura ou corpo bioplasmático) e cujas experiências precederam às de Kirlian. Com técnicas mais sofisticadas e menos sujeitas ao erro, não seria justo deixar de fora do elenco histórico desses pesquisadores, os nomes de Camille Chaigneau, Colomés, Durville, Dardenne, Girod, Adrian Majewski e Gabriel Delanne, que fizeram trabalhos demonstrando através de efluviografias a existência do fenômeno.

Nessa trajetória histórica vamos encontrar, em 1879, Walter Kilner (1847 - 1920), licenciado em Medicina e responsável pelo Departamento de Eletroterapia do Hospital St. Thomas de Londres, que realizou experiências com base nos trabalhos de Reichenbach, a fim de investigar, também, o fenômeno das emanações ódicas, como era conhecido na época.

Em 1908, Kilner chegou à conclusão que qual­quer pessoa poderia observar as referidas emanações, desde que fosse auxiliada por um estimulante externo da visão. Ele conseguiu os melhores resultados com o uso da dicianina, que é um corante derivado da anilina e foi usado na indústria fotográfica como sensibilizador para as radiações infravermelhas.

Kilner usava uma técnica diferente: ele trabalhava observando a pessoa despida, bem iluminada pela luz do dia contra um fundo negro. O observador ficava de costas para a fonte luminosa e entre ele e o fundo negro era colocada uma cuba transparente, contendo solução de dicianina. Os relatos da época indicam que 95% das pessoas com visão normal conseguiam ver a sua aura, representada por um nevoeiro tênue e luminoso em volta do corpo. Curioso é que este processo não permitia a observação do fenômeno na escuridão. Interessante, também, notar que após a experiência as imagens persistiam na retina das pessoas por algum tempo, devido à ação foto-sensível sobre o nervo ótico. As luminescências observadas apresentavam formas diferentes para homens e mulheres.

 

i Kirlian

 

A fotografia do halo energético emanado dos corpos de todo e qualquer ser vivo consagrou definitivamente o pesquisador russo Semyon Davidovitch Kirlian (1900-1980) e sua esposa assistente, Valentina Chrisanfovka Kirlian. Eles inventaram uma máquina fotográfica e obtiveram imagens desse halo energético, em 1939, ficando reconhecido cientificamente no que respeita a obtenção e conservação de imagens do fenômeno. Seu equipamento ficou conhecido como Máquina Kirlian.

A grande importância dessa descoberta reside no fato de que as emanações energéticas fotografadas pela Máquina Kirlian são dinâmicas e variam de cor, de tamanho, de aspecto e de forma de acordo com a condição psicológica da pessoa, podendo ser caracterizada nos fotogramas estados de tristeza, alegria, amor ódio, saúde, doença, angustia, estresse e tantas outras emoções e sentimentos que refletem o estado de alma da pessoa. Essas constatações abriram um interesse de utilização da fotografia Kirlian em vários campos profissionais, mostrando que o “efeito Kirlian”, nome pelo qual ficou conhecido o fenômeno, é algo muito sério.

A câmara Kirlian foi oficialmente reconhecida pela União Soviética a partir da década de 1960. A partir de então, o invento passou a contar com o interesse de criminologistas, mé­dicos, biofísicos e outros especialis­tas soviéticos. S. M. Pavlenko, presidente do Departamento de Patologia e Fisio­logia do Primeiro Instituto de Moscou reconheceu, na altura, que “a fotografia Kirlian pode ser empregada no diagnóstico de doenças, sobretudo no câncer”.

Em seguida, o processo, que recebeu o nome de kirliangrafia, difundiu-se pelos países da Europa e nos Estados Unidos e, por volta de 1970, as primeiras câmeras foram introduzidas no Brasil. Tem sido grande, desde então, o esforço do pesquisador brasileiro prof. Newton Milhomens (5, 6), que desenvolveu uma máquina com padrão próprio, utilizando o princípio do “efeito Kirlian”, com uso principalmente em Parapsicologia e Medicina. A padronização das máquinas Kirlian tornou-se necessária para permitir comparações dos fotogramas tirados, por exemplo, em diversos estados de saúde de pacientes submetidos à kirliangrafia.

A máquina consiste em uma pequena caixa colocada dentro de um campo eletromagnético de alta tensão. Ela é, portanto, um gerador de pulsos elétricos de alta tensão e com uma freqüência bem elevada. Ligando-se a máquina em uma fonte de energia elétrica, ela é preparada com o filme que será sensibilizado pelo objeto a ser observado. Entre os corpos a serem fotografados podemos incluir folhas, plantas, pequenos seres vivos em geral e o dedo humano. Este foi um tremendo avanço no registro do halo energético, reduzindo de tamanho a máquina e, portanto, o custo das imagens. Assim, a focalização dos objetos deslocou-se para o dedo humano em vez de todo o corpo ou mesmo a cabeça, como acontecia nas primeiras máquinas Kirlian.

 

i Pós-Kirlian

 

Muitos investigadores, usando o “efeito Kirlian”, deram continuidade aos seus trabalhos na União Soviética, como foi o caso de V. M. Inyuschin, da equipe de Alma-Ata, no Casaquistão, hoje uma república independente. Ele teria comentado num texto apresentado num seminário organizado em Moscou, em 1969 (4):

 

Então foi descoberto o quarto estado da matéria, chama­do plasma, no qual as partículas estão ionizadas e carregadas, com elétrons livres misturados com elas; poderemos ter plasma quente, tal como acontece nas estrelas, e plasma frio, que, de acordo com as doutrinas do bioplasma, pode ser encontrado nos organismos vivos. Pelo fato de que as partículas se acham carregadas, elas podem afetar os campos elétricos usados na fotografia Kirlian e, assim, tornarem-se visíveis no filme foto­gráfico.

 

 Vemos, assim, que foi V.M. Inyushin quem deu o nome de bioplasma a este plasma frio, que é encontrado em todos os organismos vivos, constituído por matéria ioniza­da e carregada com elétrons livres. Outra informação interessante é que a equipe de investigadores de Alma-Ata, usando emulsões fotográficas especiais, teria registrado emissões oriundas dos olhos huma­nos, capazes de atravessar finas lâminas metálicas!

Esta mesma equipe, fazendo experiências sobre contaminação, descobriu, também, (4):

 

A possibilidade de transportar infor­mação de uma cultura contaminada para outra sã, através de radiação portadora emanada da primeira, ocasionando danos á segunda. O mesmo Inyushin chegaria à conclusão de que a ‘radiação bioplásmica é a estrutura básica do organismo vivo, que assegura os seus processos energéticos’.. O conceito básico con­siste na suposição de que existe no organismo una substância - plasma - cujas propriedades se aproximam daquelas atribuídas aos plasmas - cristalinos ou aos semicondu­tores sólidos. As complexas relações mútuas entre elétrons e prótons criam uma entidade única sob o ponto de vista organizacional.

 

O engenheiro Vladimir Mas­poust (da ex-Checoslováquia) afir­ma que o plasma biológico encontra-se em todas as células animais e vegetais como uma irradia­ção que recobre as células nucleares – o que foi confirmado com um microscópio eletrônico montado numa câmara Kirlian. A perda desta energia representaria urna depressão e mesmo a morte das referidas células.

No Brasil, muitos médicos estão usando a kirliangrafia para diagnosticar seus pacientes. É o caso do brasileiro Luís Vie­gás, que a aplicou aos casos de regressão a vidas passadas sob hipnose do paciente. Esta técnica permitiu o registro das emoções, co­mo sustos, alegrias, tris­tezas e preocupações que ocorreram durante o procedimento. Aliás, muitos pesquisadores que estão estudando fenômenos paranormais, só encontram explicação por intermédio do corpo bio­plasmático.

 

3.      Natureza da Aura

 

Nossa aura, que é uma representação vibracional física (corpo físico), mental (pensamentos) e emocional (emoções e sentimentos) e se forma ao redor do corpo e principalmente contornando a cabeça, se apresenta como formas de pensamento. Nessas formas e nessas cores, o estado mental e emocional das pessoas resulta configurado ou “retratado” (3) e a figura ou imagem engendrada pelo pensamento se fundamenta nos seguintes fatores:

 

i A qualidade dos pensamentos, determinada pela cor;

i A natureza dos pensamentos, determinada pela forma e,

i A precisão dos pensamentos, determinada pela precisão dos contornos.

 

A energia anímica utilizada pelo espírito é o princípio ativo, que forma a aura do corpo fluídico ou perispírito, de tenuidade inferior à do corpo físico. Contudo, (1) “nenhuma dessas auras se compara com a do espírito que, por sua intensidade e a variedade de cores, define, com fidelidade, a natureza das suas vibrações”.

Os sentimentos e emoções têm uma enorme influência na formação das cores, a tal ponto que nos limites da gama de cores, a cor preta (todas as cores do espectro luminoso são absorvidas) é representativa dos mais baixos e animalizados sentimentos e a cor branca (todas as cores do espectro luminoso são refletidas), límpida, cristalina e sem manchas representa a pureza e a perfeição só encontradas nas mais altas formas de desenvolvimento espiritual. No intervalo desses limites, são encontradas auras com toda uma imensa variedade de cores e nuances, definindo (1) “um estado, uma emoção, um sentimento, imperfeitos, já se vê, porque a meta a ser alcançada é a perfeição, traduzida pela branca”.

É fato bem sabido que as cores percebidas e distinguidas pela visão física são as que derivam da faixa do espectro eletromagnético que contém as vibrações de luz visível, com comprimento de onda que vai de 380 - 780 nanômetros (nm), enquanto que as cores que são percebidas pelos sensitivos ou médiuns videntes na aura das pessoas se enquadram em outra faixa do espectro.

A aura humana é o espelho do pensamento, variando de cor conforme a vibração dos pensamentos, sentimentos e emoções de cada pessoa. Quando a pessoa está calma e tranqüila, ela é reveladora da evolução do espírito.

Como durante o processo de evolução do espírito ocorre, gradativamente, de encarnação em encarnação ou mesmo numa mesma encarnação, a depuração de um ou mais sentimentos e emoções juntamente com o aperfeiçoamento de um ou mais atributos do espírito, a cor representativa do estado ou grau de evolução é composta de numerosas outras cores combinadas, cada uma representando a presença de determinado sentimento, emoção ou paixão.

O procedimento de eliminação dos defeitos que caracterizam a personalidade de cada um é função de muito esforço e força de vontade e varia de pessoa a pessoa, naturalmente. Cada criatura bem intencionada procura despojar-se, com o tempo, dos defeitos que vai notando em si e, como são numerosos, muitos outros permanecem para serem eliminados na encarnação seguinte. Tomemos a vaidade, o orgulho, a inveja e ódio, todos exemplos de defeitos ou sentimentos negativos muito fortes. Se numa encarnação eliminamos o orgulho, ainda restam os outros três e assim por diante. Dominar os nossos mais baixos sentimentos e instintos deve ser uma preocupação constante de todos, pois só assim realçamos os sentimentos positivos, tão necessários na composição de nossa aura.

Antônio do Nascimento Cottas, um espiritualista famoso, que presidiu o Racionalismo Cristão durante 57 anos, mencionou certa vez a existência de cerca de 900 sentimentos positivos e negativos, mas não os relacionou; o autor dessa obra elencou cerca de 400 e apresentou em seu livro Reflexões sobre os sentimentos (7) cerca de 75, dentre os mais importantes. Todos eles influem apreciavelmente na formação do caráter e, com ele, vai mudando gradativamente, a coloração habitual da aura.

As cores habituais da aura, como já o dissemos, ocorrem quando os seres estão em condições de serenidade e paz de espírito e definem basicamente o caráter das pessoas, ao passo que as cores passageiras são função do estado mental variável, segundo os problemas que cada um enfrenta no seu dia-a-dia, a cada momento.

O mecanismo cujo efeito recai sobre a coloração da aura é o seguinte: basta a criatura se deixar influenciar por pensamentos, sentimentos e emoções impróprios, decorrentes da variação de suas atitudes e posturas, que a sua aura toma, imediatamente, a cor que determinada emoção produz. De acordo com (1): “É que a emoção produz uma vibração correspondente e esta, dominando o campo da aura, se impõe com a sua cor própria, característica e latente”.

Já mencionamos que médiuns videntes esclarecidos e os espíritos do astral inferior conseguem ler as auras dos encarnados com alguma precisão. No entanto, como a perfeição não existe no mundo Terra (1):

 

A leitura da aura só poderá ser feita com exatidão por espíritos evoluídos conhecedores de toda a sutileza da alternação e combinação de cores, já que numa mesma cor cada tonalidade possui uma expressão ou significado particular, e cada combinação de duas ou mais cores ou tonalidades exige novas definições. Os componentes do Astral Superior têm a aura invariavelmente branca porque, depois de atingir aquele estado, sua natureza passa a ser inviolável.

 

Devemos primar nossas ações não por medo de que nossa aura venha revelar o nosso íntimo aos que a ela têm acesso, mas por esclarecimento sobre as coisas sérias da vida e por dever de nossa consciência, pelo auto-respeito, pelo respeito ao livre-arbítrio de nossos semelhantes, pela dignidade e pelo nosso caráter. Este (1) “se lapida, se aprimora, se aperfeiçoa, se solidifica, sob condições estruturais indestrutíveis, de maneira que, em qualquer situação, as atitudes que pratica revelem sempre a alta qualidade dos seus atributos morais”.

 

4.      Cores da aura humana

 

Em sua obra Formas do pensamento (8), a médium Annie Besant e C. W. Leadbeater, esoteristas, autores do livro, descreveram uma grande variedade de cores e formas de pensamento, corroboradas nas correntes fluídicas do Racionalismo Cristão, conforme descrito por Luiz de Mattos (3) no capítulo sobre “Formas e cores do pensamento”, de sua obra Cientistas sem ciência, 2ª edição, 1939, p. 383-385. Com a simples intenção de tornar conhecida estas valiosas informações, transcrevemos quase todo o conteúdo de suas conclusões. Muito do que aqui se diz pode ser observado nas gravuras contidas na obra, A Vida fora da matéria (2):

 

Quando se sente uma afeição pura, mas pouco definida por alguém, a forma desse pensamento é uma nuvem irregular, por não ser produzida por uma vontade forte, um impulso ardente, enérgico, de maneira a dar-lhe uma forma regular, bem delineada, harmônica e firme em todos os seus contornos, e a sua cor é rósea; e quando essa afeição é egoísta, pouco definida, é uma nuvem mais irregular ainda e matizada de um sentimento menos puro, e assim de uma névoa de egoísmo, que se mostra claramente no meio da cor carmim, que é a cor dos pensamentos de amor.

Esta forma e esta cor pertencem a seres inferiores em espiritualidade e em educação, pois, é o egoísmo a prova real da inferioridade do ser humano.

 

Quando, porém, o ser sente uma afeição bem definida, a forma desse pensamento é distinta, algo poderosa e capaz de produzir um resultado definido, a sua cor é rósea, intensa, e brilhante, idêntica ao sentimento afetivo, bem definida, verdadeira. 

As formas criadas pelo sentimento, pela música, e a influência que ela exerce no espírito humano, são variadíssimas, bem contornadas, harmônicas e algumas lindíssimas em cores e feitios, destacando-se dentre todas as de Mendelssohn, Gounod, Wagner, como se pode ver no livro “A vida fora da Matéria.

 

Quer isto dizer que cada pensamento tem a sua forma regular, harmônica, ou irregular, e as suas cores firmes ou mescladas de cinzento e escuro, conforme o sentir de cada ser; por isso, as cores são assim classificadas: negro, significa ódio e maldade; roxo, em toda a sua escala, desde o roxo de ladrilho ao escarlate brilhante, indica a cólera brutal que se manifesta por meio de relâmpagos, de um roxo escuro, atravessando densas nuvens de cor parda, enquanto que a indignação justa se manifesta por meio de uma cor escarlate, mui viva, que apesar de não ser feia é, todavia, desagradável pelo seu brilho; um roxo escuro e repugnante, quase exatamente o que se chama roxo sangue de dragão é o indicio das paixões animalizadas, de todos os desejos sensuais e desordenados.

 

A cor moreno-claro (como de terra siena queimada) exprime a avareza; o cinzento escuro indica o egoísmo; esta cor se encontra, desgraçadamente, com demasiada freqüência; o cinzento escuro e sombrio é o sinal de depressão, enquanto o cinzento claro e lindo indica medo; o verde cinzento denota embuste, engano, fraude, enquanto que o verde escuro, salpicado de pontos e de relâmpagos, de cor escarlate, manifesta ciúmes.

 

O verde demonstra sempre a faculdade de adaptação; no caso mais inferior, quando se aplica ao egoísmo, esta faculdade se converte a miúdo em engano e falsidade; mais tarde, quando a evolução avança, a cor se faz mais limpa, mais pura, denotando no ser que a possui desejo de ser desprendido, bom, ainda que entrem em seus projetos muitos sentimentos de interesse, como seja o desejo de popularidade, ou de boa reputação.

 

Em seu aspecto mais elevado, o verde delicado e brilhante expressa o poder da simpatia. A afeição se manifesta por intermédio de toda a escala fina, desde o carmesim, à rosa; uma cor acarminada, clara e limpa, significa a afeição moral, forte e sã; se esta cor rosa se torna escura, com um moreno cinzento, opaco, indica um sentimento manifestante egoísta, enquanto que uma cor rosa pálido e pura corresponde ao amor absolutamente desinteressado, de que estão dotadas as almas elevadas.

 

Semelhante aos primeiros alvores da aurora, o amor passa de igual modo do carmim escuro, dos sentimentos grosseiros, aos tons delicados da cor rosa, mais suaves à medida que se purifica a afeição de todo o egoísmo, e cresce cada vez mais, abraçando em sua grandeza a todos os seres necessitados. Esta cor admirável, ligeiramente mesclada com o azul vivo, pode expressar o sentimento amplamente realizado, da fraternidade universal de todos os homens.

 

O alaranjado escuro significa orgulho ou a ambição, e toda a escala fina do amarelo, pertence à intelectualidade; o amarelo com fios de cinzento escuro, demonstrará a inteligência aplicada a satisfazer o egoísmo, enquanto que o amarelo claro indicará uma personalidade intelectual, elevada. O amarelo primavera, pálido e luminoso, é indício da inteligência a mais elevada e desinteressada, é a razão pura, dirigida a fins espirituais.

 

As diferentes tonalidades do azul indicam todos os sentimentos elevados; fazendo escalas desde o azul escuro da irradiação egoísta ao azul cinzento do feiticismo matizado pelo medo, até à cor intensa e brilhante, que representa o ato de irradiação pura de uma alma amante, e o esplêndido azul pálido, exaltação da cor precedente, que demonstra a renúncia do eu pessoal e a união com o Grande Foco. Um pensamento repleto de amor, produzido por uma alma piedosa, dá origem a uma série de tonalidades maravilhosas, semelhantes ao azul profundo da atmosfera da Terra no estio.

 

Algumas vezes, através destas nuvens de um azul esplêndido, resplandecem em todo o conjunto deslumbradoras estrelas de ouro à maneira de chispante chuva.

 

Um sentimento composto de afeição e adoração ao mesmo tempo se manifesta por meio de um tingido violeta, cujos delicadíssimos matizes expressam com exatidão as diversas capacidades que têm as almas para responder à concepção de um ideal elevado.

 

O brilho e a intensidade das cores denotam, em geral, a medida da força e a atividade do sentimento que lhes deu causa, que os originou.

 

5.      Conclusão

 

Do que foi exposto neste capítulo torna-se intuitivo concluir que a aura humana reúne as condições energéticas de nossos pensamentos, sentimentos e emoções, refletindo nela, através de suas cores e formas, o estado dinâmico de nosso ambiente astral e, portanto de nossas atitudes e conduta. Aos que podem ler a nossa aura, como os espíritos do Astral Superior, espíritos do astral inferior e médiuns videntes em geral, nada passa despercebido. Tudo se sabe, nada se oculta.

Vale notar, também, que uma aura saudável, coerente e luminosa nos garante um suprimento de energia vital e nos protege de campos energéticos desintegrantes e negativos de espíritos obsessores.

 

Referências deste capítulo:

 1) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 43.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2004.

 2) MATTOS, Luiz de. A vida fora da matéria. 21.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 1996.

 3) MATTOS, Luiz de. Cientistas sem Ciência, Formas e cores do pensamento. Disponível em: https://www.racionalismo-cristao.org.br/gazeta/diversos/corespens.html. Acesso em 20/02/06.

 4) CHAMBEL, Luis. À volta do corpo – A aura – religião e ciência. Revista “A Razão”.   Jul/Ago/Set 94, p. 1, 12-17.

 5) MILHOMENS, Newton. O modelo energético do homem – o efeito Kirlian.  3.ed. São Paulo: Ibrasa, 1994.

 6) MILHOMENS, Newton. Fotos Kirlian – como interpretar.  7.ed. São Paulo: Ibrasa, 1992.

 7) SAMEL, Caruso. Reflexões sobre os sentimentos. 4.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2006.

 8) BESANT, Annie e LEADBEATER, C. W. Thoughts forms. Adyar. Disponível em: https://www.anandgholap.net/Thought_Forms-AB_CWL.htm. Acesso em 20/02/06.

CAPÍTULO 12

 

 

A MEDIUNIDADE

 

No dia em que as organizações científicas, despidas de preconceitos ou influências sectárias, se dispuserem a estudar a mediunidade, sob os seus vários aspectos e peculiaridades, compreenderão a necessidade inadiável de ser feita uma campanha de esclarecimento da humanidade por meio da mais ampla divulgação dos resultados desses estudos, para que as criaturas se compenetrem de que precisam imprimir uma orientação sadia à sua vida, a fim de que o número de loucos se reduza aos descuidados, aos negligentes e aos desatentos.

Luiz de Mattos – Fundador do Racionalismo Cristão - 1910

 

 

O falta de estudo sobre a mediunidade por parte das organizações científicas, com raríssimas exceções, constitui, lamentavelmente, uma lacuna incompreensível. Com o progressivo desenvolvimento espiritual dos seres e da humanidade em geral, estamos seguros de que, no presente século XXI, teremos grandes surpresas científicas neste campo.

Este capítulo foi introduzido nesta obra com o objetivo de informar o que existe de mais avançado no conhecimento da mediunidade, sem misticismos e sem escamoteações. Trata-se de uma notável faculdade do espírito, o que não significa que, quem a possui seja um ser privilegiado.

A mediunidade, que se apresenta sob diversas modalidades, é uma faculdade inata no espírito de todas as pessoas. Dentre essas modalidades, a mediunidade de intuição, que quase todos as pessoas a possuem em maior ou menor grau, ainda que muitos não a percebam conscientemente, é a mais comum. Dada a sua importância, dela trataremos, com profundidade, no capítulo 13 sobre a Intuição. Todas as demais modalidades estão latentes em muitas criaturas. As pessoas que se dedicam ao exercício da mediunidade, na forma como vimos informando nesta obra e, mais especificamente neste capítulo, são conhecidas como médiuns ou sensitivos, isto é, verdadeiros intermediários entre a vida material e a vida dos espíritos.

 

O desenvolvimento natural da mediunidade nem sempre acompanha o grau de espiritualidade das criaturas, adquirido ao longo de suas múltiplas encarnações. É de se notar que a manifestação da mediunidade varia nas pessoas em função do seu temperamento (emoções), de seus sentimentos, da sua sensibilidade e da sua evolução. Já vimos que (1) “os bons ou maus pensamentos se atraem, na razão direta da sua afinidade e o seu instrumento de captação é a faculdade mediúnica”. Mais adiante (1): “A mediunidade é sempre útil, quando bem aproveitada, mas altamente prejudicial se colocada ao serviço do mal”.

No capítulo 9 sobre a Primazia do Espírito, mostramos que o espaço representado pela atmosfera da Terra está repleto de espíritos desencarnados e de pensamentos que se cruzam em todas as direções, vibrações essas que se aglutinam em duas correntes: a corrente do bem e  a corrente do mal.

No capítulo 10 sobre a Importância do Pensamento, mostramos que todas as pessoas (espíritos encarnados), assim como os espíritos desencarnados, estão o tempo todo a emitirem seus pensamentos sob duas únicas opções: ou estão pensando para o bem ou estão pensando para o mal, nunca para ambos, não havendo outra alternativa. De acordo com a lei das afinidades de pensamentos, os pensamentos afins ou iguais se atraem e os pensamentos contrários se repelem.

Conhecendo-se esses princípios, fica fácil entender por que uma pessoa de bom caráter, que está vibrando o seu pensamento para realizações úteis, alimentando sempre um desejo sincero de progredir material e espiritualmente e esforçando-se por alcançar os seus objetivos, estará sempre em sintonia com as correntes do bem, ficando, então, aberto o caminho para o processo da mediunidade intuitiva voltada para o bem.

Raciocinando contrário senso, fica claro por que uma pessoa de mau caráter, que se predispõe à prática do mal, que se alimenta a todo e qualquer tempo com tendências espirituais malévolas, estará em afinidade com as correntes do mal, constituindo-se em pólo de atração para os obsessores do astral inferior. Isto explica os numerosos desatinos intuitivos que ocorrem a todo momento pelo mundo.

 

1.      Traços gerais

 

Nada do que foi exposto é sobrenatural; ao contrário, todos os fenômenos mediúnicos, dentre os quais o da intuição é o mais representativo, obedecem às leis naturais da espiritualidade. Sempre que há intenções malévolas, expressas através dos pensamentos das pessoas, ocorre a justaposição, pela identidade das vibrações dos seus pensamentos com as vibrações da mesma natureza gerada pelos espíritos do astral inferior ou por outras pessoas igualmente voltadas para o mal. Veja o que nos diz a nossa fonte (1):

 

Os que, grandes ou pequenos, ricos ou pobres, humildes ou poderosos vivem à margem dos bons preceitos morais; os que praticam, oculta ou ostensivamente, ações indignas; os que trazem afivelada ao rosto a máscara da bondade e escondem na alma as mais feias vilanias; os assassinos, os ladrões, os vigaristas, os salafrários, os traidores, os desleais, os falsos, os hipócritas, os mentirosos, os valentões, os desordeiros, os pusilânimes, os vadios e, em geral, todos os patifes, não passam, sem o saber, de seres escravizados a falanges obsessoras que os tornam instrumentos dóceis da sua vontade e os levam a praticar as mais abomináveis ações.

 

Não devemos perder de vista que o astral inferior organiza-se, também, em hierarquias sofisticadas para cumprirem suas intenções malévolas e perversas, as quais recebem o nome de falanges. Fica, agora, fácil entender por que essas falanges, que permeiam o ambiente de nossa vida de encarnados, causam um grande estrago moral e físico à humanidade, em geral, apoiadas que são pela mediunidade das pessoas e das condições consciente e inconsciente que os pensamentos humanos dão aos obsessores.

Nas condições da vida terrena, as pessoas estarão tanto mais expostas aos perigos de uma obsessão quanto mais desenvolvida for a sua mediunidade. Daí, ser de máxima importância que cada um procure conhecer o grau de desenvolvimento de suas faculdades mediúnicas, com o objetivo de se orientar com acerto no controle adequado de seus pensamentos. Lembramos que já dissemos, nesta obra, que tudo na vida das pessoas passa primeiro pelo pensamento. Esse tipo de conhecimento nos leva a afirmar que todos os loucos, sem exceção, têm a faculdade da mediunidade desenvolvida e chegaram à obsessão devido às suas faculdades. Em resumo, é por isso que o espiritualismo trata a loucura como produto da ignorância da vida fora da matéria.

O espiritualismo é uma filosofia que satisfaz à nossa ânsia de querer saber cada vez mais sobre nós mesmos e a mediunidade é o seu instrumento de satisfação ou de desgosto, conforme a empregarmos para o bem ou para o mal. Para encerrar essa introdução a esse capítulo, transcrevemos (1):

 

No dia em que as organizações científicas, despidas de preconceitos ou influências sectárias, se dispuserem a estudar a mediunidade, sob os seus vários aspectos e peculiaridades, compreenderão a necessidade inadiável de ser feita uma campanha de esclarecimento da humanidade por meio da mais ampla divulgação dos resultados desses estudos, para que as criaturas se compenetrem de que precisam imprimir uma orientação sadia à sua vida, a fim de que o número de loucos se reduza aos descuidados, aos negligentes e aos desatentos.

 

2.      Tipos de mediunidade

 

Não escapa a um bom observador, que já tenha certa informação e conhecimento da vida espiritual, a existência de vários tipos ou modalidades de mediunidade, que analisaremos, a seguir, com alguma profundidade. Entre elas, estão a mediunidade intuitiva, a auditiva, a olfativa, a vidente, a psicográfica e a de incorporação, com os respectivos fenômenos objetivos de desdobramento, de materialização, de levitação e de transporte. Em outra parte dessa obra, no capítulo 8 sobre a Força Inteligente, procuramos mostrar que esses fenômenos podem ser classificados em subjetivos (os diversos tipos de mediunidade) e objetivos (os diversos fenômenos que se externalizam e atuam sobre a matéria).

 

i Mediunidade intuitiva

 

A mediunidade intuitiva é um reflexo direto da sensibilidade psíquica da pessoa. Parece ser correto dizer-se que a mediunidade intuitiva está intimamente relacionada com o órgão telepático incipiente – a glândula pineal, que também se desenvolve com a espiritualidade; por sua vez, a telepatia é uma faculdade ainda não sensivelmente desenvolvida no homem, por razões óbvias.

Estes três predicados espirituais – a intuição, a telepatia e a incorporação operam em conjunto com a glândula pineal em ações coordenadas e complementares, para se obter os melhores resultados. O desenvolvimento desses predicados sob rigoroso controle e disciplina oferece os mais perfeitos resultados na captação de pensamentos de espíritos desencarnados ou não.

Um estudo mais completo e profundo desse tema é apresentado no capítulo 13 sobre a Intuição, modalidade preferida de transmissão de intuições pelo espíritos superiores, em que os médiuns não perdem o controle de si mesmos. Completa-se dizendo que, nesta modalidade, os médiuns sabem “filtrar” as inconveniências e palavras de baixo calão por acaso intuídas pelo espíritos do astral inferior.

 

i Mediunidade auditiva

 

Na mediunidade auditiva o sensitivo ou médium ouve sons estranhos que a pessoa comum não ouve. São sons produzidos em freqüências mais altas (ultra-som) do que as freqüências audíveis do espectro sonoro (de 10 – 20000 hertz ou ciclos por segundo) ou, então, abaixo dessas freqüências. Estes sons são normalmente ouvidos diretamente dentro do cérebro sem passar pelo aparelho auditivo. É este tipo de mediunidade que permite transmitir os pensamentos dos espíritos atuantes.

 

i Mediunidade olfativa

 

Neste tipo de mediunidade, o médium tem uma sensibilidade muito grande para cheiros e aromas, pois suas glândulas olfativas se desenvolveram a ponto de captar facilmente de três mil a cinco mil aromas diferentes, desde os mais grosseiros aos mais sutis. Entre os mais grosseiros, sente os cheiros de “miasmas” (corpos orgânicos em decomposição ou putrefação), vários tipos de poluição (enxofre, cigarro, charuto, odores alcoólicos) e perfumes elaborados pelo homem, das flores do campo e sutis, como os dos fluidos deixados pelos espíritos do Astral Superior.

i Mediunidade de vidência e clarividência

 

Este tipo de mediunidade é mais raro, sendo o médium chamado de vidente. A visão desses médiuns alcança vibrações além e aquém do espectro de luz visível (as sete cores básicas e suas combinações), sendo um recurso de inestimável valor para se conhecer a vida fora da matéria, perceber ao diversos tipos de auras, etc. Veja o livro a Vida fora da matéria (2), que mostra, em gravuras elaboradas em tricomia, as auras do mundo mineral, vegetal e animal, bem como, do homem em diferentes condições de pensamentos e sentimentos. Trata-se de uma obra maravilhosa e podemos afirmar que não existe outra com tanta riqueza de informações sobre a vida fora da matéria.

Já a clarividência é a forma mais extraordinária de mediunidade. Enquanto a vidência alcança o aqui e o agora, a clarividência vai além, no tempo. Embora o futuro decorra de nossas ações no presente, isto é, depende da escolha de numerosas possibilidades por parte dos seres, a clarividência é intuída com base no conhecimento que espíritos do Astral Superior têm e intuem percepções do futuro nos médiuns, já que para os espíritos superiores não existe o presente, o passado e o futuro, tudo é eterno. É uma modalidade de mediunidade muitíssimo rara.

 

i Mediunidade psicográfica

 

É a modalidade de mediunidade em que o espírito age diretamente sobre a mão e os dedos do médium, permitindo a escrita direta de mensagens e comunicações dos espíritos. É o tipo de mediunidade bem aceita pelas pessoas comuns. Pois que, por curiosidade, procuram médiuns para receberem mensagens de parentes e amigos desencarnados, o que de fato pode ocorrer, mas a possibilidade de mistificação é muito grande e, ainda que verdadeiras, as mensagens recebidas não trazem nenhuma lição de valor ou benefício às pessoas. A grande maioria dessas mensagens provém de espíritos desencarnados que estão quedados no astral inferior. O uso da mediunidade para atender individualmente qualquer pessoa é condenável, principalmente se por este “trabalho” for necessário qualquer pagamento, ainda que a título espontâneo. A mediunidade é coisa muito séria e não se deve dela fazer mau uso.

Enquanto não se dispunha dos modernos processos de gravação eletrônica, era a única forma de registrar as informações mediúnicas. Esclarecemos que muitas obras de grande valor foram psicografadas por intuições recebidas de espíritos superiores por médiuns auditivos, mas também, um maior número dessas intuições foi recebida de espíritos do astral inferior, estas sem nenhum valor moral.

 

i Mediunidade de incorporação

 

A mediunidade de incorporação é aquela em que o espírito atua diretamente sobre o corpo do médium, sendo facilmente notada. É uma forma de mediunidade que, no momento da atuação, não escapa à vista de ninguém, pois nela, o espírito atuante tem o controle da situação. Segundo (1): “O médium de incorporação nem mesmo precisa se concentrar para receber a influência dos espíritos do astral inferior, pois a sua sensibilidade e o sistema nervoso estão de tal forma predispostos que lhe basta, para ser brutal ou brandamente atuado – conforme os sentimentos que animarem o obsessor atuante – a ação do pensamento”. A predisposição se dá, principalmente, pela natureza dos maus pensamentos – ódio, mágoa, vingança, inveja, etc. (vide o capítulo sobre a Aura) ou mesmo por debilidade espiritual atribuída a fluidos pesados de que se acha possuída a pessoa.

É mais ou menos comum observar-se a atuação de espíritos inferiores em pessoas dotadas desse tipo de mediunidade pelas ruas da cidade. Umas caem ao chão debatendo-se descontroladamente, completamente “fora de si”. É preciso não confundi-las com outras atacadas por epilepsia, que apresenta sintoma semelhante, mas é uma doença de origem nervosa, caracterizada por ataques convulsivos e perda de consciência e outros sintomas específicos. Outras, encontram-se avassaladas há muito tempo e são vistas “conversando sozinhas”, “com ninguém”: na verdade, conversam com seus obsessores. Ambas são situações em que o homem comum, sem o conhecimento espiritual, nada pode fazer em benefício desses infelizes. Citando (1): “Poderão dar-lhe outros nomes, atribuir-lhe outras causas para justificar o ignorado, mas a verdade é uma única e, mais cedo ou mais tarde, o reconhecimento da mediunidade de incorporação, como faculdade espiritual, terá de impor-se, pela sua evidência, como todas as coisas palpáveis do Planeta”.

Em condições especiais e de absoluto controle, em correntes organizadas para se demonstrar a existência da vida fora da matéria, o médium pode concentrar-se com o propósito de se deixar atuar por incorporação, havendo a justaposição do espírito atuante ao seu corpo, sem que o instrumento mediúnico perca a consciência. Segundo (1): “Esse espírito serve-se da mediunidade do instrumento de incorporação para exteriorizar o seu pensamento, deslocando-se, ligeiramente, o espírito do médium em concentração da posição normal para facilitar a captação dos pensamentos transmitidos”.

Nós acreditamos que tais condições especiais podem ocorrer, analisadoas pela boa lógica da inteligência racional e do entendimento, quando o fluido do perispírito do espírito atuante for similar ao fluido do perispírito do médium, isto é, quando houver uma identidade “quase perfeita” de fluidos, condição possível quando ambos os espíritos, o do espírito atuante e o do médium, pertencerem ao mesmo mundo espiritual de estágio ou de origem. Mencionamos identidade “quase perfeita” por que cada perispírito, a despeito de se constituírem, no caso, da mesma matéria cósmica do mundo comum de origem, se diferencia um do outro por guardar parte (memória, sentimentos, etc.) da individualidade de cada um dos espíritos em questão.

A mediunidade de incorporação acarreta grandes riscos, não sendo recomendável desenvolvê-la, a não ser em ambientes rigorosamente controlados por espíritos superiores. Se ela existe, recomenda-se conservá-la como tal, devendo o médium apenas utilizar sua sensibilidade adicional. Esta é muito útil para o efeito de guiar a sua percepção para fenômenos que ocorrem ao seu redor, sem serem relatados, mas que revelam intenções do pensamento alheio. (3)

3.      Qualidades necessárias e desejáveis

 

Há um conjunto de qualidades e características (3) que são necessárias e desejáveis em todos aqueles que venham usar e desenvolver suas mediunidades, dentre elas:

A precaução deve estar sempre presente na vida do médium. Nem todos os médiuns conhecem ou dispõem de ambientes seguros para a prática da mediunidade. Nesses casos, o médium não deve se preocupar diretamente com esta faculdade, mas pode usar discretamente a sua “[...] magnífica modalidade sensitiva para prestar, com ela, preciosos serviços no meio em que viverem, ora transmitindo conselhos previdentes, ora impedindo a prática de atos prejudiciais”.(3)

A vida sã é uma segunda qualidade ou condição primordial no cotidiano do médium. Ou seja, ele deve pautar suas ações sob a inspiração dos princípios verdadeiramente cristãos para que não seja atuado ou submetido à aceitação de mistificações por parte de espíritos obsessores, em qualquer circunstância. Em resumo, o médium deve dar exemplo de retidão de caráter e vida digna.

A humildade deve estar sempre presente em todas as situações, não devendo o médium nunca se prevalecer de sua faculdade mediúnica para se impor ou mesmo para amedrontar as pessoas. A arrogância deve ser eliminada de suas posturas. Para isso, é necessário refletir sempre sobre sua própria natureza transitória neste mundo e aprender a encarar todas as situações e coisas com muito realismo. Ninguém melhor que o médium esclarecido sabe discernir sobre o que é real e o que é irreal, pois ele sabe que (3) “[...] o tempo de duração de uma existência terrena, seja ela de setenta ou cem anos, é comparativamente, em face da vida eterna, menos do que uma gota de água do oceano”. Assim, o médium deve se imbuir de que a humildade e o realismo são ferramentas necessárias na sua vida, sendo preciso saber manejá-las a todo tempo. Diante dessa realidade, aprenderá que não se deve (3) “[...] dar tanta importância, como em geral se vê, às posições e grandezas absorventes que a vida terrena pode, no campo material, oferecer”.

A discrição é outro predicado ou característica desejável em todas as pessoas e com muito mais razão ainda, por parte dos médiuns. Com os médiuns videntes, a discrição não deve nunca ser ignorada, não revelando ou relatando o que vê junto às auras das criaturas, ainda que seja uma assistência astral elevada e positiva, pois isto pode estimular o orgulho dessas pessoas e isso é negativo. Nós estamos nos referindo aqui do orgulho com o sentido bem conhecido de empáfia.

A dedicação ao estudo é outro aspecto desejável no exercício da mediunidade. Todo médium que realmente deseja evoluir precisa estudar sempre, principalmente obras que possam alargar o conhecimento que já possui sobre mediunidade e sobre os princípios da moral cristã como, por exemplo, as obras citadas na referência a este capítulo (1, 2, 3), além de outras obras educativas, que servem para afastar, de modo geral, a ignorância da verdadeira realidade da vida.

Finalmente, o médium esclarecido e valoroso deve encarar a necessidade de eliminar um conceito que se acha muito arraigado na mente da grande maioria dos médiuns – a de que a mediunidade é um privilégio. Antes, deve saber e admitir que a mediunidade seja inata nas criaturas e que ela impõe deveres e responsabilidades muito sérias àqueles que a desenvolveram e a colocaram ao serviço do bem. Os médiuns que já fizeram essa opção sabem muito bem que o fizeram com espírito de renúncia, deixando de lado as atrações efêmeras do mundo, por saberem que elas não passam de fugidias reminiscências do passado.

 

4.      Disciplina: o segredo da mediunidade segura

 

A ninguém passa despercebido que o pensamento é fugidio, estando sempre mudando de um assunto para outro. Daí, a necessidade de se aprender e aplicar técnicas de controle e disciplina do pensamento, prática indispensável a todos e, principalmente aos médiuns. Embora muitas vezes bem intencionados, muitos médiuns acabam por se tornar vítimas dos espíritos do astral inferior e cometerem desatinos de graves conseqüências, por não praticarem uma disciplina rigorosa para com seus pensamentos e hábitos.

É de fundamental importância conhecer as pessoas de suas relações, saber com quem anda ou quem recebe em sua casa. É preciso saber selecionar essas amizades. É necessário saber evitar conversas impróprias e aprender a reduzir suas preocupações ao mínimo. Ter horas para tudo – trabalho, refeições, lazer e sono. Evitar as canseiras devidas ao trabalho excessivo. Especial atenção deve ser dada á saúde do corpo físico e mental. Exercitar sempre a sua capacidade de reação ao desânimo e ao desalento. Essas são medidas gerais válidas para qualquer pessoa e principalmente recomendadas aos que exercem a mediunidade.

Entre as medidas gerais para todas as pessoas e para os médiuns em particular está a necessidade de ter ocupação remunerada ou ser independente financeiramente. Todos sabemos que o trabalho digno é a alavanca para o progresso das pessoas e dos povos. Ele não só constitui um forte estímulo para o corpo físico, como também, em muitas profissões ditas intelectuais, serve ao desenvolvimento da inteligência e do raciocínio. O trabalho honesto, exercido em qualquer condição, excetuadas as condições de insalubridade e de trabalho escravo, é sempre proveitoso ao espírito. O trabalhador deve sempre exercer as suas tarefas com satisfação e com atenção voltada para os bons resultados, qualquer que seja a sua profissão.

Com relação ao sono e ao lazer, não resta a menor dúvida que todos nós precisamos de descanso, repouso e recreação nas horas próprias. Mas, todos devemos nos esforçar para não nos entregarmos à ociosidade e à indolência, fatores prejudiciais, principalmente aos que desempenham a mediunidade.

A referência (3) elenca um grande número de conselhos e normas disciplinares para que os médiuns tenham e conservem uma mediunidade disciplinada e segura, sem interferências indevidas dos espíritos do astral inferior. Além das condições já mencionadas, citamos algumas: alimentar-se moderadamente, não se irritar nunca diante dos erros de outrem, não discutir nunca, ser tolerante às opiniões alheias, saber ouvir sem interferir, não blasfemar nem maldizer nunca, combater os sentimentos de revolta, evitar certos ambientes sabidamente nocivos, conservar a serenidade e a paz de espírito, ser verdadeiro e leal, pensar antes de falar, saber ouvir e saber calar, ser compreensivo com as dores alheias, não se lamuriar nem queixar-se, dividir o trabalho do lar com o cônjuge, não ralhar com os filhos, ser parcimonioso com os gastos, suprimir o desperdício, combater a vaidade e o orgulho, abominar a malquerença, evitar a paixão de qualquer tipo ou por qualquer coisa, cultivar bons sentimentos, saber renunciar, ser humilde, ter vida simples, etc.

Essas recomendações são regras cristãs que valem em qualquer circunstância. Elas visam diminuir a vulnerabilidade dos médiuns (3) “[...] aos espíritos do astral inferior, que dão preferência aos médiuns de incorporação para sobre eles exercerem ação perniciosa, obsedante e aniqüiladora. Além disso, a prática desta disciplina favorece a formação de uma personalidade serena, confiante e esclarecida, indispensável ao exercício da mediunidade. Evidentemente, esta disciplina é recomendável aos que possuem qualquer das outras modalidades mediúnicas e aos seres em geral, por ser a mediunidade intuitiva comum a todas as pessoas”.

Os médiuns que trabalham em instituições sérias, como o Racionalismo Cristão (1, 2, 3), levam muito a sério a disciplina que descrevemos, não podendo ser tolerada a sua quebra, uma vez que foi instituída para segurança deles mesmos e de todos. Assim procedendo, estarão dando (3) “demonstração de amor à Causa, conhecimento dos princípios doutrinários e intransigência em relação ao cumprimento do dever. A sua quebra pode ocasionar prejuízos materiais e morais, além de descrédito para a Doutrina. Esta observação não atinge somente os médiuns, mas a todos os militantes”.

 

5.      Conhecimentos específicos

 

Os conhecimentos sobre a vida espiritual foram apresentados nos capítulos 9, 10 e 11, respectivamente sobre o Espírito, o Pensamento e a Aura. Estamos recapitulando e completando aqui certos conhecimentos espirituais específicos, relacionados com a mediunidade.

É fundamental que o ser humano se conheça como Força e Matéria para obter o melhor aproveitamento possível de sua vida terrena. No ser humano, a Força é o Espírito, invisível aos olhos materiais, que atua sobre a Matéria. A Matéria é tão somente o veículo ou instrumento do qual o espírito se serve para promover sua evolução na Terra. Além desses dois elementos, existe um terceiro, também material – o corpo astral ou perispírito, que o espírito traz de seu mundo de origem. É constituído de mátéria cósmica, tênue e sutil, também invisível aos olhos materiais. Este elemento, intermediário entre o espírito e o corpo, tem grande importância nos processos de mediunidade em geral, principalmente na mediunidade de incorporação.

Interessante assinalar que a Matéria (corpo físico e perispírito) tem propriedades, mas não tem atributos ou faculdades, enquanto que o espírito tem inumeráveis atributos ou faculdades e só algumas delas são reveladas, por serem necessárias à vida terrena. Entre estas faculdades, está a mediúnica, inata e comum a todas as pessoas, pelo menos a intuitiva. A influência que essa faculdade exerce na vida de todos nós é muito importante. Seu estudo se impõe a todos os seres que desejarem realmente viver conscientemente e não apenas vegetarem, procurando conhecer um pouco de sua natureza complexa e suas múltiplas modalidades de manifestação.

Contrariamente ao que muita gente pensa, a mediunidade não é hereditária, ela é uma faculdade ou atributo próprio do espírito. Ela, também, não é uma doença. A hereditariedade e as doenças, como por exemplo, a sífilis e tantas outras do mesmo gênero das quais a Medicina cuida, são próprias do corpo físico. Sendo mais direto, a mediunidade é uma ferramenta, um dom natural da criatura. Ou, ainda, segundo (3):

“Todos vêm à Terra encarnar com as ferramentas adequadas aos misteres que vão exercer. As ferramentas são os dons, as especialidades, as vocações. Uns trazem o tino comercial; outros, a vocação para lecionar, a artística, a científica; ainda outros vêm para ser artífices, industriais, lavradores e, entre todos, muitos trazem, por acréscimo, a faculdade mediúnica da incorporação”.

A mediunidade deve ser exercida sob rígidas regras, jamais como um meio de vida e sustento material, mas espontânea e graciosamente, objetivando o bem geral da humanidade. O médium que se afastar dessa regra fundamental estará comprometendo seriamente a sua encarnação.

A principal característica de um médium é sua alta sensibilidade, a qual tem íntima ligação com o sistema nervoso. E esse sistema, uma vez alterado, poderá levar a pessoa à irritabilidade, expondo-a as investidas dos obsessores. Por serem muito sensíveis e vibráteis, os médiuns são facilmente sugestionáveis com o que os outros falam ou fazem, dependendo de como estes sentimentos se ajustem ou se conflitem contra as suas próprias emoções e temperamento.

A conclusão que se pode tirar do que foi exposto é que o ponto fundamental para as pessoas em geral e “principalmente para os que possuem a faculdade mediúnica mais desenvolvida, é o controle individual, não se deixando irritar por coisa alguma, muito embora se manifeste neles uma forte tendência para agir de forma impulsiva. A tarefa, por certo, não é fácil, mas a dificuldade não deve influir para que o assunto não seja encarado com a seriedade que exige”. (3)

Daí, no ambiente em que vivemos, a necessidade de se esclarecerem, de aprenderem a se defender “[...] dos golpes de forças maléficas terríveis que envolvem o mundo e têm como ponto de apoio os milhões de médiuns ignorantes, displicentes e incautos dispersos pelo Planeta”.(1)

Todas as faculdades espirituais se desenvolvem progressivamente ao longo das encarnações,e a mediunidade não foge a esta regra. A nossa referência (1) descreve muito bem essa situação:

 

“Desde o primeiro grau de evolução nas camadas humanas mais atrasadas, nos ritos selvagens, na prática da magia, começam certos indivíduos a desenvolvê-la sem preparo psíquico, sem conhecimento dos riscos a que se expõem pela inobservância da disciplina que deveria acompanhar tal desenvolvimento. Isso explica o fato de encontrar-se o mundo repleto de criaturas anormais, perturbadas, paranóicas, obsedadas”.

 

Para que o médium não venha se tornar um instrumento inconsciente a serviço das perversas forças do mal e de freqüentes mistificações, torna-se necessário aprender a se resguardar de tais influências nefastas mediante a observância de adequada disciplina na forma acima apresentada.

Ressaltamos que as discussões, sob qualquer pretexto, são sempre induzidas pelas forças do astral inferior e devem ser evitadas a todo custo. São elas que levam ao desentendimento, a magoa e aos ressentimentos tão nocivos à harmonia dos lares. Ressaltamos, ainda, que quem pauta a sua vida fora da disciplina aqui exposta corre todos os riscos de avassalamento, inclusive da loucura.

 

6.      Condições para perturbação

 

Nas condições atuais de evolução do homem, observamos um desvio muito grande das suas atividades enobrecedoras para se embrenhar nas ilusões e fantasias da vida material, levando-o a um verdadeiro afastamento de seus deveres morais e espirituais. Com isso, vemos imperar, por toda parte, os baixos sentimentos e os instintos animalizados, criando condições para a perturbação geral do planeta. Portanto, ninguém ignora que condições para perturbação não faltam.

De outro lado, justapondo-se à vida terrena do homem, existe um submundo espiritual formado pelos espíritos do astral inferior que vagueiam pela crosta terrena, onde imperam (3) “os seres desencarnados de má índole, bisbilhoteiros, fanfarrões, intrigantes, os que gostam de graçolas fúteis e de mau gosto, amantes de mexericos, vingativos, gozadores, pusilânimes, ignorantes, pérfidos, ociosos, xingadores bestiais e ignóbeis que foram, quando encarnados, mentirosos, delatores, vilões, sensualistas, malandros, traidores, velhacos, impostores, pervertidos, prevaricadores, homicidas, gatunos, falsificadores e imorais”.

Esses espíritos, que se organizam em verdadeiras falanges para melhor cumprirem os seus objetivos malévolos, vivem em permanente estado de perturbação, proveniente dos crimes resultantes do mau uso que fizerem do livre-arbítrio enquanto estavam encarnados. Livres para exercerem suas nefastas ações como verdadeiros delinqüentes, empregam todo o seu tempo para atormentar os seres humanos. Estes, despreparados espiritualmente, os atraem inconscientemente, por não saberem resistir às suas insistentes e insidiosas intuições. Esta ação se faz presente com mais intensidade sobre aqueles que foram seus inimigos quando encarnados, atuando de forma mais eficaz por terem se tornado invisíveis, mediante reconhecida vingança sobre seus antigos desafetos.

Observa-se, portanto, que a ação é conjunta e se processa entre as pessoas, cujos instintos animalizados foram acima descritos – pessoas de mau caráter, desconhecedoras da vida espiritual e os espíritos obsessores, que desrespeitando as leis naturais permanecem perturbados na crosta e na atmosfera da terra. E, como precaver-se do risco de tais ações?  A resposta é uma só: mediante o uso bem orientado do pensamento sustentado por uma força de vontade muito grande dirigida sempre para o bem. Ensinando às pessoas a evitarem os maus hábitos e os vícios e a viverem conscientemente com a certeza plena da existência do mal, suportado pelos seus maus pensamentos e pelas intuições dos obsessores.

É óbvio que os médiuns, por possuírem uma sensibilidade bastante aflorada, correm riscos de obsessão muito mais freqüentes e danosos e, por isso mesmo, precisam estar muito bem prevenidos da natureza e origem desses riscos. O pleno conhecimento desses fenômenos e de como a mediunidade se processa é um dever que se impõe a todos os médiuns, esclarecendo-se sobre as verdadeiras causas da obsessão. Como esta ação nefasta dos obsessores é sutil, lenta e gradual e ocorre, inicialmente, de maneira imperceptível através de vibrações harmônicas dos obsessores com as dos médiuns, explorando neles certas tendências e anseios alimentados pelo mau uso do livre-arbítrio, só o esclarecimento dessas verdades lhes dará condições de perceber o que está ocorrendo e de reagir para repelir o mal.

A focalização intensa dos obsessores sobre os médiuns não pode nunca ser ignorada por estes, a tal ponto que devem se aperceber do que está se passando com ele e ao seu redor, pois quem constrói o pólo de atração são os próprios médiuns. Tudo depende de suas vontades e pensamentos para evitar descuidos e vacilações, pois os espíritos obsessores estão sempre atentos e vigilantes e não perdem a oportunidade de agravarem o mal.

Diante do quadro acima, pintado sob a ótica espiritualista das misérias da vida terrena, destacamos o seguinte trecho de nossa referência (3): “Aqueles que desconhecem o que somos e o que é a vida fora da matéria, não têm meios de defesas contra tais situações, e os que possuem mediunidade, principalmente a de incorporação, sem ter o adequado esclarecimento, vivem desprotegidos, terminando, não raro, vítimas da obsessão ou da loucura”.

Para concluir esta parte desse tema, lembramos que a grande maioria dos pais não tem o conhecimento de que seus filhos, desde tenra idade, possuem a faculdade mediúnica, que pode ser percebida de muitas maneiras, como por exemplo, através do choro inesperado e aparentemente sem causa, das pirraças, da desobediência, da repulsa aos ensinamentos, das mentiras deslavadas e tantas outras que, se não corrigidas desde cedo, vão afetar o comportamento dessas pessoas por toda a vida. Daí, o grande papel reservado aos pais de família no processo de forjar o caráter e incentivar os bons sentimentos de seus filhos para se construir uma humanidade melhor.

 

7.      O mal da ignorância espiritual

 

É muito grande, por parte da humanidade em geral, a ignorância sobre os fatos da vida espiritual, principalmente sobre a existência da mediunidade de forma mais ou menos generalizada. Além da mediunidade intuitiva, por incrível que pareça, a mediunidade de incorporação é mais comum do que muita gente pensa. Em todas as classes sociais há pessoas portadoras dessa modalidade de mediunidade. E, (1), “Por se conservarem nessa ignorância, uns acabam praticando o suicídio, outros desaparecem em desastres, muitos superlotam os hospitais, as cadeias e penitenciárias e grande parte desses indivíduos, com a faculdade menos desenvolvida, vive a provocar desordens, a perder-se no jogo, a deprimir-se no álcool e a arruinar-se na sensualidade desenfreada”.

E como isso acontece? A causa principal de tudo isso recai sobre os espíritos desencarnados do astral inferior que, aos milhões, perambulam pela atmosfera da Terra.

Estes espíritos identificam, rapidamente, as pessoas que possuem a mediunidade de incorporação ao perceberem a facilidade com que recebem suas intuições, o que não ocorre com as demais. Trata-se de espíritos que, quando estavam encarnados, eram amantes de discussões, intrujões, malquerentes, mexeriqueiros, desleais, desonestos, intrigantes, patifes, alcoviteiros, facciosos, corruptores e corruptos, jogadores, viciados, traficantes, bandidos, etc. Estes espíritos, encontrando campo aberto, utilizam-se da mediunidade de incorporação das pessoas para satisfazer os seus desejos malignos e assim, poderem saciar as suas paixões desenfreadas junto aos incautos e desavisados.

Por este simples fato da realidade espiritual, decorrente da lei da atração e repulsão ou das afinidades, os espíritos obsessores transformam, fatalmente, as criaturas dotadas de mediunidade de incorporação em vítimas, desde que, não possuam o esclarecimento necessário e não estejam preparadas para repelir as intenções maléficas de tais obsessores.

Na mediunidade intuitiva os efeitos podem demorar em aparecer, muitas vezes em forma de dores de cabeça sem causa aparente, perda de sono, diversos tipos de medo, angústia, estresse psíquico, maus hábitos, cacoetes e até doenças físicas. A situação se torna muito mais grave, ainda, quando se trata da mediunidade de incorporação, ficando o indivíduo sujeito a receber pesadas e deletérias cargas fluídicas que incitam a criatura contra seus desafetos e até mesmo contra os inimigos dos próprios obsessores.

Com o tempo, com o esclarecimento e a evolução da humanidade, pouco a pouco as pessoas começarão a entender e compreender essa realidade espiritual. Enquanto tais conhecimentos não forem amplamente divulgados e conhecidos as cadeias e presídios continuarão cheios de infelizes alienados e os hospitais psiquiátricos estarão repletos de loucos de todo tipo (obsedados). É o que nos ensina a obra (3):

 

Os piores males causados à coletividade são, ainda, os praticados pelos obsedados que andam soltos, sem que a maioria os reconheça. Todos eles são médiuns, uns mais outros menos desenvolvidos, mas sempre na primeira fase da evolução mediúnica e, por isso, joguetes indefesos de espíritos do astral inferior para a prática do mal.

Não comete exagero quem assegurar que as desgraças, os crimes ou desavenças, a intranqüilidade, os infortúnios, as prevaricações, as injustiças e os danos pessoais têm a sua origem, direta ou indireta, nas irreflexões e nos desatinos dos milhões de médiuns que agem na Terra inconscientes do seu verdadeiro estado, alheios à faculdade mediúnica que possuem.

 

8.      Fases da mediunidade

 

A mediunidade  desenvolve-se pela prática constante, disciplinada e segura, não através de escolas e cursos. É natural que na primeira fase o médium esteja mais propenso, por estar menos preparado, a receber intuições e incorporações dos espíritos do astral inferior. Esta ação mediúnica é sempre mais fácil de ocorrer, já que tais espíritos estão mais próximos, ocupando, junto com os encarnados, parte da superfície e atmosfera terrestre. Dito de outra forma, nesta primeira fase do desenvolvimento, o médium sintoniza-se mais facilmente com o meio ambiente, meio grosseiro comum a todos e  harmoniza-se mais facilmente com os espíritos inferiores que coabitam o nosso planeta, contrariando as leis naturais, já que a Terra é um planeta-escola, destinado apenas aos espíritos encarnados. Estes espíritos, conhecidos como espíritos do astral inferior, “ao atuarem, impõem abnegação e sacrifício ao médium, em face do estado de perturbação, maldade ou sofrimento em que se acha, ao passo que, os do Astral Superior atuam brandamente e a sua aproximação é suave e benéfica ao médium”.(3)

Em uma segunda fase, mais adiantada e mais nobre do desenvolvimento da mediunidade, os médiuns  capacitam-se  a receberem intuições dos espíritos superiores, sendo mais difícil para estes efetivarem as comunicações entre os dois mundos. A grande dificuldade está na criação de correntes de atração e concentração poderosas para formarem pólos de atração, no que os médiuns são respaldados pelos pensamentos de outras pessoas bem espiritualizadas presentes à mesa dos trabalhos e no recinto. A segunda grande dificuldade é manter constante a forte intensidade dessas correntes. A terceira grande dificuldade consiste na harmonização dos fluidos de ligação astral com os fluidos do médium, esforço que é completado pelo próprio espírito superior comunicante. Satisfeitas estas três condições a manifestação flui com naturalidade, sem percalços. A disciplina e a concentração do médium aqui é posta a toda prova, bastando um desses fatores oscilar para o espírito superior interromper a comunicação..

Não é tarefa fácil para um espírito do Astral Superior manter-se junto ao médium e manter a comunicação fluindo com naturalidade, em virtude de sua elevada pureza, incompatível com os fluidos grosseiros em que acaba por se envolver quando chega à Terra. Para conseguir isso, é necessário preparar o perispírito do médium com descargas fluídicas próprias até se identificarem os dois fluidos – o do médium e o do espírito do Astral Superior. Essa operação  assemelha-se a uma desinfecção que o Astral Superior faz no corpo mediúnico para poder atuar com segurança. Mesmo assim, é todo um trabalho conjunto, de união, em que os bons e elevados pensamentos dos presentes constituem um pólo de atração, fundamental para evitar a quebra dessa corrente fluídica e dificultar ou, até mesmo, interromper a comunicação mediúnica.

 

9.      Evolução da mediunidade

 

Devido ao estado de inferioridade e miséria espiritual por que passa o nosso planeta e, ainda, à sensibilidade de percepção mediúnica, os médiuns sofrem, por vezes, de profunda nostalgia pela absorção que fazem das ondas vibratórias dos pensamentos refletidos na atmosfera e que envolvem o nosso mundo. Por isso mesmo, o médium deverá  cuidar-se, procurando evoluir pela observação e pelo estudo constante de obras espiritualistas, para manter-se consciente de suas responsabilidades no desempenho de suas faculdade mediúnicas, as quais devem sempre ser dirigidas para o bem geral. Conhecedor que é da disciplina recomendada aos médiuns, saberá afastar os sentimentos de nostalgia e outros igualmente nocivos, reagindo com todas as energias de que dispõe.

E como deve o médium evoluir se não freqüenta cursos e escolas para médiuns? A resposta é simples e consiste em saber que toda e qualquer evolução depende exclusivamente de si mesmo mediante absorção de novos conhecimentos, cada vez mais racionais e elevados, de forma a se justaporem automaticamente no repositório de suas memórias, aumentando sempre o seu acervo espiritual. Veja esta transcrição (3):

 

A evolução consiste numa sucessão de conhecimentos novos e cada vez mais elevados, que continuadamente se superpõem. Onde há evolução efetiva, não existe lugar para a monotonia, já que em cada dia se aprende uma lição desconhecida, até mesmo nos acontecimentos aparentemente banais.

 

Essa evolução, porém, exige a conscientização do médium e o seu permanente empenho de aperfeiçoar, cada vez mais, a faculdade mediúnica; a instrução e a cultura muito o auxiliarão nessa tarefa.

 

Um dos pontos cruciais a considerar é a decisão que o médium necessita tomar tão logo descobre sua faculdade mediúnica. Esta é uma decisão muitíssimo séria. Tratando-se de um dom, conforme já explicamos, ele não deve ignorar a sua mediunidade e não tomar nenhuma atitude. Dependendo da instituição de sua escolha, ele poderá estar acelerando a sua obsessão ou a sua libertação. Esta deliberação precisa ser espontânea, nunca constrangida, ditada pela sua própria intuição e exercida em benefício próprio em momento de plena lucidez, serenidade e paz de espírito. Ele precisa conhecer muito bem a Causa que vai “abraçar” e dedicar-se sincera e espontaneamente a esta Causa, que deve estar fundamentada nos princípios doutrinários da instituição. Sua análise deve ser feita de forma isenta, como livre-pensador, refletindo sem deixar envolver qualquer sentimento religioso; do contrário, pode se dar muito mal.

Escolhida a instituição e, se esta estiver amparada por espíritos superiores, poderá então acelerar a sua evolução mediúnica em duas fases, na forma indicada anteriormente, neste capítulo, adotando a rigorosa disciplina que lhe for recomendada.

Além de promover a evolução de suas qualidades mediúnicas, o médium necessita, paralelamente, absorver a disciplina recomendada noutra parte deste capítulo, bem como, dar bastante atenção à depuração de seus maus sentimentos. Um desses sentimentos que deve merecer toda a atenção do médium é o ressentimento, que normalmente, é acompanhado de melindres. Muitas vezes, estes defeitos da personalidade e do temperamento vêm de longas encarnações pretéritas e são revelados e aflorados propositalmente por intuições dos espíritos superiores para que o médium se esforce em eliminá-los. Vejamos o que nos diz sobre o ressentimento, a referência (3): “O ressentimento é uma falha do espírito que deve ser encarada frontalmente e com naturalidade, para melhor conseguir-se o seu extermínio”.

Outro aspecto que pode parecer desanimador aos médiuns é a rotina dos trabalhos mediúnicos. Segundo o enfoque de certos médiuns a rotina pode lhes parecer monótona. Mas, se monotonia existe, deve o médium procurar a causa, o porquê da monotonia e com certeza vai encontrar respaldo para esse modo de ver na indolência e nos hábitos rotineiros a que se entrega, levando-o a estacionar em sua evolução. “À medida que o médium evolui, vai encontrando novas sensações na própria atividade espiritual em que os seus horizontes se dilatam, oferecendo-lhe novas e mais amplas e interessantes perspectivas”. (3)

Torna-se necessário que o médium não se deixe influenciar pelas manifestações que venha receber, nem mesmo tentar julgá-la ou interpretá-la. É preciso ter sempre na lembrança a lei de causa e efeito, pois o acaso não existe e tudo tem a sua razão de ser, a sua justificação. Muitas vezes, uma manifestação aparentemente sem sentido ou sem explicação pode encerrar lições ocultas para serem reveladas ou descobertas pelo raciocínio dos presentes.

Os médiuns precisam se imbuir da responsabilidade de seus trabalhos e atuar com dedicação e renúncia, sentindo os altos objetivos e a utilidade de seus trabalhos. Firmados nessa realidade, procurar fugir o mais que possível dos atrativos materiais enganosos que contrastam com os encargos próprios de uma mediunidade bem intencionada e aplicada exclusivamente para o bem. 

 

10.  Trabalhos mediúnicos

 

Vimos, neste capítulo, que os espíritos do astral inferior são de diferentes graus de evolução, mas todos estão no lugar errado por pura perturbação, não tendo retornado aos seus mundos astrais de origem logo que desencarnaram. Todos, sem exceção, são transgressores e obsessores, pois estão desrespeitando as leis naturais que regem os mundos espirituais.

Assim, uns são mais e outros menos perturbados. Há os agressivos e os melifluentes (faladores com palavras melosas) e os mistificadores, mas o médium esclarecido  tem meios e, portanto, pode e deve controlar a sua manifestação ou mensagens que venham pronunciar para manter a ética e a moral dos trabalhos. Deve assim, evitar pronunciar palavras de baixo calão, ainda que intuídos dessa forma, pois é seu dever manter o respeito necessário à boa condução dos trabalhos.

Os espíritos embusteiros e mistificadores, perturbadores mais obstinados, podem também ser desmascarados pelo próprio médium. Basta o médium estar atento e prevenido contra suas possíveis manifestações, pois eles costumam se apresentar com o desejo de intuir e procuram exteriorizar um palavreado de falsos sentimentos, repetindo conhecidos chavões comuns no misticismo religioso.

Um dos grandes receios dos médiuns novatos é a dúvida que pode lhes assaltar durante os trabalhos. Eles sentem, às vezes, dúvidas se estão transmitindo o pensamento de um espírito ou o seu próprio. Segundo (3): “Essa dúvida, entretanto, não deve prevalecer levando-se em conta que o médium possui extrema sensibilidade e a transmissão é feita muito sutilmente”. Quando o médium segue a disciplina, mantém-se calmo, entrega-se docilmente ao desempenho de seu trabalho, confiante em si mesmo,  “[...] essa insidiosa dúvida deve ser vencida pelo médium, em benefício da sua evolução”. (3)

O desenvolvimento da capacidade mediúnica, já o dissemos, é feito pela prática contínua em instituições sérias, em correntes especialmente preparadas para este fim por espíritos superiores, como ocorre, por exemplo, no Racionalismo Cristão. Nesta Doutrina, os médiuns sabem muito bem que devem seguir a disciplina à risca, não sendo permitido a nenhum médium concentrar-se e receber espíritos fora de suas correntes fluídicas, para sua própria segurança e para manter a credibilidade da instituição. Os ensinamentos espiritualistas desta Doutrina mostram, com rigor necessário, (3) “[...] os perigos a que ficam expostos os que não souberem livrar-se das influências do astral inferior”. É por isso mesmo que o médium deve abster-se sobre o uso de sua faculdade fora do ambiente da instituição onde exerce suas atividades psíquicas.

Os médiuns constituem peças-chaves durante a realização de trabalhos psíquicos. São eles que, através da manifestação dos espíritos, oferecem os temas mais oportunos para as explanações da presidência dos trabalhos, propiciando aos assistentes ouvirem o que mais precisam para se orientarem espiritualmente e, dando assim, ensejo aos mesmos que meditem e reflitam sobre a situação moral em que se encontram os espíritos manifestantes. Os médiuns mais evoluídos, além das mensagens corriqueiras de espíritos do astral inferior, transmitem, também, doutrinações dos espíritos superiores.

Com relação ao seu próprio estado psíquico, os médiuns devem manter-se calmos e confiantes nos bons resultados do seu trabalho. Procurar abstrair-se de pensar, durante os trabalhos, nos assuntos relacionados com sua vida material, deixando de lado os problemas particulares. Procurar focalizar os seus pensamentos exclusivamente nas explanações e no sentido das palavras das irradiações, bem como, na produção do seu próprio trabalho e no controle da atuação dos espíritos.

É importante ressaltar que o médium está sempre no comando de seu livre-arbítrio e, é ele que, disciplinadamente, permite ou não, a manifestação do espírito. Para isso, ele prepara-se, colocando-se num estado de relaxamento dos tecidos musculares, facilitando ao espírito manifestante a sua manifestação. Nessa ocasião os dois espíritos – o do médium e o do atuante ficam lado a lado. “Como o cérebro é semelhante, por comparação, a um aparelho receptor de rádio, o espírito atuante pensa no que deseja dizer e as vibrações desses pensamentos, por ele captadas, transformam-se nas palavras que são por todos ouvidas”.(3)

Um aspecto importante é que o médium pode auxiliar nessa transmissão. Para isso ele reforça as vibrações do espírito atuante com as suas próprias e intervém, para melhorar a clareza das palavras recebidas, trocando-as por outras apropriadas. Segundo a referência (3): “Quanto mais culto for o médium e maiores os seus conhecimentos do vernáculo, mais límpidas e expressivas serão as transmissões, facilitadas pela sua cultura”.

Influi, ainda, nas transmissões mediúnicas o devotamento e a dedicação dos médiuns que, sem fanatismo, são fieis à Causa e utilizam os princípios espiritualistas na sua vida diária com zelo e satisfação. Estes fazem a sua evolução mais rapidamente, prestando os melhores serviços possíveis. Nunca têm medo de nada, por saberem-se seguros no ambiente em que atuam.

Para que não haja influência negativa, jamais poderá ser hesitante ou tímido, como também, não deverá ser arrogante, a não ser para transmitir esse sentimento quando for do próprio espírito do astral inferior e por ele manifestado.

 Os médiuns jamais devem ter medo de nada, pois, nos recintos das sessões acham-se sempre resguardados de influências negativas. Na mediunidade, como na vida em geral, a união faz a força. É preciso manter os pensamentos positivos todo o tempo, admitindo sempre que estão dando o melhor de que dispõem, sem receios ou retraimentos. Enfim, os médiuns devem proceder sempre acertadamente, com a consciência tranqüila do dever cumprido.

Os médiuns nunca devem discutir com ninguém, muito menos com um companheiro ou companheira médium. Devem manter o silêncio e a concentração necessária ao preparo mental durante toda a duração dos trabalhos. Devem aprender a contar sempre com a estima de todos, conservando os sentimentos de amor e amizade para com todos.Não perder de vista que as vibrações harmônicas de entendimento e compreensão atuam salutarmente na formação de um clima propício à atração dos espíritos superiores.

 

11.  Mistificações

 

Discernir o falso do verdadeiro é obrigação da faculdade da razão. É pelo raciocínio que nós podemos distinguir o certo do errado e fazer a opção que nos convém, usando o nosso livre-arbítrio. Ser racional é ser sensato, cuidar-se para não ser enganado.

Existe um ditado que diz que o dinheiro é um mal necessário. Eu diria que ele é imprescindível para que cada indivíduo viva a sua vida material com dignidade e decência. Mas, nós sabemos que ele é, também, falsificável e, nem por isso, deixa de ser importante e útil. E, assim, poderíamos citar numerosas coisas e situações que podem estar sujeitas a fraudes, falsificações e mistificações, sem, contudo, perderem a sua importância e a sua utilidade. Por exemplo, se um advogado torna-se bandido e criminoso, não devemos abominar toda a classe dos advogados. Tudo isso, para dizer que a mediunidade está sujeita às mistificações por parte de certos médiuns, mas isso não a invalida de forma alguma. O que se condena não é o dom da mediunidade, mas a forma errônea como a usam.

 Todos aqueles que estudam a mediunidade e seus efeitos sabem muito bem que muitos médiuns mal formados enquadram-se na exceção às regras de conduta bem feitas, mas nem sempre bem cumpridas. Daí, a importância que devemos dar a tais regras de conduta, conforme expusemos neste mesmo capítulo. Os médiuns transgressores das normas das instituições espíritas e espiritualistas preocupam muito aos dirigentes dessas organizações e são, constantemente, advertidos para melhorarem os seus procedimentos, inclusive para seu próprio beneficio e segurança.

Muitas vezes a mistificação não é percebida pelo próprio médium no momento da transmissão mediúnica – e a fraude acontece, mas pode ser percebida por outros, dirigentes ou não da instituição, cabendo aos dirigentes a obrigação de, na ocasião oportuna, chamarem a atenção do médium para sua falha, sem que caiba a este qualquer melindre ou reação contrária. Quando se trata de mistificação voluntária, então, esta ação é mais grave ainda, cabendo advertências e, se houver reincidência, o desligamento do médium, já que este assumiu o compromisso de ser leal e verdadeiro. A repulsa à mistificação deve ser preocupação constante tanto do médium como dos dirigentes da organização.

Há muitos indícios caracterizadores e reveladores da mistificação mediúnica, todos eles em desrespeito às normas e regras ou por fraqueza do médium, afastando-se da disciplina a que está sujeito. Dentre esses indícios, ressaltamos alguns (3):

 

i O uso de segundas intenções por parte do médium para dar expansão ao seu “eu”, sem estar, de fato, atuado (falsificação proposital);

i O desvirtuamento do poder da vontade e do pensamento, entregando-se o médium a práticas mediúnicas fora de sua instituição;

i A extensão desnecessária da mensagem, não a fazendo deforma clara, nítida e precisa ao seu entendimento;

i A introdução de “algo” a mais, não consentâneo com o conteúdo espiritual da própria mensagem, levando à interpretação errônea por parte dos ouvintes ou, até mesmo, ao descrédito do médium e da instituição como um todo;

i A deturpação grosseira de qualquer comunicação, bem como, deixar de “filtrar” palavras de baixo calão não consentâneas com a natureza do ambiente;

i A deturpação de mensagem ou doutrinação de espírito superior, por puro preconceito, arraigado na mente do médium;

i A submissão irritadiça do médium aos pensamentos de dúvida e de inveja que lhe são dirigidos por espíritos desencarnados ou por alguém na assistência;

 

É muito importante manter os pensamentos elevados e a concentração durante os trabalhos espirituais, já que a falta de concentração ocasiona oscilações no campo energético, afastando a presença de espíritos superiores, pois a lei da atração está sendo violada. Neste caso, podem ocorrer mistificações, levando ao descrédito as mensagens e doutrinações recebidas, por ficarem sujeitas à mistificação.

Todo médium bem formado e espiritualizado sabe muito bem que o seu aperfeiçoamento mediúnico é motivo de perseguição tenaz por parte de espíritos atrasadíssimos e perversos do astral inferior, objetivando causar-lhe toda sorte de mal, razão por que não se deve descuidar de manter sempre pensamentos elevados para evitar avassalamento ou obsessão. Estes espíritos usam de hábeis subterfúgios para levar os médiuns à mistificação, valendo-se de todo e qualquer descuido dos médiuns em relação à disciplina de seu pensamento, posturas e atitudes impróprias.

É sempre importante destacar a grande importância que tem em manter-se a concentração necessária dos pensamentos, com cuidados redobrados nos momentos da comunicação de um espírito superior, para evitar quebra ou enfraquecimento das correntes fluídicas (do campo energético espiritual formado junto ao médium e no recinto). Se esta quebra ocorrer, aproveita-se um espírito do astral inferior eventualmente presente ou ali atraído, para aproximar-se do médium e procurar imitar e atuar como se superior fosse, isto é, em seu lugar. Essa alteração pode passar despercebida ao médium, em virtude da permanência de fluidos astrais superiores residuais junto ao médium e no recinto. São estas efluviações residuais que permanecem presentes, como o perfume de uma pessoa muito perfumada que se retira de uma sala, nela ficando ainda parte do aroma do perfume que usava.

Finalmente, embora uma mistificação desse tipo não seja facilmente notada pelo médium no momento em que ele está transmitindo uma mensagem ou uma comunicação superior, se mistificada, o médium, após o final dessa transmissão, poderá se tornar abatido e apresentar certa irascibilidade, por ter predominado o fluido astral do espírito inferior.

 

12. Conclusão

 

Do que ficou exposto infere-se a necessidade do médium se conhecer como Força e Matéria, não alimentando nenhuma dúvida sobre a vida fora da matéria. Nada se passa no mundo sem que antes passe pelo pensamento e, este emite vibrações que são captadas por espíritos desencarnados inferiores e superiores, como também, por outros encarnados. Foi, também, dado o necessário destaque à lei das afinidades espirituais. Neste contexto, tanto para o bem como para o mal, insere-se a realidade da mediunidade e a importância de seus efeitos na humanidade em geral, destacando-se obviamente, o papel dos médiuns.

Após descrevermos os diversos tipos de mediunidade, tratamos de questões como o conhecimento que os médiuns devem ter, sua disciplina e método de trabalho, suas responsabilidades, qualidades desejadas e evolução mediúnica. Especial atenção foi dada, também, ao mal da ignorância espiritual e aos grandes transtornos a que a  humanidade está sujeita por não procurar conhecer-se a si mesmo como Força e Matéria.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 43.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2004.

 2) MATTOS, Luiz de. A vida fora da matéria. 21.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor.  1996.

 3) MATTOS, Luiz de. Cientistas sem Ciência, Formas e cores do pensamento. 2.ed. Centro Redentor, 1939, p. 380/385. Disponível em: https://www.racionalismo-cristao.org.br/gazeta/diversos/corespens.html. Acesso em 20/02/06.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO13

 

 

A INTUIÇÃO: NOSSA BÚSSOLA

 

Todo mundo, em algum momento da vida, já experimentou a intuição. Ela pode se manifestar sob a forma de uma voz interna, um ato instintivo, um repente de criatividade ou flashes de imagens, que surgem na mente como se estivessem em uma tela de TV. A intuição lhe diz o que fazer, sem que você precise usar a razão. É a parte ilógica da existência. No passado remoto da história da humanidade, o homem valia-se basicamente de seu instinto para sobreviver e se relacionar com o mundo. E o instinto é uma forma primária de intuição. Num determinado momento, passamos a priorizar o uso do intelecto - e fizemos isso de maneira avassaladora. Na minha opinião, o próximo passo da evolução humana é voltar a dar mais importância à intuição.

Sharon Franquemont  – psicóloga americana – Rev. Veja Nº. 21 – 35 – 17/02/02. (4)

“Na fronteira entre o pensar e o sentir acontecem coisas de que o ego consciente não faz idéia”.

 

Thomas Goschke, da Universidade Técnica de Dresden, Alemanha – Rev. Viver Mente & Cérebro p. 40, ano XIV, nº 156, Jan. 2006.

 

 

Conforme vimos no capítulo 12 sobre a mediunidade, a intuição é a mais comum de todas as formas de mediunidade e, todas as pessoas a possuem, em maior ou menor grau. Neste capítulo, vamos focalizá-la de uma forma mais ampla e profunda, dada a sua importância nos processos que envolvem a criatividade das pessoas. O tratamento formal à intuição, sob o ponto de vista da espiritualidade, nós o fizemos quando falamos da mediunidade.

Primeiramente, fundamentados no (1) Novo Aurélio – Dicionário da língua portuguesa, 2001, vamos examinar o significado etimológico da palavra “intuição: “1. Ato de ver; perceber; discernir; percepção clara e imediata; discernimento instantâneo; visão. 2. Ato ou capacidade de pressentir; pressentimento. 3. Filos. Conhecimento imediato de um objeto ou plenitude de sua realidade, seja esse objeto de ordem material ou espiritual. 4. Filos. Apreensão direta, imediata e atual de um objeto, na sua realidade individual. 5. A faculdade intuitiva”. Assim, a intuição ocorre quando se tem uma compreensão repentina de alguma coisa, o que representa um conhecimento que se obtém diretamente, sem o auxílio da razão, muitas vezes depois de ter recorrido a esta de maneira persistente e contínua na solução de algum problema. Quanto maior for a nossa capacidade de encarar o problema por um enfoque bem diferente do modo comum de ver as coisas, mais receptivos estaremos à intuição. Em Psicologia se usa, com freqüência, a palavra insight (lampejo ou estalo) como sinônimo de intuição, mas há uma diferença marcante: a intuição é a capacidade de prever possibilidades, enquanto que o insight é a forma como a intuição é revelada.

Acostumado a propor e resolver problemas mentais, o grande Einstein sempre foi bastante intuitivo. Recebia intuições freqüentes na forma de verdadeiros insights, vinculados ao seu pensamento lógico. Ele aplicava os lampejos que recebia, juntamente com os conhecimentos da física, para resolver problemas que, de outra maneira, necessitaria do uso de experimentos laboratoriais. Assim, como livre-pensador, tinha a capacidade de contemplar problemas físicos de modo diferente do que era habitual. Na verdade, o que ocorria era uma completa liberdade que lhe permitia abandonar certos princípios e pressupostos até então tidos como irrefutáveis. Dito de outra forma, Einstein tinha o dom de reestruturar os problemas de diferentes formas para procurar e lhes dar solução e isso lhe trazia uma satisfação íntima muito grande, além de reforçar a sua autoconfiança.

 

1.      Enfoque psicológico

 

O conceito de reestruturação das idéias na solução de problemas teve início com Max Wertheimer, já a partir da segunda década do século XX, juntamente com Wolfgang Köhler, Karl Duncker e Kurt Koffka. Esses psicólogos aplicaram o conceito da reestruturação no estudo das idéias que ocorriam com freqüência na produção intelectual de grandes gênios para realizarem as suas invenções e descobertas revolucionárias. Suas conclusões nada tinham de incomum, já que se convenceram tratar-se, na verdade, de um processo fundamental do pensamento, pois que, atualmente, é sabido das ciências cognitivas que qualquer pessoa pode ter e tem percepções súbitas e originais. Estas percepções ou insights são as responsáveis finais pelo rearranjo das peças de um determinado quebra-cabeça, levando à estruturação dos pensamentos ou “configuração” correta para a solução do problema em questão. Colocando essas idéias em prática, aqueles filósofos criaram a psicologia gestáltica - uma escola de psicologia que teve seu lugar de destaque até a década de 1980.

Mas, já a partir da década de1950, muitos psicólogos começaram a voltar sua atenção para outros fenômenos que não podiam ser desprezados, conhecidos como processos cognitivos. Estes processos vieram dar lugar à psicologia cognitiva, já na década de 1980. Como é sabido, os processos cognitivos, como num computador, operam passo a passo e não aos saltos e de maneira imprevisível, como ocorre quando se experimenta uma súbita descoberta. Assim, a partir dos anos 1980, a psicologia cognitiva teve um grande surto de desenvolvimento e retomou a pesquisa do insight. É vasta a literatura dos trabalhos produzidos, desde então, a respeito do tema dos insights, mas os avanços alcançados ainda não concluíram como e de que forma opera a intuição. Segundo a referência (2):

 

Todos sabemos por experiência própria que, às vezes, a solução de um problema nos vem à mente de forma absolutamente repentina. De súbito, o nó se desfaz, cai a ficha, surge uma luz e a solução parece tão óbvia que nos espantamos de não ter chegado a ela muito antes. Mas, no estudo desse fenômeno, os pesquisa­dores deparam já de saída com uma dificuldade me­todológica: como produzir tais lampejos de maneira sistemática, de modo a investigá-los em experi­mentos psicológicos?

 

Os estudiosos da intuição perceberam, desde o primeiro momento que, previamente ao processo intuitivo, intervêm no processo cognitivo fenômenos ligados à memória, à inteligência e à consciência, as quais, tomadas como um todo, participam do próprio processo cognitivo. Muitos testes foram criados e experimentados para provar a existência da intuição e sua importância na solução de muitos problemas, resolvidos após um súbito lampejo. Este é o sinal indicativo de que obtivemos a solução do problema não por via de um pensamento lógico, mas através da intuição, mostrando que houve uma reestruturação dos dados do nosso conhecimento pré-existente. Quando menos se espera, a percepção dos elementos que compõem o problema é organizada de outra forma/ e, heureca – surge a solução. Dizemos, então, que houve uma reestruturação bem-sucedida.

Quando surge a intuição sob a forma de uma solução para um determinado problema que, durante muito tempo, “martelava” os nossos pensamentos, vivenciamos um momento de grande alegria, devido à surpresa que nos envolve – é a sensação de termos descoberto algo, que antes parecia tão nebuloso. É uma experiência emocional e, portanto, subjetiva e difícil de descrever.

Verifica-se, portanto, que a solução de muitos problemas via intuição nada tem a ver com a resolução passo a passo da lógica e dos computadores. Na intuição, o conhecimento surge de forma abrupta e involuntária, pois que, os lampejos ou insights são de outra natureza.

 

2.      Enfoque psicológico de Carl G. Jung

 

Carl G. Jung (1875-1961), famoso psicanalista que conviveu com Freud até 1912, rompendo em seguida, sempre esteve interessado pelo estudo das diferentes formas de expressão da vida, inclusive com relação à intuição. Com Jung, a intuição ganha relevo e destaque, já que foi ele que a considerou como uma das atividades do psiquismo que fundamenta o ser humano. Ele sempre tratou conjuntamente o pensamento, o sentimento, a sensação e a intuição como qualidades capazes de tipificar as criaturas pela predominância e interação de cada uma dessas funções. Ele afirmou que, somente através das faculdades preponderantes da intuição e do sentimento, poderemos entender a psique humana.

É necessário considerar que foi Jung, através de sua obra Tipos psicológicos, que destacou a intuição, bem como, o pensamento, o sentimento e a sensação como componentes indispensáveis para a formação da personalidade do homem. Ressaltou, ainda, que a intuição é um componente nascido e processado através do plano inconsciente. A despeito das mudanças e progressos da Psicologia, Jung ainda hoje é respeitado e venerado.

Jung destacou, também, o papel da intuição e sensação juntas, como formas de apreender informações e não de tomar decisões. A diferença é que a sensação deriva dos sentidos físicos da visão, audição, olfato, tato e paladar que nos proporcionam experiência direta com a percepção de detalhes, ou seja, de fatos concretos. Já a intuição consiste em processar informações relacionadas com a nossa experiência passada, objetivos futuros e processos inconscientes.

Jung, também, elaborou o conceito de que uma combinação das quatro funções resulta em uma abordagem equilibrada do mundo, onde: a sensação nos assegura de que algo está aqui (mundo objetivo); uma segunda função, o pensamento, nos assegura que podemos controlar este algo com nossas ações; uma terceira, o sentimento, nos diz se este algo é ou não adequado, se queremos aceitá-lo ou não; e, finalmente, a quarta função, a intuição indica de onde este algo veio e para onde vai.

Introduziu, ainda, o conceito de função dominante e função auxiliar, já que ninguém desenvolve igualmente todas as quatro funções e cada pessoa tem uma função fortemente dominante e uma função auxiliar, parcialmente desenvolvida. As outras duas funções são, em geral, inconscientes e a eficácia de suas ações é bem menor. Segundo (3) “Quanto mais desenvolvidas e conscientes forem as funções dominante e auxiliar, mais profundamente inconscientes serão seus opostos. Jung chamou a função menos desenvolvida em cada indivíduo de função inferior. Esta função é a menos consciente e a mais primitiva e indiferenciada”.

Um aspecto ressaltado por Jung é que as pessoas muito intuitivas consideram as implicações da experiência muito mais importantes do que a experiência real propriamente dita. Isso por que os intuitivos recebem e decodificam toda e qualquer informação que recebem muito mais rápido que a razão (pensamento) e relacionam, de forma automática, a experiência passada com as informações relevantes da experiência imediata.

Não é à toa que os propagandistas de marketing dão destaque à função dominante, ignorando a função inferior com relação ao público que pretendem influenciar ou atingir. Mas, a linguagem e os diferentes idiomas próprios de cada um têm seus efeitos na elaboração das mensagens destinadas à mídia. Mesmo assim, para alcançar um público maior, é bem provável que uma decisão seja tomada levando-se em consideração as quatro funções relacionadas à observação (sensação-intuição) e à tomada de decisão (pensamento-sentimento).

As organizações sócio-econômicas que operam em nossa sociedade moderna muito se aproveitaram dos ensinamentos de Jung, embasando dois tipos de intuição: a chamada intuição-pensamento, que enfatiza problemas e conceitos gerais e a intuição-sentimento, mais flexível e globalizante. Na primeira, o enfoque principal recai na descoberta, invenção e produção, isto é, em novas tecnologias e, portanto, deve ter um alto grau de flexibilidade; na segunda, enfatizam-se as metas e as realizações pessoais, próprias das organizações que existem com o objetivo de servir às pessoas como hotéis, hospitais, ONGS, etc.

 

3. Enfoque psicológico moderno

 

São palavras da psicóloga americana Sharon Franquemont (4):

 

Todo mundo, em algum momento da vida, já experimentou a intuição. Ela pode se manifestar sob a forma de uma voz interna, um ato instintivo, um repente de criatividade ou flashes de imagens, que surgem na mente como se estivessem em uma tela de TV. A intuição lhe diz o que fazer, sem que você precise usar a razão. É a parte ilógica da existência. No passado remoto da história da humanidade, o homem valia-se basicamente de seu instinto para sobreviver e se relacionar com o mundo. E o instinto é uma forma primária de intuição. Num determinado momento, passamos a priorizar o uso do intelecto - e fizemos isso de maneira avassaladora. Na minha opinião, o próximo passo da evolução humana é voltar a dar mais importância à intuição.

 

O que está acontecendo no mundo moderno?  Vivemos uma época de informação massiva, sem precedentes na história humana. E isso em todas as áreas de atividades, sem exceção. Como conseqüência, nossa mente fica sobrecarregada o tempo todo e o nosso cérebro não dá conta de tudo isso. Após passarmos por um período já bastante longo de evolução, deixando para trás o instinto humano, este resultou praticamente perdido no decorrer desse processo. Em outras palavras: o nosso intelecto (mente e cérebro) encontra-se sobrecarregado.

Daí, antever-se que a intuição irá ocupar um lugar cada vez maior na vida das criaturas, pois não basta apenas o intelecto para compreender muita coisa que está a demandar a nossa atenção. A intuição é fundamental por estar diretamente associada à inteligência emocional e à criatividade. Nesse campo, o brasileiro leva vantagem, por ser um povo bastante intuitivo e, portanto, criativo.

Cientistas e artistas são as categorias profissionais que mais sabem utilizar-se da intuição. Esses profissionais são criativos por excelência e são os transformadores de nossas tendências, com implicações muito grandes nos hábitos da sociedade. Eles transformam o mundo em que vivemos. Por isso mesmo, a intuição criativa ou criadora é muito mais aceita hoje do que há algumas décadas. Muitas descobertas científicas surgiram de um sonho, de uma idéia, de um insight ou flash de criatividade. É óbvio que o trabalho duro e pesado do dia-a-dia é imprescindível.

Uma outra tendência que já se observa reside na área médica, cujos profissionais voltaram a olhar para seus pacientes com uma ótica mais emocional, mais humana, como era no passado não muito distante. É preciso entender melhor o que se passa com os pacientes ou doentes, inclusive com relação às doenças psíquicas e psicossomáticas. Não basta confiar apenas nos diagnósticos instrumentais. Além do approach pessoal e emocional, há necessidade de utilizar a intuição para se ter uma relação mais direta e estreita com os pacientes.

A psicóloga Sharon Franquemont (4) não acredita que a intuição seja um dom e afirma que somos todos intuitivos, uns mais outros menos. Mas, reconhece que certas pessoas nasceram com talento para certas áreas e, essa tendência direciona a pessoa profissionalmente. O que acontece é que essas pessoas sabem explorar melhor os seus talentos, não se tratando, portanto de nenhum dom especial. As pessoas que colocam entusiasmo naquilo que fazem são, em geral, muito intuitivas. Albert Einstein, o físico alemão criador da teoria da relatividade, foi o intuitivo mais famoso da história. Ele dizia, com freqüência, que antes mesmo de examinar e equacionar os problemas, ele já percebia as soluções. Ou seja, as idéias brotavam em sua mente. Por que isso acontecia? Porque, entre outros fatores, Einstein amava o espaço como ninguém e costumava imaginar-se no espaço viajando juntamente com um raio de luz. Enfim, Einstein exercitava a intuição de forma útil para a humanidade.

É sabido que as mulheres são mais intuitivas do que os homens, mas isso se deve ao fato de que as mulheres sempre tiveram mais liberdade para exercitá-la, devido usar mais a sua inteligência emocional. Já os homens, sentem-se mais à vontade com a intuição criativa, que está relacionada com a inteligência racional. O empenho, isto é, o amor com que cada um se dedica à sua atividade influi bastante.

 Infelizmente, nem mesmo a lógica é ensinada em nosso sistema educacional. O que se dizer, então, da intuição. Por isso, é um atributo pouco conhecido e quase nunca percebido ou usado. Nossa educação não nos dá elementos para nos livrarmos das amarras que nos impedem de sermos intuitivos. Não prestando atenção às coisas surpreendentes que nos acontecem, a intuição passa despercebida. Em certos casos, como um amigo meu que avistou uma sua amiga que não via há muito tempo, não lhe ocorreu tratar-se de uma intuição e a oportunidade do reencontro foi perdida, pois quando refletiu sobre o assunto já ela havia desaparecido. Trata-se aí de uma intuição perdida.

Há muitas pessoas que passam por intuições significativas, mas trata a sua ocorrência como um ato místico e algumas a consideram como um evento divino, como foi o caso de Giácomo Puccini quando criou a sua maravilhosa opera Madame Butterfly. Mas não há nada de místico, nem divino na intuição, sendo uma simples qualidade psíquica do ser.

Fisicamente, já falamos sobre o papel desempenhado pelos hemisférios cerebrais, ficando claro que o esquerdo capta o racional e o direito o emocional. Assim que o lado direito capta uma mensagem, o lado esquerdo trata de racionalizá-la. A partir daí, o cérebro libera neurotransmissores que se dirigem às extremidades nervosas dos vasos sanguíneos, coração e pulmões, processo esse bem descrito por Daniel Goleman, professor de Harvard e autor do livro Inteligência emocional (6)

Há uma dúvida muito comum entre pessoas que querem saber qual a diferença entre intuição e pressentimento. Essa é uma tarefa que tem que ser feita pela própria pessoa. É preciso tentar descobrir em situações onde não está presente nenhum tipo de risco ou perigo. Enquanto não aprender a identificar uma boa intuição de uma má intuição, seja muito precavido com relação às suas escolhas. É por tentativa e erro que as pessoas aprendem a distinguir as intuições e a usá-las em seu próprio proveito.

Na medida em que a intuição ficar mais conhecida e as pessoas aprenderem a lhe dar mais valor, o que se tem que fazer é não perder o senso comum e achar que tudo é fruto de intuições. O pensamento racional e o raciocínio sempre terão lugar de destaque no mental das criaturas. As pessoas precisam saber como e quando estabelecer limites, para não se tornarem obsessivas. Se chegarem até este ponto, é hora de procurarem ajuda.

Finalmente, não existem estudos científicos capazes de identificar uma pessoa com características intuitivas, mas podem identificar alguns traços comuns nas mais intuitivas. Por exemplo, o intuitivo é dotado de uma visão panorâmica mais aguçada, descobrindo mais facilmente o que procura onde outros fracassam. Mas, se perguntarem como chegou à solução encontrada não sabe explicar. Nos testes de memorização, apresentam uma pontuação mais elevada. Sua capacidade de observação é muito elevada e sabem interpretar com maior acerto as imagens intuitivas que recebem.

 

4. Enfoque filosófico

 

Vimos que a intuição trabalha juntamente com o pensamento e o sentimento e que aqueles que têm intuição aguçada são pessoas muito imaginativas e criativas. Por isso, uma decisão baseada na intuição pode parecer mágica, mas não é. Vimos, também, que as pessoas podem ativar a intuição usando o conhecimento prévio e tendo objetivos claros, devendo saber discernir as informações objetivas e subjetivas e ter capacidade para fazer associações, conexões e analogias.

 

Na Grécia Antiga, filosoficamente, predominava o princípio básico inscrito na entrada do templo de Delfos dedicado a Apolo, que foi o deus mais venerado depois de Zeus, o pai dos céus: “Conheça a ti mesmo”. Na verdade, seguia-se a esta frase uma outra: “e conhecerás o Universo e os deuses”. Então, a sentença completa era: “Conheça a ti mesmo e conhecerás o Universo e os deuses”. Ninguém praticou mais esse ensinamento do que o filósofo Sócrates (469 – 399 a.C.) junto ao povo e aos seus discípulos. O mergulho no seu interior é uma forma de ampliar a espiritualidade e a intuição. Algumas religiões tradicionais adotaram esse princípio, escrito de outra forma, como no Islamismo: “aquele que conhece a si mesmo conhece o senhor”; e, no Budismo: “olha para dentro de ti, tu és um Buda”. A frase do oráculo de Delfos era uma advertência aos visitantes que se consultavam com a pitonisa (nome dado aos médiuns, em geral femininos, da época): quem desejasse conhecer os desígnios dos deuses, deveria começar conhecendo a si mesmo. Quanta sabedoria numa simples frase!

A Grécia possuía vários oráculos, mas o oráculo de Delfos manteve a sua liderança e importância desde o século VII a.C. até a época helenística. Nos oráculos atuavam as pitonisas (os médiuns de hoje) que entravam em transe e recebiam as mensagens dos deuses. Estas mensagens (intuições mediúnicas) eram interpretadas pelos sacerdotes que as transmitiam ao povo em forma de versos.

Ainda na Grécia, vamos encontrar, a seguir, Platão (427 – 347 a.C.), que foi discípulo de Sócrates. Platão era filho de uma abastada família de políticos, mas não se empolgou pela política e sim pela filosofia. Ele destaca quatro formas ou graus de conhecimento, que vão do grau inferior ao superior: crença, opinião, raciocínio e intuição intelectual. Não admitia que os dois primeiros graus fizessem parte da Filosofia. Para ele esses eram conhecimentos ilusórios ou das aparências, como os dos prisioneiros da caverna. Assim, restavam os dois últimos e, somente estes devem ser considerados válidos no âmbito da Filosofia. Concluía que (4) “o raciocínio treina e exercita nosso pensamento, preparando-o para uma purificação intelectual que lhe permitirá alcançar uma intuição das idéias ou das essências que formam a realidade ou que constituem o Ser”.

Platão cita, em suas obras, que o pré-socrático Anaxágoras tinha intuído a necessidade de introduzir uma Inteligência Universal nos seus estudos para conseguir explicar o porquê das coisas. Infelizmente, ele não conseguiu levar adiante esta sua intuição. Embora atribuindo um peso preponderante às causas físicas, continuou afirmando que a verdade direta e evidente era aquela que a pessoa recebia de um plano transcendente, sem nenhuma mediação do mundo material.

Segue-se a idade medieval das trevas em que a teologia medrou como erva daninha, interpondo-se a uma população iletrada e ignorante das coisas sérias da vida, passando a imperar o dogma e o misticismo religioso. Mas, mesmo assim, restou a idéia de que o contato direto com o sagrado promovia o êxtase religioso, a sensação de iluminação e de plenitude, uma espécie de experiência de natureza puramente intuitiva.

Cerca de mil e novecentos anos após Platão, já no século XVII, vamos encontrar René Descartes (1596 – 1650) que tratou da intuição como um dos temas básicos em suas obras Discurso sobre o método e Meditações metafísicas.

Um século mais tarde, Kant (1724 – 1804) considerou a intuição como um pensamento que engloba verdades e conhecimentos que independem da experiência adquirida, o que equivale dizer que, para o filósofo alemão, a pessoa nasce intuitiva.

Na Inglaterra, a corrente intuicionista tinha no filósofo escocês William Hamilton (1788 – 1856) seu principal suporte. Ele afirmou que a primeira manifestação do conhecimento era uma iluminação súbita que alargava a compreensão humana. Ele foi o autor da teoria do condicionado e do incondicionado (o Ser Supremo).

Isaac Newton (1643 – 1727), que além de cientista, também era filósofo, quando tinha 24 anos, observando maçãs caírem ao chão em seu sítio de Woolsthorpe, teve a intuição da Lei da Gravidade. Quantos antes dele observaram um cenário como esse e nada aconteceu. Passou, então, o restante de sua vida trabalhando para verificar aqueles conceitos que determinara como leis. Teria sido dele estas palavras: “Se pesquisarmos com intuição, poderemos, agindo com amor à natureza, fazer uma viagem fantástica e redescobrir a arte de descobrir”.

Embora não tenha sido filósofo, o físico Albert Einstein (1879 – 1955) colocava a intuição sempre lado a lado com a criatividade. Observe suas palavras no texto de sua autoria (4):

 

Se o senhor quer estudar em qualquer dos físicos teóricos os métodos que emprega, sugiro-lhe firmar-se neste princípio básico: não dê crédito algum ao que ele diz, mas julgue aquilo que produziu. Porque o criador tem esta característica: as produções de sua imaginação se impõem a ele, tão indispensáveis, tão naturais, que não pode considerá-las como imagem de espírito, mas as conhece como realidades evidentes.

 

Há muitas filosofias orientais que aplicam o conceito de intuição em conexão com sabedoria transcendental, tendo-a como algo próprio e íntimo de cada pessoa, embora, paradoxalmente, afirmem que a intuição pode ser adquirida, mediante ensinamentos e técnicas apropriadas.

 

5. Enfoque espiritualista

 

Para melhor entender e compreender a exposição sobre a natureza da intuição, como ela é gerada e como ela ocorre e, ao mesmo tempo, por que ela ocorre em certas situações e não em outras, é necessário assimilar os ensinamentos expostos nessa obra nos capítulos sobre o Espírito, o Pensamento, a Mediunidade e a Aura. Além disso, o leitor aprenderá como ter intuições benéficas e maléficas, bem como, a forma de distinguir uma da outra.

Para desenvolvermos a tema da intuição vamos nos valer do resumo feito a partir da leitura dos referidos capítulos, a seguir:

O ser humano é um composto de três elementos: corpo mental ou espírito, corpo astral ou perispírito e corpo carnal ou corpo físico. O corpo mental ou espírito prepondera sobre os corpos astral e físico, sendo ele o responsável pela geração e emissão das vibrações do pensamento, decodificados e interpretados pelo cérebro, com passagem obrigatória pelo perispírito, que é o meio sutil intermediário, que registra as memórias derivadas do pensamento.

O pensamento é vibração do espírito, manifestação da inteligência, poder espiritual saturado de força. As ondas de força e poder do pensamento cortam a superfície da terra em todas as direções e alcançam inclusive o espaço superior, do mesmo modo que ocorre com as ondas hertzianas usadas nas transmissões radiofônicas e de TV. Estas ondas têm diferentes propósitos e são geradas e moduladas em função da enorme quantidade de sentimentos que cada ser humano exerce durante a sua atividade cotidiana. Por sua vez, elas se somam e se aglutinam de acordo com cada tipo de sentimento e propósito. Através de um processo que segue a conhecida lei da atração e repulsão dos pensamentos, os sentimentos afins se atraem e os sentimentos contrários se repelem, diferenciando-se em sentimentos positivos e sentimentos negativos. É fácil compreender a enorme quantidade de ondas de pensamento diferenciadas que são emitidas, a cada instante, não só por todos os habitantes (encarnados) da Terra, como pelos espíritos do astral inferior (que estão desencarnados e quedados na superfície da Terra) e pelos espíritos do Astral Superior, no espaço e nos seus mundos espirituais de origem.

Da mesma forma que o pensamento é gerado pelo espírito de cada pessoa, ele também pode ser captado. Então, no processo do pensamento, ele tanto pode ser gerado e emitido, como pode ser recebido de qualquer das fontes mencionadas, bastando entrar em sintonia com outros pensamentos afins. O segredo reside na afinidade de pensamentos que a lei da atração e repulsão propicia, atuando a afinidade como uma sintonia, da mesma forma que se sintoniza uma estação de radio ou de TV. A sintonia fina se completa pela atenção e concentração no assunto objeto de nosso pensamento. Nós recebemos ou transmitimos aquilo que queremos.

Segundo os ensinamentos desta obra, fundamentada no mais elevado espiritualismo, derivado dos princípios difundidos pela obra Racionalismo Cristão (7), “Todos os seres humanos são dotados, dentre outras, da faculdade de intuição – faculdade mais receptiva e mais sensível em uns do que em outros. Por meio dela, espíritos desencarnados que perambulam na atmosfera da Terra, em estado de perturbação (nesta obra genericamente mencionados pela designação de astral inferior), interferem na vida e nos pensamentos dos seres encarnados, levando-os – quando estes não reagem por meio do pensamento acionado pela vontade consciente – a cometer as piores ações, fazendo-os chegar, freqüentemente, à obsessão”.

Temos, assim, duas grandes correntes de pensamentos vibrando ao redor do planeta Terra: uma corrente que aglutina os pensamentos negativos (correntes do Mal) e outra que reúne os pensamentos positivos (correntes do Bem). Conforme os pensamentos emitidos a qualquer momento por uma determinada pessoa, ela se deixa influenciar por uma ou por outra, mas nunca ao mesmo tempo, por ambas. Segundo este princípio e ainda, com as explicações que fizemos quando tratamos do tema sobre a aura no capítulo de mesmo nome, forma-se em torno da pessoa e, com maior intensidade em torno de sua cabeça, uma imagem multicolorida de diferentes intensidades e matizes, reveladora do pensamento que está sendo formado e emitido.

É essa aura, que é variável na medida em que nosso pensamento se modifica, permitindo, assim, a leitura do pensamento pelos espíritos e pelos médiuns videntes, mediante a atração de pensamentos afins. Por isso é que se diz que entre os espíritos não há segredos, tudo está ali revelado, como num livro aberto, não sendo possível esconder pensamentos ou sentimentos. Esse é, também, o princípio que fundamenta a telepatia como forma de leitura, transmissão e recepção dos pensamentos. Infelizmente, por razões óbvias devidas ao atual estado de evolução da humanidade, esta faculdade ainda é incipiente na criatura, não sendo possível o seu uso generalizado, pois o órgão físico, que se admite ser a glândula pineal, ainda não está suficientemente desenvolvido.

Pelo exposto fica fácil entender como a intuição se processa e como essa linguagem é acessível às pessoas. Por exemplo, as intuições direcionadas para os maus hábitos e para os vícios, podem ser entendidas pela explanação de Luiz de Mattos (17, p. 237 - Abalos Morais): “Não é demais insistir neste ponto: a linguagem dos espíritos desencarnados é o pensamento. Pelo pensamento eles identificam os sentimentos das criaturas, as suas intenções e tendências e disso se prevalecem os obsessores para estimular, pela intuição, os vícios e as fraquezas humanas”.

Já as intuições direcionadas para os bons atos e para os pensamentos positivos, qualquer que seja a profissão exercida pela pessoa, sem nenhum privilégio, podem ser acessadas a partir da mencionada corrente vibratória do pensamento e inclusive do espaço superior, como nos revela Luiz de Mattos em sua obra (17, p.145 – Força do Pensamento): “O grande repositório da sabedoria não está na Terra, mas no Espaço Superior. Os progressos da moderna tecnologia não seriam ainda conhecidos, se muitas das suas parcelas não tivessem sido transmitidas aos seres humanos pela via da intuição, vale dizer pela força do pensamento, diante da qual todas as distâncias se anulam”.

No mundo científico, todo aquele que se imbuir de boas idéias voltadas para o bem da humanidade como um todo, tem condições de receber boas intuições do Espaço Superior. Observe, por exemplo, o que nos diz a Dra. Glaci Ribeiro da Silva (18, p.56): “No entanto, somente uma parcela relativamente pequena dessa comunidade – os chamados visionários – é capaz de ter idéias realmente inovadoras. Essas pessoas possuem uma sensibilidade mediúnica muito desenvolvida e por isso são capazes de captar tais idéias do espaço superior através da intuição”. Neste capítulo, citamos alguns cientistas visionários, como Newton, Mendeleev, Descartes, Kant e, também no mundo dos negócios, Akio Morita e Bill Gates e na base do enfoque espiritualista da intuição, Luiz de Mattos.

Para terminar este enfoque, lembramos a grande intuição que teve Luiz de Mattos, o codificador do Racionalismo Cristão (9):

 

Luiz de Mattos considerava-se ateu antes de estudar o espiritualismo científico e foi ele que mais tarde codificou o Racionalismo Cristão, mencionando a existência de 33 classes de evolução. Como é que ele soube disso? Em primeiro lugar ele próprio era, como todos sabem, um espírito muito evoluído e depois de saber da existência da vida fora da matéria, lembranças da sua missão na Terra podem ter aflorado à sua mente por intuição das Forças Superiores. Por outro lado, o seu estudo envolvia médiuns que são os instrumentos que nos colocam em contato com a vida astral. Foram certamente esses instrumentos (médiuns) que deram a conhecer a Luiz de Mattos a existência de 33 classes espirituais de evolução.

 

No capítulo 9 sobre o Espírito, desenvolvemos e nos aprofundamos sobre a existência desses mundos espirituais, que constituem os mundos de origem ou de estágio dos espíritos, enquanto desencarnados e, posteriormente, após não necessitarem mais encarnarem para continuarem a sua evolução, atuarem como espíritos superiores.

 

6. O dilema dos especialistas: saber prévio

 

Quando a solução de um determinado problema depende da intuição e não a temos, invade-nos uma frustração muito grande. É comum entrarmos num beco sem saída, reagindo com muita frustração e desânimo. Os nossos pensamentos vagueiam e saem de foco com relação ao problema, deixando o assunto de lado. Passamos, então, a dedicar cada vez menos tempo na busca de ten­tativas sistemáticas pela solução do problema ou, então, desperdiçamos muito tempo usando nossa capacidade de refle­xão em abordagens que já se mostraram inadequadas. Nada mais nos ocorre e tudo passa a ser recorrente.

Procurando contornar essas situações frustrantes, numerosos estudos e trabalhos vêm sendo feitos em muitas universidades, com o objetivo de explicar o que é intuição. Uma dessas pesquisadoras é a canadense Janet Metcalf, da Universidade Columbia, Nova York. Estudando voluntários, em laboratório, levados a situações de insights, ela verificou que as pessoas nunca sabem quando estão próximas de encontrar solução para os problemas formulados. Com freqüência, os voluntários sentiam-se perdidos, mesmo quando estavam próximos de encontrarem a solução.

Pesquisas feitas por Daniel M. Wegner, psicólogo da Universidade Harvard, explicam que “no momento em que temos o lampejo, intenção e ação se dissociam completamente”, significando por “ação” o surgimento da idéia. Nunca temos a impressão de ter produzido a idéia genial, mas é comum a considerarmos como conhecimento próprio.

Seriam, então, os insights involuntários? Segundo nossa referência (2) “Se a idéia que conduz à solução do problema não resulta do empenho voluntário do pen­samento, o que, afinal, nos conduz a ela? Por que problemas dessa natureza nos parecem, a princípio, insolúveis, se, na verdade, dispomos do saber necessário para resolvê-los?”

Segundo Stellan Ohlsson, pesquisador do fenômeno do insight na Universidade de Illinois, Chicago, a resposta está na reestruturação, que é causada pelos insucessos constantes para resolver o problema. A ocorrência desses insucessos dá início a diversos processos inconscientes que tendem a modificar a nossa representação interior do problema. Isso leva à abertura de outras possibilidades que, de forma completamente inesperada, nos traz a solução tão esperada, passando daí em diante a ser considerada como solução banal. Baseado em observações deste tipo, Ohlsson desenvolveu uma teoria segundo a qual (2): ”ao contemplar um problema, a primeira coisa que fazemos é construir uma representação mental - ou seja, uma espécie de imagem interior – na qual só entram determinados aspectos. É como um mapa do metrô, que nos dá a se­qüência das estações e os eventuais pontos de baldeação, mas não reproduz em escala fiel as distâncias entre as paradas: ressalta, pois, apenas aqueles aspectos da realidade importantes para a utilização do serviço. Para nos orientar pelas ruas da cidade, o mapa com certeza é de pouca valia”.

Será que o saber prévio, acumulado durante longos anos, tem alguma influência? Para uns pesquisadores a resposta é afirmativa, para outros, inclusive o professor Ohlsson, o saber prévio bloqueia a percepção e impede que vejamos a questão por novos ângulos, dificultando a ocorrência do insight. Mas, é inegável, também, que o especialista, conhecendo mais sobre o assunto, tem certas condições que um leigo não teria. Contrariamente ao professor Ohlsson, pensamos que o seu posicionamento é um tanto forçado e, até mesmo, contraditório. Se Einstein tivesse que seguir a opinião de Ohlsson, ele teria falhado em suas maravilhosas concepções intuitivas sobre a relatividade especial e geral. Assim, nos parece bastante claro que o saber é necessário e indispensável, principalmente quando temos que enfrentar (2) “de forma eficaz e roti­neira problemas já conhecidos. Influências prejudiciais só se manifestam quando a ex­periência passada se solidifica de tal forma que acaba bloqueando as novas idéias”.

Mas, a coisa não é tão fácil assim. Parece que naqueles que dispõem do conhecimento prévio, a adoção de certos passos na resolução do problema conduz à exclusão de certas estratégias, talvez mais simples. É o caso do “problema da predisposição” ou até mesmo submissão a determinados métodos, o que pode nos deixar cegos para procedimentos mais eficazes, impedindo a ocorrência do insight. Foi o que constatou Abraham Luchins, discípulo de Wertheimer.

Jennifer Wiley, da Universidade de Pittsburgh, Pensilvânia, mostrou, em estudo de 1998, que nem sempre a especialização (o saber prévio) é capaz de enxergar suas próprias deficiências. Suas conclusões derivaram da aplicação de testes de inteligência e criatividade aos seus voluntários especializados e não especializados em determinado assunto.

Outros pesquisadores estavam interessados em determinar se o saber prévio tem influência na identificação do “ponto crucial” para a resolução de um problema. Ou seja, de que forma e em que grau ele nos impede de descobrir onde, afinal, esse ponto crucial poderia estar. Daí, a importância em identificá-lo, influência essa tão importante quanto dirigir a atenção para os aspectos mais críticos do problema a solucionar.

 

7. Conselhos para obter resultados

 

Podemos até aprender técnicas para o uso da intuição, mas não podemos forçar o aparecimento dos lampejos, já que eles são involuntários no dia-a-dia de nossas vidas. Nós sabemos que na solução de muitos problemas cotidianos utilizamos inconscientemente a intuição. Quando percebermos que estamos num beco sem saída e não nos ocorre uma solução para o problema que estamos enfrentando, uma boa medida seria deixá-lo de lado por algum tempo. Muitas das vezes, isso indica que estamos perto de obter a solução, ou seja, pressentimos quando estamos próximos a uma súbita descoberta. A experiência da vida nos ensina que nem sempre se consegue avançar e obter a desejada solução. Esse é o momento certo de fazer uma pausa, ou quem sabe, não resistir a uma soneca ou ao sono reparador para retomar o assunto no dia seguinte. É impressionante a quantidade de relatos relacionados à ocorrência de insights durante o sono e através de sonhos. Vamos citar dois deles, muito famosos.

Vamos nos valer, primeiramente, de um sonho, relatado pelo bioquímico alemão Friederich August Kekulé Von Stradonitz (1829-1896), que viveu no século XIX e que o levou a uma das mais importantes descobertas da Química Orgânica. Eis o relato: “Virei minha cabeça e adormeci... uma vez mais, os átomos estavam cabriolando diante dos meus olhos. Dessa vez, os grupos menores se mantinham modestamente no fundo. Meu olho mental, que se tornara mais aguçado em virtude de repetidas visões desse tipo, podia agora distinguir estruturas maiores, com múltiplas conformações; longas fileiras, às vezes encaixadas mais firmemente umas às outras; todas se dobrando e curvando-se, num movimento semelhante ao feito por uma cobra. Mas, olhe! O que foi aquilo? Uma das serpentes tinha abocanhado a própria cauda e o conjunto rodopiava zombeteiramente diante dos meus olhos. Acordei como se tivesse sido despertado pela luz de um relâmpago..”. Esse sonho o ajudou a entender como as moléculas de diversos componentes orgânicos se organizavam em uma estrutura em forma de anel hexagonal – o núcleo benzênico, base da química orgânica aromática, que o tornou famoso.(10)

Outra experiência famosa desse gênero ocorreu com Dimitri Mendeleev, químico russo, laureado pelos cientistas pela brilhante idéia de agrupar os elementos químicos em uma tabela ordenada logicamente segundo os números atômicos dos elementos, que passou a ser conhecida com o nome de Tabela Periódica dos Elementos. Essa foi uma descoberta representativa de um exemplo notável de síntese ocorrido em ciência. Foi através dessa tabela que muitos elementos químicos foram descobertos posteriormente, pois a existência dos mesmos fora prevista por Mendeleev, que havia deixado “espaços” ou “posições” vazias em sua tabela para elementos não conhecidos à época em que a preparou. O que pouca gente sabe é que essa descoberta notável surgiu de um sonho que Mendeleev tivera, não enquanto estava pensando logicamente. É uma pena que não dispomos do relato desse sonho! (12)

São numerosos os casos relatados desse tipo com gente famosa de todas as áreas. Imagine, então, quando extrapolamos para os casos da vida comum. Por isso mesmo, os estudos sobre a influência do sono e dos sonhos na solução de problemas de todos os tipos e na criatividade humana têm merecido apreciável atenção por parte dos psicólogos e das cartomantes, estas aproveitadoras e embusteiras da credulidade humana. Voluntários são submetidos a problemas de criatividade envolvendo conhecimento e relações lógicas antes e depois do sono. É muito maior o número de soluções que aparecem depois do sono devido a estratégias em que se acha envolvida a intuição, quando comparadas com as obtidas por aqueles que não tiveram uma pausa para o sono. Segundo nossa referência (4): “Os pesquisadores explicam essa diferença espantosa recorrendo a processos de consolidação que têm lugar no hipocampo durante o cochi­lo: desse modo, as novas informações recebidas são associadas ao saber armazenado na memória há mais tempo. E isso pode fazer com que descubramos com maior rapidez es­tratégias mais simples de resolução de problemas”.

Outro aspecto que ajuda na obtenção dos insights é deixar que o pensamento divague um pouco, dedicando-se a outros afazeres ou lazeres que o deixem de bom-humor. Trata-se de descansar a mente e adotar uma atitude positiva. Isso permitirá que o subconsciente trabalhe o problema sob outros pontos de vista ou enfoques, conduzindo, então, à solução. Mas, qualquer que seja o “problema” do problema, nenhuma solução desponta fácil se não for embasada no conhecimento prévio do assunto.

 

8. Aspectos práticos

 

Na última década do século XX e mais recentemente, tem sido muito grande o interesse despertado pela intuição, a ponto de, além das pesquisas cognitivas em andamento, levar muitos institutos a realizarem pesquisas de opinião pública sobre o assunto. É o caso, por exemplo, de um levantamento feito em 2003 pelo IMD - Internacional Institute For Management Development, que tem sede na Suíça, afirmando que (5) “80% dos 1.312 executivos entrevistados em nove países, avaliaram que a intuição se tornou importante para formular a estratégia e o planejamento empresarial.”. E, ainda, segundo a referência (5): “Desses, a maioria (53%) diz que recorre à intuição e ao raciocínio lógico em igual proporção no seu dia-a-dia. A intuição é velha companheira de artistas e cientistas. Num estudo recente divulgado nos Estados Unidos, 82 entre os 93 Prêmios Nobel enfatizaram o papel importante dessa capacidade na criatividade e nas descobertas humanas”.

Além dos casos relatados no item anterior sobre Kekulé e Mendeleev, ambos cientistas, vamos citar, de passagem, alguns outros casos relacionados com outras áreas da atividade humana, em que pessoas famosas e líderes de negócios e administração são unânimes em afirmar o papel relevante desempenhado pela intuição. Na música clássica, Beethovem e Mozart atribuíram suas maiores composições ao uso da intuição. Nos negócios, Akio Morita, presidente da Sony, lançou, em 1979, o famoso produto walkman, baseado em observações que fizera de pessoas caminhando pelas ruas de Tóquio e Nova Iorque levando enormes e pesados equipamentos de som às costas. Levou o problema à sua equipe que achou que ninguém teria interesse num produto dessa natureza sem dispositivo de gravação. Morita insistiu e fez prevalecer a sua intenção derivada de sua intuição e todos nós sabemos do sucesso de tal produto que perdura até os dias atuais, embora usando tecnologia mais moderna (CD Player). Hoje, são mais de 250 marcas no mercado usando o mesmo princípio, representado por um produto leve, portátil e de baixo custo. Outro caso famoso é o de Bill Gates que, quando teve a brilhante intuição de lançar um computador pessoal, não finalizou a sua formação acadêmica e, ao apresentar o seu incipiente produto aos técnicos da IBM, teria sido recusado com a seguinte pergunta: Quem vai querer um computador em casa? Nos dias atuais, apenas 30 anos após esse fato ter ocorrido, só no Brasil são 18 milhões de computadores pessoais em operação. São idéias que valem bilhões de dólares, pela sua aceitabilidade e praticidade!

Muitos empresários atualmente estão dando mais atenção à intuição, inclusive abrindo vagas em cargos de chefia para mulheres, antes relegadas a cargos secundários. Hoje não basta contar, medir, pesar e analisar números, o que muitas vezes leva muito tempo e atrasam decisões de mercado que precisam ser estratégicas. Tudo na vida está muito acelerado. Por exemplo, a preferência por um modelo novo de tênis dura apenas seis meses e uma geração de computadores fica obsoleta em 18 meses. Assim, os consumidores tornam-se cada vez mais exigentes e imprevisíveis e as pressões para tomada de decisões estão exigindo cada vez menos tempo dos empresários, cabendo à intuição papel cada vez mais relevante na definição de estratégias. Observe que nesses casos intuição e criatividade andam de mãos dadas.

 

9. O Papel do cérebro

 

Visto que todos os estudos e trabalhos científicos realizados e em realização pelos psicólogos têm confirmado o conceito de reestruturação e percepção súbita (insights ou lampejos), o que se busca é descobrir pela via de procedimentos indiretos quais regiões cerebrais respaldam o referido conceito. A primeira questão é saber se os hemisférios cerebrais atuam igualmente ou de modo diferenciado. É o que a neurociência cognitiva vem procurando fazer, usando um instrumental sofisticado que consiste em valer-se da eletroencefalografia (EEG) e da tomografia por ressonância magnética funcional (FMRT), aparelhos que medem processos neuronais, cuja duração é de milisegundos a uns poucos segundos. É preciso, contudo, assinalar que resolver problemas em geral é algo que, com freqüência, leva minutos ou mesmo muitas horas. Além disso, toda uma multiplicidade de processos cognitivos toma parte nessa operação.

Nessa linha de investigação estão os trabalhos de Marc Jung-Beeman e Edward Bowden, da Universidade Northwestern, Chicago, que partiram da hipótese de que o hemisfério esquerdo seria responsável pelo raciocínio lógico, organizado e analítico mediante o uso consciente da linguagem, ao passo que, o direito responderia pela emoção, imaginação e criatividade, que implica na atenção inconsciente e espacial, embora (2) “descobertas mais recentes da pesquisa cerebral mostram que a rígida separação entre “hemisfério esquerdo consciente” e “hemisfério direi­to inconsciente” é de difícil sustentação. Ainda assim, parece haver uma certa divisão de tarefas”.

Mesmo assim, aqueles pesquisadores partiram do princípio de que no hemisfério esquerdo ocorreria a solução passo a passo de problemas conhecidos mediante a aplicação consciente de regras lógicas e ao hemisfério direito, atribuiu papel relevante na solução de problemas que demandam o insight. Na opinião daqueles pesquisadores, os insights surpreendem aqueles que os têm porque a reestruturação ocorre no hemisfério cerebral direito. Mas, somente quando o resultado é transmitido para o lado esquerdo do cérebro acende-se, subjetivamente, uma luz na nossa mente. Em resumo, o insight ocorreria no hemisfério direito, mas a sua percepção se daria via hemisfério esquerdo. E, como chegaram a essa conclusão aparentemente controversa?

Ora, como é sabido, no processo da visão há uma inversão: as percepções do olho esquerdo são enviadas ao hemisfério direito do cérebro e as do olho direito são enviadas ao hemisfério esquerdo. Então, durante as experiências este fato foi levado em consideração, de modo que as imagens em questão fossem per­cebidas ora apenas pelo olho esquerdo, ora somente pelo direito. Procedendo dessa forma, muitos voluntários que haviam fracassado visualizando com ambos os olhos, tiveram insights quando suas percepções foram direcionadas na forma exposta. Ainda, segundo (2): “O resultado foi claro: as soluções identificadas com mais freqüência foram as provenientes do olho esquerdo para o hemisfério direito. Ao que tudo indica, os processos inconscientes que conduzem à percepção súbita ocorrem predominante­mente no hemisfério cerebral direito”.

 

10. Psicologia do juízo intuitivo

 

Um importante trabalho é o apresentado pelo cientista cognitivo Thomas Goschke (11), da Universidade Técnica de Dresden, Alemanha, sob o título Psicologia do juízo intuitivo. Segundo ele, a intuição é um tipo de inspiração espontânea, seja ela aplicável na solução de uma tarefa intelectual, seja em relação a qualquer pressentimento inexplicável que venhamos ter. Carl G. Jung contrapunha a intuição - como compreensão imediata e integrada de relações diversas - à decomposição lógico-analítica. Para o prêmio Nobel americano Daniel Kahneman, as intuições seriam “rápidas, sem esforço, semelhantes à percepção”. Mas, é claro que as impres­sões intuitivas fundam-se em processos mais ou menos complexos – os processos ditos implícitos.

É claro que os sentimentos desempenham um papel importante nesse processo, pois, muitas vezes, os juízos se expressam em sentimentos e as emoções, também, influenciam nas decisões. Há boas indicações de que uma atitude positiva conduz mais diretamente a boas intuições, enquanto que uma atitude negativa, por exemplo, representada por mau-humor e tristeza não favorecem a intuição.

Experiências levadas a efeito por pesquisadores sérios parecem confirmar a tese do neurologista António Dalmásio, segundo o qual sinais corporais inconscientes nos informam se um comportamento planejado é desejável ou não. Frequentemente, os sinais corporais, como, por exemplo, a condutibilidade elétrica da pele, que varia em determinadas situações, indicam que conseqüências emocionais se vinculam a uma ação escolhida. Novas pesquisas estão sendo feitas para confirmar ou negar essa hipótese.

É fora de dúvidas que existem situações em que nos deixamos guiar pelas intuições e isso é confirmado por testes de laboratório nos chamados juízos coerentes através de conexões semânticas distantes. São apresentadas três palavras e pede-se que se indique uma quarta palavra que “seja denominador comum”. Os que estão de bom-humor geralmente acertam mais que os de humor neutro e os tristes não conseguem fazer pontos.

E, como se coloca alguém de bom ou mau humor em laboratório? É simples: basta pedir aos voluntários que se lembrem de um acontecimento feliz de sua vida ou, então, de uma passagem triste. Tudo leva a crer que (11), “num estado de espírito positivo, amplas redes de significado são ativadas, abran­gendo mesmo associações frágeis ou distantes. E isso se manifesta claramente num senso intuitivo de coerência, mesmo que a palavra correta não seja resgatada de forma consciente”. Ou seja, (11): “Idéias criativas têm muito a ver com a capacidade de estabelecer associações incomuns e, desse modo, escapar à trilha habitual do pensamento e da ação. Segundo os resultados que obtivemos, fica claro que isso acontece com mais freqüência quanto mais alegres ou relaxados estivermos”.

Com relação à tão propalada diferença entre o hemisfério direito e esquerdo, Goschke entende haver muito mais especulação pseudocientífica a respeito do que comprovações empíricas seguras. Mas, reconhece, também, que existe, de fato, certa divisão e conexão do trabalho entre ambos. Estudos feitos usando a ressonância magnética funcional têm comprovado, com relação à intuição, a existência de certa coerência semântica nas regiões do lobo frontal superior direito. Essas regiões são, ainda, associadas a outras capacidades intuitivas, entre elas, adivinhar as intenções das pessoas, bem como, por exemplo, avaliar o grau de confiabilidade de um rosto des­conhecido. Mas, Goschke é de opinião de que a ocorrência da intuição, com certeza, não depende apenas de uma região específica do cérebro e sim de toda uma rede amplamente distribuída. Estudos de outros pesquisadores mostraram, também, que sentimentos e reações emocionais podem estar fazendo parte do problema, indicando que o juízo implícito tem relação com a atividade de centros mais profundos da emoção, como a amígdala.

Para Goschke, parece não haver dúvidas que o conhecimento específico da área de trabalho em que a intuição é desejada, faz uma grande diferença para que ela se mani­feste na forma de um aparente sentimento espontâneo. Isso porque é necessário aliar à intuição a análise lógica dos fatos conhecidos. Ou seja, sem o saber específico correspondente, também a intuição falha.

Há casos em que as reações intuitivas contradizem a avaliação racional, mas a impressão intuitiva acaba sendo corrigida pela postura consciente da pessoa. Em entrevista concedida ao editor Steve Ayan da revista Gehim & Geist, reapresentada pela referência (2), ele relata o seguinte caso (11): “Se você, por exemplo, mostra muito rapidamente rostos negros a americanos brancos, tão rápido que eles não podem ser identificados, isso vai ativar a amídala, o que permite inferir uma reação emocional espontânea negativa - mesmo que essas pessoas não tenham nenhum preconceito consciente contra negros. Mas, assim que os rostos são per­cebidos pela consciência, a atividade da amídala apresenta uma nítida redução”.

 

11. A intuição contribui para nossa felicidade?

 

Vimos que o estado de espírito (atitude) das pessoas bem-humoradas tem a ver com a qualidade das intuições que recebemos, isto é, estas pessoas estão mais abertas às associações incomuns das boas idéias do que as mal humoradas.

É, portanto, pelo menos razoável, dar uma resposta positiva à pergunta que intitula esse item. Nós sabemos que alguns psicólogos motivacionais admitem que o nosso bem-estar psíquico dependa do grau de coincidência entre as nossas metas conscientes (cumprimento de nossos deveres) e as implícitas, estas oriundas do nosso planejamento espiritual. Sabemos, também, por exemplo, que todos nós temos a necessidade de termos o controle de nós mesmos ou de sermos melhor do que outros, valores esses adquiridos ainda na infância e parcialmente acessível à nossa consciência. Se adotarmos uma postura que se afasta muito dessa realidade, obviamente iremos sentir menos alegria com os nossos sucessos.

12. A intuição tem conotação moral?

 

Se nós encararmos, como convém, que a intuição é uma excelente ferramenta a nos guiar na tomada de decisões, quando se deparam duas ou mais escolhas que o simples uso lógico da razão ainda nos deixa em dúvida, levando-nos a titubear, então a resposta é positiva. Aliás, no nosso entender, tudo na vida tem um sentido moral elevado. Mas, não devemos chegar a dizer que existe uma ética ou moral intuitiva, pois estaríamos exagerando.

Quando tivermos que confrontar certas situações ou dilemas do nosso cotidiano que envolvem uma tomada de decisão, envolvendo riscos alternativos com relação a outras pessoas, nossa razão nem sempre é uma boa conselheira. Quando isso acontecer, às vezes numa fração de segundo, podemos vir a ser movidos por uma intuição que nos diz o que fazer. Por exemplo, entre evitar a morte de três ou mais pessoas ou de apenas uma, num desastre iminente e estiver ao nosso alcance fazê-lo, nossa razão nos leva a tomar ação no sentido de salvar as três ou mais pessoas e não uma. Mas se esta “uma” for um nosso parente, filho ou filha, por exemplo, nossa intuição pode pender para este lado, mas de certa forma revirando a nossa consciência de cabeça para baixo. Bem lá no fundo, cada um tem seus escrúpulos e para isso, nossos centros emocionais estão sempre vigilantes.

 

13. Conclusão

 

Terminamos, assim, esse tema apaixonante pelo seu elevado conteúdo e de grande significação na vida das pessoas. Vimos que a intuição é uma forma indireta de conhecimento e que se manifesta através de insights, flashes ou lampejos. A captação das imagens assim apreendidas acontece muito rapidamente e o raciocínio que daí decorre é do tipo intuitivo, levando a pessoa a um discernimento instantâneo com a percepção integrada do problema.

As pessoas que estão sempre abertas ao novo e gosta de experimentar não são muito comuns. Para essas pessoas, sem desenvolverem nenhum pensamento analítico, a intuição é um recurso súbito e até instantâneo que sempre traz solução aos problemas, desde que a pessoa se convença e coloque a intuição em prática, sem titubear. Sendo a intuição uma percepção ampla, é necessário não se perder em minúcias e detalhes.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio – dicionário da língua portuguesa, 2001. São Paulo: Nova Fronteira, 2001.

 2) KNOBILICH, Günther e ÖLINGER, Michael. Percepção súbita. Revista Viver Mente & Cérebro, p. 32-39, v. XIV, n. 156 – Jan. 2006.

 3) THEOFILO, Roque. Intuição. Acesso em 09/02/2006. Disponível em:    https://www.dominiofeminino.com.br/eles/intuicao/intuicao.htm.

 4) ROQUE, Teophilo Entrevista de Sharon Franquemont. Revista Veja v. 35, n. 21, 29/05/2002.

 5) THEISS, Felix. Intuição, que bicho é esse? Disponível em: https://www2.brasil-rotario.com.br/revista/materias/rev943/e943_p6.html. Acesso em 27/01/06.

 6) GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. 68.ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.

 7) MATTOS, Luiz de. Racionalismo cristão. 43.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2004, p. 112, 145 e 237.

 8) SILVA, Glaci Ribeiro da. Racionalismo cristão e ciência experimental. São Paulo: Íbis, 2004, p. 120.

 9) SITE, Redator do. Perguntas e respostas – 2001. p. 13. Disponível em: https://www.racionalismo-cristao.org.br. Acesso em10/02/06.

10) AGUILAR, Marcelo. Desperte sua intuição. Disponível em: https://vocesa.abril.com.br/aberto/voceemacao/pgart_03_14052003_5010.shl. Acesso em 27/01/06.

11) AYAN, Steve. Pensar com intuição. Revista Viver Mente & Cérebro p. 40-42, v. XIV, n. 156, Jan. 2006. (Entrevista concedida a Steve Ayan, editor de Gehim & Geist,      tradução de Sérgio Tellaroli. s.d..

12) PIGLIUCCI, Massimo, Intuition. Disponível em:     https://www.scifidimensions.com/oct02/onintuition.htm.  Acesso em 27/01/06.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 14

 

 

O LIVRE-ARBÍTRIO CONSTRÓI O DESTINO

 

Visão espiritualista deste atributo

 

 

A ninguém é solicitado mais do que pode dar. O bom uso do livre-arbítrio está dentro da capacidade de cada um. Por que, então, cometer erros que fazem da vida um tormento?

 

Luiz de Mattos,  Racionalismo Cristão. (6)

 

 

Tudo o que estamos colocando em evidência na segunda parte dessa obra acha-se, de propósito, impregnado com os conceitos filosófico-espiritualistas de vida e, o livre-arbítrio não poderia fugir a essa orientação. O contexto dessa apresentação fundamenta-se no tema divulgado pelo autor com o mesmo título, na sua obra Reflexões sobre os sentimentos (1), tendo sido ampliada a sua linha de raciocínio.

Antevemos o dia, embora ainda distante, em que a maior parte da humanidade, se não toda, tenha acesso a esses conhecimentos filosóficos e espiritualistas em que o bom uso desse atributo espiritual constitui uma bússola norteadora capaz de impulsionar as pessoas para o bem, deixando de lado instintos animalescos embrutecidos pela mente doentia de muitos. O seu bom uso na vida material condiciona o sucesso das encarnações, tornando-as menos repetitivas, minorando o sofrimento advindo do seu mau uso. Com o apoio de um raciocínio lúcido, o exercício do livre-arbítrio poderá atingir a sua plenitude e a criatura alcançar a felicidade relativa no seu viver terreno.

 

1.      Premissas básicas

 

Comecemos a nossa incursão neste sempre presente assunto, consultando o dicionário Novo Aurélio – Dicionário da língua portuguesa (2001). Na definição dessa obra, o livre-arbítrio é apresentado como um poder abstrato, isto é, “um grande poder sem outro motivo que não a existência mesma desse poder”. Mais adiante, ainda sobre o livre-arbítrio, diz o dicionário: “o homem é dotado de poder de, em determinadas circunstâncias, agir sem motivos ou finalidades diferentes da própria ação”. Dessa forma, nada se esclareceu não se definiu coisa alguma e sua descrição é vaga e sem sentido. Isto demonstra que essa maravilhosa e tão essencial faculdade espiritual é pouco conhecida, devido às falsas concepções sobre o que é a vida.

Para entender o que seja o livre-arbítrio e o seu importante papel em tudo o que acontece na vida da criatura e, até mesmo do próprio processo de evolução espiritual do homem, é preciso invocar os conhecimentos difundidos pelo alto espiritualismo, por escolas de alto psiquismo, que ensinam não ser a vida lapidada em uma única passagem pela Terra. Pelos seus fundamentos, a vida é um composto de Força e Matéria, a primeira tendo evoluído como Força Inteligente até alcançar a condição de Espírito. Nesta condição, então, encarna em corpo humano para continuar o processo de evolução, neste estágio não mais das espécies, como muito bem ensinou Darwin no seu famoso trabalho apresentado no livro A Evolução das Espécies, mas como evolução do espírito na espécie humana, último elo material nesta milenar cadeia evolutiva. Esta evolução se processa no homem como ser encarnado, passando por numerosas vidas terrenas até atingir o Espírito níveis de alto valor espiritual e moral, essencialmente puro, lúcido e onisciente das verdades fundamentais e das leis universais, quando não mais precisa encarnar para continuar evoluindo.

 

2.      Um pouco de história

 

O primeiro a apresentar um estudo sobre o livre-arbítrio foi Eduardo Agostinho (354-430), no século III. Este sábio que, mais tarde, foi canonizado pela Igreja Católica como Santo Agostinho, pretendia com sua obra intitulada, O livre arbítrio (2) conciliar as idéias e postulados filosóficos de Platão (427 – 347 a.C.) e Aristóteles (384 – 322 a.C.) sobre as virtudes e relativas ao Bem e ao Mal com as da Igreja, o que acabou por conseguir. O nó górdio da discórdia firmava-se na existência ou não do destino, que implicava numa pré-ciência dos fatos e, portanto, nos postulados do predeterminismo. Dessa forma, a questão predeterminismo (destino) versus livre-arbítrio perdurou por mais de 1600 anos, isto é, até o início do século XXI, mas isso, ainda hoje, não é uma questão pacífica!

Este assunto foi, também, cerca de 850 anos após Santo Agostinho, retomado por Tomás de Aquino (1225-1274), outro doutor da Igreja, canonizado como São Tomás, que estendeu e completou as idéias de Santo Agostinho na sua obra Suma Teológica (3).

Com uma maior liberalização das idéias, que ocorreu com a instauração do Renascimento, chegamos a René Descartes (1596-1650). Descartes, que havia concluído a sua obra, Discurso sobre o método em 1619, quando tinha 23 anos, aborda a questão do livre-arbítrio por volta de 1649, já maduro e quase no final de sua vida, nos seus Princípios ou, mais precisamente na sua 4ª Meditação, em que tratando da vontade, se expressa, conforme citado em (4, 5): “[...] Pois ela consiste somente em que podemos fazer uma coisa ou deixar de fazê-la (isto é, afirmar ou negar, perseguir ou fugir), ou antes, somente em que, para afirmar ou negar, perseguir ou fugir as (sic) coisas que o entendimento nos propõe, agimos de tal modo que não sentimos de maneira alguma força exterior que nos obrigue a isso”. Há nesta sentença uma alusão indireta ao livre-arbítrio ou livre vontade de escolha. Mais adiante, temos, novamente, a seguinte frase de Descartes, em que “afirma ser o livre-arbítrio o poder de recusar a Verdade e o Bem até mesmo na presença da evidência que se manifesta” (4, 5), que, como vemos, é bastante explícita. E, finalmente (4, 5), “[...] pois, se eu sempre conhecesse claramente o que é verdadeiro e o que é bom, nunca teria dificuldade em deliberar qual juízo e qual escolha deveria fazer; e, assim, eu seria inteiramente livre, sem nunca ser indiferente”.

Estes conceitos, muitas vezes controvertidos ou mal interpretados, nos levaram à situação do início do século XX, quando Luiz de Mattos, (6) sem a paixão das vaidades filosóficas, completou-os de forma clara e inquestionável em sua obra Espiritismo Racional e Científico Cristão, mais tarde chamada de Racionalismo Cristão, escrita na década de 1910 e que fundamenta a doutrina do mesmo nome, estabelecida com base na reencarnação, nos deveres do espírito encarnado e nos princípios morais cristãos. Apontou-nos o autor a necessidade do seu bom uso e da racionalidade para o tratamento das coisas sérias da vida. Segundo ele, trata-se de um atributo do espírito ou faculdade arbitral, que a criatura pode usar para o bem ou para o mal, portanto, em consonância com a Metafísica. Baseados, portanto, no fundamento de que tudo na vida são possibilidades, vamos nos aprofundar nesses conceitos sobre o livre-arbítrio.

 

3.      Conceito filosófico-espiritualista

 

Os debates, pelos filósofos, sobre o tema do livre-arbítrio tornaram-se um assunto de interesse inesgotável. Praticamente, cada filósofo acaba por abordar este assunto, apresentando opinião própria. As discussões metafísicas sempre levam à confirmação de que se trata de um tema conectado às responsabilidades morais do ser, o que implica abranger o sentido da consciência e, sob ela, o sentido de responsabilidade das pessoas. No sentido prático, estamos diante de um poder de escolha, que tem muito a ver com as realizações e o sucesso ou insucesso das criaturas. Estas precisam fazer continuamente um auto-esforço sustentado para manter a sua autonomia e dignidade, isto é, manter os valores que desejam conservar, tais como, os de amizade, amor próprio, amor ao próximo, etc.

Muitos filósofos distinguem liberdade de vontade de liberdade de ação, visto que, na prática, muitos de nossos atos não são inteiramente livres, dependendo de certas restrições que estão fora de nosso controle. Estas restrições podem ser de ordem físico-causal, ambientais, psicológicas, biológicas e teológicas. Ao final desse capítulo, trataremos dessas restrições. Daí, muitos dizerem que o livre-arbítrio restringe-se às nossas “escolhas” e “vontades”. Isto porque, desde René Descartes, a faculdade da vontade acha-se perfeitamente identificada com a liberdade de escolha. O enfoque que daremos ao tema do livre-arbítrio é, antes de tudo, de ordem espiritual, mas sem nos afastarmos do sentido prático das suas implicações e conseqüências.

O livre-arbítrio é um atributo espiritual orientado pelo uso adequado do raciocínio e controlado pela vontade. Ele serve para governar as nossas escolhas e ações e sua eficiência é tanto maior quanto maior for o nosso poder de raciocínio. Completando, livre-arbítrio significa, portanto, plena liberdade de pensamento e ação tanto para o bem, como para o mal.

  Quando a criatura age para o bem, melhorando os seus hábitos e costumes, sua conduta se aperfeiçoa, o que, por sua vez, causa mais rápida evolução do espírito. Ao contrário, quando a criatura, seja por pensamentos, seja por ações, incide na prática do mal, sua evolução espiritual é prejudicada e retardada. Esse conceito não representa uma ameaça ou coerção pré-condenatória, mas o entendimento para o estrito cumprimento do dever moral.

É esse atributo que caracteriza a transição da Força Inteligente, atuante nos três reinos da Natureza, em Espírito, atuante no Homem, isto é, a partícula inteligente coloca-se em condições de encarnar em corpo humano, um organismo mais complexo e evoluído. Esta transição representa que a Força Inteligente individualiza-se e adquire consciência do Bem e do Mal, discernindo um do outro.

 

4. O processo mental do livre-arbítrio

 

Neste contexto, o livre-arbítrio é uma faculdade do espírito, isto é, um atributo do espírito. É o poder de agir com liberdade plena, impulsionado pela vontade e controlado pelo raciocínio. O processo que precede cada ação da criatura, passa-se de forma resumida, na seqüência que se descreve a seguir. As idéias e estímulos que nos chegam do meio ambiente, isto é, de fora (em relação ao indivíduo) são processadas e elaboradas em forma de pensamentos; estes, por sua vez, são trabalhados pelo raciocínio que os depura para ficarem de acordo com o que se deseja transmitir ou fazer. Ainda nesta fase, a criatura utiliza a experiência previamente adquirida e que está disponível em sua memória. Em seguida, entra em ação a vontade, que também é um atributo do espírito. Esta, com sua maior ou menor força, dependendo do grau de evolução espiritual de que se acha dotada a criatura, tem a função de colocar os pensamentos em ação, usando a faculdade do livre-arbítrio como filtro secundário, isto é, como sentinela do juízo, orientando a ação desejada para o bem ou para o mal. Neste processo, o raciocínio age como filtro primário, já que, quando a criatura não raciocina, os pensamentos são levados à ação sem uma depuração adequada quanto aos efeitos que pode produzir, induzindo a pessoa a empregar o seu livre-arbítrio de forma irracional, insensata e até mesma sob o império dos instintos animalescos, na maior parte das vezes causando danos irreparáveis a terceiros e a si mesma.

 

5.      Relação do livre-arbítrio com o Bem e o Mal

 

As crianças, mesmo em tenra idade, já possuem a consciência do Bem e do Mal. Desde cedo, começam a aprender os primeiros ensinamentos dos pais e preceptores, num processo de aquisição de conhecimentos morais. As famílias bem formadas procuram, com amor, carinho, dedicação, abnegação e espírito de renúncia transmitir aos seus descendentes o melhor que podem. Aqui, os valores morais falam mais alto e são os deveres de casa dos pais para com os filhos, com o objetivo de forjarem os seus caracteres.

Conhecendo, portanto, o Bem e o Mal e a maneira de distinguir um do outro, o livre-arbítrio oferece às criaturas duas opções e somente duas: ou empregá-lo para o Bem ou dirigi-lo para o Mal. Quando o livre-arbítrio é dirigido para o Bem, os benefícios recaem sobre quem o praticou e sobre aquele ou aqueles a quem a ação foi dirigida. Caso contrário, quando orientado para o Mal, ele reverte o mau resultado de sua ação para quem o praticou, além de prejudicar o seu semelhante. O curso normal da evolução espiritual só se processa no primeiro caso e é dele que devemos cuidar sempre em nossas ações. Isto é obvio e intuitivo e vem confirmar o preceito cristão que diz: “quem bem faz para si o faz”.

Pensar elevadamente e com profundidade, de forma concisa, dedutiva, lógica e de modo a abranger a essência do assunto, problema ou questão em análise, raciocinando sobre a validade do pensamento e aplicando-o com a força de vontade voltada para o Bem, é praticar o livre-arbítrio de forma inequivocamente correta. Com atos assim, racionalmente pensados, gerados e aplicados, caminharemos mais rápidos e seguros para completar nossa trajetória evolutiva terrena com sucesso e progresso espiritual.

Se, ao contrário, titubearmos e fecharmos os nossos olhos para os nossos problemas, não procurando resolvê-los de forma racional, tornar-nos-emos propensos a mal usar nossa força de vontade quando formos transformar nossos pensamentos em ações, disso resultando um mau uso do nosso livre-arbítrio, com todas as suas funestas conseqüências. A baixa capacidade de raciocínio encontrada em muitas pessoas, muitas vezes até com boa índole e dóceis no trato e no relacionamento, pode resultar em miséria, desgraça e muito sofrimento, tudo em decorrência do mau uso que vierem a fazer do livre-arbítrio.

Basta ter um pouco de percepção para compreender que a somatória das forças de todas as ações do pensamento e do livre-arbítrio que ocorrem em dado momento, no mundo, têm intensos efeitos opostos de incalculável grandeza e magnitude. De um lado, os efeitos gerados pelo mau uso do livre-arbítrio direcionado para o Mal trazem consigo enorme confusão de opiniões, desentendimentos entre pessoas, no seio das famílias, entre povos e nações, levando à incompreensão, ao ódio racial e à intolerância religiosa, à ira, à violência, à insegurança, à perversidade, enfim, a centenas de sentimentos negativos, normalmente divulgados com realce pela mídia moderna. De outro lado, os efeitos do bom uso do livre-arbítrio para o Bem são de natureza construtiva e altruística. Estes, conduzem ao bem-estar das pessoas, à confraternização entre povos e nações, aos sentimentos de amizade, amor, paz, concórdia e harmonia, além de centenas de outros sentimentos nobres que levam ao progresso material e espiritual da humanidade. Daí, podermos caracterizar, com certeza, o que é a corrente do Bem e o que a corrente do Mal.

Do equilíbrio dessas forças ou do seu desequilíbrio resulta progresso ou retrocesso espiritual, avanço na evolução espiritual das criaturas ou retardo no processo de ascensão do espírito. Por isso, é de transcendental importância trabalhar e influir cada vez mais para que haja um desequilíbrio nestas forças, mas em direção ao Bem e não para o Mal. Para conseguir este efeito, é necessário, portanto, que prevaleçam os pensamentos e as ações otimistas e progressistas voltadas para o bem-estar geral da humanidade, nisso desempenhando papel preponderante o livre-arbítrio.

 

6.      Conseqüências do mau uso do livre-arbítrio

 

O que leva ao mau uso do livre-arbítrio? Entre muitos fatores, podemos destacar a baixa capacidade de raciocínio, as inclinações para os maus costumes e vícios e os sentimentos inferiores, principalmente a perversidade. Essas tendências, quando não eliminadas durante a infância, período em que as crianças ainda estão sob a vigilância e orientação dos seus pais, estão sempre saturadas de vibrações inferiores e animalizadas, sendo nocivas à boa saúde mental e à evolução espiritual. Quando isso acontece, a criatura perde o respeito de si mesma e, com a consciência enfraquecida, comete desatinos reprováveis por toda pessoa que se preze. Segundo nossa referência (6): “Todo mal cresce de vulto quando praticado conscientemente, e os que assim procedem terão, sem nenhuma dúvida, um triste e doloroso despertar. Usar o livre-arbítrio como arma contra o semelhante, utilizar-se dele para injuriar, intrigar, escarnecer, caluniar e desmoralizar o próximo constitui crime da mais alta condenação”.

Todo crime precisa e deve ser reparado, mas nós sabemos muito bem que a justiça terrena é imperfeita e, portanto, falha na apreciação dos erros que cometemos. No mundo espiritual, a justiça nunca falha e ela é aplicada pelo próprio espírito na retrospectiva que sempre terá que fazer de todos os seus atos, pois é a sua própria consciência que o julga. Nada escapa à apreciação do espírito e ao seu julgamento, mas convém observar que não há um tribunal astral para julgar os atos do espírito, como pregam muitas religiões.

Há um sentimento, que é a culpa e, da qual provém um outro sentimento, que é o remorso. Quando a consciência acusa um sentimento de culpa, este é por ela remoído e “martelado” muitas e muitas vezes até que se transforma em remorso. A criatura sente, então, uma profunda necessidade de reparar o erro cometido. Se o erro relacionado a essa culpa não for reparado enquanto encarnado, o espírito, no seu mundo astral, com total clarividência, dominado pelo arrependimento e pelo remorso, anseia por uma nova encarnação. É essa disposição que leva à reencarnação do espírito, muitas vezes em condições bem difíceis.

 

7.      Os extremos: bondade e perversidade

 

Assim como a bondade é um dos mais nobres sentimentos da criatura, levando ao bem-estar geral e demonstrando espiritualidade elevada, a perversidade é um sentimento nocivo que leva à inferioridade espiritual; este demonstra que o espírito ainda precisa vencer muitas etapas, trilhar muitos caminhos em numerosas encarnações, para completar sua evolução na Terra. E, como esta não se processa sem sofrimento, precisa a criatura desenvolver mecanismos próprios de defesa contra o mal, para que o esforço de progresso que precisa empreender encontre o mínimo de obstáculos possíveis.

Quando as tendências perniciosas não são reprimidas e a criatura as leva ao extremo da maldade, nós nos deparamos com a perversidade, situação em que a consciência atinge o seu mais baixo nível. Nestas condições (6):

 

A perversidade é uma demonstração inequívoca de inferioridade espiritual. Ela significa não estar o espírito ainda convenientemente lapidado, e torna claro que as suas vibrações são idênticas às das camadas espirituais de baixo desenvolvimento da espécie humana.

 

O livre-arbítrio, em tais circunstâncias, reflete, no desacerto da orientação, o estado de ignorância do próprio espírito.

 

8.      O livre-arbítrio e a evolução

 

Já vimos que o espírito é luz, que sua intensidade própria é compatível com o seu grau de progresso e evolução. É intuitivo deduzir-se que, quanto maior for a intensidade dessa luz, maior será a vibração do espírito, o que significa, também, que maior será o seu conhecimento da vida. Isso implica em um maior controle do raciocínio e dos atos a que ele conduz, resultando no uso acertado do livre-arbítrio. É, também, intuitivo que, quanto mais intensa for a vibração do espírito, menos ele deixa-se empolgar por ações que a sua consciência reprova. Daí podermos ressaltar que (6):

 

A evolução – nunca é demais repetir – é regida por leis naturais que jamais se alteram no Tempo e no Espaço. Às suas normas imperativas ninguém se pode subtrair.

 

Essas leis colocam todos no mesmo rigoroso pé de igualdade no tocante aos meios que cada qual dispõe para fazer uso, com toda a liberdade, do patrimônio espiritual que for conquistando, de maneira mais rápida ou mais lenta, conforme a direção que tenha dado ao livre-arbítrio.

 

Colocando-se em sintonia com as leis naturais e imutáveis, pode a criatura desfazer-se de suas fraquezas, de seus maus hábitos e vícios e sempre dar um passo a mais em direção à Luz, à Inteligência Universal e, assim alcançar sua evolução em prazo mais curto.  Não retardando a sua evolução, pode a criatura, no dia-a-dia de seu viver, em todas as situações que tiver que passar não contrair mais débitos morais e resgatar os que trouxerem do passado de uma forma mais proveitosa, lapidando e limpando a sua consciência e enriquecendo os atributos morais que lhe são próprios

9. Determinismo versus Destino

 

Nessa altura, o leitor já percebeu pela leitura dos capítulos que precederam que a Evolução é a lei maior da espiritualidade. Percebeu, também, que o espírito se autodetermina, descrevendo sua trajetória evolutiva, em cada encarnação. A evolução do espírito pode ser retardada ou até paralisada pela indolência, displicência ou negligência do ser humano. Concorre muito para tais situações de relaxamento e desvio dos deveres a falsa noção que a criatura tem de estar subordinada a (6) “uma suposta predestinação ou ao jugo de um destino inexorável e cruel, contra o quais muitos pensam que seria inútil lutar”.

O determinismo e, em conseqüência, o conceito de destino é uma forma falsa de encarar as coisas sérias da vida, transformando-as em situações desastrosas. Com o livre-arbítrio, a criatura tem poder para alterar, quando bem o desejar, o rumo de sua vida, encarando de forma correta suas ações e cumprindo com seus deveres. Portanto, o responsável pelo nosso futuro somos nós mesmos, que o preparamos com as nossas boas ou más ações no presente.

Nós vivemos em um mundo material e temos que estar sempre vigilantes e alertas para não incorrermos em erros e faltas, pois estas, quando praticadas conscientemente, trazem grande prejuízo à nossa encarnação presente, já que produzem vibrações e fluidos deletérios.

Todos nós sabemos que não nos devemos deixar dominar pelos sofrimentos, opondo-lhes reação imediata. O mesmo deve ser dito com relação aos pensamentos de fraqueza, que são responsáveis por sintomas de depressão, os quais podem levar ao avassalamento espiritual. Isso não é difícil de acontecer e, para evitar a obsessão, precisamos aprender a usar o nosso pensamento e o livre-arbítrio sempre para o bem.

A vida ocorre sempre na exata medida das necessidades, pois a ninguém é solicitado dar mais do que pode. A conclusão dessa afirmação é que o bom uso do livre-arbítrio está sempre dentro da capacidade de cada um, não se exigindo nem mais nem menos. Portanto, as criaturas, se realmente levarem a vida a sério, têm todas as condições para errarem o mínimo, não tendo que passar sofrimentos e tormentos desnecessários. Nada disso acontecerá se deixarem levar por condições enganadoras de falsos amigos e maus companheiros.

Não há meio algum de bem praticar o livre-arbítrio sem responsabilidade. É esta que garante os bons resultados de nossas ações. Segundo nossa referência (6):

             

“Essa responsabilidade faz parte integrante da vida sendo, por isso, irrecusável e intransferível. É inútil negá-la, como é inútil a tentativa de escapar às suas conseqüências. A mística do perdão para os crimes, falcatruas e prevaricações não tem qualquer sentido na vida espiritual”.

 

Com o sentido de querer evitar essa responsabilidade, muitas criaturas que praticam os mais condenáveis atos, armam falcatruas e causam desordem pública, negam o livre-arbítrio e procuram se refugiar na idéia do perdão, que não existe, pois do contrário, como atribuir mérito àqueles que agem com responsabilidade? Então, nada mais correto do que enfrentar com coragem, determinação e valor todos os problemas da vida.

 

10. Restrições ao livre-arbítrio

 

Partindo-se do princípio de que não há desculpa para o mal, o homem sempre pode resistir às injunções e obstáculos que se lhe antepõem, ainda que venha encontrar restrições ao uso do livre-arbítrio. Isto implica estarmos conscientes do Mal. Do contrário, sem o livre-arbítrio, o homem não seria mais que um robô ou máquina sem qualquer responsabilidade sobre o que viesse praticar.

As principais restrições ao livre-arbítrio são de ordem físico-causal, ambientais, psicológicas, biológicas e teológicas. Uma boa análise dessa matéria foi feita por Thimoty O´Connor (7) em seu trabalho altamente classificado e, por Ted Honderich (8), que nos apresenta vários links na Internet versando sobre o assunto. Apresentamos, a seguir, algumas delas:

 

i Em decorrência da idade

 

A principal função dos pais é formar o caráter dos filhos e dar-lhes a educação que estiver à altura de suas posses reais. Os filhos precisam aprender a confiar nos pais desde a mais tenra idade, para que haja ambiente para se lhes oferecer o melhor possível em termos de educação moral e ética. Para isso, os filhos devem colocar-se em condições de bons aprendizes, mas não de submissão, pois esta sempre é alienante. É de compreender-se que, diante deste quadro, na fase da infância, o uso do livre-arbítrio é sempre limitado, pois, variando de país para país, em função das leis vigentes, a responsabilidade dos genitores sobre os filhos pode chegar até aos 21 anos. Entretanto, já se observa uma liberalização crescente em muitos países, usufruindo os jovens, desde os 14 anos, de uma liberdade relativa, o que lhes permite, gradativamente, conscientizarem-se das responsabilidades que estarão assumindo no uso de seus livres-arbítrios dentro e fora dos seus lares.

 

i Lavagem cerebral

 

Há situações que ocorrem na vida das criaturas que as levam a uma completa submissão às idéias alheias, aos pensamentos e às doutrinas religiosas, que alienam suas vontades e, portanto, sua capacidade de usarem seus livres-arbítrios. É o que acontece com a “lavagem cerebral”. Esta é inculcada através de técnicas alienantes bastante efetivas, levando-as à uma submissão irresistível, a tal ponto que muitas pessoas relegam a um segundo plano o cumprimento de seus deveres, inclusive para com a família, tornando-se verdadeiros fantoches, como que hipnotizadas por seus “gurus”. É uma forma ignominiosa de “escravidão espiritual”.

Como reverter esse processo alienante? Para essa questão não há soluções fáceis. Abdicar de sua própria vontade é coisa muito séria. Tira-lhe a liberdade e o livre-arbítrio e, em conseqüência, a responsabilidade moral pelos seus atos, todos atributos correlacionados entre si. Este triângulo de forças fica enfraquecido e debilitado, isto é, reveste-se de vulnerabilidade, da qual os aproveitadores e exploradores das fraquezas humanas sabem tirar bom proveito em benefício de seus mesquinhos interesses materiais.

Eu diria tratar-se de uma forte indolência mental, falta de raciocínio para fazer a filtragem primária das intenções de tais aproveitadores, por que é sabido que sem um raciocínio forte, como é que a criatura vai poder “ser ela mesma”, isto é, readquirir sua personalidade e força de vontade? Nesses casos, não há como escapar de um tratamento psicológico e aconselhamento espiritual muito sério. Há casos em que até a intervenção policial torna-se necessária para arrebatar a criatura de seus aproveitadores alienantes.

A lavagem cerebral ocorre, também, em numerosos outros campos que não o religioso, como nas técnicas modernas (efeito subliminar) que a mídia televisiva utiliza, na política (aliciadores políticos), na subversão dos costumes (aliciadores sexuais), na espionagem, nas ações terroristas e na guerra, em que os combatentes aprisionados passam a colaborar com o inimigo, como ocorreu na guerra da Coréia em 1950, de onde veio o nome “lavagem cerebral”. Por não termos o objetivo de analisarmos a “lavagem cerebral” em si, dispensaremos nos estender mais sobre este assunto.

 

i Subordinação autoritária

 

Muitas pessoas, que abusaram de seu livre-arbítrio, tiveram que enfrentar as leis penais vigentes em cada país e, para pagar pelos crimes que praticaram, foram penalmente condenadas. Assim, nos presídios, submetidas ao duro rigor das leis e das regras penitenciárias, dispõem de um livre-arbítrio quase que totalmente tolhido. Tudo isso é feito com o sentido de preservar o Bem da sociedade e recuperar, se possível, aqueles que apresentarem um bom comportamento no cumprimento de suas penas Mas, nem sempre isso é possível, pois muitos malfeitores recalcitrantes retornam aos presídios para resgatarem suas novas faltas. É o trabalho da justiça terrena.

 

i Opressão política, policial e religiosa

 

Nos países que não adotam a democracia como forma de governo, as pessoas vivem um cenário de restrições da liberdade individual. Sob opressão e violência policial, as pessoas não vivem o melhor dos mundos, sendo vigiadas em suas liberdades de pensar e agir. Daí, a existência de um livre-arbítrio restrito.

O mesmo ocorre em países onde a religião e o poder político atuam conjuntamente, havendo restrições ao livre pensar, como ocorre em certas ditaduras político-religiosas de muitos países do oriente. Mas, pior que tudo isso, observamos estarrecidos o tratamento diferenciado que se dá às mulheres, submissas aos homens, tratadas como objeto, como se fossem suas propriedades particulares.

i Condições biológicas

 

Muitas pessoas nascem com defeitos físicos ou de natureza mental, como os portadores da síndrome de Down, ou adquirem doenças mentais alienantes.

Não vemos necessidade de nos alongar nesses casos, já que não é difícil imaginar os diferentes tipos de restrições que encontramos nos cegos, surdos, mudos, deficientes físicos e deficientes mentais. Privados de um ou mais de seus sentidos físicos, privam-se, também, de muitas escolhas, o que limita o uso de seu livre-arbítrio.

Muito triste e degradante são os casos de pessoas loucas (obsedadas), impiedosamente abandonadas por seus parentes pelas ruas das cidades ou deixadas em precários e mal aparelhados sanatórios, onde sua recuperação, na grande maioria dos casos, é impossível, por desconhecerem a causa da loucura.

 

i Casos extremos

 

Há, também, a ocorrência de casos extremos, em que a liberdade de escolhas fica reduzida a duas alternativas ou possibilidades, levando a criatura a uma situação de “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”, como ocorre nos casos de violência à mão armada, estupros, seqüestros, etc. Para salvarmos a nossa própria vida, somos obrigados a nos submeter, temporariamente, a situações humilhantes, degradantes e traumáticas. É evidente que, nessas condições, não pode haver livre-arbítrio algum por parte da vítima indefesa.

 

11.    Conclusão

 

São, ainda, poucas as criaturas que têm a exata noção do valor do livre-arbítrio e sabem bem usá-lo com responsabilidade. É, ainda, grande o número de pessoas que se acham presas a (1) “[...] falsas concepções, pensamentos e hábitos viciosos e não aplicam por conta destas limitações a plenitude do poder do raciocínio, o que limita ou condiciona o que poderiam escolher, ficando prejudicado o exercício e alcance desta faculdade”.

São muitos os males causados pela ignorância do que é o livre-arbítrio para o viver humano. Por isso mesmo, muitas são as encarnações perdidas em sucessivas etapas. Muito se avançaria, se a humanidade procurasse compreender que o perdão realmente não existe e trocar essa idéia absurda pela compreensão do que seja o livre-arbítrio e procurasse utilizá-lo com coerência e responsabilidade. Assim, muitas reencarnações, pelas quais a humanidade paga um preço bastante alto, seriam evitadas.

Resumindo, o livre-arbítrio, junto com o pensamento, é um dos melhores instrumentos de que dispõe a pessoa para aprender e ensinar as lições da vida com grandeza de espírito, com humildade e muito amor, abreviando assim, o tempo necessário para a plena e total evolução espiritual.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) SAMEL, Caruso. Reflexões sobre os sentimentos. 2.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2001, p. 205-209.

 2) AGOSTINHO, Santo. O livre-arbítrio (trad. do original latino por Antônio Soares Pinheiro) 3.ed., Faculdade de Filosofia de Braga, 1998.

 3) DOMENECH I, Manuel Maria. Suma Teológica contrastada com la ciencia. Disponível em:  https://personal3.iddeo.es/mmdomenechi/STCC.HTM. Acesso em: 30 jan. 2006

 4) DESCARTES, René. O Mundo dos filósofos. Disponível em: https://www.mundodosfilosofos.com.br/# Acesso em: 30 jan. 2006

 5) NASCIMENTO, J. C. O Livre arbítrio. Gazeta do Racionalismo. Rio de Janeiro, jan. 2006. Disponível em: https://www.racionalismo-cristao.org.br/gazeta/artigos/o-livre-arbitrio.html. Acesso em: 30/01/2006.

 6) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 42.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2004. p 147 - 153.

 7) O´CONNOR, Thimoty. Free Will. Disponível em: https://plato.stanford.edu/entries/freewill/. Acesso em: 17 Jan. 2006

 8) HONDERICH, Ted. The determinism and freedom philosophy website. Disponível em: https://www.ucl.ac.uk/~uctytho/dfwIntroIndex.htm Acesso em: 30 jan. 2006

 

 

 

 

TERCEIRA PARTE:

 

INDÍCIOS E EVIDÊNCIAS

CAPÍTULO 15

 

 

CASOS SUGESTIVOS DE REENCARNAÇÃO

 

Quebrando as barreiras do paradigma científico

 

 

A ciência está chegando à conclusão de que tudo que existe no Universo é eterno, vivo e está em constante evolução.

Descobrir a existência da alma vivente pode ser um dos maiores presentes para a humanidade.

Gary E. Schwartz, em seu livro The afterlife experiments – 2002.

              

Eu penso que uma pessoa racional pode crer em reencarnação com base na evidência.

Ian Stevenson, pesquisador dos fenômenos de reencarnação, citado em Almas antigas (Old souls), de Tom Shroder.

 

 

Reencarnação é o processo de um mesmo espírito passar por numerosas e sucessivas encarnações, isto é, trocar de corpo e de condições de vida em outro tempo e em ambientes diferentes. Tudo o que foi dito no capítulo 9 sobre o espírito e sua encarnação se aplica igualmente para a reencarnação, que ocorre no processo do nascimento de um ser humano. Percebemos, assim, que a encarnação do espírito só ocorre na primeira vez e a reencarnação, muitas vezes. Depois que a partícula da Força Inteligente adquiriu a condição de espírito, alguns novos atributos são ativados, entre os quais, a consciência, a inteligência e o livre-arbítrio, isto é, ela se tornou individualizada e autodeterminante e vai encarnar centenas ou até milhares de vezes para promover a sua evolução. Depois de completada sua trajetória evolutiva no mundo Terra, o espírito não precisa mais encarnar. Daí em diante, segue sua evolução exclusivamente como Espírito, em mundos espirituais superiores.

Mostramos no capítulo 6 como surgiram os pioneiros do Espiritismo na segunda metade do século XIX e, no capítulo 7, como se deu o advento do moderno Espiritualismo (1910), codificado em doutrina com o nome de Espiritismo Racional e Científico Cristão por Luiz de Mattos e Luiz Alves Thomaz, atualmente conhecido como Racionalismo Cristão.

Apresentamos, também, o capítulo 16 sobre as Experiências de Quase-Morte (EQM ou NDE – near-death experience, em inglês), trazidas ao conhecimento de toda gente por Raymond A. Moody, Jr. Este pesquisador, desde 1966, vem revelando milhares de casos comprovados de quase-morte, reforçando as evidências da existência do espírito e do processo reencarnatório, isto é, expondo ao mundo a existência da vida do espírito após a morte.

No capítulo 17 são apresentados os fenômenos de regressão às vidas passadas, nos relatos do psiquiatra Brian Weiss e de vários psicólogos como Helen Wambach, Edith Fiori, Patrick Drouot (físico), Maria Peres (médica e psicóloga) e outros, cujas experiências, relatadas em seus artigos e livros, trouxeram muitos indícios e novas evidências sobre a existência da alma (espírito) e sua imortalidade, expondo ao público, através da terapia de regressão às vivências passadas (TRVP) um grande número de fenômenos, até então, exclusivamente do domínio do Espiritismo e do Espiritualismo.

Além dos pesquisadores citados, numerosas outras experiências foram relatadas por dezenas de autores e pesquisadores em centenas de livros de ampla divulgação na atualidade, em todo o mundo, inclusive via Internet. Esses fenômenos, abrangendo numerosos casos de manifestação mediúnica comprovados foram estudados pioneiramente pelo cientista William Crookes, na segunda metade do século XIX, conforme fartamente apresentado no capítulo 6. Cem anos após, na segunda metade do século XX, mais precisamente a partir da década de 1960, numerosos casos de reencarnação comprovados foram estudados por Ian Stevenson (1, 2) e colaboradores. Quase concomitantemente, tiveram lugar os estudos e pesquisas sobre os fenômenos de experiência fora do corpo (EFC ou OBE – out-of-body experience, em inglês) e experiência de quase-morte (EQM). Este capítulo mostra, também, os mais impressionantes estudos sobre mediunidade que a ciência já está pesquisando, desde o final da última década do século passado, sob a coordenação de Gary E. Shwartz através do “Projeto de Pesquisas Veritas” (3).

O que vamos apresentar neste capítulo refere-se ao despertar de alguns estudiosos – pesquisadores, psicólogos, psiquiatras e cientistas totalmente desvinculados de qualquer doutrina reencarnacionista, atraídos que foram para o estudo dessa pergunta sempre presente na mente de tantas pessoas: existe vida após a morte?

 

1.      Pesquisas de Ian Stevenson

 

Ian Stevenson, psiquiatra da Universidade de Virgínia, é um dos pioneiros da moderna investigação sobre casos correntes e sugestivos de reencarnação, verificados principalmente através de descrições feitas, em sua maioria, por crianças. Seus estudos, que iniciaram-se na década de1960, já acumulam, em seu banco de dados, mais de 2500 casos ou memórias de relatos supostamente reencarnatórios.

Se no caso das experiências de quase-morte (EQM) foi mais ou menos fácil montar um caso típico completo ou quase completo com características comuns, nas evidências de reencarnação esse procedimento não é tão fácil assim dada a característica sui generis de cada caso. Não é nosso propósito descrever alguns casos, pois não fizemos pesquisas de campo. No entanto, genericamente, verificamos que, em muitos casos, Stevenson procurou se guiar pelos indícios dos relatos, levando as crianças até aos locais onde teriam vivido antes. Stevenson deu preferência aos casos em que tais locais nunca foram visitados antes pelas crianças, de modo a constatar a veracidade de suas indicações, cenários e situações que relataram, em primeira mão. Ele constatou que, ao serem levadas aos locais indicados, elas se mostraram familiarizadas com os referidos locais e cenários, identificando as casas em que viveram, seus parentes e outras características verificadas pelo pesquisador. Dada a importância do pioneirismo de Stevenson e a persistência com que vem pesquisando este campo do mais alto interesse científico há mais de 40 anos, consagraremos mais atenção aos seus trabalhos, conforme relatado em suas obras, que passamos a comentar.

 

i Vinte casos sugestivos de reencarnação

 

Todos os livros do Dr. Ian Stevenson são importantes no estudo dos fenômenos da reencarnação. Em seu livro de 596 páginas, intitulado (1, 2) Twenty cases suggestive of reincarnation (Vinte casos sugestivos de reencarnação), ele apresenta sete casos ocorridos na Índia, três casos no Ceilão, dois no Brasil, sete no Alaska e um caso no Líbano. Este livro será comentado mais abaixo sob o título de “Entrevista dada por Ian Stevenson”, pois o conteúdo dessa entrevista refere-se, principalmente, aos casos descritos nesta sua primeira obra de divulgação sobre a reencarnação. Com esse procedimento, não nos incorreremos no risco de introduzir muitas repetições nesse nosso texto.

 

i Crianças que lembram de suas vidas passadas – uma questão de reencarnação

 

Na sua obra (4), Children who remember previous lives – a question of reincarnation (Crianças que lembram de suas vidas passadas – uma questão de reencarnação), Stevenson apresenta trinta e oito páginas de resumos de quatorze casos, dos quais treze não tinham sido incluídos na obra anterior. Os casos incluem vários povos de diferentes religiões e países, a saber: dois na Índia, um no Alaska, um em Burma, um no Sri Lanka, um no Líbano, um na Turquia, um na Tailândia, um na Inglaterra, um na Finlândia e quatro nos Estados Unidos. Nesta mesma obra, Stevenson dedica, também, cerca de quatorze páginas a uma análise dos tipos de explicações sobre os casos que estudou, a saber: leitura de vidas passadas, regressão hipnótica, experiências de dejá vu, sonhos e pesadelos, efeito de doenças e drogas, meditação, forte emoção, cenas (flashes) de adultos em plena consciência e experiências espontâneas com crianças. Stevenson nos revela aqui a reserva com que ele aprecia estas explicações, exceto com relação à última, que constitui a base de seus trabalhos:

i Experiências com “leitura” de vidas passadas

 

Stevenson afirma que esta é a mais fraca das explicações de evidências sobre reencarnação. Elas provêm de pessoas que declaram poder descrever ou “ler” as vidas passadas de outras pessoas (falsos médiuns, em busca de ganhos financeiros e notoriedade na mídia, etc.). Para os incautos, que admitem ter tanta fé assim nos relatos dessas pessoas, Stevenson recomenda que façam a experiência com isenção de ânimo, usando dois ou três desses médiuns, cada um a seu tempo e sem que os demais tomem conhecimento e confronte os resultados apresentados para perceberem que estão sendo iludidas. Quase todas as predições desses falsos médiuns referem-se a vidas passadas longínquas que não podem ser comprovadas e, portanto, destituídas de valor científico.

 

i Experiências com regressão às vidas passadas

 

Para os casos de regressão hipnótica ou induzida às vidas passadas Stevenson é, também, bastante crítico, embora considere serem dotadas de um pouco mais de evidência que a anteriormente descrita. Ele mesmo conta três experiências que realizou com pacientes seus e faz uma autocrítica.. A grande maioria dos casos, enquadrados sob essa rubrica, são de nomes e ou lugares de difícil verificação e comprovação, pois é sabido que, anteriormente ao século XIX, os registros de morte e sepultamento das pessoas eram muito precários. Uma de suas fortes críticas é que, mediante hipnose, o paciente é previamente induzido a regressar ao passado em um lugar onde admite que possa ter originado seus traumas atuais e que, depois de hipnotizado, a tendência do paciente é obedecer ao comando do terapeuta, tirando a espontaneidade de suas observações. Dessa forma, o paciente acredita que muitas das “observações” são, na realidade, fantasias. Stevenson aconselha que, mesmo na contramão das recomendações dos especialistas em regressão, o uso de crianças entre 5-8 anos daria mais espontaneidade e diminuiria as fantasias, já que elas teriam sido muito menos expostas previamente às informações correntes em nossa cultura atual. Devemos observar que as técnicas de regressão têm como principal escopo curar certos traumas e restabelecer a sanidade psíquica das pessoas afetadas do que propriamente servir como evidências de reencarnação.

 

i Experiências conhecidas como dejá vu

 

Muitas pessoas acreditam ter visto ou visitado um lugar anteriormente visto, isto é, que já era do seu conhecimento. Uma pesquisa feita revela que 76% das pessoas já passaram por esse tipo de experiência. Muitas crianças dos casos levantados por Stevenson reconheceram os lugares de suas vidas passadas, com bastante riqueza de detalhes. Há outras explicações para o fenômeno como precognição, efeitos neurológicos, etc. Estes casos são muito subjetivos e, isoladamente, não constituem evidências, a não ser para a própria pessoa.

 

i Experiências derivadas de sonhos e pesadelos

 

Entre vários tipos de sonhos, os que interessam a essa análise são os do tipo recorrente, isto é, sonhos que se repetem, sendo mais comumente reconhecidos como pesadelos. Os sonhos recorrentes são mais encontrados entre as crianças e sua periodicidade vai diminuindo à medida que as crianças tornam-se adultas. Esses sonhos parecem deixar uma fixação na memória, bem diferente dos sonhos ordinários e, geralmente são destituídos de detalhes para permitir averiguações significativas objetivando dar embasamento à reencarnação.

 

i Experiências sob o efeito de doenças e uso de drogas

 

Muitas doenças que levam ao estado febril muito intenso produzem imagens mentais muito fortes, semelhantes a delírios, de difícil interpretação. O mesmo pode-se dizer com relação ao uso de certas drogas, como por exemplo, a dietanolamida do ácido lisérgico (LSD) que permite, segundo seus usuários e adeptos, reviver memórias desta vida e de outras, muitas vezes misturadas e confusas, com a circunstância agravante de causarem efeitos colaterais muito sérios e perigosos. Não se recomenda o uso do LSD para o estudo de vidas passadas nem para evidenciar o processo reencarnatório. Apesar disso, muitos pesquisadores e psiquiatras, como por exemplo, Stanislav Grof, citado por Amit Goswami em seu novo livro A física da alma (5) à p. 97, provocou lembranças de vidas passadas sob o efeito do uso do LSD em muitos pacientes. São dele estas considerações:

 

Elas [as recordações de outras vidas] são extremamente realistas e autênticas, e costumam mediar acesso a informações precisas so­bre períodos históricos, culturas e até eventos históricos que o in­divíduo não poderia ter adquirido por meio de canais comuns. Em alguns casos, a precisão dessas lembranças pôde ser constatada objetivamente, às vezes com detalhes impressionantes... Os crité­rios para comprovação são os mesmos usados para se determinar o que aconteceu no ano passado: identificar lembranças específicas e obter evidências independentes para algumas delas, pelo me­nos. Observei e publiquei pessoalmente diversos casos notáveis, dos quais os aspectos mais incomuns puderam ser confirmados por uma pesquisa histórica independente (Grof, 1992).

 

i Experiências com meditação

 

A meditação é muito usada pelos adeptos de certas religiões orientais, como no Budismo e no Hinduísmo. Os siddhis têm muita habilidade em lembrarem-se de vidas passadas, que ocorrem espontaneamente durante as práticas de meditação. Elas não contribuem para evidência da reencarnação, mas têm valor pessoal. Comparada com a hipnose, em ambos os casos, as pessoas têm “tarefas a fazer” em busca dos eventos; não os encontrando, acabam sendo vítimas de fantasias mentais.

 

i Experiências sob forte emoção

 

Pessoas que recebem a notícia de desastre ou assistem à morte inesperada de um parente próximo muito querido (marido, esposa, filho, etc.), sem uma causa aparente, entram em um processo de depressão muito aguda que pode levar meses para desaparecer. Durante o período de depressão parecem ver cenas de vidas passadas e as tomam como tais.

 

i Experiências em estado de consciência normal

 

Muitas pessoas presenciam, espontaneamente, com relativa freqüência, cenas, lampejos ou flashes que parecem invocar memórias de vidas passadas. Elas têm pouco valor como evidência, a menos que verificadas cuidadosamente, mas têm um valor subjetivo muito intrigante para pessoas não espiritualisadas.

 

i Experiências espontâneas com crianças

 

Estas são mais confiáveis e os fatos pesquisados e relatados podem ser verificados e confrontados com o relato de outras pessoas da família e amigos desta, que a criança entende ser de sua vida passada e que, em geral, moram não muito distante uma da outra. Esta é a linha de pesquisa na qual Ian Stevenson e colaboradores vêm trabalhando há mais de quarenta anos.

Com relação às características de um caso típico, são abordadas questões como: culturas que acreditam e que não acreditam em reencarnação, influência dos pais, origem das informações sobre os casos, condições econômico-sociais dos pais, o aparecimento de recorrências, predições por parte de pessoa desencarnada antes de desencarnar, sonhos premonitórios, marcas de nascença, as características comuns entre as duas personalidades, etc. A análise desses fatores é bastante  extensa e compreensiva, nada tendo de incomum, o que nos leva a concluir que Stevenson é um pesquisador sério e interessado na busca da verdade sobre a reencarnação. Aqui, fica claro que, muitos pais tentam demover os filhos de suas idéias reencarnatórias, principalmente se a vida passada refere-se a alguém de má reputação ou mesmo conhecido assassino e essa atitude dos pais não pode ser condenada. Tal é a pressão que as crianças recebem, que acabam por fingir amnésia de suas recordações e quando adquirem um pouco mais de idade, já com menos medo de reprimenda e mais confiança, não desistem e acabam por reapresentarem suas memórias. As marcas de nascença têm papel preponderante em suas pesquisas a ponto de ter, mais tarde, editado uma obra com o título Where reincarnation and biology intersect (6, 7), com ênfase especial neste assunto.

 

Contudo, o mais importante na supracitada obra de onze capítulos, é a exposição que Stevenson faz sobre a metodologia científica aplicada às pesquisas que empreendeu. O restante do livro, cerca de 280 páginas, é dedicado à análise histórica da crença na reencarnação através dos tempos, características de um caso típico, análise e interpretação dos casos, variações dos casos em função de diferentes culturas, o valor explanatório da idéia de reencarnação e algumas especulações sobre sua própria pesquisa. Não se pode negar a validade dessas pesquisas feitas no vasto laboratório da vida, nas mais variadas culturas. Quanto às conclusões, cada um deve tirar a sua.

 

i Onde reencarnação e Biologia interceptam-se - Convergência entre reencarnação e Biologia

 

Stevenson no seu livro citado na referência (6, 7) – Where reincarnation and biology intersect (Onde reencarnação e Biologia interceptam-se-Convergência entre reencarnação e Biologia), trata da existência de certas marcas de nascença ou adquiridas ao longo da vida de alguns dos casos por ele estudados, principalmente quando ocorreram mortes violentas na reencarnação anterior. É uma obra sui generis, que procura correlacionar as referidas marcas e sinais com ferimentos por acidentes ou marcas existentes na vida anterior de seus entrevistados. A obra tem 203 páginas e trinta e cinco ilustrações analisando tais fatos. Nos 26 capítulos da obra, ele analisa as localizações das marcas de nascença, cicatrizes e feridas, bem como, defeitos de nascença e outras anormalidades, tais como posturas, gestos, movimentos involuntários (cacoetes). Analisa, também, casos com gêmeos, que apresentam memórias de outras vidas.

Escrevendo como um especialista em psiquiatria e, conhecido mundialmente como investigador científico de relatos de eventos paranormais, Stevenson faz um apelo para que esqueçamos nossas descrenças e tendências de longa data em desacreditar na reencarnação e, passar a considerar a realidade da avalanche de casos, agora disponíveis e bem documentados. Seu livro contém 112 casos de 225 estudados em sua monografia original.

Muitas das marcas indicadas são áreas sem cabelo (na cabeça) bem diferenciadas do restante, áreas de cicatrizes quase sempre sobressaindo ou em forma de depressão dos tecidos adjacentes. As mortes lembradas por essas crianças foram, na maioria dos casos, violentas. A evidência-chave resulta da estreita relação que existe entre (6) “a natureza dos ferimentos causadores da morte na personalidade prévia e a presença das marcas de nascença nas mesmas localizações no corpo das crianças que se lembram da sua vida passada e como ela terminou”.

Para terminar estes comentários sobre a obra em referência, elencamos os principais resultados destas investigações (6, 7):

 

i Uma série de casos é descrita cuja forte evidência de reencarnação excede os casos previamente relatados por Stevenson.

 

i Quando fica estabelecida a correlação entre a vida passada e a atual da criança, a evidência é geralmente encontrada na causa mortis da vida anterior, seja através de informantes que conheceram a pessoa, seja através de registros médicos feitos quando sobreveio a morte.

 

i Seis casos são descritos em que as marcas de nascença em dois lugares no corpo da criança correspondem exatamente com a entrada e saída de ferimentos que ocorreram no corpo da personalidade anterior.

 

i A incorporação de fatores físico-biológicos (marcas de nascença e defeitos de nascença) nessa série de casos de evidência de reencarnação praticamente eliminam a possibilidade de fraude, comunicação entre as famílias ou percepção extra-sensorial como explicações para tais casos.

 

i Um ferimento fatal que tenha ocorrido pouco antes da morte da personalidade anterior, facilita seu posterior aparecimento como marca de nascença.

 

i Algumas pessoas demonstram a capacidade de criar mudanças em seu próprio corpo, como no caso de stigmata ou através de certos fenômenos induzidos hipnoticamente.

 

i Cerca de 35% dos casos demonstram a existência de fobia que é, quase sempre, relacionada à causa mortis na vida passada.

 

i Stevenson ressalta e indica a existência de uma crença mais forte na reencarnação do que a que foi indicada em seus trabalhos anteriores: “A reencarnação é a melhor explicação para muitos casos”.

 

i Entrevista dada por Ian Stevenson

 

Em entrevista (8) dada por Ian Stevenson ao Dr. K. S. Rawat, Diretor da Reincarnation Research Foundation (Fundação de Pesquisa sobre Reencarnação), em Faridabad, Índia, em 1986, em contribuição ao Reincarnation Forum (Forum sobre Reencarnação), referindo-se a colegas cientistas que defendem o ponto de vista geneticista e geneticista–ambiental para os casos por ele pesquisados, Stevenson defende o ponto de vista reencarnacionista, dizendo que a reencarnação provê uma melhor explicação para os casos que pesquisou e relatou em seu livro Twenty cases of suggestive reincarnation. Confirmou serem verdadeiros os casos relatados que ocorrem bem cedo no seio das famílias e frequentemente persistem através e durante toda a vida. Tal comportamento é incomum na vida das famílias. A criança não poderia inventá-lo, nem mesmo herdá-lo de outros membros da família.

As referências (1, 8) contam a história de 20 casos de crianças que demonstraram conhecimento, ainda bem cedo em suas vidas, de fatos das vidas de outras pessoas que já haviam morrido. São casos verificados na Índia, Ceilão, Brasil, Alaska e Líbano. Descreve-se, a seguir, o padrão geral desses casos.  O caso inicia-se quando uma criança de 2 – 5 anos de idade começa a falar a seus pais ou parentes de uma vida que ela teve em outro tempo e em outro lugar. A criança normalmente sente um considerável impulso em direção à sua vida passada e importuna seus relutantes pais para a levarem até o local ou comunidade onde ela afirma ter vivido anteriormente. De tanto a criança insistir, seus pais começam, até mesmo por curiosidade, a pesquisar sobre a veracidade da história de seu filho ou filha; contudo, essas verificações, em geral, acabam ocorrendo só alguns anos após seus pais terem tomado o primeiro conhecimento da história. Se algumas dessas verificações resultam positivas, membros das famílias visitam-se uma a outra e pedem à criança que reconheça lugares, objetos e pessoas que conheceu em sua prévia existência. Algumas vezes, o caso vai para os jornais. Quando Stevenson toma conhecimento, procura investigá-lo com todo o rigor científico possível mediante uma seletiva investigação que mais parece a de um detetive para desentranhar os fatos, organizando entrevistas com intérpretes confiáveis por ele escolhidos, preenchendo questionários e preparando tabelas de avaliação, contendo os comentários que reflitam ou não a veracidade das memórias reveladas pela criança. Finalmente, uma narrativa de cada caso é preparada, publicando-se os casos mais marcantes.

 

O autor do livro mencionado, (1) nessa entrevista (8) conclui apresentando uma discussão geral das diversas hipóteses sugeridas por psicólogos e psiquiatras, em geral céticos, para explicar o fenômeno, mas suas principais conclusões nas referências citadas, levaram-no a adotar o ponto de vista da hipótese da reencarnação, em detrimento das demais que foram apresentadas mais acima, baseado:

 

i Na grande quantidade de testemunhas e ausência de motivação para enganar, o que garante que a possibilidade de fraude é praticamente inexistente.

 

i Na grande quantidade de informação não consistente com a hipótese de a criança ter obtido tais informações via contato prévio entre as famílias.

 

i Na existência demonstrada de características similares de personalidade e de habilidades não aprendidas na vida corrente, sendo improvável a hipótese de percepção extra-sensorial por falta de motivação para uma identificação, em geral trabalhosa e dispendiosa, das memórias e comportamentos relacionados com a vida passada.

 

i Na impossibilidade de hipótese de ocorrências, ao acaso, de deformidades congênitas e marcas de nascença possuídas pela criança e pela pessoa de sua vida anterior.

Daí a sua conclusão: são casos sugestivos de reencarnação, tanto sob o ponto de vista de cada caso estudado como de todos os casos coletivamente. Em favor de tudo isso, está a grande massa de informações que pesquisou e analisou ao longo de 40 anos envolvidos neste tipo de trabalho científico.

A importância de seu trabalho pode ser inferida da citação inserida na referência (9), feita pelo Dr. Harold Lief no Journal of Nervous and Mental Disease: “Ou Dr. Stevenson está cometendo um erro colossal, ou ele será conhecido como o Galileu do século XX”.

Muito interessante é o conteúdo de suas conclusões com relação a vários casos em que pesquisou crianças que têm o sexo oposto ao de sua encarnação anterior. Estas, frequentemente, vestem-se com roupas do sexo oposto e comportam-se como se seus corpos fossem realmente do sexo oposto e, até mesmo algumas, desejam submeter-se a transformações cirúrgicas transexuais. Em outras palavras, estão descontentes com seus corpos físicos atuais. No Líbano, Turquia e Alaska eles acreditam na reencarnação, mas não na mudança de sexo. Em outros países, o Dr. Stevenson tem encontrado uma alta variação de sexo, como na Tailândia (16%) e em Burma (25%). Nos demais casos estudados, essa variação oscila em torno de 5%. São diferenças culturais presentes nas mentes das pessoas.

Nos mais de 2500 casos que Stevenson tem em seu banco de dados ocorrem outras variações devido ao aspecto cultural, como por exemplo, com relação aos detalhes relacionados com os nomes das pessoas. Algumas crianças chegam a mencionar 20 a 30 detalhes que usualmente incluem os nomes próprios de pessoas de sua família e de outras com quem conviveu anteriormente e são confirmadas durante as visitas entre as famílias. Os casos que pesquisou com crianças de Sri Lanka e dos Estados Unidos, não revelam os nomes próprios do desencarnado e revelam bem menos detalhes. Por isso, nos Estados Unidos, muitos casos são classificados como “não resolvidos”, enquanto que na Índia, apenas 20% dos casos são classificados como “não resolvidos”. De seu vasto arquivo de casos, Stevenson pesquisou e estudou cerca de um terço; dois terços estão a cargo de seus colegas e colaboradores.

A conclusão de Stevenson é que (8):

 

[...]a reencarnação não é apenas a explanação para estes casos, mas é a melhor explicação que nós temos para os casos mais positivos, principalmente para aqueles em que uma criança acerta um considerável número de pontos (digamos, 20 ou 30) das indicações corretas sobre outra pessoa que viveu em uma família que vive a uma distância bem remota de sua família e, com quem sua família não teve contatos prévios. Quando nós falamos de distância remota, nós não significamos necessariamente uma distância física. Sabemos que duas famílias podem viver a dez quilômetros uma da outra e contudo serem remotas uma da outra quando elas pertencem a diferentes classes econômicas e sociais.

 

Stevenson continua no encalço de um caso ideal ou perfeito, que ele pensa não ser fácil de encontrar. Os casos mais perfeitos são aqueles em que as duas famílias não tenham se encontrado antes de serem pesquisados, já que o primeiro encontro deve fazer parte das pesquisas. Um caso ideal seria aquele em que se pudesse pesquisar um determinado sujeito, que predissesse que vai encarnar numa família próxima e que indicasse as características principais do novo sujeito, inclusive marcas de nascença, se for o caso.

Seguindo esta linha, Stevenson exemplifica com o caso de um homem, Corliss Chotkin – Alaska, descrito na referência (4), p. 259-269, que predisse a sua sobrinha que, após a morte, encarnaria em um filho dela e apontou em seu corpo, duas cicatrizes, oriundas de operações cirúrgicas. Uma era no nariz, próxima ao olho direito e outra nas suas costas. E disse à sua sobrinha: “você será capaz de me reconhecer porque eu terei estas cicatrizes reproduzidas no meu corpo como marcas”. Dezoito meses após a sua morte, sua sobrinha teve um bebê que nasceu com as duas marcas de nascença. O menino tinha 8-10 anos quando Stevenson o entrevistou e verificou as marcas de nascença, sendo a da sua costa bem mais nítida, ambas com aspecto de cicatrizes cirúrgicas. Trata-se de um caso impressionante, pena é que ocorreu no seio de uma mesma família, o que enfraquece cientificamente essa evidência de reencarnação. Mas releve-se que se trata de duas marcas com aparência de cicatrizes nos dois lugares indicados pelo tio desencarnado à sua sobrinha.

Stevenson dá muita importância à comprovação de marcas de nascença, a ponto de ter escrito o livro Where reincarnation and biology intersect (6), conforme analisamos anteriormente. Uma das questões que surge se refere ao efeito mental da mãe sobre o feto enquanto se desenvolvia no seu útero. No caso apontado, que ocorreu com  Corliss Chotkin, descrito no parágrafo anterior, a sobrinha (mãe da criança) obviamente viu as cicatrizes de seu tio e, em outros casos que ele pesquisou, a mãe viu o local do tiro que o morto levou. Ambas as situações podem levar a futura mãe a mentalizar tais feridas ou cicatrizes e influenciar suas ocorrências durante a gestação. 

Perguntado pelo entrevistador sobre a importância de seus estudos e pesquisas, isto é, da importância da pesquisa sobre reencarnação no mundo atual, assim se referiu Stevenson (8):

 

Bem, eu penso que ela tem varias importâncias. Eu penso que ela promete lançar luz, como eu disse anteriormente, sobre certos fenômenos psicológicos. Eu penso que ela apresenta, também, algumas implicações para a Biologia e a medicina através do estudo dos defeitos e marcas de nascença. Algumas crianças, como sabemos, têm algumas marcas de nascença, ou dedos faltantes numa mão, ou orelhas deformadas ou outros defeitos. E, a ciência ainda conhece muito pouco sobre os defeitos de nascença. Eu penso que a reencarnação lançará luz sobre essa questão. Então, naturalmente, ela tem uma ampla implicação sobre a questão da vida após a morte e o sentido da vida. [Enfim,] por que estou aqui?

 

Ele mencionou, na entrevista que deu, alguns casos que se aproximaram do padrão ideal a que se referiu anteriormente nesta entrevista, como, por exemplo: Swarnlata Mishra – Índia, descrito na referência (1), caso nº 4, p. 67-91.

i Corliss Chotkin – Alaska, descrito na referência (4), p.259-269.

i Imad Elawar – Líbano, descrito na referência (1), p. 274-380.

i Jagdish Candra – Índia, descrito em Cases of reincarnation type (CORT), vols. 1-4 – 1975, 1977, 1980 e 1983 – CORT 1.

i Bishen Chand – Índia, referenciado em CORT 1.

i  Kumkum Verma – Índia, referenciado em CORT 1. (8)

 

Fizemos a leitura desses três primeiros casos citados na edição inglesa das obras citadas acima. O caso de Corliss Chotkin (Alaska) já foi mencionado na entrevista (com marcas de nascença) e o caso de Imad Elawar (Líbano) é bastante longo e complexo, mas bem elucidado. O caso de Swarnlata Mishra (Índia) foi, também, pesquisado por Sri N. Banerjee, pesquisador indiano sobre reencarnação. Vamos dar algumas pinceladas sobre este caso, a seguir.

Swarnlata Mishra, uma menina, nasceu em Shahpur, norte da Índia, em março de 1948. Seu pai, Sri. M. L. Mishra era inspetor de colégios e viajava bastante, visitando cidades e aldeias ao redor da cidade em que residia. Numa de suas viagens levou consigo sua filha Swarnlata, quando esta tinha cerca de 3 anos. Perto da localidade de Katni, ela pediu ao motorista para desviar por uma estrada que indicou e que levava à “minha casa”. Ela não foi atendida. Quando pararam em Katni para tomar chá, ela afirmou que se tivessem ido à sua casa poderiam ter tomado “um chá melhor”. Seu pai ignorou, também, essa segunda insinuação. Mais tarde, morando em Panna, local mais próximo de Katni, do qual dista cerca de 160 quilômetros, seu pai soube que ela dissera que na sua vida prévia morava em Katni e o nome de sua família era Pathak. Moraram, em seguida, em Newgong, distrito de Chattarpur durante cinco anos, ocasião em que ela começou a dançar uma dança estranha e a cantar canções desconhecidas pelos pais. Seu pai ia fazendo as anotações à medida que estranhava as afirmações de Swarnlata e verificando o que podia. Mudou-se, em seguida, para Chattarpur, quando em março de 1959, foi entrevistada pelo pesquisador indiano Sri. N. Banerjee, que esteve dois dias em sua cidade e depois foi a Katni visitar a família Pathak. Ai ele verificou que os relatos de Swarnlata indicavam que em sua vida passada tinha sido Biya, filha da família Pathak. Biya morrera em 1939, em Maihar e teria renascido como Sylhet, na cidade de Assam (hoje, Bangladesh – Paquistão), antes de renascer como Swarnlata, em Katni. No verão de 1959, os membros da família Pathak e da família do marido de Biya visitaram a família de Swarnlata em Chattatarpur. Swarnlata reconheceu várias pessoas e mostrou por elas grande afeição. As investigações mostraram que as canções e danças estranhas referem-se ao período em que Swarnlata teve uma vida intermediária como Sylhet, mas as investigações sobre esta pessoa não foram completadas. Ambas as famílias negaram qualquer contato prévio, inclusive na época da pesquisa de Banerjee.

De quarenta e nove indicações e reconhecimentos feitos por Swarnlata, somente três foram incorretas ( cerca de 94% de acerto). Ian Stevenson, como sempre faz em suas pesquisas, apresenta uma tabulação completa dessas informações, as quais não deixam quaisquer dúvidas sobre a veracidade dos fatos, conforme indicado pelos comentários ali apresentados. O interessante deste caso é que ele abrange duas reencarnações, sendo uma delas “transitória” (Silhet teria morrido prematuramente, com cerca de 7 anos de idade, em Bangladesh, Paquistão).

Finalmente nesta entrevista (8), Stevenson pondera sobre as implicações que seus estudos e pesquisas terão sobre a filosofia, sobre a natureza da mente e seu efeito sobre o corpo, bem como, sobre a controvérsia materialismo versus Espiritualismo, no comportamento ético dos indivíduos.

 

2.      Trabalhos relatados por Amit Goswami

 

Muitos outros pesquisadores reuniram casos bem documentados de outras crianças, como nos relata Amit Goswami em sua obra A física da alma (5) um caso ocorrido no final do século XIX com uma menino japonês de nome Katsugoro, de 8 anos, em que o seu pai numa vida anterior morrera quando ele tinha 5 anos e que ele mesmo morrera um ano após, de varíola. Esta criança deu muitos detalhes de seu nascimento anterior, como, por exemplo, a descrição de seus pais e da casa onde viveram. Levado à aldeia de sua vida anterior, conseguiu, sem a ajuda de ninguém, en­contrar a casa em que teria vivido. No total, dezesseis itens de sua recordação de vida passada foram confirmados, conforme narrado por Hearn (1897) e pelo próprio Stevenson (1961).

Um outro caso de comprovada reencarnação, também referido por Amit Goswami na obra já citada, é o de Nicola Wheater, estudado por dois pesquisadores, Peter e Mary Harrison (1983). Transcrevemos suas palavras (5):

 

Nicola se recordava de sua vida passada como um garoto chamado John Henry Benson, que vivera em uma cidadezinha de Yorkshire, Inglaterra, na segunda metade do século XIX (cem anos antes de Nicola). Quando estava com 2 anos de idade, Nicola dizia coisas como: “Por que agora eu sou menina?” e “Por que não sou um garoto como antes?”, para seus pais. Não tardou para que a menina se lembrasse de muitas ou­tras coisas sobre sua vida passada, expressando-as de maneira tão coerente e consistente, que sua mãe se sentiu compelida a levá-Ia à cidade de sua vida passada. Lá, Nicola conduziu a mãe até a casa onde tinha vivido no século anterior. E, para seu gran­de espanto, a mãe encontrou o registro do nascimento de um menino chamado John Henry Benson no livro da igreja.

 

3.      Dr. Gary E. Schwartz: Experiências além da vida

 

Dr. Gary E. Schwartz, William L. Simon e Dra. Linda G. Russek, no seu livro (10) The afterlife experiments (Experiências além da vida), nos proporciona evidências científicas de numerosos casos estudados de mediunidade em experiências de laboratório rigorosamente controladas. O livro contém 374 páginas, divididas em quatro partes e distribuídas em 19 capítulos, expondo as revelações de médiuns atuando sob os mais rigorosos controles laboratoriais. É o primeiro e notável estudo científico sobre mediunidade realizado no final do século XX e início do século XXI, cerca de cento e quarenta anos após os estudos de Sir William Crookes, no século XIX.

Este projeto abre um vasto domínio de conhecimentos que continua restrito a muitos seguidores atuais das doutrinas espíritas e espiritualistas. Mais do que isso, o faz aplicando rigorosamente o método científico, em pesquisas de laboratório, avaliando a existência de médiuns e a mediunidade, desafiando o sistema de crenças estabelecido pelas religiões e pela ciência materialista. Ele parte, a priori, da hipótese da existência da alma (espírito) e aplica procedimentos de experimentação lógica e racional, estritamente dentro do método científico, não deixando margem para qualquer contrargumentação por parte dos céticos. Este projeto se propõe a provar, além de qualquer dúvida e de maneira convincente, que o conceito de vida tal como a conhecemos está restrito e limitado às aparências da matéria.

A continuidade deste projeto, agora sob o nome de “Projeto de Pesquisa Veritas”, numa primeira etapa está centrado no Projeto de Pesquisa de Comunicação Mediúnica, que tem o seguinte escopo (3,10):

 

i O primeiro objetivo é desenvolver a capacidade de médiuns para obter informações específicas sobre um desencarnado, bem como, informações sobre a vida depois da morte. Com este objetivo, investigar metodologias de avaliação de resultados e a aferição de médiuns potenciais.

 

i O segundo objetivo é investigar as condições que afetam a qualidade do médium. Isto inclui a comparação de resultados obtidos com ambos os olhos abertos, um olho vendado e ambos os olhos vendados entre os mesmos consulentes (sitters) e os mesmos médiuns, examinando condições que atrapalham e que beneficiam o desempenho do médium (por exemplo, transe mediúnico, fatores a respeito do consulente, fatores a respeito do desencarnado e fatores a respeito do médium) e, investigar qualquer fonte que leve a erros numa operação mediúnica (por exemplo, com o uso de eletroencefalógrafos). O objetivo é proporcionar, também, uma explicação clara do que está por trás dos resultados.

 

i O terceiro escopo envolve o treinamento para a mediunidade. Investigaremos o desenvolvimento da mediunidade, fatores predisponentes, fatores relacionados à idade e instrução do médium, respondendo à pergunta: pode a mediunidade ser ensinada?

 

i O quarto objetivo do projeto é examinar a fonte de informação do médium (por exemplo, discernindo entre telepatia e leitura ao vivo (living), leitura de informação “morta” (dead) armazenada no universo, ou obtenção de informação de um desencarnado).

 

i O quinto objetivo comparará leitura mediúnica genuína e falsa (fraude), fria (“cold”), ou gerada por computador.

 

O Dr. Schwartz está bem ciente dos milhares de falsos médiuns que existem nos Estados Unidos, cujos truques não escapam a mais simples análise. São médiuns enganadores e charlatães, que fazem uma leitura fria (cold reading) de seus consulentes. Estes nem sequer se inscreveram nos seus projetos de pesquisa, com medo de ficarem desmoralizados.

Uma experiência típica conduzida por Schwartz e seus colaboradores (10) leva em consideração muitos aspectos, tanto com relação ao médium como ao consulente (sitter). Nele, um mesmo consulente é submetido a exame por vários médiuns (até cinco) e os resultados são comparados com os obtidos por outras pessoas comuns que assumem o lugar do médium, mas não atuam como médiuns e sim como “controle”. Trata-se de um “controle” tipo placebo, muito usado para teste de medicamentos. Os médiuns são solicitados a atuarem com ambos os olhos abertos, com um olho vendado e com ambos os olhos vendados. Outras condições são:

 

i O médium senta-se de costas para o consulente, em uma saleta isolada.

 

i O médium é escolhido pela equipe de pesquisadores, dentre muitos candidatos à experimentação.

 

i O médium não tem nenhum conhecimento sobre o consulente, nem qualquer possibilidade de ter conhecido antes seu consulente.

 

i Ao médium é pedido incluir entre suas revelações o nome, iniciais do nome, sexo, faixa de idade, grau de parentesco, profissão ou background, cidade onde nasceu, descrição, fatos históricos, temperamento, opiniões e muitos outros detalhes da vida do desencarnado, tudo planilhado, podendo as revelações que o médium faz chegar a 100 itens.

 

i O consulente fica em silêncio ou é permitido responder uma ou mais perguntas (número fixado pela equipe) do médium com sim/não.

 

i As experiências são monitoradas, gravadas e até filmadas.

 

Schwartz tabula e expõe em gráficos os resultados obtidos. Em um gráfico típico, são expostas as percentagens de acerto de cada um dos médiuns e de uma pessoa comum (“controle”), que foi testada como se médium fosse, todos referidos a uma mesma consulente. Em alguns casos, médiuns muito sensíveis foram verificados, chegando a atingir 100% de acerto, em casos em que a probabilidade era de 1:1.000.000 (um para um milhão). Média de acerto de 80% tem sido comum na grande maioria dos casos. Os “controles”, que não são médiuns, atinge resultados em média de cerca de 36%. Um outro gráfico típico é apresentado, plotando-se as respostas obtidas pelos médiuns em categorias como: nomes, iniciais, descrições, fatos históricos, temperamento e opiniões contra uma escala de porcentagens. Em algumas categorias (iniciais do nome e descrições), os melhores médiuns chegam alcançar 100% de acerto! Tanto num caso como no outro, os resultados são intrigantes mesmo para Schwartz, sendo comum vê-lo comentando: “Isto não pode ser verdade!” ou “Deve haver um erro! ”. Seu conselho aos consulentes é: “esteja preparado para surpresas”.

Colocamos, de propósito, no início desde capítulo, duas afirmações colhidas no prefácio da obra citada de Schwartz: “A ciência está chegando à conclusão de que tudo que existe no Universo é eterno, vivo e está em constante evolução” e “Descobrir a existência da alma vivente pode ser um dos maiores presentes para humanidade”.

 

4. A transformação de um cético

 

Uma outra obra que obteve um grande destaque popular foi a escrita pelo premiado jornalista americano Tom Shroder e que tem o título, em português (11, 12), de Almas antigas (do título original, Old souls). Este jornalista acompanhou Ian Stevenson em três viagens de estudos e verificações, a primeira ao Líbano, em seguida, à Índia e, finalmente, ao sul dos Estados Unidos e escreveu suas memórias dessas viagens. Seu livro de 250 páginas, que está dividido em quatro partes e 18 capítulos, começa com um prólogo em que Tom Shroder nos conta como chegou ao Dr. Ian Stevenson. As outras três partes, abrangendo quinze capítulos, são dedicadas aos casos visitados nos países: oito no Líbano, quatro na Índia e três nos Estados Unidos. Stevenson, que era cético e acreditava que só se vive uma vez, após as evidências que teve a oportunidade de conhecer e presenciar em suas viagens mudou completamente o alcance e o entendimento que passou a ter da vida. Essas extraordinárias experiências transformaram seu ceticismo em reverência e admiração. Sua obra vendeu mais de treze milhões de livros, sendo best seller em vários países do mundo!

Stevenson estudou casos de reencarnação em muitos países, cobrindo os cinco continentes. Em alguns, a idéia de reencarnação é culturalmente aceita, como na Índia, Sri Lanka, Burma e Líbano e em grupos tribais do norte do Canadá. Contudo, muitos desses casos ocorreram em famílias muçulmanas, que não acreditavam em reencarnação e até mesmo, reprimiam as crianças para não darem continuidade às suas memórias. Foram estudados, também, quatro casos nos Estados Unidos e dois no Brasil.

Stevenson obteve o doutorado na Universidade McGill, em Montreal, em 1943, como primeiro lugar de sua classe. Em 1939, com a idade de 39 anos, tornou-se Chefe do Departamento de Psiquiatria da Escola de Medicina da Universidade de Virgínia. A partir daí, ele tornou-se pesquisador de crianças que diziam ter vivido em outras vidas, deixando suas atividades administrativas, suportado por fundos doados por Chester Carlson, o homem que inventou o processo Xerox, que inclusive, após morrer, deixou-lhe fundos para continuação das pesquisas.

A não ser na apresentação de suas pesquisas iniciais positivas sobre reencarnação no Journal of American Medical Association, os cientistas de vanguarda praticamente o ignoraram completamente. Somente muito tempo depois, começaram a dar crédito aos seus trabalhos no Journal of the American Society for Psychical Research e, mais recentemente, no Journal for Scientific Exploration. Atualmente, há até um cientista que o comparou como sendo o Galileu de nosso tempo.

É claro que Stevenson recebeu muitas críticas. Paul Edwards (1996) foi um de seus críticos mais ferozes, através de seu livro Reincarnation: a critical examination, an energic attack, apesar de nunca ter se encontrado com Steveson. Em seu livro, Edwards escreveu: “Ele [Stevenson] escreveu mais completamente e mais inteligentemente em defesa da reencarnação do que qualquer outro e isto constitui a razão por que ele figura proeminentemente em minhas discussões”. Edwards alega, em suas críticas, principalmente a “falibilidade humana” e que muitos informantes mentem como razão para duvidar das evidências asseguradas por Stevenson em seus trabalhos. Ele enfatiza, ainda, que Stevenson não fez nenhum esforço para explicar o que é a alma e o que acontece com a “entidade” enquanto não encarna e, ainda, qual o mecanismo de conservação de parte da memória que teve na vida anterior. E nisso, ele tem razão, pois nenhum cientista ainda o fez de forma cabal, embora os espiritualistas expliquem estas questões satisfatoriamente.

Em seus momentos mais sombrios, Stevenson sentia-se como um banido, um herético condenado por suas afrontas à ortodoxia científica. Mas sempre foi um homem determinado, reservado, escrupulosamente honesto e disposto a revelar as verdades que ia colhendo em suas pesquisas de campo. Enfim, é um cientista, cujos propósitos merecem toda boa fé.

Sobre a parapsicologia, Stevenson admite que muitos parapsicólogos estão muito isolados. São suas as palavras ditas a Tom Shroder (11, 12), em 1995, quando de sua entrevista com ele:

 

“Eles mantiveram-se confinados em si mesmos, não falando bastante a outros cientistas, e mais que isso, inatentos ao fato de que o resto do mundo não lhes dava ouvidos. Eles estavam demasiadamente fechados em seus estreitos programas de laboratório e tendiam a serem negligentes ou mesmo insolentes sobre o que acontecia no campo das experiências espontâneas”.

 

“Estas [pesquisas espontâneas] me interessavam mais. Os psicólogos modernos imitaram os físicos, tornando-se interessados apenas no que acontecia num laboratório, não em coisas como o amor e a morte, e os parapsicólogos imitaram os psicólogos. Isto é, você tem um rigoroso controle das condições. Mas, parece-me que é muito melhor estar 90% certo de alguma coisa importante do que estar 100% certo de alguma coisa que é trivial”

 

5.      Estatística de casos apresentados pela Dra. Helen Wambach

 

A Dra. Helen Wambach, que não tem nenhuma vinculação com a doutrina espírita, é renomada pesquisadora e psicóloga americana. Ela publicou vários livros de divulgação de relatos obtidos por regressão de seus pacientes às vidas passadas, dentre eles, Vidas depois da vida e Recordando vidas passadas. Suas conclusões foram baseadas em um banco de dados com mais de 1088 casos de regressão às vidas passadas. Em estatísticas obtidas em decorrência de suas observações, apresenta dados impressionantes e concludentes mostrados, a seguir (13):

 

i 25% das pessoas reencarnam, para aprender sobre si mesmas e sobre a vida.

i 18% para se harmonizarem com familiares.

i 18% para aprender o amor-doação aos semelhantes.

i 27% para crescer espiritualmente, vinculando-se à orientação de pessoas.

i 12% com objetivos variados.

 

Estes dados constituem uma boa referência para afirmarmos que a Terra é um mundo-escola, conforme o fizemos no capítulo 9 sobre o Espírito.

O quadro seguinte mostra os sentimentos que os pacientes manifestaram quanto à reencarnação (12):

 

i 81% disseram ser a reencarnação uma decisão pessoal, enquanto que 19% não lembraram.

i 68% mostravam-se relutantes, tensos ou resignados quanto à reencarnação, sendo que 32% não souberam.

i 26% assumiram a reencarnação com otimismo, com esperança de evolução, mas 74% não demonstram tais sentimentos.

 

O que estes dados nos revelam, em primeiro lugar, é a prevalência do livre-arbítrio de cada um, também, no mundo espiritual: a decisão de encarnar é própria de cada espírito. Os dados do segundo quesito são um tanto dúbios, mas acaba por indicar que a verdadeira razão para reencarnar só o espírito a sabe, em seu mundo espiritual e que as memórias relacionadas ao seu plano de reencarnação resultam embotadas.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) STEVENSON, M.D, Ian. Twenty cases suggestive of reincarnation. 2nd. Edition. Charlottesville: University Press of  Virginia , 1974.

 2) STEVENSON, Ian.Twent cases of suggestive reincarnation (summary). Disponível em:https://www.afterlife101.com/Reincarnation.html. Acesso em 20/03/06.

 3) SCHWARTZ, Gary E. “Projeto de Pesquisas Veritas”. Disponível em: https://veritas.arizona.edu/research.htm  e https://www.openmindsciences.com/. Acesso em 14/03/06.

 4) STEVENSON, M.D., Ian. Children who remember previous lives – a question of reincarnation Jefferson:.Mc Farland & Company, Publishers,  2002.

 5) GOSWAMI, Amit. A física da alma. São Paulo: Aleph, 2005.

 6) STEVENSON, M.D, Ian. Where reincarnation and biology intersect. Westport: Praeger Publishers, 1997.

 7) STEVENSON, Ian. Where reincarnation and biology intersects (summary). Disponível em: https://www.afterlife101.com/BiologyIntersect.html. Acesso em 21/03/06.

 8) STEVENSON, Ian. Entrevista concedida ao Dr. K. S. Rawat, Diretor of Reincarnation Research Foundation em Faridabad, Índia, em 1986. Venture Inward Magazine, setembro/outubro – 1995. Disponível em https://www.childpastlives.org/stevenson_intv.htm. Acesso em 10/03/06.

 9) BOWMAN, Carol. Dr. Stevenson Website of Carol Bowman. Disponível em: https://childpastlives.org/stevenson.htm. Acesso em 20/03/06.

10) SCHWARTZ, Gary E.; SIMON, William L. e RUSSEK, Linda G. The after life experiments. New York: Pocket Books, 2002.

11) SHRODER, Tom. Almas Antigas. Rio de Janeiro: Sextante, 2001.

12) SHRODER, Tom. Old Souls (summary). Disponível em: https://www.childpastlives.org/oldsouls.htm. Acesso em 20/03/06.

13) WAMBACH, Helen. A necessidade da reencarnação. Apud MIRANDA, H. Nossos Filhos são Espíritos, p.46. Acesso em 10/03/06. Disponível em: https://www.annex.com.br/pessoais/confrariahpe/encarnacao.htm.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 16

 

 

EXPERIÊNCIAS DE QUASE-MORTE

 

Visão à luz do espiritualismo

 

 

Existe uma montanha de evidências circunstanciais que a consciência sobrevive à morte do corpo. Trata-se de evidências tão fortes que seriam levadas em conta num julgamento legal. Algumas pessoas acreditam que a ciência precisa de melhores instrumentos para quantificar o que seja a consciência. Talvez quando descobrirmos o que é a consciência nós estaremos em condições de prover absoluta evidência científica que há uma vida após a morte.

Kevin Williams – especialista em fenômenos de quase-morte (2006)

 

 

A partir de 1969, com a publicação da primeira edição do livro, Life after life (A vida depois da vida) de Raymond A. Moody, Jr. – M.D. (1), que teve sua primeira edição no Brasil em 1975 e foi reeditado em 2004, milhares de entrevistas relatando casos de experiências de quase-morte foram gravadas e descritas em mais de uma centena de livros, desde então publicados. Atualmente, existem milhares de referências na Internet e até mesmo associações de pessoas que passaram por estas experiências.

A EQM – experiência de quase-morte é uma experiência lúcida associada com a percepção da consciência como elemento dissociado do corpo que ocorre no momento de uma ameaça atual iminente de morte, que, devido a algum motivo, acaba não ocorrendo. Trata-se de um fenômeno real bem diferente dos sonhos e dos efeitos de alucinação decorrentes das experiências com drogas (LSD, maconha, etc.).

O próprio livro aqui citado, que foi pioneiro na divulgação de experiências de quase-morte, doravante designada aqui simplesmente pela sigla EQM, é um clássico nesse campo. Como o nosso objetivo não é fazer relatos de EQM, pois essa tarefa não constitui o propósito de nosso livro, valemo-nos, entre outros, dos subsídios oriundos da experiência do Dr. Moody. Ele estudou 150 casos, dos quais selecionou em sua obra citada cerca de 105 casos; destes, colhemos algumas informações que serviram de base para a elaboração deste capítulo. Neles, as experiências de quase-morte se encaixam nas seguintes categorias (1):

 

1. Pessoas que foram ressuscitadas depois de terem sido con­sideradas, julgadas ou declaradas clinicamente mortas por seus médicos.

2. Pessoas que, no decorrer de doenças, acidentes ou ferimentos severos, chegaram muito perto da morte física.

3. E pessoas que, ao morrer, contaram o que se passava a outras pessoas que estavam presentes. Mais tarde, essas outras pessoas relataram para mim o conteúdo da expe­riência de morte.

 

Os casos de EQM do primeiro tipo, onde a morte clínica realmente ocorre, são mais dramáticos do que os do segundo tipo, em que ocorre apenas uma proximidade da morte. Em ambos os casos, as experiências são semelhantes. Os da terceira categoria não foram incluídos na sua obra. De qualquer forma, essas experiências são fantásticas e apresentam grande semelhança nos relatos, o que lhes dá foro de veracidade, confirmando o fato da sobrevivência da alma sobre o corpo físico.

A incerteza que existe, desde as mais antigas civilizações e culturas sobre a vida após a morte, é responsável pelo medo de pensar e refletir sobre o que a morte significa realmente para cada um de nós. O medo da morte está presente em quase todas as pessoas das mais diferentes culturas e religiões, independentemente da idade em que a morte venha ocorrer e da forma como ocorre.

Não é difícil encontrarmos por aí pessoas que já passaram pela experiência de quase-morte, mas têm medo de serem consideradas loucas quando as relatam aos seus amigos e parentes, recebendo deles olhares enviesados de desconfiança e pouco caso. Outras pessoas estão sempre muito apressadas para perderem tempo com “fantasias absurdas” ou não estão acostumadas a fazerem um esforço mental reflexivo e diferente sobre as coisas sérias da vida.

Para muitas pessoas, é muito difícil conversar sobre a morte, pelos mais diversos motivos, mas os dois principais são de natureza psicológica e cultural. Qualquer que seja o motivo alegado, existe um verdadeiro tabu quando se aborda o assunto morte. Algumas pessoas fogem a qualquer discussão a respeito dela. A morte, por uma razão muito simples, está sempre associada ao medo de morrer, medo de aceitar a morte, pois isso um dia vai acontecer conosco. Outras pensam que conversar sobre a morte pode parecer algo um tanto tétrico, capaz de atrair pensamentos negativos.

Inseridos no argumento cultural estão os elementos de nossa própria vida terrena e que nos rodeiam, tais como, objetos, coisas, pessoas e eventos. No nosso subconsciente está arraigada a idéia de que morte significa o afastamento de tudo isso, inexoravelmente, quando tudo se aniquila e volta ao pó. Isto é, estamos acostumados apenas ou principalmente com o mundo objetivo e morte não tem explicação objetiva. De qualquer forma, em última instância, a morte é tida como algo desagradável e não desejável, a não ser para os suicidas.

Existe um enfoque que afirma que a morte é a aniquilação de tudo, que após a morte tudo volta ao pó e a consciência se aniquila: são pensamentos arraigados no mundo materialista. Mas, há outro enfoque que é tão velho quanto o mundo, que concebe a existência da alma, psique, mente, consciência ou espírito, não importa o nome, mas sim saber que existe algo – a Força Inteligente, que é imortal, a animar o corpo humano e que continua vivendo após a morte. As pessoas que têm essa visão vivem uma realidade mais abrangente – a realidade espiritual, além da realidade material.

É compreensível que a ciência oficial, materialista em todas as suas concepções do que seja o ser humano, não tenha apresentado uma explicação aceitável para o fenômeno da morte. Conforme veremos, à luz do espiritualismo, este é um fenômeno tão natural como o nascimento, sendo lhe o inverso. Para entendê-lo em toda a sua simplicidade, há necessidade de compreender o que é a Força Inteligente – no homem, o Espírito, o que é a encarnação, como se processa a encarnação (nascimento) e a desencarnação (morte) e qual a razão de ser do processo encarnatório que, por sua vez, está intimamente ligado à evolução espiritual e ao progresso material. Tudo isso consta dos conhecimentos existentes, desde 1910 e ensinados nas obras do Racionalismo Cristão (2, 3, 4). Esses conhecimentos serão utilizados pelo autor para explicar, também, o que ocorre nas EQMs. 

Mesmo as religiões orientais milenares de base espiritualista, como o Budismo e o Taoísmo, praticadas principalmente na Índia e no Tibet e que não se livraram ainda do ranço do misticismo ritualístico, não esclarecem, com absoluta segurança, o que é o espírito, a sua encarnação e desencarnação e qual o propósito desse processo, que envolve os aspectos psíquicos e físicos dos seres humanos, conforme tratamos no capítulo sobre o Espírito. Essas religiões baseiam suas explicações sobre encarnação e desencarnação nos ensinamentos apresentados no Livro tibetano dos mortos (5), que deixa muitas questões em aberto e trata algumas de maneira completamente mística. De qualquer forma, este livro parece ter inspirado todos os conhecimentos teosóficos codificados por madame Helena Blavatsky, desde 1868, cujos princípios incluem o conceito de reencarnação e de carma. Mais tarde, estes princípios foram assimilados e expandidos pelo Espiritismo de Allan Kardec.

Somente a partir do século VIII d.C. apareceu o primeiro Livro tibetano dos mortos, na forma escrita, tendo sido até então, transmitido oralmente entre os iogues tibetanos. Foi C. G. Jung – o psicólogo dos arquétipos, que o divulgou no ocidente, desde 1927, tendo nele introduzido o seu “Comentário Psicológico”. O Livro tibetano dos mortos (5) estabelece que há um continuum entre a vida tal como a conhecemos e a morte: as experiências porque passamos, tanto do lado de cá como da lado de lá, são chamadas de passagens ou “bardos”. As passagens ou “bardos” que ocorrem enquanto não morremos são três: o primeiro “bardo” é o nascimento, o segundo, vai da infância até a morte e o terceiro é a morte física do corpo. A partir do quarto “bardo” inicia-se a jornada além da morte: durante o quinto “bardo” ocorre a libertação e encontro com o seu carma (idéia do resgate dos atos maus) e através do sexto “bardo”, há o preparo para a reencarnação. Todos esses “bardos” são descritos com riqueza de detalhes, mas com muito misticismo; daí haver a interpretação literal ou exotérica, que é a popular e, a interpretação simbólica ou esotérica, que é a do conhecimento dos lamas do Tibet. Esta é, também, a interpretação que embasa o Budismo na sua doutrina do renascimento. Mas, ressalte-se que para os budistas, a alma é efêmera, irreal. Se tivermos que resumir, diríamos que o Livro tibetano dos mortos tem a sua marca essencial na idéia da vida e da morte como uma viagem contínua para que todos os carmas sejam resgatados.

 A grande maioria dos cientistas, inclusive pesquisadores que estudam a consciência e têm renome internacional, afirma que a morte é o fim da consciência. Para eles, a morte é como desligar o aparelho de televisão, encerrando o programa que estava sendo apresentado. Aceitando esse mesmo exemplo, nós afirmamos que ele é falso. Desligar o aparelho de televisão não afeta o sinal que está nas ondas (vibrações) aéreas que provêm da estação transmissora – a origem dos programas. Quantas e quantas televisões são desligadas ao mesmo tempo e o sinal ainda continua no ar alimentando outros aparelhos de televisão, nos diversos canais em que estão sintonizados. Apenas, no aparelho desligado, não podemos mais ver as cenas e ouvir os sons, como o corpo que tomba inerte, após a consciência (dizemos nós, o espírito) deixá-lo. Enquanto a estação de transmissão estiver com o programa no ar, os aparelhos de televisão a ela ligados ou com ela sintonizados estarão captando o sinal e o convertendo em sons e imagens. Se o aparelho que foi desligado voltar a ser ligado e sintonizado no mesmo canal em que estava, as cenas e os sons continuarão a ser exibidos, o que não é possível com o exemplo da consciência (espírito), a não ser nas experiências de quase-morte, pois se trata, então, de uma morte aparente ou, espiritualmente falando, de um desdobramento espiritual, que ocorre sob várias modalidades e tem diversos propósitos.

Na analogia que fizemos, a consciência (o espírito) é o sinal de transmissão individualizado para o corpo em questão e, quando ele cessa de vibrar e alimentar o corpo com sua energia (vida), o corpo queda inerte. Ou seja, na concepção popular, ocorreu a morte e, na concepção espiritualista, ocorreu a desencarnação do espírito que, liberto da matéria, retorna ao seu mundo de origem, isto é ao mundo próprio de onde veio encarnar. O que há é simplesmente a morte do corpo, devido à desencarnação do espírito, por ser este o agente ativo que incita o corpo humano e lhe transmite a vida. Então, para os materialistas e céticos, existe a morte do corpo e nada mais; para os espiritualistas existe a morte do corpo e a desencarnação do espírito, isto é, os dois fenômenos, sendo o primeiro uma conseqüência (efeito) do afastamento do espírito (causa). Neste processo, por deixar o espírito de incitar o corpo ao qual levava-lhe a vida (energia), este último entra imediatamente em decomposição física, química e biológica, que é a morte atestada pela medicina oficial.

Portanto, com base na analogia citada, as teorias científicas correntes (materialistas) clamam que a experiência de quase-morte é um produto do aparelho de televisão, ou seja, do cérebro. Usando essa mesma analogia, nós dizemos que essa informação é falsa, porque é o sinal de televisão proveniente da estação transmissora de TV que é alimentado ao aparelho de televisão, a verdadeira fonte (causa). A única e exclusiva função do aparelho de televisão é converter o sinal recebido (ondas hertzianas) em cenas e sons, isto é, o televisor apenas interpreta os sinais, da mesma forma que o cérebro interpreta as vibrações (energia) recebidas do espírito.

1.      Descrição típica de um caso completo

 

Diante dos milhares de relatos acumulados em mais de uma centena de livros publicados sobre EQM e, também, de muitos milhares de artigos existentes na Internet e nas organizações criadas para estudar o fenômeno, é possível idealizar e criar um caso típico completo de EQM.  Entre essas associações estão, por exemplo, a IANDS – International Association for Near-Death Studies (Associação Internacional de Estudos de Quase-Morte) e a NDERF – Near-Death Experience Research Foundation (Fundação para Pesquisa de Experiências de Quase-Morte). Há, é verdade, muitas variações nos relatos e nas circunstâncias que propiciaram as experiências, mas cerca de quinze a dezoito elementos recorrentes estão, parcial ou totalmente, sempre presentes nas descrições registradas. Raymond A. Moody, Jr. M. D., autor do livro best seller, intitulado A vida depois da vida, anteriormente referido, idealizou, também, um caso típico. Por isso mesmo, para seguir o roteiro desse capítulo é indiferente tomarmos uma ou outro como referência, mas o “relato típico” que apresentamos, a seguir, consta da obra de Moody (1), páginas 37-38 que, data vênia, estamos reproduzindo. Ei-lo:

 

Um homem está morrendo e, conforme chega ao grande desgaste físico, ouve sua declaração de morte pelo médico. Ele começa a ouvir um barulho irritante de chiados agudos e ao mesmo tempo sente que está se movendo rapidamente através de um túnel longo e escuro. Depois disso, de repente ele se encontra fora de seu próprio corpo físico, mas ainda no ambiente físico imediato e vê o próprio corpo a certa distância, como se fosse um espectador. Ele observa a tenta­tiva de ressuscitá-lo a partir desse ponto de vista incomum e encontra-se num estado de revolta emocional.

 

Após certo tempo, ele se acalma e fica mais acostumado com essa condição ímpar. Ele percebe que ainda tem um “corpo”, mas de uma natureza muito diferente e com poderes muito diferentes do corpo físico que ele deixou para trás. Logo outras coisas começam a acontecer. Outras pessoas vêm ao seu encontro para ajudá-lo. Ele vislumbra os espíritos de parentes e de amigos que já faleceram e um espírito doce e caloroso de um tipo que ele nunca encontrou antes - um ser de luz - aparece perante ele. Esse ser faz uma pergunta para fazê-lo avaliar a própria vida e o ajuda no processo, mostrando uma retrospectiva panorâmica e instantânea dos principais eventos de sua vida. Em determinado momento, ele se vê se aproximando de algum tipo de barreira ou fronteira, aparentemente representando o limite entre a vida terrena e a próxima vida. Ainda assim, ele sente que deve voltar para a terra, que o momento de sua morte ainda não chegou. Nesse ponto, ele resiste, pois agora foi envolvido por suas experiências na vida depois da morte e não quer retornar. Ele está repleto de sentimentos intensos de alegria, amor e paz. No entanto, apesar de sua atitude, de algum modo ele se religa ao corpo físico e volta a viver.

Mais tarde, ele tenta contar aos outros, mas sente difi­culdades. Em primeiro lugar, não é possível encontrar pa­lavras humanas adequadas para descrever esses episódios sobrenaturais. Ele também percebe que os outros zombam da história, então ele pára de contar. “Mesmo assim, a experiência afeta sua vida profundamente, especialmente sua visão acerca da morte e seu relacionamento com a vida”.

 

Como não se trata de um relato real e sim de um “modelo”, constatamos que na obra citada existem cerca de 105 casos reais, relatados e amplamente comentados, caso a caso, pelo profissional autor do livro, cuja experiência profissional é indiscutível e respeitada pelos seus pares e pela opinião pública mundial.

Para embasar suas explicações nos casos reais que relata, o autor coloca às páginas 39-41 de seu livro (1) uma série de fatos que, a priori, os parametriza, a guisa de explicações necessárias para bem entender o conteúdo das experiências de quase-morte. Ei-los:

 

 

1. Apesar das semelhanças marcantes entre vários relatos, não há nenhum que seja precisamente idêntico (embora alguns estivessem marcantemente próximos).

 

2. Não encontrei nenhuma pessoa que relatasse todos os com­ponentes da experiência citada anteriormente. Muitos rela­taram a maioria deles, isto é, oito ou mais, dentre os quinze.

 

3. Não existe nenhum elemento citado anteriormente, que todas as pessoas tenham relatado que apareça em todas as narrativas. No entanto, alguns desses elementos chegam bem próximos de serem universais.

 

4. Não existe um único componente do meu modelo abstrato que apareça em apenas um relato. Cada elemento apareceu em várias histórias separadas.

 

5. A ordem pela qual a pessoa em via de morrer atravessa os vários estágios brevemente delineados anteriormente pode variar da ordem dada no “meu modelo teórico”. Para citar um exemplo, várias pessoas contaram ter visto o “ser de luz” antes, ou ao mesmo tempo em que deixaram o corpo físico, e não como no “modelo”, algum tempo depois. Entretanto, a ordem na qual os estágios ocorrem no modelo é bastante típica, e grandes variações não são comuns.

 

6. Quão profundamente na qual a pessoa vivencia essa ex­periência hipotética completa parece depender do fato de a pessoa ter realmente passado por uma morte clínica apa­rente, e se esse for o caso, por quanto tempo esteve nesse estado. Em geral, as pessoas que foram declaradas “mortas” parecem relatar experiências mais completas e detalhadas do que aquelas que apenas chegaram perto da morte, e aquelas que estiveram “mortas” por um período mais longo vão mais a fundo do que aquelas que estiveram “mortas” por um período mais curto.

 

7. Conversei com algumas pessoas que foram declaradas mortas, ressuscitadas e que voltaram sem relatar qualquer um desses elementos comuns. Na verdade, elas dizem que não lembram nada sobre sua “morte”. De forma bastante interessante, conversei com diversas pessoas que foram realmente declaradas clinicamente mortas em ocasiões dife­rentes e com anos de distância, e elas contam não ter viven­ciado nada numa das ocasiões, mas que foram bastante envolvidas pelas experiências da outra.

 

8. Deve ser enfatizado que estou contando relatos, experiências ou narrativas de primeiro grau, que outras pessoas me passaram verbalmente durante as entrevistas. Assim, quando comento que um dado elemento do “modelo completo” não ocorre num determinado relato, não implica necessariamente que não aconteceu com a pessoa envolvida. Apenas quero dizer que essa pessoa não me contou que isso tenha ocor­rido, ou definitivamente não fica claro em seu relato que tenha vivenciado isso. A partir desse parâmetro, então, vamos observar alguns dos estágios e eventos comuns das experiências de morrer.

 

2.      Casos na Literatura

 

Ainda, dando seqüência a este embasamento que precisamos para fundamentar nossas explicações sobre tais fenômenos, estamos apresentando, a seguir o caso 105, que consta (1) das páginas 108 – 114, apresentado como um caso completo e real e que corrobora o que foi exposto nos parâmetros da citação anterior. Trata-se de um relato longo e excepcional que incorpora quase todos os elementos constantes do caso típico e das observações feitas acima. Eis o relato desse homem (1):

 

 Quando isso aconteceu, eu sofri, como ainda sofro, de um episódio sério de asma brônquica e enfisema. Certo dia, tive um acesso de tosse e aparentemente rompi um disco na parte inferior da minha espinha. Por dois meses consultei uma série de médicos devido à dor agonizante e finalmente um deles me indicou um neurocirurgião, o doutor Wyatt. Ele me examinou e disse que eu precisava ser internado imediatamente e assim fazendo, colocou-me na tração em seguida. O doutor Wyatt sabia que eu tinha uma doença respira­tória séria, então chamou um pneumologista, que informou que o anestesista, doutor Coleman, deveria ser consultado para ver se eu poderia ser anestesiado. Assim, o pneumolo­gista cuidou de mim por quase três semanas até que final­mente me levou a um ponto em que o doutor Coleman pudesse me anestesiar. Um dia, ele finalmente concordou, embora ainda estivesse muito preocupado. Eles marcaram a cirurgia. Uma noite, já no hospital, fui dormir e tive um sono agitado até algum momento da madrugada, quando acordei com uma dor aguda. Virei-me na cama e tentei encontrar uma posição mais confortável, mas nesse momento uma luz apareceu num canto do quarto, pouco abaixo do teto. Apenas uma bola de luz, quase como um globo e não era muito grande, eu diria que tinha cerca de trinta ou qua­renta centímetros de diâmetro; e quando a luz surgiu, uma sensação tomou conta de mim. Não posso dizer que era uma sensação estranha, porque não era. Era um senti­mento de completa paz e extremo relaxamento. Pude ver a mão que se estendia da luz até mim e a luz disse: “Venha comigo. Quero mostrar-lhe algo”. Então, imediatamente, sem qualquer hesitação, estiquei minha mão. Ao fazer isso, tive a sensação de ser erguido e de ter deixado meu corpo. Quando olhei para trás vi que ainda estava deitado na cama enquanto subia até o teto do quarto. Nesse momento, quando saí do corpo, assumi a mesma forma da luz. Tive a sensação e, terei de usar minhas próprias palavras para descrever, uma vez que nunca ouvi ninguém falar sobre nada parecido, que essa forma era definitiva­mente um espírito. Não era um corpo, apenas uma nuvem de fumaça ou vapor. No entanto, a forma que assumi tinha cores. Havia laranja, amarelo e uma cor que eu não sei distinguir - parecia um azul índigo, um tom de azul. Essa forma espiritual não tinha a forma de um corpo. Era mais ou menos circular, mas tinha o que posso chamar de mão. Eu sei disso porque quando a luz veio até mim, eu estendi minha mão. Mesmo assim, o braço e mão do meu corpo estavam parados, pois eu podia vê-los na cama, ao lado do meu corpo, enquanto eu me elevava até a luz. Mas quando eu não estava usando essa mão espiritual, o espírito voltava ao formato circular. Assim, eu fui atraído para a mesma posição em que a luz estava e começamos a nos mover até o corredor, atra­vessando os andares, ao que me parece, até chegar ao térreo. Não tínhamos qualquer dificuldade para atravessar portas ou paredes. Elas simplesmente se desfaziam conforme nos aproximávamos delas. Durante esse período, era como se estivéssemos via­jando. Eu sabia que estávamos nos movendo, mas não havia a sensação de velocidade. Em dado momento, quase instantaneamente para dizer a verdade, percebi que tínhamos chegado à UTI do hospital. E eu nem sabia onde ficava aquela sala, mas chegamos lá e novamente estávamos no canto, perto do teto, acima de tudo o mais. Eu vi os médicos e as enfermeiras caminhando em seus jalecos verdes e as camas colocadas ali. Então esse ser me disse - mostrou-me - “Você ficará aqui. Quando trouxerem você da mesa de operação vão colocá-lo naquela cama, mas você nunca acordará daquela posição. Você não saberá de nada depois de ir para a sala de cirurgia até que eu volte para buscá-lo algum tempo depois disso”. Agora, não quero dizer que isso tenha vindo em palavras. Não era como uma voz audível, porque se fosse eu esperaria que os outros na sala tivessem ouvido a voz, mas eles não ouviram. Foi mais como uma impressão que veio até mim. Mas veio de forma tão vívida que não havia como dizer que não ouvi ou não senti. Era definiti­vamente para mim. E o que eu via - bem, era tão mais fácil reconhecer as coisas enquanto estava nessa forma espiritual. Eu me per­guntava: “O que é que ele está tentando me mostrar?”. Eu sabia imediatamente o que era, o que ele tinha em mente. Não havia dúvida. Era que aquela cama - a cama à direita assim que se entra do corredor - seria onde eu ficaria e ele me trouxe aqui com um propósito. Então, disse-me porquê. Ocorreu-me que o motivo para isso é que ele não queria que eu sentisse nenhum medo quando chegasse o momento de meu espírito deixar o corpo, mas que ele queria que eu soubesse qual era a sensação nessa hora de transição. Ele queria me confortar para que eu não tivesse medo, pois ele estava dizendo que não estaria ali imediatamente, que eu passaria por outras coisas antes, mas que tudo o mais perderia a importância porque ele estaria comigo no final. Quando me uni a ele nesse passeio até a UTI e eu próprio me tornei um espírito, de alguma forma fomos fundidos em um. Claro que ainda éramos dois separados. Mesmo assim, ele tinha total controle sobre tudo o que se passava no que dizia respeito a mim. E mesmo que estivés­semos viajando pelas paredes e tetos e assim por diante, bem, parecia que estávamos numa comunhão tão próxima que nada poderia ter nos incomodado. Novamente, era apenas uma paz, calma e serenidade que nunca tinham sido encontradas em qualquer outro lugar. Então, depois de me dizer isso, ele me levou de volta ao quarto do hospital e quando voltei vi meu corpo nova­mente, ainda deitado na mesma posição em que o tínhamos deixado e instantaneamente eu estava de volta ao meu corpo. Eu diria que estive fora do corpo por cinco ou dez minutos, mas a passagem de tempo não tinha nada a ver com essa experiência. De fato, nem me lembro se já pensei nisso como um momento especifico. Bem, a coisa toda me surpreendeu, pegou-me completa­mente desprevenido. Foi tão vívido e real - mais do que uma experiência comum. E, na manhã seguinte, eu não tinha nem um pouco de medo. Quando fiz a barba, percebi que minha mão não estava tremendo como nas seis ou oito semanas anteriores. Eu sabia que morreria e não havia arrependi­mento nem medo. Não havia nenhum pensamento do tipo: “O que posso fazer para evitar isso?”. Eu estava pronto. Um dia antes da cirurgia, que aconteceria pela manhã, eu estava no quarto do hospital preocupado. Minha esposa e eu temos um garoto, um sobrinho adotado e passávamos por algumas dificuldades com ele. Então decidi escrever uma carta para minha esposa e outra para o meu sobrinho, co­locando algumas de minhas preocupações em palavras e decidi esconder as cartas onde encontrariam apenas depois da cirurgia. Após escrever cerca de duas páginas para minha esposa, foi como se as comportas tivessem sido abertas. De repente, debulhei-me em lágrimas, soluçando. Senti uma presença e a princípio pensei que talvez tivesse chorado tão alto que incomodara uma das enfermeiras e que elas tinham vindo ver qual era o problema comigo. Mas não ouvi a porta abrir. Novamente senti essa presença, mas não vi nenhuma luz dessa vez e os pensamentos ou palavras vieram até mim, assim como acontecera antes e ele disse: “Jack, por que você está chorando? Eu achei que você ficaria feliz de vir comigo”. E eu pensei: “Sim, eu estou feliz. Quero muito ir”. E a voz insistiu: “Então, por que você está chorando?”. Eu respondi: “Nós estamos com problemas com nosso sobrinho, você sabe e tenho medo de que minha esposa não vá saber criá-Io. Estou tentando colocar em palavras como me sinto e o que quero que ela tente fazer por ele. Também estou preocupado porque sinto que talvez minha presença pudesse colocar os pés dele no chão”. Foi quando os seguintes pensamentos dessa presença vieram até mim: “Como você está pedindo por outra pessoa e pensando nos outros, não em si, concederei aquilo que me pede. Você viverá até ver seu sobrinho se tomar um homem”. E, de repente, ele se foi. Eu parei de chorar e rasguei a carta para que minha esposa não a encontrasse acidentalmente. Naquela noite, o doutor Coleman veio me dizer que esperava muita dificuldade para me anestesiar e que eu não deveria ficar surpreso se ao acordar eu encontrasse vários fios, tubos e máquinas à minha volta. Eu não contei o que eu havia vivenciado, apenas concordei e disse que iria cooperar. Na manhã seguinte, a cirurgia demorou muito, mas tudo correu bem e eu estava recobrando a consciência quando vi o doutor Coleman, que estava comigo e disse-lhe: “Eu sei exatamente onde estou”. Ele perguntou: “Em qual cama você está?”. Eu respondi: “Estou na primeira cama à direita quando se entra do corredor”. Ele deu risada e certamente pensou que eu estava falando essas coisas estranhas por causa da anestesia. Eu queria contar o que havia acontecido, mas no mesmo instante o doutor Wyatt entrou e disse: “Ele está acordado agora. O que você quer fazer?”. E o doutor Coleman disse: “Não há nada que eu possa fazer. Nunca fiquei tão perplexo na minha vida. Estou aqui com todo esse equipamento montado e ele não precisa de nada”. O doutor Wyatt disse: “Surpresas ainda acontecem, sabia?”. Assim, quando pude me levantar da cama e olhar em volta do quarto, vi que estava na mesma cama que a luz havia me mostrado vários dias atrás. Tudo isso aconteceu três anos atrás, mas as imagens ainda são tão vívidas quanto naquela época. Foi a coisa mais fantástica que já aconteceu comigo e fez uma grande diferença. Mas eu não converso sobre esse assunto. Contei apenas para minha esposa, meu irmão, o padre e agora para você. Não sei como dizer, mas isso é muito difícil de explicar. Não estou tentando causar um grande abalo na sua vida e não estou tentando me vangloriar. É que só depois disso não tenho mais quaisquer dúvidas. Eu sei que existe vida depois da morte.

 

3.      Explicações existentes

 

As explicações existentes na literatura científica relativas aos fenômenos de quase-morte são numerosas, existindo já uma considerável literatura com relatórios apresentados por psicólogos, psiquiatras, médicos, neurocientistas, psicobiólogos e filósofos. A seguir, apresentamos as principais correntes (6):

 

i Teoria da morte cerebral

 

Esta teoria foi popularizada pela Dra. Susan Blackmore em seu livro Dying to live (7). Segundo ela, todas as EQM apresentam o mesmo perfil e esta mesmice é o ponto fraco para que possa ser considerada real. Segundo esta teoria, não é porque o paciente está viajando em direção a uma bela vida pós-morte, mas porque os neurotransmissores estão entrando em colapso e criando as mesmas ilusões para todos os que estão em vias de morrer. Mas, a questão fundamental é: somos indivíduos com almas, personalidades, pensamentos e mentes que nos são exclusivos ou somos simplesmente corpos controlados pelos nossos cérebros, à maneira dos computadores, embora existam diferenças entre um IBM, um Apple ou um PC?

Os neurocientistas e pesquisadores estão divididos. Uns aceitam a realidade e a validade das experiências de quase-morte e admitem pesquisar estas experiências rigorosamente; já outros, nem querem ouvir e continuam pesquisando a consciência no cérebro, mas respeitam as opiniões daqueles que passaram pela experiência. Mas, ainda assim, fica a pergunta: qual a causa e o que significa ter uma EQM?

Assim, temos duas correntes de pesquisadores sobre a EQM: uma que adota a rota psicológica e procura as razões desse comportamento estranho e bizarro; outra, que toma a rota fisiológica e procura em alguma parte do cérebro o mal-funcionamento deste nestas ocasiões.  O problema é que a grande maioria dos que passaram por uma EQM não aceita a rota fisiológica. Para estes, reduzir uma profunda e transformadora experiência a nada mais que o “piscar” de neurotransmissores em exaustão, seria o mesmo que imaginar uma estátua de Michelangelo como nada mais sendo que pura e simplesmente mármore.

Se não existe o além, o pós-morte, e tudo, não passa de efeitos de um cérebro agonizante, por que tanto interesse em EQMs? Se tudo, alma e personalidade, cérebro e corpo irão se transformar em pó e cinzas, por que então o cérebro se exprime dessa maneira fulgurante aos que passam pela EQM, que relaxam em paz e descrevem visões maravilhosas?

Se se trata apenas de alucinação, por que um grande número de pessoas relata experiências em que ouviu expressões como, “Sua missão ainda não está completa”, ou, “Seu tempo para morrer ainda não chegou” nas suas EQMs? Por que sempre essas mesmas mensagens feitas por “um ser de luz”? Todas as alucinações poderiam sempre ter uma mesma resposta ou pergunta do “ser de luz”?  Por isso mesmo, muitas pessoas que passaram por uma ou mais EQMs, continuam acreditando numa vida após a morte e não numa alucinação em massa. Veja mais argumentos e contra-argumentos em (8).

 

i Teoria baseada em Charles Darwin

 

O fundamento dessa teoria é o desejo que emana da raça humana em querer ajudar aqueles que estão em dificuldade no momento do inevitável fim de suas vidas. A teoria baseada em Darwin da sobrevivência dos mais capazes nos diz que cada espécie está lutando para manter-se viva e garantir a sobrevivência de seus descendentes neste planeta. Os animais ajudam-se uns aos outros no momento de suas mortes, como é notório o caso dos elefantes. Por que não, também, a espécie humana, que na hora da morte de um de seus membros, a pessoa não estaria sendo consolada sobre a sobrevivência de algo que o homem tem (a alma) e ainda desconhece? Esta teoria aplica-se aos mais idosos (9).

 

i Teoria alucinatória

 

Alguns cientistas, que acreditam firmemente que um dia a EQM será explicada por meio das funções do cérebro, sugerem que a produção de endorfinas pelo cérebro durante o processo da morte induz o moribundo a essas alucinações da mente. Mas as endorfinas apenas provocam um estado de euforia seguida de relaxamento, como acontece com os atletas nas academias de ginástica. Todavia, sabe-se também, que as endorfinas não são alucinógenos e não podem recriar um estado mental como na EQM, embora possam até estar envolvidas no processo do alívio da dor, mas elas não estariam sozinhas.

Sabe-se, também que certas substâncias anestésicas do grupo das quetaminas (ciclohexanonas) provocam um estado de leveza semelhante ao que ocorre na EQM e uma teoria é que tais substâncias seriam liberadas pelo cérebro no momento da morte e poderiam ligar-se a certos receptores de neurotransmissores e serem responsáveis por todo o processo EQM, mediante o bloqueio dos referidos receptores (10).

O professor de psicologia Dr. Ronald Siegel da UCLA (University of Califórnia, Los Angeles).rejeita a importância mística e espiritual que ocorre na EQM e declara ter provocado quase todos os efeitos da EQM em testes de laboratório com LSD. Outros pesquisadores, embora concordando que o quadro de sintomas induzidos por esta droga seja semelhante, os fenômenos não são os mesmos, já que a droga destrói a realidade e os fenômenos de EQM são descritos como se fosse uma hiper-realidade.

 

i Teoria do lobo temporal

 

Algumas visões semelhantes às que ocorrem na EQM aparecem, também, na epilepsia associadas com dano no lobo temporal do cérebro. Os pesquisadores descobriram que, estimulando este lobo temporal com descargas elétricas, podem reproduzir alguns dos sintomas da EQM, como os de deixar o seu corpo, a regressão das memórias, etc. Eles pensam que o estresse de estar próximo da morte estimula este lobo. Mas, isso só é válido para pessoas que tinham tumores ou receberam ferimentos nesta área do cérebro.

Contudo, alguns cientistas pensam que a presença de reações químicas no cérebro não significa que a EQM é estritamente resultado de uma reação química. A ciência pode apenas estar descrevendo alguns aspectos da morte física que se relacionam com o cérebro (11).

 

i Teoria da falta de oxigênio

 

Outras possíveis explicações relacionam a EQM com a falta de oxigênio no cérebro ou a presença de dióxido de carbono. Mas isto não explica as descrições que alguns pacientes fazem do que acontece na sala de cirurgia nos momentos em que ocorrem a EQM. O Dr. Michael Sabom relata um caso em que a análise do sangue do paciente, retirado no momento da EQM, revelou alto teor de oxigênio no sangue e baixo teor de gás carbônico, enquanto o paciente lhe revelou inclusive os detalhes dessa análise durante sua experiência fora do corpo. Outras experiências com falta de oxigênio no sangue deixam a pessoa caótica como nos casos de alucinação psicótica (confusão, desorientação e medo) em vez de calma, tranqüila e com um sentimento de ordem, como ocorre nos casos de EQM. Aliás, pessoas que já passaram por ambas, dizem que há uma diferença da água para o vinho.

Outra questão é que as alucinações induzidas por drogas, ou por falta de oxigênio têm lugar com os pacientes acordados, enquanto que, nos casos de EQM, os pacientes estão inconscientes ou até mesmo sem nenhum registro do eletroencefalógrafo (linha zero, sem ondas cerebrais). Há, também, os casos de acidentes em que os pacientes apresentam EQM que acontecem na própria cena do desastre e não no hospital, não tendo o paciente ingerido qualquer droga ou anestésico e, provavelmente, sem falta de oxigênio no cérebro (12, 13, 14). Esta teoria está longe de explicar esses casos.

 

i Teoria da despersonalização

 

A primeira tentativa moderna de explicar a EQM em termos psicológicos surgiu em 1930 por um psicólogo que defendeu a idéia de que quando uma pessoa enfrenta a desagradável realidade da doença e da morte sua primeira tentativa é substituí-la por fantasias agradáveis para proteger-se. Segundo ele, o paciente se “despersonaliza”, removendo o seu “eu” de si mesmo. – isso explicaria a flutuação do corpo, conforme relatado nas EQMs. Embora o argumento possa ter sua razão de ser, pode-se contra-argumentar que muitos fatos que ocorrem na EQM não se encaixam no critério da “despersonalização”, tais como os sentimentos místicos e espirituais muito fortes e a acentuada prontidão e consciência da ocorrência dos fenômenos por parte dos pacientes (15).

 

i Teoria da memória do nascimento

 

Esta teoria pretende comparar a EQM com o que acontece no momento do nascimento. Quando uma criança nasce ela deixa o útero e viaja através de um túnel (o canal uterino) em direção à luz e o que a espera na luz normalmente é bastante calor humano e amor. Assim, o que aconteceria no momento da morte é pura memória de quando a vida começou. Os contra argumentos são: um bebê quando nasce não flutua em alta velocidade pelo túnel, mas é puxado ou empurrado com fortes e dolorosas contrações de sua mãe. E como este modelo pretende explicar o encontro com amigos e parentes do “morto”? Aqui, a parteira ou o médico é tomado como o “ser de luz” que aparece nas EQMs, o que nos parece ridículo. Outro argumento contrário é que o sistema nervoso do bebê não está suficientemente desenvolvido, a tal ponto que possa assimilar memórias do nascimento e revelá-las nos casos de EQM.

Os defensores da teoria das memórias do nascimento alegam que as lembranças dessas crianças se referem à paz e ao conforto que tiveram enquanto no útero de suas mães, não aos eventuais traumas do processo do nascimento propriamente dito. Contudo, nascer não é um processo agradável, pois normalmente as crianças o fazem chorando, como se estivessem num processo de agonia. Em contraste, as EQMs são descritas como uma das mais agradáveis experiências que uma pessoa pode ter (16).

 

i Teoria pós-morte

 

Para ilustrar o que pensam alguns cientistas que não aceitam as explicações materialistas, vamos inserir alguns comentários de renomados médicos e pesquisadores sobre EQMs:

 

Dr. Melvin Morse (17), que fez todas as pesquisas básicas com crianças recém nascidas, afirma categoricamente: “Não há explicação para a luz”.

Dr. Kenneth Ring (18), talvez o mais respeitado pesquisador de todos os pesquisadores de experiências pós-morte e um dos que mais lutou para colocar esse assunto no programa acadêmico e publicou, junto com Sharon Cooper, o livro Near–Death and out-of-body experiences in the Blinds (Experiências fora do corpo e de quase-morte nos cegos) diz:

“Qualquer explicação neurológica deve ser capaz de mostrar como o processo inteiro de fenômenos associados com o núcleo da experiência (isto é, o estado-fora-do-corpo, o conhecimento paranormal, o túnel, a luz dourada, a voz ou presença, o aparecimento dos parentes mortos, as lindas visões, e assim por diante) se apresentaria de uma maneira subjetiva e autêntica como conseqüência de eventos neurológicos específicos disparados pela aproximação da morte. Eu estou convencido que a responsabilidade da prova se deslocou agora para aqueles que desejam explicar as EQMs dessa maneira”.

 

O Dr. Kevin Williams (6, 18) afirma:

 

“Existe uma montanha de evidências circunstanciais que a consciência sobrevive à morte do corpo. Trata-se de evidências tão fortes que seriam levadas em conta num julgamento legal. Algumas pessoas acreditam que a ciência precisa de melhores instrumentos para quantificar o que seja a consciência. Talvez quando descobrirmos o que é a consciência nós estaremos em condições de prover absoluta evidência científica que há uma vida após a morte”.

 

A nossa conclusão para as afirmações do Dr. Ring é que há tantas características consistentes nas EQMs que seria muito difícil encontrar uma boa explanação para todas elas como resultantes da ação física do cérebro. Ou seja, ele acredita que as evidências sobre EQM são tão fortes para os pesquisadores que acreditam na sobrevivência da consciência, que estes não se devem sentir responsáveis por provar como elas acontecem, mas deixar recair o ônus da prova sobre os céticos.

 

4.      Explicações comentadas por Moody

 

Nas páginas 147-165 do seu já citado livro, Raymond Moody Jr. apresenta cinco explicações para os fenômenos de EQM, classificando-as em três tipos: 1) sobrenaturais, 2) naturais (científicas) e, 3) psicológicas.

 

4.1) Sobrenaturais

 

Moody declara nunca ter ouvido relatos em que os pacientes se referissem às aparições de seres invisíveis, do tipo diabólicos, pois se as houvessem os fenômenos seriam dirigidos para os sentimentos de ódio e destruição. Ao contrário, o que os pacientes observam são forças ditas divinas ou “seres de luz”, que dirigem o curso dos fenômenos para o bem, o amor e a compaixão.

 

4.2) Naturais (científicas)

 

Moody enquadra nesta categoria as explicações farmacológica (alucinatória), fisiológica (falta de oxigênio no cérebro) e neurológica (lobo temporal). Vejamos, resumidamente, cada uma delas.

i Farmacológica

 

É a teoria alucinatória que descrevemos com detalhes mais acima. Fundamenta-se nas drogas usadas durante a intervenção cirúrgica como anestesia. Certas drogas médicas causam um estado de confusão mental, ilusão e alucinação: esses efeitos podem ser assemelhados aos estados de EQM. Cita o caso das quetaminas (anestésicos do grupo da ciclohexanona), cujos derivados são usados como anestesia intravenosa. Cita um caso de uso do óxido nitroso por um cirurgião dentista, ocasião em que a paciente, teve um estado semelhante a EQM. Moody afirma que existem diferenças marcantes entre os estados alucinatórios por drogas e os causados por EQM e descarta esta explicação. A variedade das drogas administradas é enorme: aspirina, antibióticos, adrenalina hormonal, anestésicos locais e inalatórios. Muitas das drogas não atingem o sistema nervoso central e, portanto não produziriam os efeitos alegados pelos defensores desta teoria. Além disso, muitos casos de EQM não passaram pelas salas de cirurgia (acidentes, afogamentos, etc.). O uso de drogas como o LSD e a mescalina (cacto mexicano ou peiote) serve para alcançar outras dimensões superiores segundo seus usuários, mas que não deixam de ser alucinatórias.

 

i A explicação fisiológica

 

É a mesma teoria da falta de oxigênio, que descrevemos acima. A fisiologia trata das funções dos órgãos e dos sistemas e as relações entre si. Esta teoria procura atribuir ao cérebro agonizante por falta de oxigênio a explicação para as EQMs. Não se trata de estresse cerebral ou algo fisiológico, pois muitos casos de EQMs ocorreram sem ferimentos.

 

i A explicação neurológica

 

Esta é a mesma teoria do lobo temporal, que já descrevemos acima. A neurologia lida com a causa, o diagnóstico e o tratamento de doenças do sistema nervoso, isto é, o cérebro, a medula e os nervos. Segundo os defensores desta teoria, dois dos eventos mais importantes seriam explicados pela neurologia: a revisão instantânea dos eventos da vida (retrospecto panorâmico) e os fenômenos extracorpóreos. Pretendem assemelhar a EQM aos casos de epilepsia. Moody descreve um caso à p. 154/155 de seu livro. As imagens apresentadas são aleatórias, fora de ordem e têm pouca significação, o que nos leva pensar em confusão mental, com distorções do tempo. Enfim, tratam-se de imagens triviais desordenadas, bem diferentes de uma EQM.

Moody descreve, também, o que seja uma “alucinação autoscópica” à p. 157-158 de seu livro, visão de “si mesmo” projetada fora do corpo do paciente. A pessoa pode ouvir e conversar com sua visão autocóspica. Não tem nenhuma semelhança com o corpo físico que é visto de fora nas EQMs. As alucinações autoscópicas ainda não foram explicadas pela ciência. “Assim, tentar explicar todas as experiências extracorpóreas como alucinações autoscópicas seria simplesmente substituir uma frustração por um enigma”, conclui Moody.

 

4.3) Explicações psicológicas

 

Estas explicações dependem da corrente a que se filiam os psicólogos, não havendo unanimidade entre eles.

 

i Pesquisas de isolamento

 

Semelhante à teoria da despersonalização, que já apresentamos acima. Trata-se de experiências psicológicas conduzidas com pessoas em estado de isolamento ou submetidas a tarefas repetitivas e monótonas por longo tempo. Moody refere-se a exemplos de pessoas perdidas, náufragos, etc. que tiveram visões parecidas às EQMs. Os fenômenos são do tipo distorção da noção do tempo, sensação de estar parcialmente dissociado do corpo, sensações de “ser um” com o universo, não querer voltar à civilização, etc. Se voltam, apresentam uma sensível mudança de valores. Existem semelhanças com alguns casos de EQMs, o paciente apresentando sinais de isolamento, solidão e privação de contato com outras pessoas, o que também ocorre nas UTIs. Conta um caso de visão de pessoas, amigos e conhecidos, inclusive já mortos.

 

i Sonhos, alucinações e ilusões

 

Os defensores desta hipótese, apresentam as EQMs como se fossem ilusões. Moody descarta essa possibilidade, por serem as pessoas que relataram seus casos seres normais, não portadoras de qualquer tipo de psicoses – são pessoas normais da sociedade, que garantem enfaticamente que as EQMs por que passaram não foram sonhos.

Finalmente, Moody diz não propor qualquer explicação ou preferência pelas explicações indicadas, mas alega que elas são, no mínimo, questionáveis e acrescenta: “Na verdade, tudo o que realmente quero sugerir é isso: vamos ao menos abrir a possibilidade de que as experiências de quase-morte representam um novo fenômeno para o qual poderá ser necessário desenvolver novos modos de explicações e interpretação”.

 

5.      Explicação à luz do espiritualismo

 

Com o verdadeiro conhecimento dos fenômenos, tudo pode ser explicado, até mesmo para as mentes mais exigentes A intenção aqui é dar uma explicação mais ou menos sucinta para os dois casos acima apresentados no livro do Dr. Moody, à luz do espiritualismo, com base na minha experiência de vida como livre-pensador e nos princípios Racionalistas Cristãos, descritos com detalhes em outros capítulos dessa obra, principalmente os referentes ao espírito, ao pensamento, perispírito, aura, etc.

Primeiramente, devemos mencionar que são dois casos que apresentam certas características comuns e outras diferentes, uma vez que, no caso típico, procurou-se ser o mais abrangente possível quanto ao fenômeno de quase-morte, enquanto que, no segundo caso – um caso real e longo, o entrevistado demorou o seu enfoque em relatar o que ocorrera dias antes da intervenção cirúrgica e não propriamente durante a intervenção.

 

5.1) Primeiro caso

 

Embora o caso típico nos leve a inferir que se trata de um homem já idoso, uma estatística sobre os casos apresentados na obra do Dr. Moody indica que passaram pela EQM, num universo de 105 relatos, 26 homens (25%), 37 mulheres (35%), 8 crianças (8%) e 34 não informados (32%). Isso mostra uma distribuição bem representativa. Não foi possível analisar as religiões e crenças que os pacientes professavam, embora sabidamente de natureza variada. Com relação às causas de internação e intervenções cirúrgicas, quando estas se tornaram necessárias e isso ocorreu na maioria das vezes, anotamos: parada cardíaca: 13 pessoas (12%), acidentes de carro (nas estradas e no trânsito urbano): 13 pessoas (12%), paradas respiratórias: 2 pessoas (2%), causas diversas: 14 pessoas (13%) e causas não informadas:  63 pessoas (64%).

Diante desse quadro de amplo espectro, pensamos que o exemplo típico reflete muito bem a maioria dos eventos que ocorrem numa EQM e, portanto, é representativo e nele podemos nos fixar para o objetivo da análise que estamos fazendo.

Na visão espírita e espiritualista racionalista cristã, conforme tratamos por ocasião em que descrevemos a encarnação e desencarnação do espírito, o ser humano ou criatura humana, a pessoa ou o indivíduo, como queira chamar, é constituído de três elementos – o corpo mental ou espírito, que é a Força Inteligente portadora da vida, o corpo astral ou perispírito e o corpo físico propriamente dito. E mais, o perispírito é também matéria tênue, diáfana e sempre acompanha o espírito, própria do mundo de onde o espírito veio para encarnar aqui na Terra e do qual o espírito sempre se serve. Bem, o corpo físico é o nosso corpo material proveniente da própria Terra.

À luz do que aí foi colocado, passemos a analisar os principais aspectos e fenômenos da EQM, que resumimos nos seguintes pontos:

 

i Ouve barulhos e chiados irritantes

 

Todos nós sabemos que uma sala cirúrgica não é um local absolutamente isento de sons e ruídos. Nos casos de acidentes, é comum muitas pessoas se aglomerarem ao lado do corpo, fazendo comentários com vozerio intenso e nervoso, buzinas de outros carros, etc. E, ainda, há pessoas mais ou menos sensíveis aos sons e ruídos, como acontece, por exemplo, com relação ao sono. Umas têm o sono tão pesado, que não se importam com ruídos e sons à sua volta; já, outras, acordam ao menor ruído.

 

i Passam por um túnel longo, estreito e escuro

 

O túnel longo, estreito e escuro pode estar representando um “arquétipo”, como acontece, também, no nascimento, quando o bebê e sua mãe passam pelas dificuldades do parto. Essa memória, como todas as memórias, é guardada no perispírito.

 

i Encontra-se fora do corpo

 

O espírito se liga ao corpo por meio dos tênues e diáfanos elementos materiais de seu perispírito. Ao se afastar e ficar fora do corpo, o espírito leva consigo o perispírito, que continua mantendo com o corpo um meio condutor através do qual o espírito leva ao corpo o seu fluxo de energia, como acontece, também, no sono e nos sonhos. Trata-se do fenômeno do desdobramento espiritual. Se, por vontade do espírito, houver o corte da energia, ocorre a morte definitiva do corpo, irreversível. As condições do desdobramento, como na EQM, são reversíveis.

 

i Percebe e vê tudo à sua volta

 

Todas as percepções são vibrações próprias e, portanto moduladas pelo espírito, são inerentes ao conjunto espírito-perispírito. O cérebro é apenas o instrumento do mundo material (do corpo humano) que converte os estímulos e reflexos, isto é, que decodifica todas as informações sentidas e gravadas no perispírito pelo espírito em informações compreensíveis aos nossos sentidos físicos. Este fluxo de energia modulada pelo espírito tem via dupla, de modo a nada escapar de registro (gravação) no perispírito. A via espírito – perispírito – cérebro – sentidos físicos, é transmissora e a via sentidos – físicos – cérebro – perispírito – espírito, é receptora e ambas operam em frações de segundo, quase instantaneamente. Então, seja no estado de vigília ou em qualquer outro estado alterado da consciência, é sempre o espírito que está no comando.

 

i Encontra “pessoas”: parentes e amigos já “mortos”

 

Aqui está a revelação de um problema espiritualmente muito sério. A grande maioria dos espíritos que desencarnam, permanece um tempo mais ou menos longo na superfície da Terra, nela ficando quedados em função de vários fatores, dentre eles, a ignorância espiritual, o misticismo religioso, o apego às coisas materiais e até mesmo para praticarem o mal mediante intuições malévolas aos seus semelhantes, atraídos que são por pensamentos afins. Chegam a formar falanges para praticar toda a sorte de maldades, mediante indução mediúnica junto aos encarnados. São, também, os promotores de fraudes em muitas sessões espíritas. É claro, por razões óbvias, que as intuições de tais espíritos desencarnados se dirigem de preferência, aos seus parentes mais próximos e seus amigos que na Terra ficaram, quando desencarnaram. Outro fator de atratividade de tais espíritos, devido à materialidade maior de seus perispíritos e dos vícios que praticaram quando encarnados é aproximarem de viciados da mesma espécie e grau, para por indução satisfazerem seus desejos. É isso que no espiritualismo chamamos de perturbação espiritual, que pode chegar, nos estados mais graves, à obsessão com todos os sintomas conhecidos. Estes espíritos precisam ser ajudados a retornarem aos seus mundos de origem, o que é feito, sempre que possível, pelos “seres de luz” do Astral Superior. Enquanto não regressarem a seus mundos de origem, permanecem perturbados e perturbando todos aqueles a que assediam e assistem. Não podem, também, voltar a encarnar diretamente aqui da atmosfera da Terra, tendo primeiro que regressarem aos seus mundos de origem, rebalancearem as suas consciências e programarem uma nova encarnação.

 

i Encontra o “ser de luz”

 

Quando o espírito encarnado (a pessoa) que possui um grau de espiritualidade maior devido a ter passado por numerosas encarnações, conheceu e praticou os conhecimentos espirituais enquanto encarnado, dedicou-se ao cumprimento de seus deveres, praticou o bem e afastou-se do mal e dos vícios, quando desencarna, com certeza, será ajudado direta e imediatamente por um ou mais “seres de luz”, que o espiritualismo cristão designa com o nome de espíritos do Astral Superior. É fácil intuir que igual fenômeno, até mesmo por razões de aconselhamento e consolação (não está na hora, sua missão ainda não terminou, tem mérito para continuar a viver, etc.), ocorre nos casos de EQM.

Esclarecemos que os espíritos do Astral Superior são aqueles que, pela sua sabedoria, inteligência, sentimentos nobres, amor e bondade dedicados aos seus semelhantes, já terminaram o seu curso aqui na Terra e não mais encarnam e, nos planos superiores, onde continuam a evoluir sem precisarem de corpos humanos, estão, todavia, comprometidos com a evolução dos habitantes desse planeta, podendo ser acessados quando emitimos pensamentos e sentimentos afins aos citados, o que causará harmonia de vibrações. Milhares de pessoas que conhecem o Racionalismo Cristão praticam esse procedimento naturalmente.

 

i Faz uma análise retrospectiva de sua vida

 

Nada mais natural do que o relato de ações desse tipo. Não se trata de uma ilusão. Nós humanos quando temos juízo e praticamos nossos deveres com a responsabilidade esperada de todos nós, agimos com seriedade e damos valor à vida, sempre fazemos um balanço de nossas consciências, alguns esporadicamente, outros todas as noites antes de se recolherem para dormir. Ou seja, fazemos um retrospecto das atividades do dia e refletimos sobre suas conseqüências para nós, para a nossa família e para os nossos semelhantes. É óbvio que o mesmo ocorre com o espírito quando se vê livre da matéria, ainda que temporariamente, como nos casos de EQM e que tais reflexões e memórias alcancem outras vidas pregressas, Mas, somente quando chegar ao seu mundo de origem, livre de qualquer perturbação oriunda do mundo Terra, poderá o espírito, serenamente, acessar todas as memórias de suas vidas passadas, sem restrições de espaço e tempo e programar uma nova encarnação, se for o caso e dela ainda necessitar.

 

i Barreira final

 

O espírito encarnado se encontra como um prisioneiro em uma prisão. Nos casos em que não esteja contrariando as leis naturais e imutáveis do Universo, o espírito pode e até deve afastar-se temporariamente do corpo, como ocorre nos diferentes desdobramentos espirituais conscientes (para junto com o Astral Superior, realizar trabalhos de grande significação e relevância para a Humanidade) e inconscientes (como no caso do sono e sonhos e experiências fora do corpo - EQM). Como na EQM o espírito se afasta do corpo, sempre com o perispírito, em situação de inconsciência leve ou profunda, esta inconsciência se esbarra no limite do fenômeno, a partir do qual a desencarnação definitiva pode ocorrer. Quando isso está prestes a acontecer e não era para acontecer, ocorre a intervenção dos “seres de luz” acima analisados, intuindo-lhes, por telepatia, uma recomendação para regressar ao corpo. É a barreira final aludida nos casos de EQM, ou seja, uma “linha demarcatória”, no sentido figurado.

 

i Regresso ao corpo

 

Lembramos que a transição dessa vida para a vida puramente espiritual é um fenômeno natural, quando chega a hora e o espírito assim comanda e ordena a si mesmo. No entanto, o mesmo não se pode dizer da EQM, sendo esta, como o próprio nome está dizendo uma experiência da criatura humana, de natureza temporária e de curtíssima duração. Terminado o fenômeno, como vimos o espírito só encontra duas alternativas: ou desencarnar (morte definitiva) ou voltar ao corpo. Na EQM, terminada esta, o espírito regressa ao corpo.

 

5.2) Segundo caso

     

Temos aqui um caso típico de experiência fora do corpo - EFC (ou OBE – out-of body-experience), que ocorreu dias antes da intervenção cirúrgica e que reúne aspectos bem similares a uma EQM. Na verdade, ambos os casos referem-se ao fenômeno conhecido espiritualmente como desdobramento espiritual. Assim sendo, tudo o que fez parte das explicações que fizemos no primeiro caso se aplica igualmente aqui.

Há uma singularidade própria desse relato e, por isso mesmo, devemos dar o destaque necessário. Trata-se de um conhecimento pré-cognitivo, comum nos casos de premonição, em que o espírito ou a consciência parece vivenciar lugares e eventos que ainda estão por acontecer, envolvendo ou não outras pessoas. O exemplo refere-se ao próprio indivíduo que, apreensivo pelo que lhe pudesse acontecer durante a cirurgia, pois seu caso era muito delicado por sofrer também de enfisema pulmonar, desdobra-se (“sai do corpo”) com a ajuda de um “ser de luz” ou espírito superior e é levado até à UTI, atravessando portas e paredes através dos corredores do hospital. Neste local, o “espírito de luz” mostra ao “desdobrado” detalhes da chegada à UTI e a posição do leito em que ficará após a operação para que ele os memorize e os relate posteriormente aos seus médicos, deixando-os surpresos sobre esse conhecimento do paciente, pois ninguém sabia disso antes de acontecer, exceto o próprio paciente. Parece uma história fantástica, mas trata-se de fenômeno comum e muito estudado e praticado no espiritualismo.

Outro aspecto desse relato que vale a pena destacar é a presença de cores luminosas na forma que o “desdobrado” assumiu (de uma bola) durante sua vivência fora do corpo: laranja, amarelo e azul em diversas nuances. Estas e outras cores, presentes todo o tempo na aura das pessoas, decorrem dos sentimentos e variam em função destes e dos pensamentos que são vibrações, emitidas de acordo com o grau de espiritualidade da pessoa. Essas cores são registradas no perispírito das pessoas e, como este acompanha sempre o espírito, foram vistas por este durante sua caminhada ao longo dos corredores.

O episódio, ainda antes da operação, decorrente de uma reflexão profunda que o paciente fez e sentiu sobre sua recente vivência fora do corpo, aguçou-lhe a consciência e as emoções, levando-o a chorar e a tomar a decisão de escrever uma carta para sua esposa e outra para seu sobrinho, a quem sempre teve a nobre intenção de fazer dele um homem de caráter. Lendo a aura do paciente (seu “assistido”), o “espírito de luz”, percebendo que após o desdobramento por que passara, ainda ficaram resíduos do sentimento do medo da morte, mostra-lhe sua presença, dessa vez intuitivamente, através do diálogo (o paciente ouviu vozes), com o objetivo de confortá-lo e assegurar-lhe que tudo iria correr bem. Tomado de coragem, o paciente rasga as cartas que escrevera e aguarda confiante os acontecimentos que o levou a um final feliz. Este caso mostra o valor do pensamento positivo e altruísta na vida das criaturas, levando-as ao cumprimento do dever pelo livre-arbítrio voltado sempre para o bem, o que lhes garante o mérito por suas ações.

Nossa intenção ao inserir este capítulo em nosso livro foi a de corroborar os relatos de experiências de quase-morte (EQM), dando-lhes um significado espiritualista cristalino e sem misticismo, ainda não observado na vasta literatura consultada.

 

6.      Conclusão

 

Cerca de 20% de todas as pessoas declaradas clinicamente mortas passam por experiências de quase-morte – EQM, com todas as características ou com parte delas. É o resultado de uma pesquisa feita pelo Dr. Pim Lommel do Grupo Holandês do IANDS – International Association for Near-Death Studies (Associação Internacional para Estudos de EQM). Ele estudou e entrevistou 344 pessoas declaradas clinicamente mortas. Dessas, 18% passaram por EQM e 12% tiveram uma EQM profunda, isto é, com todas as características descritas no caso típico apresentado neste capítulo. (19)

Outra organização que recebe os relatos de pessoas que passaram pela EQM via Internet através de formulários cuidadosamente preparados é a NDERF – Near-Death Experience Research Foundation (20) (Fundação para Pesquisa de Experiências de Quase-Morte. Jody A. Long (21), usando um universo de relatos bastante expressivo de 626 casos, dos quais foram rejeitados 324 casos, em primeira mão, para 302 casos e, posteriormente, estes foram refinados para 280 casos, estudou e analisou as atitudes dos que passaram por EQM antes e depois das suas experiências. O estudo é bastante complexo, mas pinçamos alguns números: cerca de 220 (88%) pessoas narraram suas preferências religiosas antes de passar pela EQM; dessas, 199 pessoas (90,45%) disseram que mudaram de crença após a experiência. As mudanças de crenças e atitudes perante varias religiões foram apresentadas em uma tabela, destacando-se: 17% se deslocaram para a espiritualidade, 5% para as religiões cristãs, 5% para a religião católica, 3,5% para o paganismo e 3% para o Budismo. Curiosamente, não houve alteração (0%) entre os agnósticos. As demais pessoas que indicaram preferências religiosas, após a EQM, tiveram alteração menor que 2% ou não apresentaram alteração significativa.

A principal conclusão que podemos tirar desses e de numerosos outros estudos cuidadosos, sérios e representativos é que as experiências de quase-morte deixam uma marca profunda na mente das pessoas, levando-as a refletirem sobre aspectos da vida fora da matéria, da Força Inteligente (chamem de alma, espírito ou consciência) que cada um de nós somos e da preponderância dessa Força sobre a matéria (nosso corpo e nosso cérebro). Em um outro enfoque, reforça os valores morais e éticos da criatura.

Convém destacar que, praticamente em todos os relatos, as “pessoas” ou partes delas conservam as suas percepções e sentidos, ainda que afastados do corpo físico. Na doutrina espiritualista, a explicação reside no segundo corpo ou perispírito, que não só retém a memória e os sentidos como os aguça com extrema nitidez. Há casos de pessoas completamente surdas, que ouvem durante a EQM sem precisarem dos ouvidos físicos e, também, de pessoas completamente cegas, que enxergam durante a EQM, sem precisarem dos olhos da matéria. (20)

Outra conclusão importante, que nos leva a refletir, refere-se à perda do medo da morte, pois, a criatura passa a compreender que a morte não é o fim, mas o princípio de uma nova vida espiritual e representa apenas uma linha demarcatória entre o mundo do ponderável (da matéria) e o mundo do imponderável (do espírito). Mas, estas noções de espiritualidade, são apenas o começo de muitas revelações que hão de vir na medida em que a ciência se concentrar nos estudos dos fenômenos invisíveis que ocorrem fora da matéria e provêm da realidade espiritual do ser.

Os cientistas não duvidam mais da colossal quantidade de evidências observadas nos relatos de EQM. Resta, apenas, adaptar sua metodologia cientifica para esses e outros assuntos paranormais e transcendentais, que estão demandando a confirmação da Ciência, dentre eles, o estudo da mediunidade, a natureza do espírito, o pensamento, etc.

Não importa se a Ciência venha se intrometer no campo filosófico e vice versa; o que interessa é dar resposta cabal, inquestionável a esses assuntos de tanta relevância para a humanidade que está carente desses conhecimentos.

 

Referências deste capítulo:

 

 1) MOODY Jr., Raymond A. A vida depois da vida. São Paulo: Buterfly, 2004.

 2) MATTOS, Luiz de. Racionalismo Cristão. 43.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 2004.

 3) MATTOS, Luiz de. A Vida fora da matéria. 21.ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 1996.

 4) MATTOS, Luiz de. Prática do racionalismo cristão. 12.ed. Rio de Janeiro:Gráfica Portinho Cavalcanti, 1989.

 5) EVANS-WENTZ, W. Y (Org). O Livro tibetano dos mortos – com estudos introdutórios de C G. Jung e outros. São Paulo: Pensamento, 1960.

 6) WILLIAMS, Kevin. Scientific Theories of the NDE. Comentários do livro Death´s Door de Jean Ritchie. Disponível em: https://www.near-death.com/experiences/experts01.html. Acesso em: 14/12/05.

 7) BLACKMORE, Susan. Dying to Live. Disponível em: https://www.near-death.com/experiences/articles001.html.Acesso em 04/01/06.

 8) STONE, Greg. Dying to live by Susan Blackmore: Critique. Disponível em: https://www.visitunderthetree.com/NDE/NDEa.html. Acesso em 04/01/06.

 9) GOLDSMITH, T. C. The Evolution of Aging. Disponível em: https://www.azinet.com/articles/Aging_Evolution.html. Acesso em 04/01/06.

10) JANSEN, Karl l. R.. The ketamine model of the near-death experience. Disponível em: https://www.mindspring.com/~scottr/nde/jansen1.html. Acesso em 04/01/06.

11) TEMPORAL LOBES. Acesso em 04/01/06. Disponível em: https://www.neuroskills.com/index.html?main=tbi/btemporl.shtml

12) NINDS CEREBRAL HYPOXIA INFORMATION. Bethesda: National Institute of Neurological Disorders and Stroke. Disponível em: https://www.ninds.nih.gov/disorders/anoxia/anoxia.htm. Acesso em 04/01/06.

13) SABOM, Dr. Michael. Light and Death (estatística). Disponível em: https://www.near-death.com/experiences/experts07.html. Acesso em 04/01/06.

14) SCHYZOPHRENIA: Pshycotic hallucinations. Disponível em: https://www.emedicinehealth.com/articles/18995-1.asp. Acesso em: 04/01/06.

15) STEINBERG, Marlene and Schnall, Maxine. Strangers to ourselves. Disponível em: https://www.depersonalization.info/overview.html. Acesso em 04/01/06.

16) DOUGHERTY, Sarah Belle. Mysteries of prenatal consciousness. Disponível em: https://www.theosophy-nw.org/theosnw/issues/sx-sbd2.htm. Acesso em04/01/06.

17) MORSE, Melvin. Where God lives (article on Dr.Melvin Morse). Disponível em: https://www.near-death.com/experiences/experts06.html. Acesso em 04/01/06.

18) RING, Kenneth. Mindsight (blinds). Disponível em: https://www.near-death.com/experiences/experts04.html.Acesso em 04/01/06.

19) Lommel, Pim. – Dutch NDE Study (comments by). Disponível em: https://www.mikepettigrew.com/afterlife/html/dutch_study.html. Acesso em 04/01/06.

20) AUTORES, Diversos. Site Contents/Index. Disponível em: https://www.nderf.org/site_index.htm. Acesso em 08/01/06.

21) LONG, Jody A. Near-death esperience, religion and spirituality.  Disponível em: https://www.nderf.org/religion_spirituality.htm. Acesso em 08/01/06.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO 17

 

 

REGRESSÃO ÀS VIDAS PASSADAS

 

 

A memória de um evento passado, seja de outra vida ou não, possui três elementos principais: pensamento, emoção e sensação. Ou seja, toda memória é composta da lembrança dos fatos que ocorreram e do que pensamos sobre eles, das emoções sentidas neste mesmo momento e das sensações experienciadas no corpo. A mente grava tudo o que acontece nos seus mínimos detalhes. Uma vez gravado, este passado pode continuar repercutindo no presente.

Morris Netherton, introdutor da TRVP no Brasil.

 

Os estudiosos desse assunto, tão em voga hoje em dia, ponderam que os aspectos referentes à regressão de memória remontam a épocas muito antigas. No antigo Egito, os sacerdotes-médicos, como Hermés, a usavam promovendo o desdobramento espiritual dos pacientes, por meio de técnicas de indução magnética de relaxamento, amplificando a sua percepção. Dessa forma conseguiam chegar à memória extra-cerebral (subconsciente) e tomar conhecimento das causas profundas de seus males psicológicos e explicar muitas causas aparentemente físicas.

O Conde Engenheiro Eugéne-Auguste Albert de Rochas d´Aiglun (1836-1914), destaca-se (1) como um dos pioneiros na introdução das técnicas de regressão de memória, conhecimentos que divulgou através de sua obra, Les Vies Sucessives. Seguiram-lhe outros grandes psicólogos e psiquiatras de nosso tempo, como Stanislav Grof, Helen Wambach, Edith Fiore, Roger Wolger, Patrick Drouot (físico) e Brian Weiss (psiquiatra). O conde de Rochas serviu, portanto, de referencial nas diferentes culturas, por ter usado, pela primeira vez, técnicas de indução, como a hipnose, que é a que direciona mais diretamente os terapeutas a tomarem contato com outras realidades até então desconhecidas, levando muitas pessoas à reformulação da sua ideologia de vida. Muitos desses terapeutas escreveram obras de divulgação e transformaram-se em best sellers, como Brian Weiss, Edith Fiore e Helen Wambach.

Esses psicólogos e psiquiatras passaram a adotar técnicas psicoterapêuticas que permitem levar o paciente a um estado alterado de consciência, com o objetivo de resgatar memórias ou reminiscências traumáticas do seu passado. Teorizam que estas memórias estejam bloqueadas pelo consciente e reprimidas ou bloqueadas no inconsciente e, que causam transtornos de ordem psicossomática, certos problemas orgânicos, bem como, problemas que dificultam o relacionamento interpessoal. Portanto, o uso da regressão de memória é um recurso, método de trabalho ou técnica baseada na hipótese que há fatos traumáticos do passado que influem e trazem desajuste, problemas e conflitos de variada natureza na vida presente de muitas pessoas. Essa técnica passou a ser conhecida com a sigla de TRVP, que tem o significado de Terapia Regressiva a Vivências Passadas ou Terapia de Regressão às Vivências Passadas, ou ainda, Terapia de Regressão às Vidas Passadas.

A maneira como estes pesquisadores foram levados ao descobrimento e ao uso, hoje bastante difundido, das técnicas terapêuticas de regressão às vivências passadas (TRVP), varia, mas na sua essência liga-se ao processo intuitivo. É o que o leitor poderá inferir do que se segue.

A Dra. Helen Wambach (1), americana, psicóloga no Centro Médico de Monmouth de Long Branch, Nova Jersey, USA e catedrática na Faculdade local, pesquisadora dinâmica e ativa, nos conta que, ao subir a escadaria de uma biblioteca sentiu a sensação de que estava em outro local e em outro tempo. Levou um susto, recuperou-se e, em seguida, adentrou-se à biblioteca e foi direta e automaticamente pegar um livro que sentira ter sido seu.  Qual não foi a sua surpresa ao perceber, através de uma visão projetada em sua mente, que estava cavalgando uma mula que percorria uma longa pradaria com aquele livro apoiado no arreio da montaria. Era um lugar ensolarado e o sol queimava suas costas e aquecia suas rústicas roupas. Enquanto essa visão ocorria, lia sobre a vida de um sacerdote que estava à beira da morte, num período em que ele esteve em coma.

Já a Dra. Edith Fiore (1), americana, catedrática da Universidade de Miami, Florida, USA, autora do livro You have been here before, nos conta que, ao tratar de um paciente hipnotizado que sofria de inibições de natureza sexual, ele teria dito: “duas ou três existências atrás fui padre católico” e, em seguida, narrou suas vivências como sacerdote italiano que teria vivido no século XVII. O que foi mais surpreendente para ela foi que, após analisar suas vivências, esse paciente ficou curado de suas inibições.

O Dr. Patrick Drouot (2, 3, 4), que é físico francês, autor de vários livros de divulgação tratando de espiritualidade, da reencarnação, do desdobramento espiritual e da terapia de vidas passadas, adotando a explicação reencarnacionista, escreveu, Nós somos todos imortais (2), Reencarnação e imortalidade (3) e Memórias de um viajante no tempo (4).

 O Dr. Brien Weiss (5), que é médico psiquiatra americano, formado em 1966 pela Universidade de Colúmbia e, em 1970, pela Escola de Medicina da Universidade de Yale, iniciou sua carreira como médico residente no Hospital Mount Sinai da Universidade de Miami nos diz que era cético. Como pesquisador, publicou 37 ensaios na área de psiquiatria, quando começou seus estudos com regressão. Seus estudos e seu passado não o prepararam para as surpresas que iria encontrar no seu trabalho como psiquiatra. Sabia dos estudos sobre parapsicologia que estavam sendo feitos nos Estados Unidos e no mundo, mas eles nunca lhe despertaram interesse, por lhe parecerem muito superficiais.

Com os métodos convencionais de terapia, até então por ele utilizados com poucos progressos, submeteu ao tratamento terapêutico, por 18 meses, uma paciente com o pseudômino de Catherine, que ele apresentou em seu primeiro best seller, Muitas vidas muitos mestres (5). Quando nada parecia funcionar utilizou a hipnose e qual não foi a sua surpresa, ao verificar, através de uma série de transes hipnóticos, que sua paciente recordara-se de fatos ligados às suas vivências ocorridas em vidas passadas. Mas, o seu ceticismo só desmoronou-se definitivamente quando a paciente passou a receber mensagens de natureza espiritual com revelações sobre a sua vida pessoal, que ele verificou serem verdadeiras.

Lemos, no prefácio do seu livro citado (5):

 

Não tenho uma explicação científica para esses fatos. Há muitas coisas acerca da mente humana que se encontram além de nossa compreensão. Talvez, hipnotizada, Catherine tenha sido capaz de focalizar parte de seu subconsciente que armazenou lembranças reais de vidas passadas, ou, quem sabe, ela tenha interceptado aquilo que o psicanalista Carl Jung denominou de inconsciente coletivo, a fonte de energia que nos cerca e que contém a memória de toda a raça humana.

 

Os cientistas estão começando a procurar essas respostas. Enquanto sociedade, temos muito a ganhar sobre os mistérios da mente, da alma, da continuação da vida após a morte e da influência das experiências de vidas passadas no nosso comportamento atual. É óbvio que as ramificações são ilimitadas, principalmente nos campos da medicina, psiquiatria, teologia e filosofia.

 

A este livro, seguiram vários outros que ajudaram a divulgar e a chamar a atenção para a hipótese reencarnatória desses fenômenos, como: Meditando com Brian Weiss (6), A Divina sabedoria dos mestres (7) e Muitas vidas, uma só alma (8), editadas no Brasil. Nessas obras, fruto da observação de cerca de 10.000 casos de regressão individual e em grupo, Brian Weiss confirma o seu entendimento sobre a espiritualidade dos fenômenos. Da referência (6), destacamos, à p. 11:

 

Hoje, acredito que não somos somente humanos, nem mesmo seres humanos que, eventualmente, desfrutam de experiências espirituais, mas seres espirituais que têm experiências humanas. Possuímos diversas dimensões que podemos vivenciar e das quais podemos usufruir. Temos em nosso espírito possibilidades acima do tempo e das limitações físicas. E há muitas formas de entrarmos em contato com o Eu Superior que abrigamos. Trata-se de um caminho no qual quanto mais avançamos, mais nos tornamos capazes de alcançar graus cada vez mais altos de espiritualidade.

Da referência (7), destacamos os dizeres contidos na mensagem deixada na sua contracapa:

 

Acredito que o maior objetivo de nossas vidas é atingir o conhecimento íntimo de que somos almas imortais, trazidas a esta grande escola chamada Terra para aprender lições sobre amor, compaixão, paciência, equilíbrio e harmonia, não-violência, fé e esperança, relações amorosas e assim por diante. O aprendizado dessas lições é a única esperança para a humanidade.

 

Finalmente, ainda com Brian Weiss, na sua última obra lançada no Brasil em Novembro de 2005, Muitas vidas, uma só alma (8), ele aventura-se no planejamento de vidas futuras, através do condicionamento do paciente e escolha de uma entre várias possibilidades. Na verdade, sua visão nos leva à questão do uso do livre-arbítrio, um dos atributos espirituais de que somos dotados e que é tratado na nossa obra de forma própria em capítulo à parte. São suas palavras, extraídas da contracapa de seu livro citado, referindo-se à progressão às vivências futuras (8):

 

Descobri que essas pessoas [seus pacientes] passaram a tomar decisões mais sábias e a fazer escolhas melhores. Podiam olhar para uma próxima encruzilhada e pensar: Se eu escolher esse caminho, o que vai acontecer? E se eu escolher aquele outro? Às vezes, a visão de futuro se concretizava.

 

Podemos ir até o futuro se o fizermos com sabedoria. O futuro, próximo ou distante, pode ser o nosso guia, repercutindo no presente e nos influenciando a tomar decisões e fazer escolhas melhores. Podemos mudar o que estamos fazendo agora com base no que o futuro nos mostra, E isso muda o nosso destino positivamente.

 

Nós estamos interessados em examinar mais de perto a questão da regressão às vidas passadas, pois o futuro nesta vida depende do uso que fazemos de nosso livre-arbítrio e de tantos outros fatores, de planejamento espiritual anterior à reencarnação feito em outro plano ou dimensão. 

 

1.      TRVP e a hipnose

 

Não convém perder de vista que, de um modo geral, todas as terapias são regressivas e seu objetivo é fazer o paciente regredir até ao fato traumático causador de seu problema atual. Ao chegar a esse ponto, o paciente experimenta um grande conteúdo organo-sensorial, momento em que o terapeuta utiliza uma técnica de relaxamento, desprogramando as emoções causadoras do trauma, curando o paciente por meio de um trabalho de auto-resolução de conflitos vivenciais. Tudo isso dentro da linha de orientação psicoterapêutica transpessoal. Mesmo assim, a cura não é tão fácil e rápida assim: pode levar de dez a vinte sessões de duas horas cada.

De outro lado, é sabido que um dos principais objetivos da hipnose é provocar estados alterados de consciência. Ela tem vários níveis de atuação: superficial, médio, profundo e sonambúlico. Somente nos dois últimos casos, o paciente não tem consciência para saber o que está vivenciando. A terapia de regressão utiliza a hipnose no estado hipnoidal superficial e em alguns casos, no estado médio, suficientes para promover um relaxamento físico e mental em que as ondas cerebrais estariam vibrando no modo alfa. Trata-se de algo semelhante ao estado de torpor, que antecede ao sono.

 

2.      Técnicas de Regressão

 

A terapia de regressão foi introduzida no Brasil (1) pelo Dr. Morris Netherton (Ph. D.), por volta de 1981. Seus estudos sobre a influência das vidas passadas na vida atual, nos Estados Unidos, iniciaram-se nos anos 60. A partir destes estudos, ele desenvolveu o seu reconhecido método de acesso a estas memórias passadas. Em 1978, publicou nos EUA, seu primeiro livro intitulado, Vidas passadas - uma abordagem psicoterápica. A partir desta data vem ensinando a Terapia de vidas passadas (TVP) em inúmeros países, entre eles, Suíça, Alemanha, Holanda, Canadá, Índia e Brasil, além dos Estados Unidos.

Atualmente dirige, na Califórnia, a AAPLE – Association for the Alignment of Past Life Experience. Nestes mais de 30 anos de experiência em TVP ele acumulou um dos mais respeitáveis currículos da história da psicologia. Baseado nesta experiência ele afirma que a TVP “não está, de modo algum, associado ao ocultismo, exceto quanto ao fato de compartilhar da aceitação da possibilidade da reencarnação”. Afirma também que “acontecimentos de vidas precedentes podem produzir efeitos tão devastadores no comportamento atual de um paciente quanto qualquer coisa que lhe aconteça nesta existência” e que a Terapia de Vidas Passadas é eficiente mesmo naqueles que não acreditam em reencarnação. São ainda dele estas palavras (9): “A TVP não realiza cura milagrosa. O paciente é responsável por sua própria melhora. Pode ele mediante um intenso trabalho e concentração, deixar o seu passado para trás e impedi-lo de interferir no presente, possibilitando assim que toda a força do seu potencial humano se concretize”.

Apenas como ilustração, apresentamos como ocorre uma sessão típica de terapia de regressão às vidas passadas (10), a seguir. De início, o terapeuta procura assegurar ao paciente um ambiente calmo e agradável. Já na primeira consulta, o terapeuta discutirá com o paciente seus pensamentos e metas que deseja alcançar com a terapia que vai aplicar. Em seguida, o terapeuta encorajará o paciente a fechar os olhos e relaxar. É comum sugerir imagens para ajudá-lo a relaxar e entrar em um estado de vibração mental alfa ou delta. Isto permitirá ao paciente tornar-se mais receptivo a imagens que provêm do subconsciente – o lugar onde suas memórias de vidas passadas são guardadas. Seu subconsciente armazena milhões e milhões de memórias, mas apenas algumas delas têm interesse no caso. O que importa é acessar aquelas que se relacionam com o problema que está presente em sua vida atual. Esta fase de relaxamento é atingida mediante uma orientação modular, guiada pela voz do terapeuta. Assim que for atingido o relaxamento total, o terapeuta orienta o paciente a explorar sua vida passada. Durante essa fase o paciente é solicitado a explorar cenas em outro tempo e local de sua vida. O paciente será conduzido através de vários incidentes-chaves de sua(s) vida(s), focalizando as experiências que teve com emoções não resolvidas, problemas e conflitos. Este processo utiliza metade do tempo da sessão; a outra metade é dedicada a curar os efeitos dos padrões de pensamentos negativos, emoções e traumas físicos que estejam perturbando o paciente na vida atual. A maioria das sessões de regressão dura entre noventa minutos a duas horas.

É claro que, decorridos longos anos de aplicação da TVP em outros países, com técnicas cada vez mais aprimoradas, muitas técnicas terapêuticas de regressão surgiram no Brasil. Uma das técnicas disponíveis, no Brasil, é conhecida como Técnica Peres (11), desenvolvida, sistematizada e aperfeiçoada ao longo de vinte e cinco anos com base na Técnica Netherton, tendo sido aplicada em cerca de 10.000 mil pacientes.

A Técnica Peres, segundo a médica e psicóloga Maria Júlia Pereira de Moraes Prieto Peres, sua desenvolvedora (11), “utiliza recursos da psicanálise, da análise transacional, da terapia centrada na pessoa, da gestalt, da terapia rogeriana, da programação neurolinguística, de treinamento autógeno, da sofrologia, da visualização criativa, da imaginação ativa e outros recursos que na medida da necessidade da minha experiência eu fui adotando”.

Sua autora realiza, também, cursos de especialização, ensinando a sua Técnica de Terapia Regressiva às Vivências Passadas a psicólogos e psiquiatras. Contudo, qualquer que seja a técnica, o objetivo é provocar um estado alterado de consciência e aplicar a terapia de regressão às vivências passadas. Maria Peres foi presidente do Instituo Nacional Brasileiro de Terapias Regressivas a Vivências Passadas (INTV).

 

3.      Vidas passadas e vivências passadas

 

Alguns psicólogos enxergam uma diferença a ser considerada entre “regressão às vivências passadas” e “regressão às vidas passadas”. Esta diferença ocorre por que os traumas do passado não têm que ser necessariamente oriundos de supostas vidas passadas. Eles podem ter se originado, também, da vida intra-uterina, de problemas durante o nascimento e de vivências da infância e da adolescência; podem, até mesmo, terem (11) “ocorrido ontem, na semana passada, no mês passado, no ano passado, enfim, em qualquer etapa da vida atual e não, obrigatoriamente, em supostas vidas passadas”. A palavra, “supostas” serve para resguardar aqueles que não são reencarnacionistas.

 

4.      Modelos explicativos

 

Consultando a literatura sobre os modelos explicativos da regressão de memória vamos encontrar muitas hipóteses de explicação. No Curso proferido por Maria Peres (5) ela aponta 31 explicações, mas ela própria adota o modelo reencarnacionista. Há, ainda, muita polêmica a respeito. Entre espíritas e espiritualistas existe muita divergência e duas correntes. Há uma corrente que defende esta teoria, mesmo estando na contramão de um de seus princípios (o esquecimento das vidas passadas, após a reencarnação, é uma lei natural); existe outra corrente que alega tratar-se de uma terapia espírita e, portanto deveria ser exercida nos recintos da doutrina espírita, Vejamos o que disse Maria Peres em (11):

 

Ora, nós não vivenciamos uma vida inteira, a pessoa “recorda-se” apenas do episódio traumático relacionado com o problema em que se esta a trabalhar. A outra parte defendia que se tratava de uma terapia espírita, e que deveria, como tal, ser feita, em centros espíritas. Eu então defendi a tese, e passei a divulgá-la, até agora, que esta não e uma terapia espírita, é uma terapia como outra qualquer, exercida apenas por médicos e psicólogos, muito bem treinados nesta área, e como tal, exercida em nível de consultório, com o máximo respeito pelo cliente, pelo sigilo e pela ética profissional.

 

Em ambos os casos trata-se de diferentes opiniões sobre a teoria reencarnacionista, mas há outras explicações, como vimos. O terapeuta pode não ser reencarnacionista e utilizar outros modelos teóricos explicativos da regressão de memória. Cada terapeuta tem suas próprias convicções para explicar o fenômeno, já que o objetivo da regressão de memória é simplesmente terapêutico, não o de transformar as convicções de seus pacientes. Cada um, terapeuta e paciente, têm o livre-arbítrio de escolher suas próprias convicções. Mas, a influência reencarnacionista prepondera entre os membros do grupo de terapeutas no Instituo Nacional Brasileiro de Terapias Regressivas a Vivências Passadas (INTVP).

Uma das grandes perguntas, com muitas respostas explicativas e sem nenhuma definitiva, é saber onde é que fica armazenada essa memória. Há os materialistas que argumentam que tudo está no cérebro e nas reações neuronais. Jung propôs o modelo do inconsciente coletivo, uma espécie de “coletor-armazenador” de todas as memórias que ocorrem no mundo, onde aquele que precisasse de uma determinada memória, bastava acessá-lo. Freud propôs e adotou um modelo psicodinâmico. Kenneth Ping introduziu um modelo baseado na filosofia transpessoal. Enfim, existem muitos modelos para explicar esta questão. Há uma frase corrente em psicologia que diz “que o inconsciente é apenas um mapa e um mapa é uma representação do território, não é o território”.

Não é nossa intenção explorar todos os modelos explicativos correntes. Sabemos que muitos terapeutas e pacientes constrangem-se em adotar a teoria da reencarnação como embasamento da terapia regressiva, a qual ainda não é reconhecida pelas associações científica às quais estão vinculadas as especialidades de psicologia e psiquiatria. Adotam, então, o modelo apoiado em Freud, Jung e outros notáveis, trabalhando com a idéia do inconsciente, tanto que em vez de “Terapia de Vidas Passadas”, preferem “Terapia de Vivências Passadas”, sendo muito sutil essa diferença conceitual.

Por mais que muitos adotem a teoria da reencarnação como embasamento da terapia regressiva, que ainda não é reconhecida pelos meios científicos convencionais, alguns constrangem-se em ostensivamente adotar tal modelo, criando outro alternativo, apoiado em Freud, Jung e outros notáveis e trabalhando com a idéia de inconsciente.

 

5.      Objetivos alcançados

 

Não existe nenhuma terapia cem por cento, bem sucedida, mas os melhores e mais bem treinados terapeutas (psicólogos e psiquiatras) alcançam (11) “altas percentagens de êxito, respeitadas as suas indicações e contra-indicações, pois não é uma panacéia que venha resolver todos os problemas de todas as pessoas”. O terapeuta bem compenetrado de seu papel o exerce no sentido de orientar seus pacientes a vencerem as dificuldades que estão vivenciando; por isso mesmo, a regressão não deve ser informativa nem interpretativa, mas unicamente vivencial.

 

6.      Tipos de vivências

 

Há uma idéia geral de que os pacientes, nas supostas regressões às vidas passadas, assumem o papel de personalidades que tenham sido importantes no passado, como reis, rainhas, personalidades notáveis e históricas, heróis de guerra, etc. Os terapeutas nos dizem que não há nada de mais errado do que esse pensamento e as estatísticas desses profissionais informam que raramente os pacientes regridem a personagens como os indicados. Ao contrário, os tipos são os mais comuns, de todas as classes sociais e culturais que possa-se imaginar.

O mais importante e isso acontece, é que os pacientes regridem a ambientes e situações vivenciadas dolorosas e de medo, como tortura, guerra, mortes por acidentes, incêndios, afogamento, soterramento, estupros, crimes passionais, etc. As situações de medo são muito comuns: medo do escuro, de altura, de águas profundas, de ambientes fechados (claustrofobia), de multidões e muitas outras. Curioso é que algumas situações são devidas às condições do nascimento (uso de fórceps, por exemplo, que deixa marcas de nascença ou cefaléia crônica).

 

7.      Técnicas e métodos

 

Em geral, os institutos profissionais agregam especialistas que adotam uma explicação comum, embora não haja exigência para que assim seja. É natural que assim seja, pois existe uma lei natural que nos diz que os afins se atraem. Dada à grande diversidade de explicações, é também natural que existam outros institutos em muitos países. Também, não é incomum que certos especialistas adotem uma linha própria de explicações sem filiar-se a nenhuma instituto ou associação. É, também, conhecido que decorridos tantos anos da introdução das técnicas de regressão às memórias passadas até aos dias de hoje, há uma maior abertura e os procedimentos a que se referem são mais aceitos pela comunidade científica e pela população em geral. O que interessa, no caso, são os resultados que os pacientes obtêm.

Os institutos e associações de classe desempenham, também, um papel relevante para evitar que pessoas não qualificadas venham exercer esses procedimentos, como por exemplo, pessoas que não são médicos, psicólogos e psiquiatras. Mesmo assim, há terapeutas que não têm formação universitária, pois alguns cursos técnicos proliferam por aí. Muitos aprendem essas técnicas em livros de boa qualidade, que são traduzidos no Brasil. Assim, qualquer pessoa que tenha acesso a tais obras, pode levianamente começar a fazer regressões, daí podendo resultar o aparecimento de certas aberrações, piorando os problemas dos pacientes em vez de corrigi-los ou curá-los.  

É possível impedir que certas contra-indicações possam ocorrer, combatendo-as ou minimizando-as, mediante o uso de um código de ética. Muitos terapeutas de regressão fazem, na primeira consulta apenas uma pré-avaliação das condições dos pacientes, ocasião em que se verifica se há contra-indicações. Alguns casos de contra-indicações incluem: mulheres gestantes, pessoas hipertensas, crianças até dezoito anos. Uma extensa ficha de avaliação psico-médica é levantada nas primeiras sessões, para avaliar se o tratamento deve prosseguir ou ser interrompido. É comum nas três primeiras sessões descobrir condições de extrema tensão devida aos castigos e injustiças que o paciente recebeu de seus pais. De modo geral, a terapia dura de 10 a 20 sessões o que é bastante rápido em relação às terapias comuns. O paciente recebe recomendações e orientações para sair de sua situação de sofrimento o mais rápido possível, aprendendo a atuar por si mesmo no intervalo das sessões. Dessa forma, ele vai reformular o seu padrão de comportamento para um novo modelo de vida.

Outro aspecto a considerar são certos “acidentes de percurso”, que teoricamente poderiam ocorrer durante a regressão, como por exemplo, dificuldade de “regressar”, isto é, o paciente não aceitar ou tornar-se refratário às técnicas de desprogramação. Estas precisam desvincular a emoção do trauma que o paciente vivenciou. Situações desse tipo podem não ser evitadas por terapeutas inadvertidos, do tipo autodidata, que já foi mencionado antes. Mais grave ainda, seria praticar a auto-regressão, que pode estar cercada de perigos, o que (5) “iria agravar o seu problema ou desencadear um outro problema que até então estava reprimido e desconhecido por ela”.

 

8.      Os perigos da auto-regressão

 

É possível realizar a auto-regressão, mas não é recomendável. É sempre um procedimento perigoso ou de risco, embora existam livros que a recomendam. Se uma situação bastante incomum ocorrer durante a auto-regressão, o terapeuta estaria sozinho e as eventuais providências de que viesse necessitar, não estariam ao seu alcance. Como realizar, por si mesmo, a desprogramação e o retorno, necessários numa sessão de regressão? A desprogramação é um “apagamento”, feito mediante certas frases, especialmente elaboradas para isso, que o terapeuta diz ao paciente e este, no estado alterado de consciência, assimila e grava no seu inconsciente. Um exemplo (11):

Assim, por exemplo, se o paciente vivenciou o fato traumático de que caiu por um barranco abaixo, tendo sofrido um traumatismo craniano do qual veio a morrer, o que lhe causava medo das alturas e cefaléia crônica, por exemplo, ao recorda-se do fato, se está na rua, a uma janela, em qualquer lugar, ele pode lembrar-se tranqüilamente daquilo, sem sentir o medo. Sem a desprogramação, ele continuaria a sentir a “recordação” penosa. Depois da desprogramação, nós fazemos uma programação positiva, pela indução de outras frases, para que o paciente também as assimile no sentido de melhorar o seu modelo de vida.

 

Pelo código de ética, jamais o terapeuta poderá programar o paciente de forma perversa. A programação do paciente sempre deve ser bem feita e respeitar os padrões, os valores e o sistema de crenças do paciente, para não induzi-lo a coisas que ele não deseja, como por exemplo, tentar mudá-lo de religião. As ordens têm que ser genéricas e úteis ao paciente e a toda e qualquer pessoa. São frases de autoconfiança, auto-ajuda, de serenidade, de paz, de calma, etc. Em outras palavras, deve-se respeitar o seu livre-arbítrio e isto faz parte do treinamento do terapeuta.

Normalmente, depois do retorno e finalização, o paciente é chamado pelo nome; aliás, esse é a único momento em que ele é chamado pelo seu nome, mencionando-se a data e o local em que está para que não fique como se estivesse numa outra situação do passado. Finaliza-se a sessão induzindo-se o paciente para que saia da sessão perfeitamente bem e sinta todas as partes do seu corpo, para eliminar a sensação de relaxamento pelo qual passara durante a sessão de regressão.

 

9.      Contra-indicações

 

Devido ao conteúdo emocional que certas situações traumáticas podem acarretar ao paciente é senso comum entre os psicoterapeutas evitar fazer o tratamento regressivo nas seguintes condições:

 

i Crianças com idade inferior a dezesseis anos

i Idosos com idade superior a sessenta anos

i Gestantes (a descarga emocional afeta o feto)

i Pessoas psicóticas

i Pessoas cardíacas

i Pessoas obsedadas (pode se desequilibrar mais ainda por interferência de obsessores, em vista de sua sintonia com espíritos desencarnados).

 

Sobre os obsedados, obviamente não há consenso. O mesmo acontece com relação a curiosos, desprovidos de qualquer trauma, pois a terapia deve ser usada por profissionais treinados com o objetivo de curar certos traumas e não de pesquisa ou para satisfazer a curiosidade alheia.

Outro aspecto da questão é o que vem sendo debatido por muitos terapeutas de formação espírita, em que alguns defendem o ponto de vista que a mesma deveria ser feita em centros espíritas, restando a contra-argumentação que se ali feita, deveria ser graciosa, nada se podendo cobrar. O problema esquenta mais ainda quando se considera que o Espiritismo advoga o pleno esquecimento das vidas passadas, para que melhor ocorra a evolução na presente encarnação. O tema é muito polêmico.

 

10.  Dois casos confirmados

 

A seguir, são apresentados dois casos de regressão, que foram devidamente documentados e amplamente divulgados como confirmados pelas investigações realizadas, sendo referidos como boas evidências da existência da reencarnação.

 

i Caso Ray Bryant (jornalista)

 

Este caso de regressão, ocorrido na Inglaterra, em 1983, nos proporciona boa evidência para convencimento da existência da reencarnação (12). Certo dia, o Dr. Joe Keeton, foi procurado por Ray Bryant, jornalista do Evening Post, de Londres, para o qual trabalhava. Este jornal havia encomendado a ele uma série de artigos sobre o tema da paranormalidade, inclusive para enfocar, em um desses artigos, as evidências de reencarnação. Para dar à matéria um enfoque pessoal, o jornalista propôs a Keeton que o hipnotizasse embora Bryant nunca o tivesse sido. Keeton aceitou o desafio, pois estava interessado em pôr à prova suas próprias habilidades.

Sob efeito da regressão hipnótica, Bryant lembrou de várias personalidades que tinha sido no passado, inclusive a do soldado Reuben Sttaford, que lutou na Guerra da Criméia. De acordo com as lembranças de Bryant, este soldado, ao retornar à Inglaterra, passou os últimos anos da vida trabalhando como barqueiro no Tâmisa. Ainda, de acordo com as memórias da regressão, a vida de Sttaford começou em 1822, quando ele nasceu em Brighthelmston e terminou no ano de 1879, quando morreu afogado em um acidente, em Londres. Em sua personalidade anterior, o jornalista londrino adquiriu um acentuado sotaque da região de Lancashire, detalhe que refletia o fato de que Stafford passara grande parte de sua vida no norte da Inglaterra. Ainda que se tratasse de algo impressionante, o fato em si não constituía prova de nada, sendo assim, após testemunharem a manifestação do soldado vitoriano, dois membros da equipe de Keeton, Andrew e Margaret Selby, foram buscar evidências da existência real daquele homem.

Em Londres, na biblioteca Guildhall, o casal teve a sorte de encontrar uma lista com nomes de vítimas da Guerra da Criméia. Dela constava o nome do sargento Reuben Stafford, que servira no 47º Regimento de Infantaria de Lancashire e fora ferido na mão, na Batalha dos Quarries - um combate de pouca importância ocorrido durante o cerco de Sebastopol. O documento também fornecia detalhes da carreira posterior do sargento, que havia recebido condecorações por bravura antes de ser reformado.

 Na sessão de hipnose seguinte, essas informações saíram espontaneamente da boca de Ray Bryant. A data, o local e o nome da batalha foram recordados por ‘Sttaford’, assim como outros fatos da sua carreira militar. Todos absolutamente corretos.

Mas a pesquisa do casal Selby não terminou aqui. Trabalhando alguns dias nos registros do cartório, descobriram a certidão de óbito de Reuben Sttaford e puderam verificar que o militar morrera por afogamento, tendo sido enterrado em East Ham.

Será que esses fatos poderiam ser conhecidos sem alguma forma de reencarnação? Na regressão do jornalista a possibilidade de que a ‘memória escondida’ tenha sido ativada praticamente não existe, pois os dados biográficos do soldado morto não eram publicamente conhecidos. A não ser que se considere Keeton e seus voluntários como impostores, o retorno do veterano da Guerra da Criméia no corpo do jornalista do século XX é bem mais que uma mera hipótese.

 

i Caso James Johnston (o homem-do-submarino)

 

Este caso diz respeito à investigação da vida de uma personalidade, James Johnston, que morreu na II Guerra Mundial a bordo de um submarino dos Estados Unidos. Esta vida passada foi descrita por um paciente que sofria de claustrofobia e medo de água, submetido à terapia regressiva hipnótica, em 1987. Como se fosse James, o paciente contou a historia como tripulante do USS Shark (SS-174), estacionado na baía de Manila no início das hostilidades com o Japão. Ele descreveu sua vida antes de entrar na Marinha, bem como, as operações pré-guerra do Shark. Ele identificou outros membros da tripulação e a natureza das operações no mar. Em 11 de fevereiro de l942 o Shark foi afundado por uma carga de profundidade lançada pelo inimigo. James descreveu a seqüência imediata de atividades durante o ataque do destróier japonês e a inundação progressiva que teve lugar durante o afundamento do Shark. O desprendimento do espírito do corpo de James foi relatado. O paciente nasceu em 1953, bem depois do episódio relatado.

Rick Brown, o hipnoterapeuta, que conduziu a terapia e a investigação subseqüente, obteve documentos do Civilian Conservation Corps, da Marinha americana, bem como, os dados pessoais e data de nascimento da escola onde James havia estudado. Brown conduziu a pesquisa das operações navais descritas por James nos Arquivos Operacionais do Centro Naval Histórico dos Estados Unidos. Ele visitou a cidade natal de James, em Alabama, onde entrevistou diversos amigos e parentes. A maior parte das recordações de memória de James obtidas durante a regressão foi verificada através dessas fontes. Um vídeo documentário desse caso foi preparado, após a investigação.

 

11.  Conclusão

 

Ao final, podemos fazer algumas reflexões importantes sobre essas técnicas, hoje tão difundidas na nossa cultura como um dos processos conhecidos como medicina alternativa, usada para curar certos traumas e fobias. Elas indicam que somos seres preexistentes, pois são numerosos os casos que puderam ser comprovados e, isso, surpreende até mesmo os terapeutas. De forma geral, elas revelam a importância dos cuidados durante a gestação, que introduz efeitos psicosomáticos sobre o feto extensivo à vida das crianças e mostra-nos que somos seres sobreviventes à morte biológica.  Mais que isso, estas experiências alertam-nos sobre a realidade das intervidas, ou seja, de vivermos no mundo dos espíritos ou plano espiritual antes de decidirmos voltar a um novo corpo material (reencarnar) para novas experiências de aprendizado e aperfeiçoamento para a nossa individualidade espiritual.

 

Referências desse capítulo:

 

 1) LIMA, J. L. Niederauer de. Terapia de vidas passadas. Disponível em: https://paginas.terra.com.br/religiao/confrariaconsolador/terapia.htm. Acesso em 20/03/06.    

 2) DROUOT, Patrick. Nós somos todos imortais, São Paulo: Record, 1995.

 3) DROUOT, Patrick. Reencarnação e imortalidade. Rio de Janeiro: Nova Era, 1997.

 4) DROUOT, Patrick. Memórias de um viajante no tempo. Rio de Janeiro: Nova Era, 1997.

 5) WEISS, Brian L. Muitas vidas, muitos mestres. Rio de Janeiro; Salamandra, 1998.

 6) WEISS, Brian L. Meditando com Brian Weiss. 6.ed. Rio de Janeiro: Sextante, 1998.

 7) WEISS, Brian L. A divina sabedoria dos mestres. 11.ed. Rio de Janeiro: Sextante,  1998.

 8) WEISS, Brian L. Muitas vidas, uma só alma. Rio de Janeiro: Sextante, 2005.

 9) MESQUITA, Regis. Morris Netherton. Disponível em: https://t-v-p.vilabol.uol.com.br/artigos.html. Acesso em 20/03/06.

10) SITE, Editorial. Fact or fiction? Disponível em: https://www.castlenightstar.com/pastregression.html. Acesso em 28/03/06;

11) CHAMBEL, Luis. Ir ao passado e voltar. Revista “A Razão”, jul-ago-set/1996, p. 6-10.

12) SITE, Editorial. Reencarnação. Disponível em: https://www.fenomeno.trix.net/fenomeno_fenomenos_1_ar-reenc.htm. Acesso em: 29/03/06.

13) BROWN, Rick. The Journal of Regression Therapy, v. V n. 1, 1991, p. 62-71. Disponível no site https://www.afterlife101.com/Submarine.html. Acesso em 29/03/06.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

PARTE 4:

EPÍLOGO

CAPÍTULO 18

 

 

O DESPERTAR DA ESPIRITUALIDADE

 

Síntese e objetivo do conteúdo dessa obra

 

“Conheça-te a ti mesmo”.

Inscrição no Templo de Delfos – Grécia, atribuída à Sócrates.

 

“Só sei que nada sei”.

Sócrates

 

 

Percorremos um longo caminho para chegar a este ponto de nossa obra, tendo recuado  3500 anos a. C. da historia da Ciência e da Filosofia. Recorremos aos ensinamentos milenares da Filosofia, da Metafísica e da Ciência. Passamos em revista aspectos da Ciência antes e depois de ter separado da Filosofia e, seguimos o desdobrar da Ciência Natural em vários ramos, como a Física, a Química, a Biologia e outras todas elas ciências muito especializadas e reducionistas.

A nossa obra está composta em quatro partes. Na primeira parte, penetramos nos meandros da Ciência o suficiente para o bom entendimento de seus propósitos e méritos.

 Mas, o real objetivo deste livro está contido na segunda parte da obra, em que expusemos os conhecimentos espiritualistas modernos, livre de qualquer ranço sectário, místico e das tradições religiosas. Mostramos também que, para reconhecer e adquirir espiritualidade não é necessário recorrer a qualquer religião ou culto oriental, em geral cheios de termos místicos e ultrapassados para o estado atual de cultura do mundo. E, alertamos para não se confundir misticismo com os conhecimentos verdadeiramente espirituais e a espiritualidade.

Na terceira parte, expusemos os indícios e evidências apresentadas por cientistas, psicólogos, psiquiatras não vinculados com o Espiritismo ou com o moderno espiritualismo, sendo, portanto, todos os pesquisadores independentes não submetidos a qualquer influência ou interferência do gênero. São os casos estudados de reencarnação, experiências de quase-morte e de regressão às vidas passadas.

Finalmente, na quarta parte, tiramos uma conclusão de tudo o que foi visto e passamos nossa mensagem ao público leitor em geral e aos cientistas, de quem muito se espera, neste século XXI no tratamento científico dos fenômenos que constituem a vida fora da matéria.  A seguir, fazemos um vôo rasante à guisa de síntese objetiva sobre toda a obra.

 

1.      Nossa realidade objetiva

Ao percorrermos os cinco capítulos da primeira parte, ficamos sabendo que, apesar das limitações a que se impuseram, a Ciência e os cientistas estão sempre dispostos a admitir seus próprios erros quando uma teoria falhar e outra se mostrar melhor, isto é, a Ciência jamais se colocou em posição irredutível. E isso está na própria essência da Ciência que admite uma construção progressiva, onde a sua história já mostrou que as ditas “verdades científicas” são muitas vezes provisórias, sujeitas sempre a uma evolucionária revisão de suas teorias e leis em função de novas evidências e realidades. A seguir, apresentamos uma síntese dessa parte introdutória de nossa obra.

 

i O Universo como Força e Matéria

 

A primeira parte – nossa realidade objetiva, contendo cinco capítulos, foi dedicada exclusivamente à visão científica abrangente do Universo e como a Ciência nos insere como seres humanos, perante este maravilhoso contexto universal. Maravilhamo-nos e nos sentimos tão pequeninos diante da grandeza universal. Verificamos que tudo que existe no Universo, se compõe de Força e Matéria, demos uma olhadela no interior dos átomos e examinamos as quatro forças físicas que atuam na natureza. Procuramos saber os fatos e os paradoxos da Física Quântica. Verificamos a preocupação atual dos físicos quânticos na busca de uma “Teoria do Tudo”, que venha unificar as quatro forças da Natureza.

 

i Os caminhos da evolução

 

No que toca à Biologia e ao estudo da origem das espécies e do Homem, dedicamos um considerável espaço na apresentação do aparecimento da vida na Terra, sob o enfoque da Teoria das Espécies de Darwin e do Neodarwinismo. Focamos, também, a polêmica que ainda perdura e se acirra nos dias atuais entre o evolucionismo e o criacionismo.

 

i Metodologia científica

 

Ainda nesta primeira parte, procuramos enfocar o que é a Ciência, como ela trabalha e que é o método científico, quais as ferramentas que utiliza e sua abrangência. Estudamos o método científico e a práxis científica com os seus diferentes recursos utilizados para sustentar uma teoria científica, inclusive o recurso da irrefutabilidade.

 

i Verdade, realidade e paradigma

 

Finalmente, enquadramos ainda dentro do contexto da primeira parte, a compreensão e o entendimento que a Filosofia e a Ciência pretendem quando abordam assuntos de natureza subjetiva, como a Verdade e a Realidade. Por último, ainda dentro desta parte, enfocamos o conceito de Paradigma, que circunscreve a ação da Ciência dentro de certos limites de estudo, tornando-a cada vez mais reducionista.

A nossa conclusão destes conceitos e a historia da Ciência nos confirma isso, é que toda verdade humana é provisória e ela evolui em função do conhecimento ou saber que, por sua vez, acompanha a evolução humana. Num mundo globalizado, que já está dando os seus primeiros passos, isso torna-se cada vez mais real. Encontrado o verdadeiro caminho, respeitadas as culturas próprias de cada povo, o mundo encontrará tempos de paz e muita prosperidade e outro será o viver na terra. Mas, neste longo caminho da Ciência, o conhecimento do Homem como Força e Matéria, isto é, como Espírito e Corpo e a interação entre os dois, diante de uma realidade mais abrangente, ficou praticamente estacionado.

 

2.      Uma realidade mais abrangente

 

Esta parte de nossa obra foi dedicada ao estudo da vida fora da matéria e suas implicações na vida das criaturas. Composta de nove capítulos, esta segunda parte inicia-se objetivando explicar uma série de fenômenos até então inexplicáveis, que ocorreram quase que simultaneamente nos Estados Unidos e na Europa por volta da segunda metade do século XIX. A seguir, o leitor encontrará uma síntese de seus capítulos.

 

i O surgimento do Espiritismo

 

Pela primeira vez na História da Humanidade, os fenômenos transcendentais ou paranormais passaram a ser estudados, inclusive por parte da Ciência, tendo à frente cientistas notáveis como, William Crookes e Charles Robert Richet, este último fundador da Parapsicologia. Mas, infelizmente, a Ciência colocou muitos obstáculos aos trabalhos desses pioneiros notáveis, levando-os ao descrédito. O mesmo não aconteceu com outros pesquisadores independentes, cujos trabalhos culminaram com o surgimento do Espiritismo de Allan Kardec, há cerca 150 anos.

 

i O advento do Racionalismo Cristão

 

Posteriormente, já no início do século XX, no Brasil, com ênfase filosófico-espiritualista, surgiu o Espiritismo Racional e Científico Cristão, em 1910, atualmente denominado Racionalismo Cristão. Dedicamos um capítulo inteiro ao estudo e apresentação dos conhecimentos difundidos pelo Racionalismo Cristão, por meio de seus fundadores, codificador e consolidador, respectivamente, Luiz de Mattos, Luiz Alves Thomaz e Antônio do Nascimento Cottas.

Vimos no segundo capítulo da primeira parte, que muitos fenômenos da Física Quântica estão além de nossa realidade imediata, inacessíveis aos nossos sentidos. Para examinar esses fenômenos e serem explicados os físicos valeram-se da alta Matemática. Trata-se de fenômenos relativísticos ou quânticos que parecem bizarros, fora do “senso comum”. O mesmo sucedeu com os estudiosos dos fenômenos ditos paranormais e transcendentais, que tiveram que se valer de pessoas com sensibilidade mais aguçada, conhecidas como médiuns. A tentativa de se usar instrumentos elétricos e eletrônicos sensibilíssimos, óticos e digitais, embora úteis, não foi, até o momento, bem sucedida. Mas, há todo um campo aberto para isso para a Ciência trilhar.

Os fenômenos da vida fora da matéria sempre causaram e vêm causando estranheza a todos aqueles que não se mostram interessados em averiguar e investigar a sua verdadeira natureza, olhando com perplexidade e até descaso tais fenômenos. Contudo, o conhecimento desses fenômenos é tão velho quanto o mundo. Filósofos e cientistas de elevada evolução, desde as mais remotas épocas e em vários países lançaram as sementes de tão necessário conhecimento.

 

i A Força Inteligente

 

Em outro capítulo, dedicamos bastante atenção à pesquisa e conhecimento sobre o que é a Força Inteligente, que atua em todos os reinos da Natureza, dando vida à Matéria. O conhecimento das idéias ali expostas tem destacado papel para o entendimento da atuação conjunta desses dois únicos constituintes – Força e Matéria – na constituição de todos os seres vivos, em que cessada a atuação da Força Inteligente, cessa a vida. É a Força Inteligente que é responsável pela difusão da vida em todos os reinos da natureza, inclusive nas primitivas estruturas atômicas e moleculares do reino mineral. Mostramos que ela é autogovernável, autoexpressante e automanifestante em todas as formas de vida observáveis. Infelizmente, ela vem sendo ignorada pela Ciência, que trabalha com a hipótese de que tudo deriva da Matéria, deixando sem estudos profundos um vasto campo do conhecimento.

Explicamos, também, que ao longo e durante toda essa interminável cadeia evolutiva, a Força, partícula da Inteligência Universal, percorre todos os reinos da natureza - o mineral, o vegetal e o animal. Durante todo esse longo percurso, acumula sempre e sempre mais Força e mais Inteligência, passando por experiências e vivências múltiplas e diferenciadas, até alcançar um grau suficiente de “informação”, o que a torna capaz de ativar e dar vida a seres com organismos cada vez mais complexos. A partir daí, a Força habilita-se a evoluir na forma humana, circunstância em que já dispõe de consciência e uma inteligência básica, desenvolvida em todos os estágios anteriores e pela primeira vez, capaz de poder usar o atributo do livre-arbítrio, que nada mais é do que a vontade própria. Com este atributo ou faculdade, a Força Inteligente passa a ter a denominação de Espírito, que é a Força individualizada no homem, podendo, então, entre tantas e tantas opções, fazer escolhas inteligentes e assumir a responsabilidade de suas ações, o que não acontece nos animais que precederam ao homem na cadeia evolutiva.

 

i A Primazia do espírito

 

Embrenhamo-nos, em seguida, no capítulo intitulado a Primazia do Espírito, no estudo e conhecimento do Espírito, sua encarnação e reencarnação, bem como, sua desencarnação. Foram apresentados os principais atributos do espírito e destacado o papel da inteligência e da consciência dentre eles. Referindo-se ao nosso “Eu Superior”, diferente do nosso ego, explicamos de onde viemos e para onde voltaremos toda vez que desencarnamos de acordo com os princípios naturais e imutáveis do Universo.

Ainda sobre o Espírito, desmistificamos sua existência, dando-lhe o cunho de racionalidade de que é dotado. Explicamos a existência dos mundos espirituais, inferior e superior, aos quais chamamos de Astral Inferior e Astral Superior, dentro do ponto de vista estritamente espiritualista moderno, por ser o Espiritualismo uma ciência eclética, filosófica e evolucionista. Mostramos como é bastante nocivo e até mesmo uma desgraça para o espírito desencarnante, ficar quedado na atmosfera da Terra, isto é, no Astral Inferior e, pior que isso, causando tantos males à humanidade, o que vale dizer a outros espíritos encarnados promovendo a sua evolução terrena.

Explicamos a verdadeira composição da criatura humana, como espírito e corpo (Força e Matéria), tendo de permeio o perispírito ou corpo astral, também matéria tênue e sutil, que sempre acompanha o espírito. Comparamos o espírito a um eterno viajante cósmico, que tem uma trajetória evolutiva a cumprir aqui na Terra, participando da Evolução de todo o conjunto cósmico. Força e Matéria são os componentes básicos de tudo quanto no Universo existe. Estes componentes estão presentes em toda a parte, no Universo inteiro, em seus componentes primordiais ou sob a forma organizada. É a Força Inteligente, no Homem o espírito, que plasma a Matéria, em um processo incessante e complexo de agregação e desagregação. Através desses processos, a Força organiza e transforma o meio ambiente para proporcionar a evolução de suas partículas inteligentes que, em suas numerosas formas aparentes, estão constantemente agindo sobre os organismos dando-lhes vida, particularmente no Homem. Daí, uma vez reconhecidas e aceitas essas verdades pela Ciência, ser necessário estender a noção de vida, que tem uma abrangência bem maior do que simplesmente biológica, isto é, dotada de um metabolismo material e orgânico e que se replica.

É compreensível que o Espírito é, na criatura humana, a Força Inteligente individualizada e autodeterminante, isto é, que possui o atributo do livre-arbítrio. Desse fato marcante, a evolução realiza-se a um ritmo mais rápido, podemos até dizer acelerado, o que está comprovado quando se compara a presença dos ancestrais do homem na Terra há apenas cerca de dois milhões de anos contra uma história evolucionária de três e meio bilhões de anos. Na linha do tempo evolucionário, isso representa apenas 0,06% de todo o tempo evolutivo na Terra. O que teria influído tão decisivamente na velocidade de seu progresso? Fica claro que foi o uso do seu livre-arbítrio, aliado a três outros importantíssimos atributos do espírito ­– a inteligência, o raciocínio e a criatividade, escudados no seu atributo maior – a consciência de si mesmo.

Ainda sobre a Primazia do Espírito, nós fizemos uma distinção básica: a evolução da Força nos três reinos da natureza se fez e continua sendo feita por meio das formas, isto é, a Força evoluiu e continua evoluindo para aperfeiçoar os corpos que ela animou e anima; já no Homem, a evolução da forma quase cessou e deu lugar para a evolução do espírito, através do conhecimento acumulado durante muitas vidas e guardado no perispírito – o subconsciente dos psicólogos. O que nós procuramos deixar claro é que a Força Inteligente precede à Matéria e a anima em uma incalculável variedade de formas em tudo quanto existe no Universo. E aí está um campo muito grande para a pesquisa dos cientistas, mormente físicos, biólogos, médicos, neurocientistas, psicólogos, parapsicólogos, e, porque não dizer também, os filósofos, qualquer que seja a religião que professam. 

Mostramos, também, que a humanidade ainda está muito carente de espiritualidade e que ser espiritual não é ser místico, nem agir esotericamente, como o fazem tantas organizações e instituições ditas “secretas”. O Espiritismo sadio – o espiritualismo, desmistificado não é religião, estando isento de qualquer ranço evangélico ou místico de qualquer natureza. Identificamos para quem o desejar, que o Espiritismo Racional e Científico Cristão foi codificado no Brasil e tem hoje o nome de Racionalismo Cristão. Sua difusão está se processando rapidamente por vários paises da Europa, África, América do Sul e América do Norte. Apesar de novo, codificado em 1910, por Luiz de Mattos e Luiz Alves Thomaz, irradia-se pelo mundo, levando a bandeira da espiritualidade e da moral cristã com o lema “Uma Filosofia para o nosso tempo”.

 

i A importância do pensamento

 

Na seqüência lógica dos conhecimentos, no capítulo 10 – A importância do pensamento – passamos pelo estudo e pela explicação espiritualista do que seja o pensamento, o qual deriva do ato volitivo de pensar. Pensar é raciocinar, transmitir vibrações moduladas por idéias e imagens de concepção do espírito, criando, resolvendo, solucionando, descobrindo e esclarecendo os problemas da vida. É intuitivo saber que tudo passa pelo pensamento, antes que qualquer coisa aconteça. Se olharmos ao nosso redor, excetuando-se a própria Terra e toda a natureza que nela existe tudo o mais foi construído pelo Homem e passou antes pelo seu pensamento. Ele é, assim, o sustentáculo, o fundamento de toda a evolução natural, cultural e psíquica do Homem, desde os primórdios das eras primitivas até o presente estágio de desenvolvimento. Portanto, não é exagero afirmar-se que o pensamento é tudo na vida da criatura. A criatura que não se dá ao trabalho de pensar por indolência ou por falta de vontade, não evolui, estaciona, fica para trás.

 

i A aura: espelho da alma

 

Outro assunto ligado aos conhecimentos espiritualistas é a aura. No capítulo sobre este assunto explicamos que a aura é formada por matéria tênue, subtil e invisível, ionizada sob a forma de uma emanação ou bioplasma e ativada pela força do pensamento. Ela se expressa como sendo um campo energético vibracional que circunda o corpo das pessoas, sendo mais densa e mais perceptível ao redor da cabeça. Ela é o espelho da alma, através da qual revela-se a natureza dos pensamentos, sentimentos e emoções que emitimos. Ela pode captar ou repelir as vibrações de outros pensamentos, sentimentos e emoções, de acordo com a lei das afinidades, segundo a qual, os pensamentos afins (positivos ou negativos) atraem-se e pensamentos contrários repelem-se. Há cerca de cento e cinqüenta anos a aura vem sendo estudada por pesquisadores e cientistas sérios da Europa, Estados Unidos e Brasil, com o objetivo de identificar sua verdadeira natureza e função, bem como, no sentido de torná-la visível e fotografável. Há, também, muitos estudos defendendo o seu efeito no aparecimento de numerosas doenças psicofísicas. No capítulo em questão, tratamos da aura sob um enfoque científico e espiritualista.

 

i Mediunidade

 

Este capítulo foi introduzido nesta obra com o objetivo de informar o que existe de mais avançado no conhecimento da mediunidade, sem misticismos e sem escamoteações. Trata-se de uma notável faculdade do espírito, o que não significa que, quem a possui seja um ser privilegiado.

É incompreensível que a falta de estudos sobre a mediunidade por parte das organizações científicas, com raríssimas exceções, constitui, lamentavelmente, uma lacuna incompreensível. A Parapsicologia praticamente jogou fora um século de oportunidades para dedicar-se, com todo o rigor científico, ao estudo deste assunto, interrompido após os estudos de Charles Robert Richet, seu fundador. Vimos, com satisfação, que a pesquisa sobre a mediunidade foi retomada, ao final da última década do século passado, por uma equipe de cientistas liderada por Gary E. Schwartz, que a estuda em laboratório, conforme descrevemos no capítulo 15. Com o progressivo desenvolvimento espiritual dos seres e da humanidade em geral e dos avanços da Ciência, estamos seguros de que, no presente século XXI, teremos grandes surpresas científicas neste campo.

Mostramos que a mediunidade, que se apresenta sob diversas modalidades, é uma faculdade inata no espírito de todas as pessoas. Ela apresenta-se sob diversas modalidades e graus de sensibilidade, sendo a mais comum delas, a mediunidade de intuição, que quase todas as pessoas a possuem em maior ou menor grau, ainda que muitos não a percebam conscientemente. Dada a sua importância, dela tratamos, com profundidade, em capítulo separado. Todas as demais modalidades estão latentes em muitas criaturas e as pessoas que se dedicam ao exercício da mediunidade, são conhecidas como médiuns ou sensitivos, isto é, verdadeiros intermediários entre a vida material e a vida dos espíritos.

Explicamos, ainda, que o desenvolvimento natural da mediunidade acompanha o grau de espiritualidade das criaturas, adquirido ao longo de suas múltiplas encarnações. Fizemos notar que a manifestação da mediunidade varia nas pessoas em função do seu temperamento (emoções), de seus sentimentos, da sua sensibilidade e da sua evolução. E, ainda, que os bons ou maus pensamentos se atraem, na razão direta da sua afinidade e o seu instrumento de captação é a faculdade mediúnica. Deixamos claro, também, que a mediunidade é sempre útil, quando bem aproveitada, mas altamente prejudicial se colocada ao serviço do mal.

 

i A Intuição: nossa bússola espiritual

 

Dedicamos todo o capítulo 13 ao estudo da intuição. Ali esta é enfocada de uma forma mais ampla e profunda, dada a sua importância nos processos que envolvem a criatividade das pessoas. O tratamento formal que demos à intuição, sob o ponto de vista da espiritualidade, nós o fizemos quando apresentamos a mediunidade.

A intuição ocorre quando se tem uma compreensão repentina de alguma coisa, o que representa um conhecimento que se obtém diretamente, sem o auxílio da razão, muitas vezes depois de ter recorrido a esta de maneira persistente e contínua na solução de algum problema. Quanto maior for a nossa capacidade de encarar o problema por um enfoque bem diferente do modo comum de ver as coisas, mais receptivos estaremos à intuição. Em Psicologia se usa, com freqüência, a palavra insight (lampejo ou estalo) como sinônimo de intuição, mas há uma diferença marcante: a intuição é a capacidade de prever possibilidades, enquanto que o insight é a forma como a intuição é revelada.

Lembramos aqui que, acostumado a propor e resolver problemas mentais, o grande Einstein sempre foi bastante intuitivo. Recebia intuições freqüentes na forma de verdadeiros insights, vinculados ao seu pensamento lógico. Ele aplicava os lampejos que recebia, juntamente com os conhecimentos da física, para resolver problemas que, de outra maneira, necessitaria do uso de experimentos laboratoriais. Assim, como livre-pensador, tinha a capacidade de contemplar problemas físicos de modo diferente do que era habitual. Na verdade, o que ocorria era uma completa liberdade que lhe permitia abandonar certos princípios e pressupostos até então tidos como irrefutáveis. Dito de outra forma, Einstein tinha o dom de reestruturar os problemas de diferentes formas para procurar e lhes dar solução e isso lhe trazia uma satisfação íntima muito grande, além de reforçar a sua autoconfiança. Enfatizamos que, da mesma forma, a maioria de nós pode usar essa belíssima e útil faculdade do espírito, como o fizeram e continuam fazendo os grandes cientistas e as maiores inteligências encarnadas aqui na Terra.

 

i O livre-arbítrio constrói o destino

 

Tudo o que colocamos em evidência na segunda parte dessa obra acha-se, de propósito, impregnado com os conceitos filosófico-espiritualistas de vida e, o livre-arbítrio não poderia fugir a essa orientação. Trata-se de uma faculdade manifestada pela vontade livre e determinada na realização das metas que a criatura programou para a sua trajetória evolutiva. O seu bom uso na vida material condiciona o sucesso das encarnações, tornando-as menos repetitivas, minorando o sofrimento advindo do seu mau uso. Com o apoio de um raciocínio lúcido, o exercício do livre-arbítrio poderá atingir a sua plenitude e a criatura alcançar a felicidade relativa no seu viver terreno.

Antevemos o dia, embora ainda distante, em que a maior parte da humanidade, se não toda, tenha acesso a esses conhecimentos filosóficos e espiritualistas em que o bom uso desse atributo espiritual constitui uma bússola norteadora capaz de impulsionar as pessoas para o bem, deixando de lado instintos animalescos embrutecidos pela mente doentia de muitos.

 

3. Indícios e evidências

 

O que apresentamos na Terceira Parte de nossa obra, refere-se ao despertar de alguns estudiosos – pesquisadores, psicólogos, psiquiatras e cientistas – totalmente desvinculados de qualquer doutrina reencarnacionista, atraídos que foram para o estudo dessa pergunta sempre presente na mente de tantas pessoas: existe a vida após a morte? Seus trabalhos nos oferecem fortes indícios e evidências da existência do espírito e do processo de reencarnação.

 

i Casos sugestivos de reencarnação

 

No capítulo sobre A Primazia do Espírito, mostramos que tudo o que foi explanado sobre o espírito no que diz respeito à sua encarnação se aplica igualmente à reencarnação, que ocorre no processo do nascimento de um ser humano. Reencarnação é o processo de um mesmo espírito passar por numerosas e sucessivas encarnações, isto é, trocar de corpo e de condições de vida em outro tempo e em ambientes diferentes. Portanto, percebemos, lógica e intuitivamente, que a encarnação do espírito só ocorre na primeira vez e a reencarnação, centenas e até milhares de vezes.

Além dos cientistas e pesquisadores citados na segunda parte de nossa obra, numerosas outras experiências foram relatadas por dezenas de autores e pesquisadores em centenas de livros de ampla divulgação na atualidade, em todo o mundo, inclusive via Internet.

Assim, fora do ambiente espiritualista, cerca de cem anos após as experiências de William Crookes, na segunda metade do século XX, mais precisamente a partir da década de 1960, numerosos casos de reencarnação comprovados foram estudados por Ian Stevenson e colaboradores. Quase concomitantemente, tiveram lugar os estudos e pesquisas sobre os fenômenos de experiência fora do corpo (desdobramento espiritual) e experiência de quase-morte.

O acervo das pesquisas de campo de casos sugestivos de reencarnação levantados por Ian Stevenson e colaboradores já ultrapassa 2500 casos. Os três principais livros de Ian Stevenson e uma entrevista por ele dada, em 1986, embasaram as informações que apresentamos. As evidências de reencarnação por ele estudadas sob rigoroso método e condições científicas, em vários países do mundo, são irrefutáveis. Ian Stevenson analisa, também, uma série de nove explicações para os fenômenos estudados, mas prefere adotar a teoria reencarnacionista.

Este capítulo mostra, também, os mais impressionantes estudos sobre mediunidade que a ciência já está pesquisando, desde o final da última década do século passado, sob a coordenação de Gary E. Shwartz através do “Projeto de Pesquisas Veritas”. Os primeiros resultados foram analisados e publicados, em 2002, através do livro The after life experiments e divulgados pela mídia americana e são inquestionáveis. Este trabalho continua. O “Projeto de Pesquisas Veritas” abre um vasto domínio de experimentos que continua restrito a poucos seguidores atuais das doutrinas espíritas e espiritualistas.

 

i Experiências de quase-morte

 

Apresentamos, também, no capítulo 16 as Experiências de Quase-Morte (EQM ou NDE – near-death experience, em inglês), trazidas ao conhecimento de toda gente por Raymond A. Moody, Jr. Este pesquisador, desde 1966, vem revelando milhares de casos comprovados de quase-morte, reforçando as evidências da existência do espírito e do processo reencarnatório, isto é, expondo ao mundo a existência da vida do espírito após a morte.

Em 1969 nos Estados Unidos e em 1975 no Brasil, veio à lume a obra pioneira de Raymond A. Moody, Jr. – M.D. intitulada The Life after life (A vida depois da vida). Este livro foi reeditado no Brasil em 2004, com o mesmo título, relatando e explicando pouco mais de uma centena de casos. Seguiram-se outras iniciativas, através de milhares de entrevistas, relatando casos de experiências de quase-morte, gravadas e descritas em mais de uma centena de livros, desde então publicados. Atualmente, existem milhares de referências na Internet e até mesmo associações de pessoas que passaram por estas experiências.

A EQM – experiência de quase-morte é uma experiência lúcida associada com a percepção da consciência como elemento dissociado do corpo que ocorre no momento de uma ameaça atual iminente de morte, que, devido a algum motivo, acaba não ocorrendo. Trata-se de um fenômeno real bem diferente dos sonhos e dos efeitos de alucinação decorrentes das experiências com drogas (LSD e outras).

Essas experiências são fantásticas e apresentam grande semelhança nos relatos, o que lhes dá foro de veracidade, confirmando o fato da sobrevivência da alma sobre o corpo físico.

Informamos que neste capítulo abordamos os problemas associados ao medo da morte, para concluir que a morte não existe: morre apenas o corpo físico.  A incerteza que existe, desde as mais antigas civilizações e culturas sobre a vida após a morte, é responsável pelo medo de pensar e refletir sobre o que a morte significa realmente para cada um de nós. O medo da morte está presente em quase todas as pessoas das mais diferentes culturas e religiões, independentemente da idade em que a morte venha ocorrer e da forma como ocorre. Por isso, muitas pessoas têm verdadeiro horror em falar de morte, pois isso um dia vai inexoravelmente acontecer conosco.

Inseridos no argumento cultural estão os elementos de nossa própria vida terrena e que nos rodeiam, tais como, objetos, coisas, pessoas e eventos. No nosso subconsciente está arraigada a idéia de que morte significa o afastamento de tudo isso, inexoravelmente, quando tudo se aniquila e volta ao pó. Isto é, estamos acostumados apenas ou principalmente com o mundo objetivo e morte não tem explicação objetiva. De qualquer forma, em última instância, a morte é tida como algo desagradável e não desejável, a não ser para os suicidas.

Existe um enfoque materialista que afirma que a morte é a aniquilação de tudo, que após a morte tudo volta ao pó e a consciência se aniquila: são pensamentos arraigados no mundo materialista. Mas, há outro enfoque que é tão velho quanto o mundo, que concebe a existência da alma, psique, mente, consciência ou espírito, não importa o nome, mas sim saber que existe algo – a Força Inteligente, que é imortal, a animar o corpo humano e que continua vivendo após a morte. As pessoas que têm essa visão vivem uma realidade mais abrangente – a realidade espiritual, além da realidade material.

É compreensível que a ciência oficial, materialista em todas as suas concepções do que seja o ser humano, não tenha apresentado uma explicação aceitável para o fenômeno da morte. Conforme vimos, à luz do Espiritualismo, este é um fenômeno tão natural como o nascimento, sendo lhe o inverso. Para entendê-lo em toda a sua simplicidade, há necessidade de compreender o que é a Força Inteligente – no homem, o Espírito, o que é a encarnação, como se processa a encarnação (nascimento) e a desencarnação (morte) e qual a razão de ser do processo encarnatório que, por sua vez, está intimamente ligado à evolução espiritual e ao progresso material. Tudo isso consta dos conhecimentos existentes, desde 1910 e ensinados nas obras do Racionalismo Cristão, os quais foram utilizados pelo autor para explicar, também, o que ocorre nas EQMs. 

 

i Regressão às vidas passadas

 

Para completar o conjunto de experiências consagradas ao estudo da vida após a morte, passamos em revista, no capítulo 17, os fenômenos de regressão às vidas passadas. Centenas de relatos do psiquiatra Brian Weiss e de vários psicólogos foram examinados, como os de Helen Wambach, Edith Fiori, Patrick Drouot (físico), Maria Peres (médica e psicóloga brasileira) e outros, cujas experiências foram relatadas em seus artigos e livros. Estes autores apresentaram casos contendo muitos indícios e novas evidências sobre a existência da alma (espírito) e sua imortalidade. Eles expõem ao público, através da terapia de regressão às vidas passadas (TRVP) um grande número de fenômenos, até então, exclusivamente do domínio do Espiritismo e do espiritualismo.

A maneira como estes pesquisadores foram levados ao descobrimento e ao uso, hoje bastante difundido, das técnicas terapêuticas de regressão às vidas passadas (TRVP), também denominadas por outra corrente de psicólogos e psiquiatras de regressão às vivências passadas, varia, mas na sua essência liga-se ao processo indutivo.

Devemos, contudo, lembrar que estas técnicas psicoterapêuticas são utilizadas com o objetivo de levar o paciente a um estado alterado de consciência, com o objetivo de resgatar memórias ou reminiscências traumáticas do seu passado. Teorizam que estas memórias estejam bloqueadas pelo consciente e reprimidas ou bloqueadas no inconsciente e, que causam transtornos de ordem psicossomática, certos problemas orgânicos, bem como, problemas que dificultam o relacionamento interpessoal. Portanto, o uso da regressão de memória é um recurso, método de trabalho ou técnica baseada na hipótese de que há fatos traumáticos do passado que influem e trazem desajuste, problemas e conflitos de variada natureza na vida presente de muitas pessoas.

Foi-nos possível encontrar e transcrever dois casos comprovados de regressão em que as condições, os ambientes e as pessoas referidas como pertencendo às vidas passadas de seus pacientes, puderam ser comprovadas.

 

CAPÍTULO 19

 

 

ULTIMATUM À RACIONALIDADE

 

Um apelo rumo à espiritualidade

 

“Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância”.

Sócrates

 

 

Através desse capítulo estamos encerrando essa nossa jornada, cuja motivação principal foi a de procurar despertar todos aqueles que realmente se interessam em procurar respostas paras as eternas perguntas da humanidade: de onde vim o que estou fazendo aqui e para onde vou após a morte (desencarnação). Mais objetivamente, procuramos motivar os físicos, biólogos, psicólogos, parapsicólogos, psiquiatras e cientistas em geral, aos quais fazemos um sincero apelo e exortação no sentido de estudarem e pesquisarem a vida fora da matéria, começando pelo estudo sério da mediunidade e da realidade do espírito e do mundo espiritual. Procuramos apresentar as conclusões seguindo capítulo por capítulo, na forma como aparece no corpo do livro, mesmo sabendo que assim procedendo corremos o risco de algumas repetições.

 

1. O Universo

 

Existem muitas teorias para explicar o Universo. Mesmo a teoria do Big Bang, com alto grau de aceitação, inclusive por parte da Igreja Católica, não é um fato, mas uma teoria que implica em evolução (fase atual de expansão) e involução (fase de contração) do Universo. Curioso é que essa teoria tem um caráter evolucionista. Vemos aqui, que há uma certa acomodação ou coexistência entre Ciência e Religião, que não se sabe por quanto tempo resistirá. Pois que, enquanto na ciência várias teorias diferentes podem coexistir de modo pacífico, em religião, isso é bem mais difícil. As dissensões religiosas, por exemplo, entre o Cristianismo, Judaísmo e Islamismo, todas monoteístas, cultuando um mesmo Deus, embora com nomes diferentes, são irreconciliáveis, por causa do fanatismo dogmático de todas elas.

2. Força e Matéria

 

Diante do dilema Força Inteligente e Matéria, só restam duas atitudes a tomar: uma nos conduz ao absurdo, de continuarmos endeusando a Matéria, a outra nos levará à pesquisa do incognoscível transcendental, cujas leis continuam desafiando a Ciência. Este dilema não poderá perdurar por mais tempo, pois a humanidade está carente de informações e pedindo uma direção segura para sua evolução. Afinal, o que é real? Por que existe o ser e qual é o seu destino? Precisamos levantar o véu da Matéria para descobrirmos. Estas questões foram tratadas nos capítulos da segunda parte deste livro, em especial nos capítulos 8 – A Força Inteligente e 9 – A Primazia do Espírito.

A pesquisa do incognoscível transcendental é um campo desconhecido e aberto à investigação séria e honesta, sem o ranço místico das religiões. É necessário apenas coragem e valor, que todo cientista honesto possui, mas que é preciso não hesitar em examinar com isenção de ânimo, aceitando os resultados surpreendentes, mas não milagrosos que, com certeza, encontrará além da Matéria. A hora é agora, no limiar desse novo século, pois a humanidade está cansada de tanto materialismo e misticismo!

 

3.      Os caminhos da evolução

 

A grande polêmica que hoje vemos ser travada entre os criacionistas e os evolucionistas, localiza-se num único nó de discórdia: o entendimento que uns e outros fazem da natureza da Força Criadora ou Inteligência Universal, que os mulçumanos denominam de Alá, os religiosos cristãos denominam de Deus e outros povos têm as suas próprias denominações. Nenhum conhecimento verdadeiro pode haver dessa verdadeira grandeza se o homem não colocar uma pá de cal no misticismo e se despir de suas mazelas, de seu egoísmo, de sua vaidade e de tudo o mais que o avilta como ser superior. Enquanto isso não acontecer, estaremos expostos aos nossos instintos inferiores, não estaremos sendo racionais nem estaremos utilizando a lógica que o bom senso nos aconselha. Foi por isso e sobre isso que dedicamos nossa atenção na elaboração dos capítulos da segunda parte dessa obra.

Sendo a busca da verdade a meta máxima da Ciência, ela não deve se isolar de outros ramos do conhecimento como o tem feito nos últimos dois séculos, afastando-se da Filosofia, ainda que seus métodos de investigação utilizem diferentes metodologias. Por último, mas não sem menos força, há a considerar os progressos havidos na Psicologia e por que não dizer, também, na Parapsicologia, no Espiritismo e no Espiritualismo, conforme colocamos no capítulo 6 – O surgimento do Espiritismo e no capítulo 7 – O advento do Racionalismo Cristão.

Em primeiro lugar, precisamos deixar de lado os dogmas religiosos, que vão continuar servindo a maior parte da humanidade mais alguns séculos, pois o seu grau de evolução espiritual não alcança mais do que isso: exprimir a sua fé naquilo que lhe é revelado pelas religiões como provindo de Deus. Mas também, a ciência precisa livrar-se de seu hermetismo e os cientistas precisam abrir o leque de suas descobertas para o homem de conhecimento médio, pois a ciência e as verdades dela decorrentes devem estar para todos e não apenas para uns poucos privilegiados. Há necessidade, também, de simplificar as coisas para o uso comum e para o entendimento mais geral possível.

Tudo o que foi estudado e explicado até aqui em matéria de evolução, tratou apenas da evolução somática, do corpo como tal, negligenciando a evolução mais importante que é a evolução da Força Inteligente. A isso consagramos o nosso livro, no sentido de apontar o que já se conhece e estimular a pesquisa no que ainda nos falta conhecer. Muitos cientistas já chegaram perto, bem perto mesmo, de uma mudança de paradigma, mas por uma razão ou outra, desistiram de levar adiante pesquisas nesse sentido. Muitos poucos o fizeram, mas foram casos isolados e seus trabalhos ou não tiveram a divulgação necessária ou seus autores foram colocados no ostracismo. Por isso, ressente-se de seu prosseguimento.

Existe um ditado e a evolução é uma prova disso que diz: “a natureza não dá saltos”, que pode ser usado para significar que tudo tem o seu tempo certo. Assim, vale esse ditado para nos situarmos na evolução do Homem. É fácil de entender que há cerca de dois milhões de anos e isso é quase nada em termos de evolução somática das espécies, tínhamos o primitivismo de nossos ancestrais, que vieram constituir os primeiros corpos adequados para a evolução do Espírito, ainda que se tratasse de corpos em transição para o nosso atual estágio de evolução humana. Mas foram necessários e suficientes, à época, para darem início ao que chamaremos de a evolução espiritual do homem.

Chegou o momento de afirmarmos que o início da evolução hominal, isto é, da Força Inteligente no corpo humano como Espírito encarnado, coincide também com o início da evolução espiritual no planeta Terra, a partir da qual começaram a surgir, gradativamente, as diferentes raças com suas culturas diferenciadas, como ainda acontece na atualidade. À medida que a evolução somática progredia juntamente com as respectivas culturas, realizava-se, como continua realizando-se, silenciosamente, a evolução espiritual que cada vez mais encontra condições propícias para a sua realização.

Nós ressaltamos nos capítulos constantes da segunda parte de nossa obra que, também a “evolução espiritual não dá saltos” e ela objetiva, principalmente, a evolução da inteligência, da moral e da ética, vale dizer do caráter, pela apuração contínua dos sentimentos mais nobres do homem até a eliminação completa dos seus instintos animalescos.  Esta evolução é individualizada, isto é, ela é feita de “per si”, mas ela se realiza, também, em grupos.

 

4.      Metodologia científica

 

A Ciência considera como teoria uma hipótese superior e bem suportada. Assim, uma teoria bem aceita é aquela que resistiu ao teste do tempo e a coleção de novos dados tende a torná-la um fato científico, como o exemplo do heliocentrismo do sistema solar, que na época de sua apresentação era uma mera hipótese. Exemplos de fatos científicos bem aceitos são encontrados na Física Quântica, embora nunca ninguém tenha observado diretamente um elétron, uma fusão estelar, ondas de rádio, entropia e tantas outras partículas de natureza material ou energética. 

Apontamos neste capítulo que devemos sempre ter em mente que as explicações alternativas para “anomalias” ou discrepâncias de uma dada hipótese sempre devem ser tratadas como qualquer outra hipótese: devem ser pesadas, testadas e eliminadas ou confirmadas, mas uma hipótese não pode ser considerada refutada até que seus testes produzam muitas linhas de evidências positivas, indicando que a hipótese anterior era realmente inconsistente com os dados empíricos.

Sabemos, também, que o grau de sofisticação das investigações científicas atuais leva os estudiosos da área a se valerem da Matemática estatística para que a análise dos dados observados possa ser ajustada às predições de uma teoria. É por isso que se costuma dizer que as teorias científicas modernas são probabilísticas. Embora muitos cientistas detestem a Matemática estatística, trata-se de uma ferramenta indispensável nos experimentos científicos atuais e deve ser usada sempre que a probabilidade fizer parte do contexto experimental.

Na análise que fizemos sobre o método científico, não deixamos de lado o princípio da falseabilidade, introduzido por Karl Popper nos anos 1930. Ele se tornou um conceito importante na Filosofia da Ciência (Epistemologia) e consiste em fazer uma observação ou uma experiência física que tente mostrar que uma determinada asserção ou teoria é falsa, isto é, não é corroborada pelos testes feitos. Já as leis científicas têm carater mais universal, como a teoria da gravitação de Isaac Newton, que para muitos cientistas foi tão testada que se comporta como se fosse uma lei física.

 

5.      Verdade, Realidade e Paradigma

 

A inclusão de nossos textos sobre Verdade, Realidade e Paradigma, agrupados sob um único capítulo, fez-se necessária para conceituar novas abrangências e alargar os limites de nosso entendimento e conhecimento. Torna-se necessário estabelecer-se uma visão mais abrangente do que seja paradigma e que permita conhecer o Homem em toda a sua inteireza, seja ele chamado holístico, cibernético ou pluralístico. É necessário conhecer certos fenômenos hoje tidos como produtos da imaginação, como os casos de doenças mentais e de obsessão, cujos conhecimentos não podem mais ser adiados.

Há todo um vasto campo de fenômenos, dos quais ninguém duvida, mas que não foram explicados racionalmente pela Ciência, entre os quais estão os seguintes: experiência de quase-morte (EQM), experiências fora do corpo (EFC), telecinesia, telepatia, premonição e todos os tipos de mediunidade. O estudo da mediunidade é essencial para dar credibilidade às pesquisas sobre a existência do espírito, do perispírito, da consciência, do pensamento, da aura, do livre-arbítrio e as conseqüências do seu bom e mau uso. Todos esses estudos estão sendo protelados pela Ciência por falta de definição de um novo paradigma que os englobe, quem sabe, dentro de um conceito mais amplo e geral que inclua a Força Inteligente em atuação sobre a Matéria. Estão nessa vertente os campos de estudo da Psicologia, Parapsicologia, Espiritismo e Espiritualismo. Quem sabe poderia haver uma união ou unificação dessas áreas de estudo com as ciências físicas e biomédicas para levar avante estudos científicos dessa natureza.

Nós acreditamos que os físicos poderão investigar cientificamente estes campos com grande benefício para a humanidade se de fato assim o desejarem, descobrindo todo um mundo invisível onde predomina a Força Inteligente, intangível e invisível aos olhos da matéria. Basta, para isso, fazerem uma abordagem sistêmica séria e adequada do assunto, sem preconceitos. Primeiro é preciso descobrir e entender tais fenômenos – queiram chamá-los de metafísicos, paranormais, psíquicos, extrasensoriais ou transcendentais – e sua “real” natureza para compreender que eles não podem ser controlados ou “domados” ao bel prazer do experimentador, como é o caso da “dupla personalidade” do elétron onda-partícula e do princípio da incerteza da física quântica, aceita pelos físicos. Com os conhecimentos sugeridos nesse parágrafo e no anterior, poderá então a Ciência compreender de onde viemos o que estamos fazendo aqui na terra e para onde iremos após a morte física do corpo, bem como o verdadeiro sentido da vida, questões essas que vêm sendo abordadas, sem respostas satisfatórias desde o início da humanidade.

Infelizmente, porém, parece que as ciências, a sociedade e as instituições estão adormecidas para enxergarem que precisamos ultrapassar este ponto de inflexão paradigmático. Se isso for aceito, poderemos ter uma visão mais abrangente do mundo e de nossa relação com ele, visto que inerentemente fazemos parte do processo num sistema dinâmico e universal fechado ou aberto, no primeiro caso se o Universo for finito e no segundo caso, se for infinito. Assim, parece-nos que a Física e os físicos, estão numa posição privilegiada para estudar de forma mais cabal a consciência humana e o destino da humanidade em direção a um modelo mais profundo do ser humano, onde certos fenômenos simplesmente “são”.

À medida que a sociedade passar a adotar valores mais qualitativos e humanísticos, com certeza, a Ciência avançará nessa direção e tornar-se-á muito mais útil à humanidade, respondendo com convicção tantas e tantas questões que são atualmente abordadas de maneira incorreta e até falsamente por muitas religiões, charlatães e místicos, etc.

Como foi visto no corpo dessa obra, a Parapsicologia já deu o primeiro passo no sentido de co-existir com a Física. Já vimos também que a Física separou-se da Filosofia por volta de 1750, mas já é hora de voltarem-se uma para a outra. Com relação ao Espiritismo e ao Espiritualismo, alguns físicos já deram os primeiros passos, mas a comunidade desses cientistas ressente-se de ouvir falar em fenômenos extrafísicos, extra-sensoriais e espiríticos. Os cientistas evitam falar nesses assuntos, quer seja por medo, quer seja por preconceito ou por qualquer outro motivo, mas um dia, mais cedo ou mais tarde, terão que encarar a existência da vida espiritual dentro (no homem) e fora da matéria (no espaço-tempo, em mundos espirituais).

 

6.      O surgimento do Espiritismo

 

A despeito do pioneirismo de Allan Kardec e seus discípulos, cujas microbiografias foram apresentadas, a verdadeira fase científica do Espiritismo contou com os trabalhos de Sir William Crookes e Gabriel Delanne, seguidos dos trabalhos de Charles Robert Richet, fundador da Parapsicologia. Este deu continuidade aos trabalhos de Delanne e classificou a história da fenomenologia psíquica em quatro períodos, apresentados neste capítulo. Foi ele, também, que classificou os fenômenos metapsíquicos em dois grupos gerais: fenômenos subjetivos e fenômenos objetivos, também estudados neste capítulo e ainda hoje usados pela Parapsicologia.

Lembramos que Charles Richet desvendou um caminho distinto, estritamente científico, sem nunca ter-se tornado espírita. Na verdade, ele foi um continuador experimental dos experimentos de Sir William Crookes e de Gabriel Delanne. Enxergamos aqui, com isenção de ânimo, uma certa incompatibilidade entre os trabalhos rigorosamente científicos de Richet e a doutrina de Kardec que, até os dias de hoje, não conseguiu se livrar do “ranço” místico dos evangelhos, o que mais a aproxima de uma religião do que de uma doutrina filosófica e científica.

Observa-se que, na época, o movimento espírita francês já estava totalmente dominado pelos ritos, excetuando-se, neste tempo, apenas Gabriel Delanne, que, muito doente, insistia com a sua Sociedade Francesa de Estudos de Fenômenos Psíquicos e suas publicações na revista Le Spiritisme. Era natural que Richet, que se tornara amigo de Delanne, fosse rígido quanto à metodologia científica, pois foi isso que lhe valeu o Prêmio Nobel de fisiologia, em 1913.

 

7.      O advento do Racionalismo Cristão

 

Vimos no capítulo 7 – O advento do espiritualismo, os passos seguidos por Luiz de Mattos e Luiz Alves Thomaz como fundadores e codificadores e, mais tarde, Antônio do Nascimento Cottas, como consolidador, na implantação de uma doutrina instituída originariamente com o nome de Espiritismo Racional e Científico Cristão. Esta doutrina tem atualmente o nome de Racionalismo Cristão e tem como alicerce conceitos científicos, filosóficos e espiritualistas de alcance universal. Seus princípios estão isentos de misticismo e do ranço religioso e se alicerçam no conhecimento da vida fora da matéria e nos elevados ensinamentos de ética e moral pregados por Jesus Cristo há mais de dois milênios, restaurando assim a pureza de seus ensinamentos, que não eram religiosos, para o nosso tempo e para a posteridade. As minibiografias de seus fundadores e consolidador foram apresentadas.

Trata-se de uma doutrina filosófica que não é religião, que para sua divulgação cunhou o lema “Uma filosofia para o nosso tempo”, conforme pode ser visto no seu portal https://www.racionalismo-cristao.org.br, na Internet. Seu livro básico – Racionalismo Cristão, bem como, todas as suas obras, podem ser baixadas gratuitamente da Internet.

Todos nós sabemos que nem a ciência nem a filosofia nem nenhuma doutrina pode ser considerada acabada. A humanidade evolui e com ela as sociedades e as culturas que as acompanham. O Racionalismo Cristão, sendo uma doutrina evolucionista, segue esta regra porque os caminhos da evolução espiritual são continuados e eternos.

Numerosas questões como qual é a natureza da Força Inteligente, o que é consciência, qual o centro de nossas memórias, de onde viemos, para onde vamos, o que estamos fazendo neste planeta, o que é a evolução espiritual, qual foi o início do universo e tantas outras, permanecem sem resposta por parte da Ciência. Não basta estudar, classificar e ensinar é preciso realmente entender e compreender o que é o ser e a vida e o que fazer dela em proveito da espiritualização dos povos.

Esperamos que no presente século esta situação se modifique e novas luzes venham a ser lançadas cientificamente sobre todas ou pelo menos algumas das questões transcendentais do homem para acelerar o seu progresso material e espiritual no planeta.

 

8. A Força Inteligente

 

Na visão espiritualista, todo o Universo se constitui de Força e Matéria, sendo esta última a formar todas as substâncias e corpos e a primeira a animá-los. Mas aqui o conceito de Força vai muito além do conceito ensinado pela Física.

Vimos no capítulo 8 - A Força Inteligente, que ela está presente em todo o Universo e permeia todo e qualquer tipo de matéria, seja ela inorgânica, orgânica ou organizada, bem como todas as células vivas individualmente e, no seu conjunto, em cada ser vivo. Ela é o agente ativo que, atuando sobre a matéria, que é o agente passivo, subjaz à estrutura atômica da matéria e, nos seres vivos (plantas e animais), subjaz às células, dando-lhes vida. Aqui, apresentamos uma extensão do conceito de vida aos minerais, conforme já adiantamos quando tratamos da Evolução, na primeira parte desse livro.

No homem, temos a Força Inteligente, a vida plena e inteligência plena, com livre-arbítrio e demais atributos da Força, que, a partir desse ponto, evolucionariamente, recebe o nome de Espírito.

Trata-se de um campo desconhecido e aberto à investigação séria e honesta, sem o ranço místico das religiões. É necessário apenas coragem e valor, que todo cientista honesto possui, mas que é preciso não hesitar em examinar com isenção de ânimo, aceitando os resultados surpreendentes, mas não milagrosos que, com certeza, vai encontrar além da Matéria. A hora é agora, no limiar desse novo século, pois a humanidade está cansada de tanto materialismo!

Citamos abundantemente a obra Racionalismo Cristão, de Luiz de Mattos, aqui e em todos os capítulos da segunda parte de nossa obra, por ser ele uma síntese coerente, justapondo Filosofia e Ciência nos conhecimentos relacionados com a vida fora da matéria e com a espiritualidade.  Segundo ele, “Não se deve inferir, daí, a inexistência de vida no reino mineral nem a de inteligência no reino vegetal. Apenas se menciona a predominância dos atributos fundamentais apontados, para facilitar a compreensão do leitor, dada a transcendentalidade do assunto”.

 

9. A primazia do espírito

 

Todo o capítulo 9 – A primazia do espírito, foi dedicado à apresentação dos conhecimentos sobre a vida fora da matéria no que respeita á natureza do espírito, seus atributos principais, sua encarnação e desencarnação, mostrando a realidade espiritual da tese reencarnacionista, dos mundos espirituais e da Inteligência Universal.

Para o espiritualismo, espaço e tempo são duas relatividades terrenas desconhecidas no Astral Superior, onde a realidade é absoluta e se desenrola em outras dimensões. O campo de vista do ser humano é restrito às três dimensões. A ciência terrena conhece a velocidade da luz (trezentos mil quilômetros por segundo), mas nada sabe, ainda, sobre o pensamento e sua infinita velocidade, por vivermos num mundo de três dimensões.

Nada sabemos, também, com relação à velocidade com que se movem os espíritos do Astral Superior, por não ser de interesse dos habitantes do planeta Terra. Mas, sabemos que os espíritos do Astral Superior se movem no continuum Espaço-Tempo, de forma instantânea e que têm como campo de ação extensões que escapam aos limites de compreensão existentes no horizonte do mental humano e, por deveres, atribuições que não se assemelham aos do viver terreno.

 

10. A importância do pensamento

 

Nossa análise sobre o pensamento no capítulo 10 – A importância do pensamento teve ênfase no conhecimento espiritualista, mas, também não deixamos de analisá-lo sob o ponto de vista da Psicologia.

Sob o enfoque espiritualista, mostramos que o pensamento é vibração do espírito, tendo por fundamento o ato volitivo ou da vontade. Foi apresentada sua forma de geração e captação de idéias e informações por atração das correntes de pensamento existentes na Terra e no Espaço Superior, em que a intuição desempenha relevante papel. Nos humanos a transmissão do pensamento é feita primordialmente através de palavras escritas e faladas e, entre os espíritos, diretamente por telepatia.

Segundo a Psicologia, quanto à sua natureza, o pensamento pode ser analítico, verbal, simbólico ou abstrato. Mostramos que é através do pensamento analítico que a pessoa se utiliza da lógica e dos modelos logicamente estabelecidos para tirar suas conclusões ou obter resultados práticos. Já no pensamento verbal, a criatura parece ouvir e vivenciar as suas próprias idéias e as transfere a terceiros por meio das palavras próprias de cada idioma, no contexto de uma linguagem escrita e falada adequada aos seus ouvintes. O pensamento simbólico ou abstrato é exercido através de símbolos ou modelos formais, como na matemática, no desenho, nos projetos, na música, na linguagem corporal, etc. O pensamento abstrato, é sempre livre e desvinculado do mundo físico. Nele, a intuição prepondera sobre a lógica no processo de avaliação dos modelos mentais.

 

 11. A Aura: espelho da alma

 

Do que foi exposto no capítulo 11 – A aura: espelho da alma, torna-se intuitivo concluir que a aura humana reúne as condições energéticas de nossos pensamentos, sentimentos e emoções, refletindo nela, através de suas cores, o estado dinâmico de nosso ambiente astral e, portanto de nossas atitudes e conduta. Aos que podem ler a nossa aura, como os espíritos do Astral Superior, espíritos do astral inferior e médiuns videntes em geral, nada passa despercebido. Tudo se sabe, nada se oculta.

Vale notar, também, que uma aura saudável, coerente e luminosa nos garante um suprimento de energia vital e nos protege de campos energéticos desintegrantes e negativos de espíritos obsessores.

 

12. A mediunidade

 

Do que ficou exposto no capítulo 12 – A mediunidade, infere-se a necessidade de se conhecer como Força e Matéria, não alimentando nenhuma dúvida sobre a vida fora da matéria. Nada se passa no mundo sem que antes passe pelo pensamento e, este emite vibrações que são captadas por espíritos desencarnados inferiores e superiores, como também, por outros encarnados. Foi, também, dado o necessário destaque à lei das afinidades espirituais. Neste contexto, tanto para o bem como para o mal, insere-se a realidade da mediunidade e a importância de seus efeitos na humanidade em geral, destacando-se obviamente, o papel dos médiuns.

Após descrevermos os diversos tipos de mediunidade, tratamos de questões como o conhecimento que os médiuns devem ter sua disciplina e método de trabalho, suas responsabilidades, qualidades desejadas e evolução mediúnica. Especial atenção foi dada, também, ao mal da ignorância espiritual e aos grandes transtornos a que a humanidade está sujeita por não procurar conhecer-se a si mesmo como Força e Matéria.

 

13. A intuição: nossa bússola

 

Vimos que a intuição é uma forma indireta de conhecimento e que manifesta-se por meio de insights, flashes ou lampejos. A captação das imagens assim apreendidas acontece muito rapidamente e o raciocínio que daí decorre é do tipo intuitivo, levando a pessoa a um discernimento instantâneo com a percepção integrada do problema.

Aprendemos, também, que as pessoas que estão sempre abertas ao novo e gostam de experimentar não são muito comuns. Para essas pessoas, sem desenvolverem nenhum pensamento analítico, a intuição é um recurso súbito e até instantâneo que sempre traz solução aos problemas, desde que a pessoa se convença de que se trata de uma boa intuição e a coloque em prática, sem titubear. Sendo a intuição uma percepção ampla, é necessário não perder-se em minúcias e detalhes.

 

14. O livre-arbítrio constrói o destino

 

Vimos que são, ainda, poucas as pessoas que têm a exata noção do valor do livre-arbítrio e sabem bem usá-lo com responsabilidade. É, ainda, grande o número de pessoas que não sabem raciocinar, deixando se prender por velhos pensamentos, maus hábitos e falsas concepções e acabam deixando se envolver por pensamentos alheios, sem uma filtragem adequada. Essas pessoas não aplicam o raciocínio por causa destas limitações e, dificilmente, alcançarão a plenitude do poder do raciocínio. Isso limita ou condiciona o seu poder de escolha, ficando prejudicado o exercício do livre-arbítrio.

São muitos os males causados pela ignorância do que é o livre-arbítrio para o viver humano. Por isso mesmo, muitas são as encarnações perdidas em sucessivas etapas. Muito se avançaria, se a humanidade procurasse compreender que o perdão realmente não existe e trocar essa idéia absurda pela compreensão do que seja o livre-arbítrio e procurasse utilizá-lo com coerência e responsabilidade. Assim, muitas reencarnações, pelas quais a humanidade paga um preço bastante alto, seriam evitadas.

Em resumo, o livre-arbítrio, junto com o pensamento, é um dos melhores instrumentos de que dispõe a pessoa para aprender e ensinar as lições da vida com grandeza de espírito, com humildade e muito amor, abreviando assim, o tempo necessário para a plena e total evolução espiritual.

 

15. Casos sugestivos de reencarnação

 

Aqui neste capítulo, demos muita ênfase aos trabalhos de Ian Stevenson que, desde a década de 1960, vem estudando casos de reencarnação em crianças, em vários países do mundo. Analisamos alguns casos relatados em três de seus livros e tivemos acesso aos dados de uma entrevista sua.  É claro que Stevenson recebeu muitas críticas. Seu crítico mais feroz crítico, Paul Edwards (1996) enfatizou que Stevenson não fez nenhum esforço para explicar o que é a alma e o que acontece com a “entidade” enquanto não encarna e, ainda, qual o mecanismo de conservação de parte da memória que teve na vida anterior. Na nossa presente obra, sob o enfoque espiritualista, explicamos estas questões satisfatoriamente.

Stevenson, em seus quarenta anos de trabalho, reuniu um acervo consubstanciado em mais de 2500 casos, dos quais ele estudou e vem acompanhando cerca de um terço, deixando o restante para seus colaboradores e seguidores. Em muitos momentos sombrios, Stevenson sentia-se como um banido, um herético condenado por suas afrontas à ortodoxia científica. Mas, sempre foi um homem determinado, reservado, escrupulosamente honesto e disposto a revelar as verdades que ia colhendo em suas pesquisas de campo. Enfim, é um cientista, cujos propósitos merecem toda nossa boa fé.

Neste mesmo capítulo, mostramos os importantes trabalhos que vêm sendo realizados por Gary E. Shwartz e sua equipe, examinando a mediunidade e testando médiuns em experiências de laboratório. Os resultados obtidos, sob rigoroso controle experimental, são surpreendentes. 

Apresentamos, também, uma estatística apresentada pela Dra.Helen Wambach, psicóloga americana, que não tem nenhuma vinculação com doutrinas espiritualistas, oriunda de entrevistas realizadas com 1088 pacientes, aos quais aplicou terapia de regressão às vidas passadas. Segundo ela, os dados colhidos são reveladores da existência da vida além da morte.

 

 16. Experiências de quase-morte

 

Foram numerosos os trabalhos consultados em livros e na Internet. As estatísticas feitas pelo Dr. Pim Lommel, na Holanda, ouvindo 344 pessoas declaradas clinicamente mortas, indicaram que 18% delas passam por experiências de quase-morte. Uma outra estatística feita com 626 casos de pessoas declaradas clinicamente mortas, nos Estados Unidos, sob a coordenação de Jody A. Long, indicou que 90% passaram por uma experiência de quase-morte e dessas, 17% mudaram de crença para a espiritualidade. 

A principal conclusão que podemos tirar desses e de numerosos outros estudos cuidadosos, sérios e representativos é que as experiências de quase-morte deixam uma marca profunda na mente das pessoas, levando-as a refletirem sobre aspectos da vida fora da matéria, da Força Inteligente (chamem-na de alma, espírito ou consciência).

Destacamos que, praticamente em todos os relatos, as “pessoas” ou partes delas conservam as suas percepções e sentidos, ainda que afastados do corpo físico. Na doutrina espiritualista, a explicação reside no segundo corpo ou perispírito, que não só retém a memória e os sentidos como os aguça com extrema nitidez. Há casos de pessoas completamente surdas, que ouvem durante a experiência de quase-morte sem precisarem dos ouvidos físicos e, também, de pessoas completamente cegas, que enxergam durante as experiências de quase-morte, sem precisarem dos olhos da matéria.

Destacamos, também, outra conclusão importante, que nos leva a refletir, refere-se à perda do medo da morte, pois, a criatura passa a compreender que a morte não é o fim, mas o princípio de uma nova vida espiritual e representa apenas uma linha demarcatória entre o mundo do ponderável (da matéria) e o mundo do imponderável (do espírito). Mas, estas noções de espiritualidade são apenas o começo de muitas revelações que hão de vir na medida em que a ciência se concentrar nos estudos dos fenômenos invisíveis que ocorrem fora da matéria e provêm da realidade espiritual do ser.

Muitos cientistas não duvidam mais da colossal quantidade de evidências observadas nos relatos de experiência de quase-morte. Resta, apenas, adaptar sua metodologia cientifica para esses e outros assuntos paranormais e transcendentais, que estão demandando a confirmação da Ciência, dentre eles, o estudo da mediunidade, a natureza do espírito, o pensamento, etc.

Não importa se a Ciência venha intrometer-se no campo psicológico e vice-versa; o que interessa é dar resposta cabal, inquestionável a esses assuntos de tanta relevância para a humanidade que está carente desses conhecimentos.

 

17. Regressão às vidas passadas

 

Finalizamos fazendo algumas reflexões importantes sobre essas técnicas apresentadas no capítulo 17 – Regressão às vidas passadas de nossa obra, hoje tão difundidas na nossa cultura como um dos processos conhecidos de psicologia alternativa, usada com sucesso para curar certos traumas e fobias. Elas indicam que somos seres preexistentes, pois são numerosos os casos que puderam ser comprovados e, isso, surpreende até mesmo os terapeutas. Nós apresentamos dois casos comprovados.

De uma maneira ampla e geral, essas técnicas mostram-nos que somos seres sobreviventes à morte biológica.  Mais que isso, estas experiências alertam-nos sobre a realidade das intervidas, ou seja, vivemos no mundo dos espíritos ou plano espiritual antes de decidirmos voltar a um novo corpo material (reencarnar), para novas experiências de aprendizado e aperfeiçoamento sob a mesma individualidade espiritual. Porém, muitas pessoas encaram a regressão às vidas passadas apenas como indícios de reencarnação e não como evidências.